Yu-Gi-OH! - Hollow Fighters

Vol. 1: "... Mas poucos são escolhidos"



OST: Florence – Adult Life

— Você está vendo, não tá vendo?

— Vendo o que seu velho biruta?

— Olhem ali, seus merdas! Para lá!

Tsuguhiko segurou ambos os internos pelas bochechas e os apontou na direção do campo de trabalho

O Centro de Detenção de Kosuge era uma prisão que prezava pela reabilitação dos presos através do seguimento da ordem, dos bons relacionamentos e ser produtivo para sociedade, e uma das maneiras que a instituição encontrou para aplicar esses três métodos foi colocar todos os prisioneiros para trabalhar duro.

Kosuge possui um campo de trabalho braçal para prisioneiros que mais parecia uma fazenda particular, com direito a celeiro, silo e hortas em abundância (muito provavelmente cultivadas por internos veteranos). Agora no campo estavam espalhadas diversas figuras trajadas de preto e branco vigiadas por homens fardados. Pelo terreno era possível ouvir os gritos do oficial chefe, dando ordens e instruções para que os presos fizessem corretamente o seu trabalho.

Tsuguhiko, Tashiro e Kawata eram alguns dos que estavam debaixo daquele sol quente, empunhando enxadas para arar a terra, mas naquele momento pouco importava as ordens de merda que aqueles malditos guardas cuspiam para ele, o que era de interesse agora para o ex-duelista era aquela joia bruta que havia acabado de chegar. Ele não o conhecia, sequer sabia o seu nome, mas o velho homem tinha a certeza absoluta de que aquele era o escolhido e seus colegas precisavam saber disso.

Por mais que Tashiro e Kawata fossem absolutamente incompetentes para entender qualquer coisa que Tsuguhiko balbuciava.

— O que? Você está falando do novato? – Perguntou o rapaz de cabelos ralos – E o que tem ele?

— Desde que ele chegou o velho ficou maluco – Disse o homem de quase meia idade já voltando a fazer seu trabalho com a terra – Tá parecendo minha filha com os idols pop dela, hahaha!

— Que mané idol pop! Eu não quero saber dessas futilidades, mas sim de um talento real para o jogo! – Gritou o velho homem em protesto aos comentários dos colegas – Meus sentidos de duelista podem estar atrofiados, mas em todos esses anos eles nunca mentiram pra mim!

— Hehehe, ei velho acho que o sol tá torrando seu cérebro – Comentou o mais jovem.

— Pois é, tente descansar um pouco, você tá suando bastante, desse jeito vai sofrer de insolação.

— Porra de insolação o que! Eu nunca estive tão vivo quanto hoje!

— Ei vocês três, parem de conversinha fiada e voltem ao trabalho! – Gritou um dos vigias próximos ao trio de detentos.

— S-sim senhor! – Responderam Kawata e Tashiro fazendo uma saudação para o homem e logo retomando o trabalho com suas enxadas.

Tsuguhiko não teve opções a não ser bufar e voltar ao seu trabalho, mas ainda assim ele não conseguia desvincular seus velhos olhos do jovem de cabelos longos, precisava se aproximar dele de alguma forma. O ex-duelista cruzou seu olhar pelo campo de trabalho procurando por alguma solução, uma forma de chegar até ele, e viu que o rapaz estava responsável pela distribuição de sementes, logo uma ideia passou pela sua cabeça.

— Ei senhor guarda.

OST: Kaiji – Wish

— Qual o problema, 746? – Respondeu o guarda. Nenhum oficial em Kosuge era permitido de chamar os detentos pelo nome, apenas pelo número do uniforme.

— Eu estou começando a ter dificuldades aqui com a enxada… Minhas costas estão doen-

— Não me venha com desculpas para burlar o trabalho, eu estou ciente do seu histórico, 746!

— Não! Não! Não! Eu não estou falando disso, eu só queria saber se eu podia pegar um trabalho mais leve, como distribuir sementes, hehehe… – Comentou o velho homem com um sorriso amarelo para o guarda.

— Hum… Me de um minuto – O guarda apertou o botão do comunicador preso ao colete – Senhor o detento 746 quer saber se pode trocar de função por hoje… Ele comentou que está com problemas na coluna senhor… Sim senhor entendido…

— E então…

— Foi aprovado, vou pedir para o 822 trocar de lugar com você, me siga.

— Como quiser senhor.

Uma das principais armas de um duelista é a sua capacidade de manipular o quanto de informação o seu oponente receberia durante um duelo e decidir quanto dessa informação é mentira, e por isso Tsuguhiko como um duelista experiente se tornou um expert em conseguir a empatia dos outros ao seu redor, as rugas e a catarata deveriam servir para alguma coisa. Como de praxe, o homem de idade avançada entorta as costas e se encolhe dentro do próprio espaço, simulando o semblante perfeito de um pobre coitado.

Claro que para Tashiro e Kawata isso apenas gerava revolta nos dois, já haviam perdido as contas de quantas vezes tiveram de ficar com todo trabalho enquanto Tsuguhiko ia descansar debaixo de alguma sombra com um estoque de rabanetes recém-colhidos. Tashiro até tentou simular essa mesma estratégia, mas ele não era tão velho e nem um bom ator. Já com Kawata, calvície não era um bom motivo para pular o trabalho, fora que o jovem tinha um porte relativamente atlético, os guardas não iriam dispensar alguém do trabalho nessas condições.

