Underwater

Finalmente a verdade


Eu decidi que iria pelo mar por dois simples motivos, um eu era muito mais veloz no mar e eu estava atrasada, e o mar me acalmava, me dava uma certa segurança e paz.

Nadei em alta velocidade pelo mar raso perto da praia, era meia noite e não tinha perigo, os únicos barcos que boiavam no mar eram pesqueiros vazios, ninguém além de mim e talvez algum ser sobrenatural marinho se atrevia a mergulhar ou nadar a essas horas. Pelo fato de eu estar em mares rasos a “cápsula” de bolhas que me envolvia, creio eu para me proteger, escapava levemente para a superfície deixando meu rastro visível, mas como eu disse antes, era meia noite e não havia problema algum.

Chegando ao local imergi vendo Tereza sentada na ponta do cais com os pés na água, ela os mexia pra frente e pra trás, completamente distraída, sorri, mergulhei em sua direção, nadei o mais profundo que conseguia para não lhe chamar a atenção, não queria assusta-la, minha cauda dourada bateu com força contra a areia erguendo-a e ao mesmo tempo me escondendo, eu descobrirá esse truque com Rebecca, além desse truque podíamos fazer algas crescerem para nós esconder, podíamos ficar invisíveis,podíamos criar chuvas para atrapalhar pescadores, de vez em quando ilusões para espanta-los, certos truques exigiam bastante sabedoria de magia e às vezes objetos mágicos, debaixo do cais me arrastei até a areia fria da noite, eu até o momento não me tocará que era perigoso nadar, mas para minha sorte não havia câmeras naquele cais, mas meu problema não era esse.

Já seca e com pernas me pus de pé subindo discretamente por debaixo do cais para depois contorna-lo, uma mão tocou meu ombro e eu pulei de susto, temendo o pior virei-me de supetão me deparando com a loira do tchan, também conhecida como Rebecca.

-Que susto sua infeliz!- Gritei atraindo a atenção da Tereza que se levantou e nos olhou confusa.

-Ai Desculpa.- Ela levou as mãos ao ar.- Credo, menina rude.- foi em direção a Tereza a abraçando com força, ela nem parecia mais nervosa como hoje a tarde.- Oi Princesa.

Ergui a sobrancelha cruzando os braços desacreditada.

“Princesa”?

-Oi Chero meu.- Abri a boca abismada, mas que desgraça de intimidade era essa?

Revirando os olhos andei até as mais novas melhores amigas do pedaço, trombei com Rebecca para mostrar que o produto era meu, a loira ergueu uma sobrancelha sorrindo de lado e Tereza riu, a desgraçada me conhece.

-Ih ciuminho.- Rebecca riu de mim.Fechei a cara mostrando-lhe a língua.

- Eu não tô com ciúmes, tá legal?- As meninas riram de mim, ignorei-as ficando séria de verdade e me sentei na ponta do cais, olhei para as garotas, encontrei uma Rebecca também séria e nervosa.- Temos coisas mais sérias para tratar.

A loira do tchan veio até mim vacilante e se sentou deixando um grande vão para que Tereza sentasse entre nós, batemos juntas a mão na madeira do cais. Minha amiga estava assustada, talvez com o fato de termos mudado de expressão do nada, ou da Rebecca ter calado a boca, se eu não soubesse da situação também ficaria assustada.

-Amiga… Eu..- Gaguejei, o nervosismo me atingiu como um soco desprevenido.

-Nós.- Rebecca corrigiu.- Nós queremos te contar algo.

Tereza caminhou lentamente até nós sentando no nosso meio, alternava o olhar entre eu e Rebecca, ambas visivelmente nervoíssimas, suspirei e decidi que aquela era hora:

-Amiga eu… eu não sei se percebeu mas…Coisas aconteceram comigo, eu me tornei algo…Eu tenho agido estranha e realmente o que aconteceu comigo foi estranho, mas desde o primeiro momento eu aceitei minha nova natureza.- Terminei meu discurso com um suspiro.

Rebecca pegou as mãos de Tereza atraindo a atenção dela.

-Eu… eu sempre fui o que a Clara se tornou, desde pequena eu tive convicção da minha natureza, eu nasci assim e eu mantenho isso em segredo porque nós.- Ela apontou para si mesma e para mim.- Somos vistas como aberrações na sociedade.

-Ficamos com medo de falar, medo da sua reação, porque o que somos não é normal, nunca vai ser.- Continuei olhando nos olhos confusos de Tereza.- Por favor, por favor nos aceite como somos.

