-Eu te amo. – Ele disse.

Eu lhe dei um abraço sufocante ao ouvir isso, mas ele não pareceu reparar. Ele me amava! E a ninguém mais! Eu era egoísta quando se tratava dele. Ainda mais egoísta do que eu já era. Tentei responder, mas ainda me sentia paralisada.

-Eu... Te amo... Também...

Ele sorriu e me beijou. Fiquei feliz por saber que pelo menos essas adoráveis palavras eu fui capaz de pronunciar.

-Amor, acho melhor você se deitar para descansar.

-Não! Quero ficar com você... Não vou dormir hoje à noite!

-E como é que você pretende trabalhar amanhã?

Por alguma estranha razão eu não havia pensado no trabalho.

-Eu não sei... –Respondi-lhe.

-Eu sei. Se você não dormir, vai aparecer por lá igualzinho a um zumbi. Descanse, vai te fazer bem!

-Mas eu não quero! Quero ficar aqui com você! Se eu dormir, só vou te ver de manhã... E nem está tão tarde assim... São só dez horas!

-Dez horas já é tarde...

-Não é não!

Eu o abracei ainda mais forte que antes e fiquei deitada ao seu lado. Eu estava começando a ficar com sono, mas não queria nem pensar nisso. Dormir era terrível quando se estava com ele.

-Dorme Jessy... Eu vou estar aqui com você. Não tem problema algum.

-NUNCA!

Ele suspirou e me abraçou também.

-Eu te amo, - Ele disse-me. – mas você é teimosa em demasia, mocinha.

Ele sorriu e me beijou.

-Vamos ver um filme.

-Você quer me fazer dormir...

-Sim, quero. Vamos ver um filme.

Ele passou de canal em canal até encontrar um documentário chato do Animal Planet para assistir.

-A gente não vai ver isso!

-É claro que vamos, Jessy! Eu adoro os bichos!

Que horrível. Que injusto! E o pior era que eu não poderia fazer nada. Deitei no sofá ao seu lado e aninhei-me em seus braços. Em menos de vinte minutos de filme eu já estava dormindo.

****

Quando abri os olhos, tudo era azul. Um azul bem escuro e acinzentado. Parecia um tipo de bolha... E eu estava ali dentro.

Havia uma mesinha preta bem no meio da bolha azul, junto a um troninho igualmente preto. Sentado nele estava Ville, vestindo o mesmo casaco que deixara comigo na noite anterior. Ele também segurava uma taça cheia de algo vermelho; aparentemente vinho. Quando me viu, cumprimentou-me:

-Boa noite, amor!

-Boa noite. – Eu lhe disse ainda confusa. – Onde estamos, Ville?

-Bem no meio dos seus sonhos.

-Ah!

Até que isso fazia sentido. Estar dentro de uma bolha azul parecia bastante irreal. Logo me senti bem deprimida: eu havia dormido.

-Isso quer dizer que você me fez dormir!

-Obviamente. Isso não é legal?

-É terrível! Eu queria estar acordada com você agora!

Ele bebeu um pouco do estranho conteúdo da taça e respondeu:

-Eu acho legal, porque até mesmo dormindo você está comigo.

Minha obsessão tinha atingido níveis sobrenaturais: eu pensava nele o dia todo, me comunicava mentalmente com ele, sonhava com ele... Isso não era nada comum!

-E por que você tem uma cadeira legal e eu não tenho?

Ele deu uma risadinha e bebeu mais um pouquinho do conteúdo da taça.

-Você pode ter uma também. O sonho é seu!

Verdade. Pensei em um troninho igual ao dele, que se materializou bem do meu lado.

-Não tive a mínima criatividade...

-Não importa não. É bonito.

Tentei me sentar, mas não tive a menor vontade. O troninho sumiu com a mesma velocidade que apareceu.

-O que houve? – Ele perguntou.

-Quero sentar com você... Tem espaço pra nós dois aí.

-Então venha.

E eu fui. Abracei-me a ele e não soltei mais... Queria que ficássemos juntos dessa forma para todo sempre... Ou melhor, até que ele viesse me matar. Sim, eu estava pronta para morrer.

-Ville... – Eu sussurrei. – Ainda tenho medo que você se vá... Não faça isso... por favor, não me deixe!

Por que eu estava dizendo isso agora? Deve ser coisa de sonho...

-Eu nunca faria isso... Só aprendi a viver depois que te conheci, amor. Sem você, o meu coração não bate mais.

Inevitavelmente, estendi minha mão direita por seu peito e senti a batida acelerada daquele coração. Ele batia por mim.

-Eu te amo. – Ele sussurrou em retorno a meu gesto.

Segurou minha mão e me beijou como nunca antes. Fez-me sentir flutuando nas nuvens e logo parou.

-É hora de acordar. – Disse ele.

-Não! Agora não... Ainda não!

-Eu lhe peço para dormir e você não quer, lhe peço para acordar e você não quer! Decida-se!

-Desculpa, Ville... Mas é que eu gosto de ficar com você... Não quero acordar agora!

-Eu vou estar ao seu lado quando acordar. Confie em mim.

-Tem certeza?

-Absoluta.

****

Abri os olhos. Nada era azul. Meu quarto era repleto de cores variadas e não tinha nada a vez com uma bolha. Os raios de sol não batiam na cama, pois estava nublado. Senti duas mãos frias a me abraçar.

-Bom dia, amor.

-Bom dia, Ville...

Ele me puxou para mais perto de si e beijou minha testa. Logo em seguida disse:

-Teve uma boa noite de sono?

-Tive. Sonhei com você.

-É, eu sei.

Seus lábios deslizaram até meu pescoço novamente e dessa vez o beijo foi ainda mais calmo e suave que o anterior. Desta vez ele não ficou nervoso, mas disse que tinha de ir antes que fosse tarde.

-Não Ville... Não faz isso não...

-Tudo que eu digo, você sucessivamente nega. Como posso sobreviver dessa forma?

-Ah... Isso não tem nada a ver! Fica mais um pouquinho, vai...

-Você vai se atrasar para o trabalho... É melhor que eu me vá!

Choraminguei mais um pouco e nada valeu a pena. Ele se foi assim mesmo. Arrumei-me de qualquer forma e vesti seu casaco para ir trabalhar. Queria sentir sua presença outra vez e conversar com o Ville imaginário.

Saí de casa com pressa e fui com o carro que um dia pertencera a meu pai para o trabalho. Era só um Volkswagen verde, bem velhinho... Dirigi até o centro, onde eu trabalhava numa lojinha de antigüidades que assim como o carro, já pertencera ao meu pai. E lá fui eu, concentrada em nada mais que Ville Valo, para o trabalho.

Sinceramente, eu não fazia idéia de onde isso iria me levar.