O ex-duelista sorriu vitorioso debaixo da carcaça de coitado enquanto olhava de canto para os dois colegas, se divertindo com seus olhares de óbvia indignação. Não demorou muito até ele cruzar o campo junto ao guarda e parar em frente ao cercado de madeira que dava a volta no que seria uma futura horta.

— Ei, 822! - Gritou o Oficial.

— Hum? Algum problema senhor, guarda? – Tsuguhiko quase deu um pulo para trás quando viu o porte do prisioneiro que se apresentou diante do guarda.

Um rapaz alto de cabelos castanhos e olhos chocolate, devia ter um pouco mais que um metro e noventa, seu torso era robusto e a sua barriga inchada. Seu queixo era quadrado e coberto por costeletas que desciam das laterais e formavam uma barba, fora isso não existia qualquer resquício de um bigode abaixo do nariz de batata do rapaz.

— Vamos estar movimentando o senhor, irá começar a arar o campo – Respondeu o oficial.

— Err… Mas me disseram que faz parte do protocolo, os novatos podem escolher onde trabalhar na primeira semana – Contestou o gigante.

— Seria esse o caso, mas o interno 746 está com problemas de espinha, como pode ver ele já é um senhor de idade…

O brutamontes voltou seu olhar para Tsuguhiko que imediatamente se encolheu ainda mais no seu casco imaginário, como uma verdadeira tartaruga.

— E nós já temos muitas pessoas trabalhando com as sementes hoje – Explicou o homem fardado – Mas se não estiver contente em trabalhar com a enxada posso falar com o comandante para lhe designar outra função.

— Entendo… Nesse caso, tudo bem se eu puder trabalhar com os porcos hoje? – Perguntou o homem com um grande sorriso no rosto.

“Com os porcos?” Pensou Tsuguhiko.

— Com os porcos? – Perguntou o oficial em voz alta. O que já era de se esperar, não existia detento naquele maldito presídio que gostasse de chegar perto do chiqueiro – Tem certeza disso?

— Tenho sim, eu adoro animais, mas eu vi que parece já ter muita gente no celeiro hoje – Respondeu o gorila – Mas não vi quase ninguém passar pelo chiqueiro.

— E-entendo, nesse caso não deve haver problemas – O oficial então se virou para Tsuguhiko – 746 você já sabe como proceder, pegue as sementes e comece a espalhar.

O ex-duelista nem demorou e já foi entrando no cercado, passando pelo oficial e o gigante que deu passagem para ele.

— Quanto a você, me siga. Vou te passar suas instruções.

— Está certo senhor… Ei Kouda ojou-chan, boa sorte com as sementes!

— Eu já disse pra não me chamar disso, seu bosta! - Gritou o rapaz alvo da fixação de Tsuguhiko.

“Então seu nome é Kouda?” Pensou ele.

— Vai se divertir com seus parentes! – Gritou Kouda.

— Hahaha! Está melhorando seu senso de humor, cabeludinha, continue assim – Após esse último comentário, o brutamontes se direcionou ao chiqueiro junto do oficial.

O velho agilmente foi até o saco de sementes e encheu sua bolsinha até a boca, depois correu até onde havia visto o novato pela última vez. E lá estava ele, vestindo o uniforme da prisão com o número 681 marcado neste, ele estava quase terminando uma fileira para ir para a próxima leva. Precisava acompanhá-lo.

— B-boa tarde, c-com licença m-meu rapaz… Precisa de ajuda?

— Não preciso, velho. Some - Esse tipo de atitude já era de se esperar, afinal se ele fosse alguém fácil não estaria em Kosuge, mas ainda assim.

“Mas que audácia desse pivete!” Tsuguhiko gritou internamente. Ele não conseguia entender qual a dificuldade que os jovens tinham de causar uma boa impressão, era tão difícil assim tratar bem os mais velhos?

— O-o que? Olha como fala comigo seu pirralho! – Gritou Tsuguhiko tentando conter a vontade de dar um tapa no pé da orelha daquele garoto – Não sabe tratar os mais velhos com respeito, não?

— Eu nem sequer te conheço, por que eu deveria ser respeitoso com você? Ainda mais alguém com esse uniforme…

— Olha quem fala!

— Em momento nenhum eu pedi por algum respeito seu – E mesmo dizendo tudo isso, Kouda não havia sequer virado para olhar o senhor nos olhos.

— Tsc… Pirralho insolente, que seja então – Gritou o ex-duelista, que começou a plantar as sementes imediatamente.

— Eu já não disse pra sumir? – Perguntou Kouda com uma voz mais raivosa.

— Você não demonstra respeito por mim, então eu não preciso ter qualquer apreço pela sua pessoa, vou trabalhar onde eu quiser!

Tsuguhiko não conseguiu ter nenhuma reação ao que veio a seguri. Kouda agarrou a gola de sua camisa listrada e o puxou. O jovem não era tão alto quanto aquele gorila que virá a alguns minutos, mas era alto o suficiente para tirar os pés dele do chão apenas o agarrando pelo colarinho.

— Eu vou te fazer engolir essas sementes se não sumir da minha frente, velho! Já está começando a encher meu saco!

