Eles chegaram ao banco discretamente, tentando manter-se longe da imensa massa de repórteres que se aglomerava em frente ao prédio. Mas é óbvio que não conseguiram. Por que esses malditos bancos tem que ter uma única porta? Nick pensou. A pergunta era retórica, claro. Ele sabia que era por segurança, mas seria ótimo se houvesse uma entrada mais discreta.

No fim Nick e Judy, rostos já conhecidos da multidão, tiveram que fazer as suas caras mais confiantes e atravessar o pandemónio sem dar mais declarações. Isso fazia Judy lembrar da fracassada tentativa de entrevista que ela dera durante o seu primeiro caso.

Os repórteres a cercando.

Nick indo embora.

Judy sacudiu a cabeça levemente, percebendo que havia parado por um momento. Fez uma nota mental de descobrir por que cargas d’água ela parava de andar toda a vez que tinha uma lembrança vívida. E deu graças à Deus por ninguém ao seu redor poder ler pensamentos.

Além da cacofonia terrível de perguntas sobre o caso atual, Judy ouviu vários comentários preconceituosos e perguntas sobre o seu casamento com Nick. Já faz um ano!— Ela pensou - será que esse povo não tem nada melhor pra pensar?

Judy descobriu Nick a encarando, e corou. Por que ela sempre tinha que corar? Não é como se fosse a primeira vez que ele te olha, coelha boba! - ela se recriminou - estamos casados a mais de um ano!

Eles finalmente chegaram às portas do banco e entraram, respirando fundo depois de passar pela porta de vidro. A primeira coisa que fizeram foi procurar Jack Savage. O agente atendia um telefonema num canto do saguão, por isso Nick e Judy esperaram à certa distância. Apesar do gesto educado, Judy se esforçou para ouvir a conversa.

Uma das vantagens de ser uma coelha.

— Eu sei, velho amigo, não se preocupe. – O jaguar parecia à vontade ao telefone – eu vou cuidar disso pessoalmente.

— Waesel... – Judy não conseguia ouvir tudo o que o “amigo” do Agente falava do outro lado da linha – poderia... Problemas.

— Ah, culpa daquele idiota que você mandou atrás deles, ele é um espião, não um maldito fuzileiro! Só serve pra seguir alguém, precisaria de uma carta do presidente ou uma boa maleta de dinheiro pra executar o serviço. – Jack falava em um tom descontraído e baixo, pelo que Judy percebeu que nem Nick podia ouví-lo.

Ela o cutucou.

— Finja que está conversando comigo quando ele olhar pra cá! – sussurrou.

Nick deu de ombros.

— Que eu saiba, eu estou conversando com você.

Judy lhe lançou um olhar fulminante.

— você entendeu!

Ela esticou as orelhas, encostada próximo à parede de mármore travertino branco.

—... Ser... Alfa 2 – ela ouviu a voz do correspondente de Jack.

Jack não se despediu de quem quer que fosse o cara do outro lado, apenas desligou o telefone subitamente e dirigia-se à saída quando os policiais o alcançaram.

— Agente Savage! – Judy abordou o jaguar que sorriu.

— Me chame de Jack. – ele lançou um olhar divertido a Nick. – vocês dois me chamem de Jack.

Jack— Judy disse – enquanto almoçávamos, nós pensamos muito sobre o caso até agora.

O olhar da coelha era quase tão afiado e penetrante quanto uma espada lilás em chamas.

— E decidimos... – Nick começou, encarando o jaguar com os olhos semicerrados –... Que não vamos ser apenas os rostos nos jornais.

Jack não parecia ter entendido.

— Não sei se vamos chegar a algum lugar – Judy disse, determinada – mas vamos ajudar a solucionar esse caso, ou estamos fora.

O agente parecia estar se segurando para não rir. Nick não lhe deu tempo para tentar.

— A questão é a seguinte, Savage: Nós somos um raposo e uma coelha com mania de grandeza, e não vamos aceitar sermos fantoches da ZIA só porque um agente nos chamou. Temos nossos próprios meios de resolver as coisas.

Se Jack sentiu-se ofendido, não revelou.

— Vocês acham que seriam ao menos minimamente capazes de resolver um caso que os melhores peritos do mundo não conseguiram até agora?

Judy fez a sua expressão mais desafiadora.

— Quer apostar?

