Vapor

21. Adorável


CAPÍTULO 21

adorável

alissa fontes

Ela não se sentia muito confiante sobre o que estava prestes a fazer.

Já tinha passado boas horas no telefone conversando tanto com sua mãe quanto com sua avó, embora as duas tenham tentado interromper os planos da garota, alegando que não queriam atrapalhar, a menina sabia a verdade. Podia perceber pelo tom de voz da sua mãe no como Alessandra estava feliz em saber que sua filha voltaria para o Brasil, voltaria para o seu lado.

Dona Amélia, por sua vez, não era exatamente do tipo de pessoa que demonstrava emoções com muita facilidade. A senhora fez questão de dar um sermão na meta, alegando com sua teimosia de sempre, que estava muito bem obrigada e que por mais que ela amasse a garota, não queria atrapalhá-la em conquistar seus sonhos. Ao conversar com a avó, Alissa se pegou sorrindo silenciosamente, sabendo que na verdade Dona Amélia estava vibrando de felicidade por trás daquela máscara ranzinza que ela carregava.

Naquele meio tempo ela já tinha se comunicado com várias pessoas sobre a transferência, faltava apenas Calum e seu pai. Ela sentia que estava retardando aquela conversa, como se estivesse tentando comprar tempo, porque seria muito difícil conversar com os dois. Não queria ter que deixar Calum, porque ele era a melhor coisa que tinha acontecido com ela há muito tempo, porque era o sorriso dele que iluminava seus dias cinzas e estressantes. Também não queria ir embora quando a sua relação com seu pai finalmente estava andando, quando havia tanto para se perdoar e para conversar.

— E então? — Calum indagou, olhando para a namorada com uma expressão cansada.

Alissa tinha o chamado até o quarto dela no campus, não tinha feito mais do que dez horas que ele tinha chegado da Europa. Era possível perceber pela sua expressão cansada que tudo o que ele precisava no momento era uma boa noite de sono e talvez alguma comida quente. Só de vê-lo assim, ela murchou, não queria falar aquilo para ele naquele momento.

Só que ao fazer isso ela estava perdendo tempo. E ela conhecia Calum, sabia como ele iria se sentir magoado caso ela continuasse guardando essa informação até não poder mais.

— Como foi sua viagem Cal? E a tour? Eu senti tanto a sua falta. — ela disse sorrindo timidamente enquanto trancava a porta do apartamento. Eram só os dois aquela noite. Marina tinha saído para jantar com Ashton, e embora ela tivesse dado o melhor de si para convencer a amiga que aquilo não era um namoro e sim dois amigos indo comer juntos, Alissa tinha suas dúvidas.

Um sorriso preguiçoso surgiu no rosto de Hood, ele se aproximou da garota, pousando suas mãos na cintura dela enquanto a olhava nos olhos.

— Foi ótimo. — disse com sinceridade — Eu e os meninos amamos a experiência, mal podemos esperar para sair fazendo tours de verdade e com mais frequência. Fomos tão bem que em breve iremos começar uma nova tour, até agora só sabemos que será na América do Norte e ao redor da Europa.

O sorriso de Alissa vacilou por alguns momentos, ela estava muito feliz pelos meninos. Todavia, conforme eles ganhavam fama, mais começavam a fazer mais e mais shows, ficando completamente distantes e fora do alcance dela. Novamente a ideia de que um dia Calum iria desaparecer lhe veio a mente, junto com o aviso de Aimee.

Por Deus, como ela odiava se sentir assim.

— Ali, está tudo bem? Você está com uma expressão triste. — Calum disse, perceptivo.

Alissa ergueu o olhar até ele, mordeu os lábios sem saber por onde começar. Como ela explicaria para ele que não queria perdê-lo, que tinha tanto medo de perdê-lo? Como ela explicaria que tinha que ir embora? Ela não sabia o que fazer, era a primeira vez que ela estava em um relacionamento assim, que de fato havia amor e confiança de ambos os lados.

— Cal, eu preciso te contar uma coisa.

Só de ouvir o tom de voz da namorada, Calum franziu o cenho. Ele sentia que algo estava estranho com ela já fazia um bom tempo. Alissa não era exatamente a melhor pessoa do mundo ao tentar esconder seus sentimentos, e bem, Cal por outro lado era muito bom em ler cada detalhe no rosto dela.

— Aconteceu algo na casa do seu pai?