— Tenta a sorte, pirralho! – Respondeu no mesmo tom de voz agressivo. Tsuguhiko já tinha visto de tudo em sua vida, não era um pirralho que iria lhe assustar – Você sabe quem eu sou? Tem a mínima ideia? Para estar fazendo isso eu tenho certeza de que-

— Eu não to nem ai para quem você é, velhote!

— Pois deveria! Você é apenas mais um sujeitinho nojento que chegou nesse fim de mundo por ter feito alguma merda lá fora, não é diferente de mim ou de qualquer outro – E mais uma vez o talento nato com as palavras de Tsuguhiko entrava em ação – A única diferença entre mim e você aqui dentro é que eu estou nessa espelunca a bem mais tempo e pode apostar que esses anos me deram experiência o suficiente para FODER com a vida de mimadinhos que nem vo-

A fala do ex-duelista então foi interrompida quando sentiu um impacto contra o seu estômago que quase o fez vomitar o arroz frito que havia comido mais cedo. Olhou para baixo e viu o joelho de Kouda encaixado contra o seu estômago. Depois um empurrão veio que o fez ir de encontro ao chão de terra, derrubando as suas sementes.

— Cof! Cof! Cof!

— Ei vocês aí, o que tá rolando? – Gritou o guarda do lado de fora do cercado! – Sem confusões durante o trabalho!

— E vo-

— Está- Cof! Cof! E-está tudo b-bem! – Tsuguhiko interrompeu o jovem de cabelos longos. Sabia que ele faria besteira, os guardas de Kosuge conseguem ser muito violentos quando querem, principalmente com novatos que os desafiam, e o velho não podia deixar com que essa jóia bruta fosse danificada. Por mais que odiasse essa atitude infantil, aquele temperamento forte poderia se tornar uma qualidade no campo de batalha – Acabei engolindo uma mosca e o Kouda-kun quis me ajudar.

— Você tem certeza? – Perguntou o guarda olhando para Kouda e depois para o ex-duelista.

— T-tenho sim, hehe… – Respondeu Tsuguhiko enquanto se levantava com a mão sob a barriga – Eu que indiquei para ele me acertar no estômago já que era o mais perto, eu só não esperava que fosse uma joelhada, mas não posso culpa-lo… Nem todos são formado em primeiros socorros.

— Entendi… Nesse caso, quer que eu o leve até a enfermaria?

— N-não, está tudo bem! Já estou bem melhor, obrigado hehehe

— Certo, nesse caso voltem ao trabalho, os dois! – Ordenou o oficial.

— Sim.

— S-sim…

O guarda se retirou assim que viu ambos os detentos voltarem ao trabalho. Tsuguhiko recolheu o máximo de sementes que haviam caído no chão e retomou sua função com certa dificuldade devido a dor na barriga.

– N-não vai nem me agradecer, seu maldito hehehe – Perguntou o velho.

— Eu não pedi a sua ajuda, coroa – Grunhiu Samson.

— Hehehe, não seja ingrato, rapaz… Criar confusões nesse tipo de lugar é sempre perigoso, você chama muita atenção e ganha muitos inimigos. E nenhum de nós dois quer isso, quer?

— Tsc… Tá você venceu, diga de uma vez o que quer, velho.

Vitória!

— Finalmente estamos chegando em algum lugar - Tsuguhiko sorriu vitorioso – Você meu rapaz… Você tem talento.

— Talento? - O detento levantou uma sobrancelha para o ex-duelista.

— Naquele momento em que você viu através do meu disfarce, você tem uma intuição afiadíssima – Respondeu o homem de idade avançada. Tsuguhiko até ajeitou a coluna corcunda para falar com o jovem – Já jogou Monstros de Duelo alguma vez?

— Monstros de- Pff hahahaha! É sério isso? Hahahahaha! – E então foi isso, o ridículo havia tomado conta. Uma curta risada escapou entre dentes de Kouda, o que pareceu um sinal para que suas cordas vocais trabalhassem a todo a vapor e logo o que era apenas um sorriso de deboche se transformou em uma gargalhada.

O sorriso de Tsuguhiko se desmanchou na hora, aquele tipo de rotina era cansativo demais. Falar com idiotas era sempre cansativo, até porque as reações são sempre as mesmas: “Era isso? Tudo isso por um jogo?”.

— D-do que você está rindo, maldito? – Disse o velho explodindo em fúria.

— Hahaha… Haha… Então era só pra isso? Por uma partida? Fala sério.

Derrota.

— N-não! Eu não tenho tempo para brincadeiras, pirralho! Eu quero mais do que uma simples partida! – Trovejou o velho!

— Ei vocês dois! - E mais uma vez um oficial veio a interromper – Parem de conversa fiada e ao trabalho!

— Tsc… Não podemos falar agora, por favor me dê uma chance! – Implorou o homem – Amanhã durante o horário do intervalo me encontre na biblioteca! Por favor!

O ex-duelista olhou fixo para os olhos carmesim daquele jovem e observou suas olheiras profundas. Ele queria apenas uma chance e nada mais do que isso, seus olhos velhos encolheram e suas rugas se contorceram, simulando um semblante de pura pena. Não esperava ter de ir tão longe, mas Tsuguhiko é um homem que vive em prol de Monstros de Duelo, faz parte de sua essência como um ser humano, e agora que a chance perfeita para retornar a esse mundo está em sua frente ele não iria desistir tão facilmente.

