Wyrda

Uma promessa e um sinal de amor eterno


Milena P.O.V.

Os olhos dele haviam se fechado, e a respiração já fraca só havia diminuído, logo, desapareceu, ela havia perdido o elfo duas vezes no mesmo dia.
– Knabben... – Chamou-o, mas não houve resposta. – Knabben, por favor... acorda!
– Milena... O que...? – George procurou encará-la, mas ela escondeu o rosto angulosos com os cabelos mesmo curtos, as lágrimas cairam sob a testa do elfo, escorreram até seus olhos, pelas bochechas e então, sob o corpo esverdeado do dragão.
– POR FAVOR, ACORDA! – Milena gritava, esperneava, balançava o amado, mas não havia resposta alguma, nem mesmo as mãos, sempre inquietas moviam-se, notou então os olhos abertos ainda, aqueles dois pequenos olhos negros, nos quais ela sempre se perdia, ela não conseguia se preocupar com mais nada, apenas com o elfo, não notou que Marfhir, cego pela dor de sua cavaleira voava em zigue-zague.
“Milena, por favor, controle suas emoções... por favor, vamos dar um jeito!”, pedia o dragão, em meio ao desespero de ter perdido o elfo. Ele conhecia aquela dor mas, não podia se deixar dominar como ela havia deixado.
“Ele está morto... Knabben... Knabben...” E então ela continuou a chorar o nome do mesmo, logo em seguida, sentiu a dor do dragão e a conexão entre eles a abandonando, dois grandes vazios formaram-se em seu peito, a visão se tornou turva, e ela caiu, sob o peito de George, ainda agarrada ao corpo de Knabben.

...

A música e o cheiro de almíscar a fizeram despertar. Milena estava deitada, com os olhos cheios de lágrimas, havia sonhado com aquelas palavras ditas por ele antes de...
“Eu amo você”, aquelas três palavras ecoavam em sua mente, e então, ela sentiu Marfhir cutucá-la com sua mente.
“Onde estamos?”, perguntou ao dragão.
“Levante-se, siga pelo corredor a direita, e depois, abra a quinta porta à esquerda.”, respondeu o dragão, irradiando alguma melancolia, mas tentando ainda assim, confortá-la. Por um momento, Milena apenas sentou-se na cama e cavaleira e dragão confortaram um ao outro. Ela levantou-se, em algum momento a haviam removido a armadura e a substituído por um vestido longo e branco, seus cabelos estavam penteados e presos por pequenos ramos e flores. Fixou os olhos em seu reflexo na água, estava bonita, mas a feição morta anulava todo o resto.

Ainda descalça, ela seguiu as instruções de Marfhir, caminhando vagarosamente, arrastando-se sutilmente pelos corredores até achar a quinta porta à esquerda, ao adentrar reparou no quarto mal iluminado, em George sentado no canto da sala, fitando o centro, onde o elfo, com roupas limpas e feridas totalmente curadas parecia apenas dormir, um longo sono, longo demais...
Milena colocou-se a chorar, apoiada sob o peito do elfo. Não suportava a dor de perdê-lo, era como se ela mesma houvesse morrido.
–Pobre criança – Sussurrou ao fundo uma voz feminina, Milena não se preocupou em fitá-la, pois ela logo a abraçou – Vocês tinha algo o qual eu não via há muito tempo. Ainda mais entre espécies tão diferentes. Estão ligados, mesmo que mudem o verdadeiro nome. A dor dela é tão grande que...

Milena então a fitou com raiva, ela não podia simplesmente calar a boca?!

Mas em poucos segundos a raiva dissipou-se, ela a observou direito, uma mulher alta, com longos cabelos vermelhos, quase tão vermelhos quanto o vestido que lhe cobria todo o corpo, era sem duvida elegante, pulseiras, colares e tiaras em ouro enfeitavam-na, e seus olhos, era de um azul leitoso, mesmo com o rosto novo e sem rugas, Milena percebeu o quão velha ela era.
– Estou disposta a ajudar-lhe, há alguns anos seu pai salvou minha vida, agora, eu pago o favor, ajudando a filha mais nova. – A voz da mesma soava tranquila.
– E como fará isso? – Milena perguntou, estava crente de que trazer Knabben de volta era impossível e jamais desejaria abandonar as lembranças que tinha dele.
– Desistiria do que tem de mais precioso para trazê-lo de volta? – A pergunta acertou-lhe em cheio, havia muito para ela que podia ser considerado precioso, mas, o que tinha prioridade? Marfhir? Jamais deixaria que o dragão morresse por puro capricho.
– Não estou falando em outras pessoas, seria demais, estou falando de seu intimo, do material, ou sentimental, quem sabe. Se tem grandes terras, muitos bens, um grande dote, ele lhe será tirado, se tem boas lembranças, elas lhe serão arrancadas, esse lhe será o preço.

Milena hesitou.
– A vida logo terminará de abandonar o corpo dele, então, se apresse, ou perderá sua única chance de... – Milena já tinha certeza de sua resposta, se seria tirado dela, então,que assim seja, ele havia morrido por ela, agora, ela o traria de volta, não permitiu que a mulher completasse sua frase.
– Eu aceito.

Então a mulher de longos cabelos vermelhos cantou, poucas palavras puderam ser traduzidas, Milena não tinha certeza de como ligá-las, eram antigas demais. A mesma então passou a despir-se, em pouco tempo, estava nua, exibindo as tatuagens que cobriam todo o corpo, um longo dragão, o qual, cada passo, cada nota, iluminava-se mais e mais, e quanto mais rápido ela ia, mais a luz se fortalecia, então, por um segundo, Milena pensou ter sentido uma mente tão grande que assustou-se o suficiente para cair de joelhos no chão, sentiu-se miserável, sentiu que, mesmo que todo o mundo unido, seria apenas uma parte minúscula daquela mente. A luz na mulher intensificou-se cada vez mais, até quase cegar a menina, ela dançava rápido, mal podia acompanhar os passos e a musica passou a não ser mais distinguível, era um ritual de invocação.

