Os pneus derraparam quando Judy fez a curva sobre o gramado perfeitamente aparado de Gregory Lions, destruindo tudo pelo caminho. As balas continuavam chovendo sobre o veículo, obrigando a coelha a serpentear. Nick resolveu que era melhor pôr o cinto. Ele não sabia, mas pouco tempo depois se arrependeria amargamente dessa decisão.

Judy começou a dar a volta na casa, os pneus traseiros deixando para trás trilhas escavadas na grama. A coelha olhava atentamente em volta, procurando uma saída que não fosse o portão principal. Tinha alguns minutos, no máximo, antes que Jack recobrasse a consciência e mandasse helicópteros atrás dos dois. Ela acelerou um pouco mais, aproximando-se da linha das árvores do bosque particular de Lions.

Então foi cegada por uma explosão de luz. Dezenas de holofotes apontados em sua direção acenderam ao mesmo tempo, penetrando sua retina com mais de 6000 watts de luz branca. Instintivamente, Judy fechou os olhos e abaixou o rosto, enquanto virava o volante e fazia o carro dar uma volta de 180 graus.

O pequeno utilitário quase capotou. Judy abriu os olhos devagar, com manchas coloridas toldando a sua visão. Piscou pra se livrar delas, mas elas insistiram em continuar ali. Certa vez, quando era criança, Judy apostara com um de seus irmãos para ver quem ficava mais tempo olhando para o sol. Ela apenas olhara para cima por alguns segundos, mas ficara mais de quinze minutos com manchas verdes na visão. De alguma forma, aqueles holofotes foram piores do que isso. Os seus solhos começaram imediatamente a doer. Judy esfregou os olhos.

— Hey, Cenourinha – Nick disse – Tudo bem?

Nick estivera olhando para o computador, por isso as luzes não haviam lhe causado nenhum mal. Ainda com as manchas verdes toldando a sua visão, Judy olhou para o aparelho. Isso não melhorou a situação.

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00h: 45m: 20s

A coelha pôs as patas sobre o volante que trepidava levemente. Piscou mais algumas vezes, gesto que apenas pareceu piorar as manchas em sua vista, e acelerou novamente, deixando para trás uma trilha luminosa e dezenas de alarmes. Maldita casa enorme – Judy pensou, enquanto procurava uma saída e rodeava a mansão. Passaram pela porta pela qual haviam entrado na casa.

Então Judy viu, logo depois da esquina seguinte das paredes da mansão. Aquela parede parecia entrar no pequeno bosque que ficava dentro dos limites do terreno. O gramado desaparecia perto do fim da parede, que terminava em uma enorme porta fechada e uma pequena estradinha que seguia para dentro da mata.

Parecia uma estrada de manutenção ou... Ah.

Uma estrada de serviço. Os jardineiros, paisagistas e eventuais encanadores e pedreiros deveriam entrar por ali. Judy deu graças por Lions ser tão cuidadoso com a estática, pisando fundo no acelerador e entrando no bosque.

Assim que o carro preto que a coelha dirigia desapareceu sob as árvores, um potente canhão de luz começou a varrer o gramado à sua procura. Judy acelerou ainda mais quando o helicóptero passou perto do lugar onde eles estavam. Jack devia ter chamado reforços.

A estrada era mais longa do que parecia, cheia de curvas, e Judy começou a ficar realmente impressionada com as dimensões da casa daquele leão. Haviam percorrido pelo menos um quilômetro desde que entraram na estrada quando viram o portão. Diferente do portão da frente, esse era feito com uma armação de tubos de aço e tela de arame galvanizado.

O único problema eram os quatro carros pretos do outro lado. Jack havia fechado todas as saídas da mansão. Os agentes nos carros do outro lado saltaram de seus veículos com armas à postos. Judy olhou para Nick, pera o computador e depois para o portão.

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00h: 13m: 09s

Ao invés de parar, Judy continuou com o pé no acelerador. Nick encolheu-se no assento quando o carro atingiu o portão, arrebentando o cadeado que o segurava fechado e fazendo cada lado soltar-se violentamente e voar em uma direção.

Um dos lados do portão atingiu o primeiro carro preto e o agente que estava agachado atrás dele. O outro perdeu-se no mato. Judy não teve tempo de pensar. A estrada estava completamente bloqueada pelos veículos dos agentes, por isso ela vez uma curva suicida e jogou o carro dentro do bosque. Por sorte, as árvores eram espaçadas o suficiente para que ela conseguisse passar.

Assim que entrou no bosque, pôde ouvir os agentes acelerando atrás dela. O chão era completamente irregular, coberto de raízes e buracos, mas isso não impedia Judy.

— Judy, olha a árvore! – Nick gritou, enquanto a policial desviava o tronco por centímetros e perdia um espelho retrovisor – O buraco! Esquerda! Olha a pedra!

Judy desviava de todos os obstáculos, tentando manter a velocidade alta. Os tiros varando a traseira do carro não ajudavam. O pneu dianteiro bateu em uma raiz, fazendo o carro derrapar para a direita, e colidir com uma árvore, quebrando a Janela do passageiro e amassando a porta à cerca de dois palmos do braço de Nick. Judy passou por uma poça de lama, entrando em uma clareira, com os perseguidores a apenas cem metros de distância. Nick desviou os olhos do caminho, olhando para o notebook.