O ex-duelista, uma vez conhecido como “Tsuguhiko do Saque Cometa”, faria de tudo para perseguir seus sonhos, mesmo que isso significasse ter de abrir mão do que sobrou de seu orgulho nessa carcaça enferrujada.

O velho olhou com cuidado as expressões que Kouda fez naquele momento, o jovem olhava o ex-duelista de cima com olhos cerrados e queixo erguido. Tsuguhiko estava sendo julgado pelo mais novo, como um superior olha para seu subordinado atrapalhado. Para o ex-duelista abaixar sua cabeça assim para jovens que não tem nem metade da sua experiência em campo era frustrante, genuinamente doloroso, mas desde que Kouda aceitasse estaria tudo bem para ele.

— Entendo… Bem eu não tenho nada de importante para fazer amanhã, então por mim tudo bem.

Esperança!

— Ah obrigado! Muito obrigado! – Tsuguhiko segurou a mão de Kouda que não carregava a bolsa de sementes e a apertou forte num cumprimento histérico – Eu sou Tsuguhiko Matsuyama, é um prazer enorme poder conhecê-lo!

— Tsc… Que seja – Samson puxou sua mão do cumprimento de Tsuguhiko – Kouda. Kouda Samson.

— Kouda Samson, é um nome forte! Digno de um campeão!

— Tá! Tá! Que seja, agora vamos voltar ao trabalho antes que aqueles guardas venham encher o saco de novo.

— Ah! De fato! – Tsuguhiko então pegou sua bolsa de sementes e retomou o trabalho no campo.

OST: Florence – Inspiration

O trabalho teve fim algumas horas depois, quando o sol já estava se posicionando atrás das montanhas que rodeiam Kosuge, A careca de Nobuhiko finalmente teria um descanso depois de tanto castigo abaixo daquele sol quente. Os guardas foram um a um se espalhando pelo campo, para buscar cada um dos detentos e organizá-los em fileiras, que iriam se direcionar para o banho antes do jantar e por fim, cama.

— Ai! - Gritou Tsuguhiko ao sentir uma dor aguda vinda da sua nuca – O que pensa que tá fazendo, seu maldito?

A fileira de Tsuguhiko havia sido a primeira a ter permissão para se banhar, o que para o velho era ótimo, ele já não aguentava mais sentir as suas roupas colarem no seu corpo, a parte ruim mesmo era “quem” havia entrado junto com ele.

— Te dando uma lição, seu velho de merda – Gritou Kawata – A gente teve que cobrir a sua parte por culpa sua! Agora minhas costas estão me matando!

— Pff, tão jovem e já reclamando de trabalho extra? Sabe que isso fala muito de você mesmo, não é Kawata? – Perguntou o velho enquanto ligava o chuveiro – Aliás me dá um sabonete, você tá com um a ma- Ai

— Enfia no cu! - Esbravejou Kawata após arremessar o sabonete na cabeça de Tsuguhiko – Você fala como se não fosse VOCÊ que fugiu do trabalho braçal!

— Eu não estava fugindo, seu moleque! Eu já disse, eu estava indo atrás de uma joia bruta!

— Aquele garoto novo? – Kawata esfregou o sabonete na sua bucha e passou a ensaboar seu corpo – Até agora eu não entendi qual a sua, tá com tesão nele, por acaso?

— Não, seu imbecil! Eu já disse dezenas de vezes pra você e aquele ignorante do Tashiro que eu estou atrás do talento dele!

— Talento? Pra que? Para Monstros de Duelo?

— Sim!

— E por que isso do nada, porra?

— Eu não sei… É apenas um pressentimento – Era fato, não só a idade, porém tudo o que Tsuguhiko havia passado nos últimos anos, enfraqueceram seu sexto sentido. Por isso que era tão incomum ele sentir algo logo hoje, talvez nem fossem seus sentidos, mas sim um sinal divino para algo maior – Faz anos que meus instintos de duelista não gritam tão alto, eu sinto que preciso dele! Talvez essa seja a minha oportunidade para voltar ao jogo!

— Tsc, fala sério velho…

— Eu nunca falei tão sério na minha vida, Kawata… – Mesmo que a água dos chuveiros de Kosuge estivesse gelada, Tsuguhiko se sentia aquecido, como se algo tivesse ascendido dentro dele, uma chama de esperança havia aparecido.

O velho sentiu o olhar de Kawata pousar sobre a sua expressão, provavelmente estava fazendo uma feição horrível agora, mas não importava as opiniões do ruivo quanto a esses assuntos. Ele nunca poderia entender as suas razões, provavelmente ninguém naquela prisão iria, com exceção de duas pessoas e uma delas estava bem ao alcance de suas mãos. Nada iria impedir este velho homem de lutar uma vez mais.

— Mehhh… É parece que não tem o que fazer – Kawata soltou um suspiro pesado – Tá bom então, velho. E o que você pretende então? Não é como se você pudesse fazer qualquer coisa dentro desse lugar.

— Não… Tem uma coisa que eu posso fazer, preparar terreno…

— Terreno? Como assim?