Por um breve momento Milena precisou fechar os olhos, uma grande criatura iluminada apareceu a sua frente, o espaço onde estava parecia ter se ampliado em milhões de vezes, as estrelas a envolveram e ao fundo, vira milhões e milhões de galáxias e em seguida, um dragão que cintilava em todas as cores, reconheceu-o das histórias de sua mãe, e curvou-se.

A voz dele ecoava em todo o universo.

George P.O.V

O homem assustou-se ao ver a irmã de pé, ao lado da velha amiga Fidelly, uma elfa tão velha quanto o próprio tempo, com os olhos em chamas verdes e o corpo manchado em luz, notou uma pequena fita rósea quase invisível amarrada ao pulso da jovem, esta fita estava ligada ao pulso de Knabben. Ele a tentou tocar.
– Não. Ela conseguiu... – Fidelly afastou George da irmã, e então o obrigou a se sentar. – Vamos apenas esperar. Ela é forte. Aquela aura... Havia tempo que eu não a via em um cavaleiro. Marfhir a escolheu bem.
– Por que ela...? – George sentiu-se diminuído, tolo, mesmo com tantos anos de estudo, não conseguia compreender o que ocorria ali, com a própria irmã. Não sabia como ajudá-la.
–Venha, deixe-os, vou contar-lhe uma história. – A elfa o puxou para fora do cômodo, deixando Milena e Knabben ali, a menina queimando em chamas verdes ligada por uma fita rósea ao elfo.

Milena P.O.V.

Eu vejo tudo, eu vejo sua alma, conheço seus desejos, criança – Disse o dragão, alto e claro, Milena não o ousou interromper. – Uma boa criança, de coração puro e inocente, ama a verdade e a justiça, sempre disposta a sacrificar-se, mas... diga-me, ele vale a pena?
Vale. – Respondeu firme, aumentando o tom de voz ao limite. – Eu lhe dou o que quiser, por favor, por favor, traga-o de volta.
– Minha criança – O tom passou a exibir pequenos fragmentos de um tom fraterno. – seu destino será totalmente alterado.
– Eu não... – Milena sentiu as lágrimas escorrerem por seus olhos – Não consigo ver meu destino sem ele.
– Arrancarei de ti suas lembranças e darei a você e ele uma noite, apenas uma noite, para que possa se despedir, então, virei buscá-la e... – O dragão então piscou, os enormes olhos multicoloridos e as estrelas a envolveram, a luz a cegou, e ela, pela primeira vez, deixou-se envolver pela claridade.

...

Acordou em Ellésmera, em seu quarto, ainda usava o vestido branco e seus pés permaneciam descalços, explorou o a casa e ninguém encontrou, sentiu o cheiro das flores que plantara com a mãe, elas apenas exalavam perfume em momentos especiais, sentiu que aquele era um momento especial.
– Milena? – Uma voz conhecida chamou-a, e ao virar-se deparou-se com um Knabben confuso, ainda com as roupas que a mulher amiga de George o havia emprestado, estava lindo, com os cabelos desgrenhados, no emaranhado mais charmoso do mundo, os olhos iluminados, e a pele corada.

Sem nem mesmo pensar, Milena correu para os braços dele, o mesmo a tomou nos braços e pela primeira vez, sem dificuldades, mortes, dou ou inimigos, beijou-a.

~off P.O.V.

Milena beijou o elfo como nunca antes, aproveitou cada pequeno segundo, cada pequeno toque, já Knabben, ciente do acordo, beijava-a em agonia, sabendo que ela o esqueceria em breve, não porque queria, mas porque sacrificou-se para salvá-lo. Sabia que ela seria infeliz, mas estava grato, ele jamais desistiria de lutar por ela.

Milena envolveu a cintura do mesmo com as coxas grossas, e este a segurou firme, guiando-a para o cômodo mais próximo. Ele a deitou, e fitou o rosto da mesma por um longo tempo, guardando cada pequeno detalhe.
– Eu amo você – Sussurrou Knabben.
– Eu também amo você – Sussurrou Milena em resposta.

Knabben sabia que o que estava prestes a fazer agora era um sinal como para ela era o matrimonio, era um sinal de amor eterno, uma pequena jura.
– Eu não vou desistir de procurar por você, não vou desistir de fazê-la lembrar. – O elfo beijou a cavaleira e então, com delicadeza, retirou a fina roupa que ela utilizava fazendo o mesmo com a sua própria.

Ao final da noite, Knabben, com a menina adormecida em seus braços notou que ela ainda usava o colar que a havia lhe dado tanto tempo atrás, mal sabia ele que ela jamais o tirou, mesmo com tanto tempo. Ele a apertou e sentiu seu cheiro uma ultima vez antes de adormecer fazendo uma promessa silenciosa.

...

Mesmo um dragão antigo, sentiu pena se separá-los, mas o fez ainda assim, retirando a menina dos braços do elfo, apagando as memórias da mesma, notando apenas algo que ele mesmo não esperava. A linha rósea que os ligava não havia se enfraquecido, nem um pouco, pelo contrário, mesmo com as memórias da mesma apagadas, ela continuava lá, com um brilho ainda mais forte.

E então ele notou o que a havia fortalecido.

Uma promessa, e um sinal de amor eterno.