A luz verde ainda estava acesa, indicando que o sinal de wi-fi ainda podia ser alcançado. Mas como? Nick pensou. Rodamos mais de um quilômetro! Então olhou para o lado. A menos de duzentos metros, á sua direita, a mansão de Lions se destacava, totalmente iluminada. Nick teria dado um tapa na própria testa se não estivesse tão desesperado. Por isso a estrada tinha tantas curvas. Eles haviam rodado mais de um quilômetro ao redor da mansão de Lions. Nick olhou para a tela.

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00h: 02m: 34s

— Cenourinha, temos um problema.

— Temos vários problemas! – Judy falou – de qual deles você está falando?

Nick apontou a casa enorme ao seu lado. O helicóptero que a sobrevoava começou a vir na direção deles. Um tiro estraçalhou o outro espelho retrovisor. Judy entrou na floresta de novo, e as árvores voltaram a esconder a mansão. Ela desviou um tronco caído e espremeu o carro entre duas pedras. Uma motocicleta subitamente apareceu ao lado deles, com dos mamíferos sobre ela. O motorista ( uma loba ) desviava as árvores e buracos enquanto o garupa (uma chita) atirava. Judy guinou o carro para longe delas, mas elas continuavam os seguindo.

As balas quebraram as janelas de trás, esburacando os bancos traseiros. Um tiro errou a cabeça de Judy por pouco, abrindo um buraco no para-brisa e rachando todo o vidro, o que dificultou a visão da coelha ainda mais. Ela deu graças quando um galho bateu no vidro, estilhaçando-o em um milhão de caquinhos.

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00h: 01m: 21s

O sinal ainda era forte ali. Nick começou a pensar furiosamente. Tudo parecia impossível. Outra bala passou raspando por suas orelhas e saiu pela janela quebrada. Judy acertou outra raiz, batendo a porta de Nick novamente. E então viu. Cerca de quatrocentos metros à frente, estava o rio.

— Judy! Nick gritou. – O rio!

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00h: 00m: 45s

— Eu tô vendo! – ela devolveu.

E Nick se lembrou da caixa. A caixa que Jack havia entregue. Era sua última esperança.

Ele a tirou do bolso, atrapalhando- se com o fecho. Judy viu o que ele estava fazendo e viru-se para ele, quase acertando uma árvore novamente.

— Jack te falou como funciona esse troço? – ela gritou.

Jack falara algo confuso sobre elétrica... Eletrônica? Eletromagnética?

— Eu não sei! – ele só ficava repetindo pra só usar em último caso, por que ia cortar a comunica... – o carro afundou num buraco, cortando a frase de Nick e o fazendo morder a língua. Judy olhou para o rio cada vez mais próximo, depois para o notebook.

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00h: 00m: 21s

— Acho que isso se encaixa em “último caso”! – ela disse.

— Mas foi o Jack quem deu! E se...

— Aperta logo esse botão!

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00h: 00m: 10s

Nick procurou o botão na caixa. Uma bala acertou o painel à sua frente, e Nick derrubou o cubo de plástico. Abaixou- se para pegar a caixa no chão do veículo, que sacolejou novamente, arrastando- a para baixo do banco.

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00h: 00m: 06s

Nick esticou-se ainda mais para pegá-la, mas o cinto o segurou. Ele puxou a faixa de tecido para o lado, estendendo o braço ao máximo...

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00h: 00m: 05s

As pontas de suas garras atingiram algo. O carro deu outra guinada repentina, e a caixa escorregou para trás, caindo entre o extintor de incêndio e o trilho do banco.

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00h: 00m: 03s

A raposa contorceu-se, puxando o cinto para o lado de novo e abaixando-se sobre o freio de mão, tateando a parte de trás do banco.

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00h: 00m: 01s

Nick puxou a caixa para a frente, pegando- a do chão e segurando firme.

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00h: 00m: 00s

O cubo de plástico preto tinha um discreto botão preto protegido por uma tampa transparente. Nick retirou a tampa.

Nick olhou para o notebook. A mensagem mudara.

PREPARANDO PARA ENVIAR...

ESTABELECENDO CONEXÃO...

ENVIANDO... (12%)

— Não! – Nick gritou – Não!

Ele apertou o botão.

Então várias coisas aconteceram ao mesmo tempo.

O computador no colo de Nick chiou e estalou, e a tela ficou preta. Faíscas pipocaram entre as teclas. No mesmo instante, faíscas explodiram no painel do carro, e todos os medidores a pagaram, Juntamente com os faróis. O ar se encheu com eletricidade estática, arrepiando os pelos de Nick.

A motocicleta se aproximou de novo, mas teve que desacelerar por causa de uma grande pedra. O tiro que deveria acertar Judy foi desviado para trás.

E a bala atingiu o tanque de combustível.

O mudo desacelerou, enquanto as faíscas que cercavam o carro naquele momento começaram uma reação em cadeia. A direção do carro travou, fazendo Judy perder o controle. As rodas dianteiras ficaram presas em uma vala, erguendo o eixo traseiro do veículo.

A moto caiu, e seus ocupantes voaram para longe dela.

Eles nem chegaram ao chão antes do tanque de combustível explodir, lançando o para-choque traseiro para o alto.

E o carro em chamas caiu no rio, espalhando os focos de incêndio correnteza abaixo, enquanto a carcaça de metal era arrastada em direção ás corredeiras.