— He, você já se esqueceu? – Disse Tsuguhiko enquanto forçava todas as rugas do seu rosto a colaborarem para formar um sorriso inspirador – As apresentações são essa semana.

— Ah verdade! Eu já estava quase esquecendo! Pera, você pretende colocar aquele moleque no meio? Mas como isso vai ajudar?

— Horá do banho acabou! Terminem de se enxaguar, pegue uma toalha e cada um e sigam para pegar os novos uniformes! – Gritou um guarda do lado de fora do banheiro, gerando uma inquietação nos presos.

— Porra, mas já?

— Pois é, nem terminei de lavar minhas costas!

— A qualé champs! Mais 5 minutos!

— Eu não vou me repetir! – Gritou o guarda de maneira incisiva.

— Tsc, que merda!

— Babaca do caralho…

Os presos fecharam seus chuveiros quase que todos ao mesmo tempo, pondo fim a pausa para o banho.

— Você verá, Kawata… Você verá – Tsuguhiko não disse mais nada, apenas se virou para sair junto aos outros, sendo acompanhado pelo amigo que também não respondeu.

No horário de jantar Tsuguhiko tentou se sentar junto de Samson para conversar, mas não encontrou nem ele e nem o brutamontes que o acompanhava, mas tirando isso o jantar foi mais agradável que o de costume. A comida parecia mais gostosa, Kawata e Tashiro estavam menos irritantes e o refeitório não era tão barulhento assim, até mesmo os velhos olhos pareciam enxergar de forma menos embaçada. O ex-duelista se sentia um pouco mais vivo agora e ele pretendia cultivar essas sensações cada vez mais.

Tsuguhiko pela primeira vez em anos havia encontrado um pouco de conforto.

Após o banho, não demorou muito para os detentos se aglomerarem em uma fila oblíqua e disfuncional, o que obrigou os guardas a terem de intervir e organizar tudo eles mesmos. Era uma rotina padrão para eles, já tentaram dar diversos sermões nos presos para que eles se organizassem corretamente no refeitório, mas o diretor Tominaga Mutsu acabou desistindo da ideia.

“Acredito que seja um pouco de ingenuidade a nossa esperar que uma manada de homens, que trabalham oito horas diárias debaixo do sol quente, se comporte na hora da fila para pegar sua refeição. Apesar de criminosos, eles ainda são humanos. Apenas se atente em manter a ordem no refeitório e nada mais”. Esse foi o pedido de Tominaga.

Por conta disso o refeitório era de longe o lugar mais caótico da prisão, o trabalho dos guardas ali era apenas evitar que acontecesse confusões entre aqueles homens e manter um mínimo de ordem, de resto os presos estavam livres para fazer o que quiserem durante aquele intervalo antes de dormir.

Pelo grupo de Tsuguhiko ter sido o primeiro a entrar e sair do banho, eles teriam a prioridade na fila, principalmente o ex-duelista, por mais que não gostasse de admitir, ser velho tinha suas vantagens. Kawata e ele pegaram então suas bandejas, tiveram a gororoba irreconhecível do dia despejada sobre seus pratos e por fim tomaram seus assentos numa mesa retangular de metal razoavelmente grande.

— Ah, é tão bom chegar primeiro! – Comentou o jovem aliviado – Ter que brigar por assento nesse lugar é uma merda.

— Nisso nós dois concordamos – Respondeu Tsuguhiko – O único problema agora será manter esse lugar, não duvido que algum fedelho venha tentar tomar nosso assento…

— Relaxa, eu vi que o grupo do Tashiro-san tinha ido depois da gente, quando ele chegar aqui não teremos problema pra guardar lugar…

— Nesse caso é bom ele se apressar… – Tsuguhiko pegou sua colher, escavou um punhado daquele purê alaranjado e o engoliu todo de uma vez.

A comida de Kosuge nunca foi das melhores, ela apenas tem o propósito de fornecer os nutrientes necessários para os detentos para que possam trabalhar bem. O ex-duelista quando chegou nesse lugar, a meses atrás, odiava essa gororoba com todas as suas forças, mas com o tempo conseguiu enxergar o seu valor, apesar do gosto ainda não ser dos melhores.

Os detentos do presídio em suma maioria tem um truque para comer sem ter de sentir o gosto, engolir tudo de uma vez com água (truque esse que fora ensinado aos outros por Fujimura Tokio, um antigo detento que era conhecido por ter ganho alguns campeonatos de comer cachorro quente na juventude), claro que nem todos os presos faziam isso, afinal alguns dos que estavam ali eram pessoas pobres que foram presas roubando para colocar alguma comida na mesa, então para eles qualquer punhado de carboidrato puro sal e pimenta já era uma boa pedida.

Tsuguhiko por um momento então parou de ter foco no seu “apetitoso” jantar e cruzou o olhar pela enorme fila que se estendia pelas bordas do refeitório, procurando pela sua tão valiosa jóia.

— Ah eu to tão ansioso para o fim de semana! – Kawata interrompeu a busca de Tsuguhiko – Já faz mais de um mês que a Kurita-san não vem pra cá! Não vejo a hora de poder vê-la outra vez!

— Ela é de fato uma garota talentosa, sempre fico impressionado quando ela vem pra cá – Comentou Tsuguhiko sem dar muita atenção aos delírios do colega.