O agente deveria estar achando aquela afirmação infantil e ridícula. Pelo menos, é o que Nick acharia se alguém lhe dissesse isso. Mas o jaguar só bufou.

— Ótimo. Vocês estão dentro. – ele disse – desde que meus superiores não fiquem sabendo, eu posso mostrar a vocês os recursos que temos à disposição. Mas que fique claro: vocês estarão por conta própria. Nada de reforços, nem suporte técnico. Vão estar praticamente no escuro, a não ser quando eu puder ajuda-los. E só poderão contar com o que já sabem sobre o caso, e o que eu puder fornecer.

Judy teve uma lembrança tão vívida que teve quase certeza de que os outros podiam ouvir a voz em sua cabeça.

Ela fitara profundamente a ficha aberta sobre o balcão.

— Pistas, zero, Testemunhas, zero, e ainda não está nem no sistema então, recursos... Zero! – Garramansa havia dito.

Judy de por si de volta ao presente, sussurrando.

Só espero que a sua carreira não dependa desse caso...

Nick olhava para ela sorrindo. Ela não pôde conter uma gargalhada.

— Agora só falta um prazo absurdo pra aumentar a pressão. – ela disse, entre risos – como 24 horas, dessa vez.

Nick pôs as mãos na cintura, erguendo uma sobrancelha.

— Eu me contentaria com 48.

— Ah, cale a boca, esse já um velho conhecido. – ela virou-se para o felino negro – estamos dentro, Jack Savage. E já temos uma pista.

***

— Então, onde fica a casa desse cara? – Nick estava ao volante dessa vez, mascando um chiclete enquanto rodava pela rua larga.

— A mansão dele. – Judy se esticava no banco para alcançar a tela do GPS. – ele mora em frente ao rio na Hightown, perto das corredeiras.

Nick fitou a coelha por um momento, impressionado.

— Na Hightown? – ele questionou – achei que lá só houvessem restaurantes finos e condomínios de luxo.

Judy puxou o cinto de segurança para o lado, ajeitando- o ao seu pequeno corpo.

— É a única mansão, e inclusive, tá mais pra um palácio.

Eles haviam conseguido aquele endereço depois de uma procura rápida nos arquivos da polícia. Extraoficialmente, aproveitaram para avisar Bogo que não voltariam ao ZPD até a conclusão do caso, e que se alguém viesse perguntar, desse uma desculpa qualquer como “não estou autorizado a comentar sobre investigações em andamento”.

Quando o búfalo descobriu que eles estavam trabalhando com Jack Savage, ele quase surtou, e eles tiveram que desconversar antes que o chefe descobrisse qe eles tinham o número do celular de Jack. Bem, um dos números de um dos celulares, mas já contava.

— Então... – Nick falou, olhando para a frente – Você acha que essa pista vai levar a algum lugar? Quer dizer, a família do cara era dona do cofre a umas cinco gerações, e tal, mas agora o cofre pertence ao senador Miller. Quanto mais penso sobre isso, mais sem sentido essa história parece.

Nick virou a esquina, ainda olhando fixamente para o cainho em frente. Judy exibiu a sua expressão de quem não entendera nada.

— Como assim, sem sentido? – ela disse – você não prestou atenção?

Nick desviou um carro de girafas que freou bruscamente e sentiu-se tentado a descer aplicar-lhes uma multa, mas acabou apenas buzinando.

— O que disse? – ele perguntou.

— O nome do Antigo dono do cofre é Gregory Lions.

Nick fez uma expressão de espanto.

— Da Lions & Roars* Company?

— Exatamente – Judy disse – A marca de armamento e munição mais vendida do mundo, na frente até da Lincester**.

— Retiro o que disse. Se Lions roubou esses planos, será a espionagem industrial mais lucrativa da história. – ele suspirou. Suspirara demais nessas últimas três horas. – tem certeza que não quer deixar a ZIA cuidar disso?

— E perder a ação? – Judy olhou para ele com o olhar mais sarcástico que sabia fazer – Se tivesse algum malandro por aqui que não fosse tão covarde...

— “Se tivesse algum malandro por aqui que não fosse tão covarde...” – Nick imitou a voz de Judy – Você não pode ficar no meu pé pra sempre!

Judy exibiu-lhe a aliança.

— Pra sempre não. – ela afirmou – Só “até que a morte nos separe”.

— Muito engraçado. – Nick disse – muito mesmo.