Alissa piscou, e depois riu negando.

— Não, eu te falei, na verdade as coisas foram muito boas por lá.

— Então o quê está te incomodando tanto Ali? Dá para perceber que você está ansiosa com algo, eu só não sei com o que.

Ela sorriu triste.

— Cal, uns meses antes de começarmos a namorar, eu pedi uma transferência de volta para o Brasil. A princípio para poder cuidar da minha avó, já que ela vive sozinha e a minha mãe está muito ocupada com o novo casamento dela, a última coisa que eu quero é impedir a minha mãe de ser feliz... Naquela época eu não estava bem com o meu pai, então também era uma oportunidade de ficar distante dele e de finalmente cortar laços.

“Eu não te conhecia ainda, não sabia o como eu iria sentir a sua falta só de ouvir você dizer que iria passar meses fora do país em tour. Eu só tinha Marina e Ashton, e dizer adeus para os dois já era doloroso o suficiente. Só que Marina sempre entendeu a minha situação, acho que pelo fato de ela não ser daqui também conta um pouco.”

“Eu não esperava conseguir a transferência, na verdade eu tinha perdido as esperanças. Minha avó está terrivelmente doente, os médicos não tem muita certeza sobre quanto tempo ela poderá continuar seguindo com essa doença. E eu jamais iria me perdoar se nunca mais a visse novamente, porque ela é tudo para mim-“

Enquanto falava, a voz de Alissa saía embargada e seus olhos começaram a ficar vermelhos. Diversas palavras, na maioria das vezes, sem conexão alguma uma com a outra começaram a sair de sua boca. Ela estava nervosa, não queria deixar Calum, não queria que ele ficasse furioso com ela e acima de tudo não queria perdê-lo.

Ele por sua vez, a olhava com atenção. Calum sempre soube do carinho que Alissa tinha por sua família materna, sobre o como ela prezava pelo bem estar de sua mãe mesmo que isso viesse a tirar de seu conforto. E em um momento onde ele poderia estar sentindo raiva de Alissa, Hood não pode evitar sentir admiração.

Seus orbes olharam novamente para ela, ele gostaria de ter uma máquina fotográfica que pudesse fotografar tudo sobre ela, da forma como ele a via.

Porque aquela garota era incrível, era encantadora. E a forma como ela se doava incondicionalmente pelas pessoas que amava era adorável.

Alissa era adorável.

E ao vê-la chorando desesperadamente, ele percebeu que ela não tinha noção do quão adorável ela era.

Calum a envolveu em seus braços, deixando que a garota o abraçasse no corredor de entrada do apartamento enquanto chorava, engasgada com as palavras que gostaria de dizer. Ele apenas deixou que aquele momento passasse e ela chorasse o que precisava, e quando finalmente se acalmou, Alissa suavizou o aperto no corpo dele.

— Eu não queria que você me visse assim, descabelada e feia surtando. Por isso que eu estive demorando tanto para contar. — ela murmurou contra a camiseta cinza dele.

As mãos de Calum subiram até os cabelos dela, realizando um cafuné suave com a intenção de acalmá-la.

— E quem te disse que você é feia chorando, mulher? — Calum, apesar da dor, riu, atraindo o olhar de Alissa para si. Delicadamente ele começou a secar as lágrimas dela com as pontas dos dedos.

— Você não está bravo?

— Não — respondeu sério —, eu já te disse que nunca conseguiria ficar bravo com você. Eu só estou triste.

— Me perdoe.

— Alissa, — Calum riu soprado — você não me precisa pedir desculpar por escolher ajudar a sua família. Afinal, é da sua família que estamos falando. Eu te compreendo completamente.

Ela prendeu o ar por alguns momentos, sem conseguir acreditar naquilo.

— Lembra de quando você conseguiu essa tatuagem no seu ombro? Eu fiz duas tatuagens nas mãos em homenagens aos meus pais, porque eu os amo e quero carregá-los comigo. Acredite em mim, eu entendo o que você vai fazer. E eu não sinto raiva nem nada do gênero, na verdade eu admiro a sua força para deixar suas coisas aqui e ir para outro país em questão de dias. Você não tem noção da sua força, e eu te admiro por isso. — a voz dele era doce e tranquilizante, por isso, conforme Calum falava, as lágrimas paravam de descer dos olhos de Alissa. Em algum momento os dois apenas conversavam baixinho enquanto um fazia carinho no outro silenciosamente.