— E quem disse que to falando de talento? Já viu aquele mulherão? – Comentou Kawata, estava se animando mais do que devia.

— É só nisso que você sabe pensar?

— Claro que não! Ela é de fato muito talentosa, tem uma voz linda, sabe dançar muito bem, mas… Sua beleza está acima de qualquer coisa, só de olhar para aqueles pei- olhos! Eu já sinto meu coração aquecer…

— Você não acha que já tá grandinho o suficiente para parecer um adolescente de 14 anos? – Cuspiu Tsuguhiko entre dentes – Nunca vi uma puberdade tão tardia.

— Escuta aqui velho! Eu, assim como todos os homens nesse lugar, fui privado de meus prazeres carnais e estou tendo de viver a minha vida preso dentro de um cubículo, e eu já não aguento mais ter de conviver com CUECA! – Gritou Kawata a plenos pulmões – Eu olho para os lados e só vejo, homens! Homens e mais homens! Até entre os guardas só tem macho! Como que um romântico como eu pode sobreviver num cenário apocalíptico desses?

— Suas prioridades são desprezíveis, Kawata… – O velho já nem se dava mais o trabalho de olhar para o rosto do jovem de cabelos falhos

— Desprezíveis? Desde quando querer admirar a beleza em seu estado mais puro é um ato desprezível? – Questionou o jovem – Eu sou apenas um homem pecador como qualquer outro, velho!

— Acredito que o problema esteja na maneira como você fala, Kawata – Zombou Tashiro se intrometendo na conversa e já se sentando ao lado do ex-duelista.

— Hum? Ah finalmente.. Onde você estava, já não tava aguentando mais ter de ouvir as besteiras do Kawata sozinho – Disse Tsuguhiko.

— Besteiras? Ora seu-

— Hehehe, foi mal pelo atraso, a fila tá uma loucura hoje – Tashiro interrompeu Kawata – Aliás vocês estão falando do que exatamente? Peguei o bonde andando.

— Kawata estava apenas sendo um pervertido como sempre.

— Ei! Pelo menos não sou eu que to gadando um cabeludo, velho gagá!

— Que porra de “gadar”, seu moleque! Isso é um assunto sério! Diferente das suas perversidades de adolescente!

— Ei! Ei! Ei! Se acalmem vocês dois, vamos apenas aproveitar o jantar como três homens civilizados – Proferiu o homem de meia idade – Por sinal, eu quase esqueci, Tsuguhiko-san…

— O que fo- Ai!

— Que MERDA foi essa de deixar a gente na mão? – Manifestou Tashiro após afundar o braço rechonchudo do velho colega com um soco.

— É! Eu falei isso com ele! Esse arrombado foi puxar as bolas do novato – Grunhiu Kawata.

— Do novato?

— É, o cabelo moita, grande e bagunçado!

— Eu já disse que eu não fiz nada disso – Gritou o velho homem com a mão sobre o ombro dolorido – Eu só fui conversar com ele, precisava conhecer o garoto!

— Por causa daquela sua intuição de velho? – Perguntou Tashiro.

— Sim! Quer dizer, não é uma intuição de velho, mas sim os meus sentidos de duelista!

— Mas que papinho ein… – Disseram os dois colegas um uníssono.

— Ah que foda! Vão se foder vocês, mal conseguem entender como uma invocação por tributo funciona, nem sei porque perco meu tempo me explicando para dois idiotas como vocês – Tsuguhiko pega então sua bandeja e se levanta.

— Ei peraê, onde você vai? – Perguntou Tashiro.

— Me sentar em outro lugar, já cansei de ouvir suas baboseiras.

— Você sabe que a essa já devem ter pego tudo né? – Questionou Tashiro – Vai acabar tendo de comer no box do banheiro de novo.

— Eu prefiro! Até o cheiro de fezes do banheiro fede menos do que essas merdas que vocês vivem falando.

— Ah Tsuguhiko-san, deixa disso-

— Cala boca, Tashiro! Já estou farto do deboche de vocês!

O ex-duelista por fim deixa a mesa dos colegas.

Tsuguhioko já estava cansado de dialogar com ignorantes, tem feito isso nos últimos meses com frequência e isso só ocasionou um aumento considerável na tensão sobre seus ombros. Ele planejava viver bastante, então não queria deixar seu estresse acumular até ao ponto em que ele passaria a depender de remédios de controle comportamental. Já teve que passar por isso uma vez, não deixaria o mesmo acontecer de novo.

O velho homem caminhou pelo refeitório barulhento a passos lentos, inspirando e suspirando para tentar acalmar a si mesmo, suas mãos apertavam tão forte as extremidades da bandeja de comida que as veias de seus punhos saltavam em meio a pele enrugada. E no meio de todo aquele falatório entre detentos sem educação.

— Nada como uma bóia depois de um dia cheio de trabalho – Disse uma voz familiar – Por sinal tu sabe o que é isso? Eu jurava que era Kuri-kinton, mas é salgado, fora a cor.

— Eu não faço ideia, mas não é como se saber “o que é” importasse, comida é comida.

— Nisso parece que nós concordamos – Parece que era o dia de sorte de Tsuguhiko – Bem agora nós precisamos achar um lugar pra sentar, deixe me ver… Espera… Ei Kouda-kun, aquele não é cara que tava trabalhando com você hoje?