-Era só isso?- Ela perguntou com um sorriso, eu e Rebecca nos entreolhamos, como assim “só isso”.

- Você sabe o que somos?- Perguntou Rebecca assustada, eu também estava assustada, eu mesma demorei pra sacar que eu era uma sereia.

-Claro!- Ela agarrou nossas mãos com um sorriso de compressão.- Não vejo problema algum em minhas amoras serem lésbicas. Não tenho preconceito.- Sorriu, eu e Rebecca engasgamos como o ar, foi engraçado porque fizemos isso juntas.

-Não, não, não amiga.- Eu disse negando rapidamente, ela tinha entendido tudo errado!- Nós não somos lésbicas.- Afirmei e Rebecca assentiu.

-Não? Poxa pareceu, eu...Eu agora tô assustada, se vocês não são o que pensei, o que vocês são?- Tereza nos olhava confusa.

-Terê.- Fiz minha melhor voz calma, precisava que ela acreditasse e se acreditasse não se desesperasse, até a chamei pelo seu apelido.- Nós não somos normais.

Eu e Rebecca assentimos uma para a outra é juntas falamos:

-Tereza, nós somos sereias.

Ela largou nossas mãos e nos olhos no fundo dos olhos, depois gargalhou.

Riu, riu,riu e derrepente parou.

-Eu não gostei da brincadeira.- Ela disse fria como jamais tinha visto, Tereza nunca era fria.

Ela olhou para nós esperando que nós nos desculpassemos pela brincadeira idiota, mas não era brincadeira e ambas as feições expressavam isso, era uma verdade e Tereza estava travada por ver isso em nós.

-É... É verdade.- Ela gaguejou engolindo em seco. Assentimos.- Eu não acredito.

Me levantei, eu sabia que ela não acreditaria, ela passou a vida ao meu lado, me conhecia de cima a baixo, mas mesmo assim era algo difícil de acreditar. Rebecca também se levantou e a única que permaneceu sentada foi Tereza.

-Não precisa acreditar em nossas palavras.- Rebecca disse se preparando para um pulo.

- Acredito em seus olhos.- Eu disse pulando no mar junto da loira.

Cai nas água, mas não esperei para me transformar lá em baixo, antes dos dez segundos se acabarem nadei até a superfície saindo com minhas roupas molhadas para fora, finquei meu olhar no de Tereza e reprimi um sorriso quando a água borbulhou ao meu redor, eu estava coberta de água do pescoço para baixo nadando com muito esforço para me manter imersa, quando minha transformação acabou vi a boca de Tereza abrir em um 'O’.

Logo após Rebecca emergiu majestosamente, ela deu um impulso no fundo e nadou para cima, emergindo até um pouco abaixo de sua cintura coberta por escamas douradas, revirei os olhos para o exagero da minha amiga. Nadei até o cais me apoiando na madeira e usando de minha força para tirar parte de meu corpo da água, Tereza alternava o olhar entre minha cauda e a de Rebecca, tadinha estava assustada.

-Acredita agora?- Perguntei sorrindo.

Já secas e devidamente explicadas decidi que era a hora certa para falar sobre a chantagem.

Peguei meu celular. E dei para Rebecca e Tereza se aproximou dela para também ler, vi Rebecca empalidecer e Tereza ficar atônita.

-O que caralhos você fez pra alguém te ameaçar?- Perguntou Tereza preocupada, dei de ombros, eu estava tentando descobrir fazia três dias.

-Já tem idéia de quem seja?- Perguntou Rebecca.

-Kaila.- Eu joguei a bomba.

-Kaila?!- Exclamaram juntas.

-Não tem como! Ela é uma lesada.- Eu tive que concordar com Rebecca.

-Sem contar que… Olha pra ela, você acha que essa piranha de olho de mato vai ser inteligente o suficiente para planejar algo assim?- Tereza perguntou.

Suspirei.

-Não sei, mas para prevenir essa semana fiquem de olho nela por favor?- Supliquei e elas pensaram um pouco.

-Tudo bem.- Tereza disse.- Por mim tudo bem.

-O mesmo.- Rebecca disse sorrindo.- Mas eu não entendo, na foto eu também estou, porque ela também não me chantageou?

Aquela era uma pergunta que eu não tinha parado para fazer, será que só eu tinha sido ameaçada? Pelo que parecia sim, mas porque? Porque diabos ela tinha me escolhido para chantagem.