— Cal?

— Sim?

— Muito obrigada por ter entrado na minha vida, eu sinto que sou uma pessoa muito mais feliz com você. E eu não queria te deixar. Eu juro.

Um sorriso terno surgiu no rosto de Calum.

— Você não deveria estar me agradecendo, — ele disse enquanto dava um peteleco de leve na ponta do nariz dela, o que roubou uma risada da menina — te fazer feliz é o meu papel. Se não que raio de namorado eu seria?

Alissa olhou para ele por alguns momentos, a intensidade faiscava entre os dois.

— Sabe que você está dificultando mais as coisas, não? Você só está fazendo com que eu sinta cada vez mais saudade de você. Seria tão mais fácil se você me dissesse alguma mentira doce. Se você...

Calum parou por alguns momentos ao acariciar o rosto de Alissa, por fim as inseguranças apareceram em seu rosto junto com a tristeza. O moreno suspirou, sem tirar os olhos dela.

— Você pode me prometer duas coisas Alissa?

— Claro. É claro que eu posso. — ela sussurrou.

— Primeira, seja feliz. E segunda, me dê um último beijo.

Alissa deu uma risada triste, tentando se controlar para que mais nenhuma lágrima escapasse de seus olhos.

E então ela se inclinou na direção dele por uma última vez, sendo envolta por toda atmosfera aconchegante que ela já conhecia. Ao sentir sua boca contra a de Calum, ela não pode evitar pensar que aquilo era certo. Que era ali que ela deveria estar.

Quando sentia o calor do corpo dele contra o dela, era ali que ela tinha certeza de que não haveria nada assim. Não haveria outro Calum Hood.

Alissa não era exatamente uma fã de aeroportos, na verdade ela se sentia um pouco ansiosa sobre estar em um pedaço de metal sobrevoando um oceano interminável. Só de pensar nas boas horas que ela ficaria presa sentada no banco de um avião, seu estômago se revirava por completo.

Naquele dia apenas Steice e Marina puderam acompanhá-la.

Calum tinha pedido desculpas milhares de vezes, acontece que os meninos já tinham um show agendado para aquele momento já fazia bons meses. Contudo ela não ficou brava, Alissa sempre soube das consequências do caminho que ele tinha escolhido para si, e enquanto ela estivesse na faculdade estaria presa a um único lugar, nunca poderia viajar pelo mundo ao lado dele. Doía pensar que ela ainda o amava, que o término tinha sido tão tranquilo e compreensivo que chegava a ser doloroso.

— Tem certeza de que você pegou tudo? — Steice indagou enquanto ajudava a arrastar uma mala para fora do táxi.

— Eu não faço a mínima ideia, — Alissa respondeu fazendo uma careta — honestamente espero não ter deixado nada para trás no apartamento.

— Acho que está tudo ok. — Marina disse saltando do carro. Naquele dia a mexicana vestia uma camiseta lisa branca, camisa xadrez vermelha e calças jeans pretas. Apesar de não demonstrar muito para não preocupar a amiga, Marina também estava se sentindo triste.

Alissa era como seu porto seguro, a amizade que as duas tinham era sincera e repleta de companheirismo. Pensar que ela passaria os próximos anos de sua graduação sem a Fontes por perto para poder conversar, rir e desabafar era apavorador. Só que sua amiga era tudo para si, então jamais impediria ela de fazer algo que fosse fazê-la feliz.

No fundo, Marina se apegava a ideia de que Alissa iria voltar todo final de ano para poder passar dezembro com ela.

— Meninas eu não quero ir. — os lábios da menina tremeram, o que indicava que ela estava prestes a começar a chorar.

Marina passou seus braços ao redor dos ombros da amiga e a envolveu em um abraço.

— Está tudo bem anjo. Quer dizer, está tudo bem se você realmente prometer vir todo fim de ano para Sydney passar o tempo comigo.

A ameaça da Gonzales deu certo e acabou fazendo com que Alissa desse risada.

— Eu vou. Prometi para Victor que iria passar os natais aqui. Pode ficar tranquila.

— Ah, isso é um alívio. Por um instante fiquei com medo de nunca mais te ver. — Steice disse com os olhos castanhos repletos de lágrimas.

— Ah, o que vai ser de você sem a sua veterana? — Alissa resmungou, puxando Steice para um abraço em grupo.