Era Samson mais uma vez ao lado daquele homem gigante. O gorila estava cruzando o refeitório com seus olhos pequenos, colocando a mão aberta sobre sua testa, como se aquilo fosse ajudá-lo a ver melhor, e foi nesse gesto que seus velhos olhos se encontraram com os do jovem robusto. Imediatamente Tsuguhiko olhou para o lado e viu Samson mais atrás com a sua bandeja de comida, era de fato o seu dia de sorte.

— Tsc, é… É ele mesmo – Cuspiu Samson entre dentes.

— Ah, perfeito! Ei campeão! – Conforme o homem andava na direção de Tsuguhiko, um efeito semelhante ao eclipse acontecia, com as luzes do refeitório sendo encobertas por aquela sombra enorme – Eu não consegui me apresentar hoje mais cedo, é um prazer, me chamo Fukuda Aiji.

O ex-duelista olhou para a mão estendida de Fukuda, não eram apenas grandes, mas calor tomavam cada extremidade da palma de sua mão. Era até irônico ver a figura de alguém tão intimidador com uma personalidade tão casual, ao menos dentro de um presídio. Tsuguhiko segurou a mão do homem para cumprimentá-lo, sua mão foi envolvida pelo que parecia ser um tapete de tão áspero, seu braço foi balançado com tanta força no cumprimento que parecia que seus pés seriam retirados do chão a qualquer momento.

— E-eu me chamo T-tsuguhiko Ma-matsuyama – Respondeu em meio ao cumprimento abrupto.

— É um prazer conhecê-lo, Tsuguhiko-san – Respondeu Fukuda – Eu e meu colega estamos com problemas para achar um lugar em que possamos sentar para comer, o senhor poderia nos dar alguma ajuda?

Ali estava uma oportunidade.

— Ah sim claro! – Respondeu quase que de imediato – Eu estava sentado até agora pouco com meus colegas, Tashiro e Kawata ainda devem estar lá guardando lugar!

— Oh perfeito! Poderia nos mostrar o lugar?

— Sim! Por favor me sigam, hehehehe – Tsuguhiko não podia conter o sorriso que se formou em meio as rugas de seu rosto. Aquela era uma oportunidade perfeita para ir colocando seu plano em prática e aos poucos se aproximar de Samson. O jovem já tinha se mostrado antes como uma pessoa fechada, mas o velho tinha certeza que poderia ultrapassar essas barreiras, só o precisava era ser um pouco insistente.

O ex-duelista deu meia volta e se direcionou para a mesa onde seus bons companheiros estavam sentados.

“Você não tem vergonha na cara?” É o que pensariam dele, e a sua resposta seria: “Não!”

Tsuguhiko não tinha vergonha alguma, pelo contrário, sentia-se orgulhoso de tamanha sagacidade. Tsuguhiko não era mais um “homem de ação”, mas sim um “homem de negócios”. Se quisesse conquistar o mundo dos duelos de novo, vergonha e orgulho deveriam ser o menor de seus problemas.

Tudo estava a ocorrer bem como o planejado. Tsuguhiko só não contava com uma coisa no seu plano.

OST: Kaiji – Predicament

Mal tinha se virado para seguir pela própria sombra até a mesa de Tashiro e Kawata quando um som alto de metal ecoou logo atrás dele, sendo seguido por uma explosão de risadas por todo o refeitório.

— Kouda-kun! – Gritou Fukuda.

Quando o ex-duelista se virou para olhar o que tinha acontecido, ele encontrou Samson caído no chão com o rosto enterrado no meio do purê. Fukuda se ajoelhou para ajudar o colega a se levantar. Em seguida ele levantou seu olhar procurando o causador daquilo e seu olhar cruzou-se com um par de olhos castanhos familiares, era um homem alto com músculos em evidência através da camisa listrada que tinha mangas dobradas acima dos cotovelos, cabeça raspada nas laterais e cabelo liso penteado para o lado.

O homem encalvecido não tinha o melhor relacionamento com os presos de Kosuge, desde que chegou procurou evitar ter qualquer contato com os outros detentos, mas tinha alguns sujeitos que eram impossíveis de se evitar, e aquele ali na sua frente era um deles. Hayakawa Tadami, preso por agiotagem e crime organizado. Ele era do tipo mais perigoso que essa prisão poderia oferecer, neste Centro de Detenção podia não ter assassinos psicopatas, contudo Hayakawa se encaixava no tipo que “ainda” não era um assassino. Afinal ele pode não ter cometido tais crimes hediondos, mas ninguém pode garantir que ele não os cometeria se necessário.

– Pô cara foi mal hahaha, eu não vi você passando hehehe…

Se Kosuge era uma savana, Hayakawa Tadami podia ser visto como uma espécie de leão, enquanto pessoas como Tashiro e Kawata seriam algo próximos a zebras. Já os homens que estavam ao redor, rindo como nunca, faziam jus a hienas se aproveitando da ferocidade de um dos maiores predadores desse ambiente.

Aquele homem não era do tipo que Samson e Fukuda, novatos recém chegados, deveriam se envolver. E aquilo era só uma iniciação, só isso, só o que eles precisavam fazer era aceitar aquilo por hora e fugir.

— Ah porra… – Murmurou Tsuguhiko dando a volta em Fukuda para ficar ao lado de Samson e ajudá-lo a se levantar – Tá tudo bem, garoto, só ignora. Vem cá me deixa te-

— Tira a porra da mão de mim! – Kouda puxou seu braço das mãos do velho para se levantar por conta própria. Esfregou a manga do uniforme contra o rosto para poder enxergar os seus arredores.

— Não viu a gente passando? Acho isso bem improvável… – Fukuda se colocou entre o detento e Kouda, estufando seu peito inchado.

— Hehehe tá, talvez eu tenha visto sim, mas não me leve a mal, isso é apenas uma forma de mim e a rapaziada lhe dar “boas vindas” – Hayakawa recuou alguns passos com a presença do gorila na sua frente, o detento era alto, contudo Fukuda era um verdadeiro gigante.

— Ei vocês dois, deixem isso pra lá, dá pra pegar mais comida na cantina – Gritou Tsuguhiko agarrando o braço dos dois rapazes, mas nenhum deles se movia ou sequer dava bola para seu discurso pacifista.

— Entendo… – Respondeu Kouda, ignorando Tsuguhiko.

— Entende, né? Ótimo hahaha! Nesse caso nós não temos nenhum recen-

OST: Hanachirasu – Demon Soldier

Samson não deixou o homem terminar. Aproveitou que estava ao lado de uma das mesas para agarrar a bandeja de comida mais próxima a ele e, com um giro, fez o objeto metálico colidir em cheio contra o rosto de Hayakawa, para o horror de Tsuguhiko.

O refeitório inteiro se calou com o estalo da pancada. O corpo do detento foi ao chão junto da bandeja, espalhando ainda mais daquela gororoba cor de cenoura. Agora só o silêncio reinava.

“Ah não… Vai começar”

Pensou Tsuguhiko que foi se afastando da dupla a passos de tartaruga. Nada de bom sairia daquilo e pior ainda seria se ficasse, pois ele sabia bem o que esse tipo de ação resultava em Kosuge,

— AI! QUE MERDA ESSA SEU FILHO DA PUTA? – E Hayakawa óbviamente foi o primeiro a quebrar esse silêncio, não só isso como as ações do detento a partir iriam gerar uma reação em cadeia. O homem manchado de laranja se levantou com agilidade e saltou na direção de Samson.

Seu avanço encurtou a distância entre os dois em segundos e usou essa brecha para abraçar a cintura do jovem de cabelo negro e levanta-lo do chão. Samson tentou se soltar dando cotoveladas nas costas de Hayakawa, mas o maior estava tão embriagado em ódio que essa dor não seria o suficiente para fazê-lo soltar. Hayakawa tirou Samson do chão e o levantou acima da cabeça para em seguida jogá-lo com violência sobre a mesa de aço mais próxima.

— BRIGAAAAAAAA! – Gritou um dos detentos com toda a força de suas cordas vocais. Aquilo era um sinal claro de que qualquer maneira civilizada de se resolver aquela situação estaria sendo descartada de antemão.

Hayakawa pulou em cima da mesa para ficar por cima de Samson e de imediato tentou lhe acertar um soco no rosto, mas tudo que seu punho encontrou foi o ferro frio da mesa do refeitório abaixo deles graças aos reflexos ágeis de Samson, mas aquilo não pareceu incomodá-lo, pelo contrário, era como lenha para a fogueira que era a sua raiva. Outro soco veio na mesma intensidade, agora contra o peito do menor e o acertando em cheio.

— Kouda-kun! – Gritou Fukuda tentando retirar Hayakawa de cima do menor, mas foi impedido quase que imediatamente pelos detentos próximos, que pularam em cima dele para impedi-lo – Argh porra!

Tsuguhiko tentou rastejar para fora daquela multidão que se formou ao redor dos dois detentos, mas foi impedido. Sua covardia não seria apoiada.

— Cof! Argh, sai de cima de mim seu merda! – Samson grunhiu de dor e em resposta desferiu uma cabeçada em Hayakawa, seguida por um chute no peito do seu oponente que o jogou para trás.

Samson desceu da mesa pronto para continuar. Armou as mãos e correu na direção de seu oponente, se abaixou a tempo de desviar de um direto de direita para desferir um soco na altura da costela, Hayakawa grunhiu de dor e respondeu com uma joelhada que foi defendida por Kouda com as mãos nuas, Samson então deu um salto para trás afim de evitar uma cotovelada.

O detento partiu na direção do moreno para encurtar a distância mais uma vez, contudo o mesmo golpe não iria funcionar duas vezes, e antes que pudesse alcançar seu adversário uma dor latente se espalhou por todo o seu tórax que o forçou a se ajoelhar, havia sido acertado em cheio na barriga, um impacto tão potente que quase o fez vomitar.

Estava acabado, Samson agora já tinha o rosto do maior como alvo do seu chute de direita, era certeza que iria manda-lo para enfermaria.

— Boa noite seu filho de uma puta! - Gritou Kouda com o pé levantado.

Sangue manchou o chão do refeitório de Kosuge naquela noite.

Fim do Primeiro Dia.

Pena de Samson Kouda: 2 anos, 11 meses, 3 semanas, 6 dias, 23 horas, 56 minutos e 59…

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