-Verdade isso é estranho, porque será?- Tereza compartilhou das mesmas dúvidas.

É um estalo se fez presente em nossa mentes, como se estivessemos conectadas dissemos juntas:

-Marcos.

Rebecca passará mais de um mês conosco, isso foi o necessário para que ela soubesse o quanto Miriam & Cia implicavam conosco, mas em especial Kaila, ela sempre me olhava torto e quando beijava o monte de bosta do namora me olhava, como se eu quisesse.

-Isso tá fora de controle!- Tereza exclamou.

-Eu acho uma reação bem normal se comparada com algumas, nem todos os humanos irão reagir bem ao saber que não são a única espécie racional.- Rebecca disse.- Humanos tem medo do desconhecido.

-Eu acho que Kaila está com medo.- Comentei atraindo atenção.- Medo de mim, ela está me ameaçando para que eu fique em meu lugar, mas mal sabe ela que isso é o que eu mais quero.- Deitei no colo da Tereza que acariciou meus cabelos.

Rebecca olhou para seu celular e se levantou.

-Tenho que ir.- Ela disse e assentimos.-Até amanhã Tereza, Clara ficaremos de olho.

Sorri para ela.

Ela se despediu e desapareceu na rua, eu não temia por ela, Brasil era um lugar perigoso mas éramos sereias, eu tinha quebrado a mão de um babaca, tenho certeza que Rebecca não mediria esforços com quem tentasse a machucar.

-Eu fiquei magoada.- Tereza começou desviando seus olhos amendoados para o vasto azul, ela apertou os lábios com força respirando fundo, alguns dos seus cachos caiam sobre seu rosto e ela parecia perdida, como se seu mundo estivesse acabado de dar uma volta de 567°graus.

-Isso é uma coisa tão… Tão grandioso e mágico eu queria participar desde o começo.- Ela continuou acariciando meus cabelos com ternura, em seu rosto uma feição de tristeza se formou, ela estava se sentindo excluída e eu me sentia um monstro por fazê-la se sentir assim.- Porque você escondeu de mim por tanto tempo? Quase dois meses…- Ela finalmente me olhou, o peso em meu coração voltou a reinar, ela estava com olhos lacrimejantes.- V-você não confia em mim?

Arregalei os olhos levantando bruscamente, ela estava chorando, ela estava chorando!

-Não! É lógico que eu confio! - Quase gritei levando a mão ao peito.

-Então porque não me contou antes?- Ela repetiu a pergunta.

Coloquei minhas mãos em seu rosto e respirei fundo.

-Terê, contar pra alguém que se é um ser sobrenatural não é um algo que se faz todo dia, é difícil é assustador.- Eu desabafei, ser sereia para mim era algo mágico, tirando a parte das ameaças e de esconder o segredo de quem mais ama.- Eu tinha medo que você não aceitasse.- Ela estava prestes a se defender quando eu a cortei.- Eu sei! Você nunca faria isso, mas pensa se põe no meu lugar, acordar em um dia qualquer e descobrir que tem uma cauda não é a coisa mais legal do mundo, por mais que pareça, eu sei que você também temeria se fosse o seu caso, mesmo sabendo que eu nunca te deixaria de lado mesmo que você fosse uma cabra.

Ela se aproximou e me abraçou com força.

-Desculpa, mas é que… Não é fácil pra mim também, nunca mentimos uma pra outra é agora saber que você… Que vocês são sereias é estranho. E saber que desde o começo você não me contou nada, machuca.- Ela disse em meu ouvido enquanto eu retribuía o abraço afundando o rosto em seus cachos.- Eu sei que em seu lugar eu temeria, mas eu contaria, por causa da nossa promessa. Você temer a mim faz dela inválida!

Apertei os lábios com força.

A promessa como eu poderia esquecer dela?

Eles voavam por todos os lados com lanças e adagas em mãos, homens pássaros de asas escuras batalhavam com homens pássaros de asas de cores variadas, era ágeis e aparentemente fortes, filetes de água voavam por todos os cantos cortando como navalhas, mas apenas atingiam os homens pássaros de asas negras.

Eu uma pequena criança estava assustada com toda aquela agitação eu era apenas uma criança, uma pequenina criança com medo, eu estava prestes a explodir minha cabeça doía como se os filetes de água me cortassem, mas era apenas uma visão, uma visão que me assustava, os gritos, mortes, sangue, fortes demais para uma criança suportar.

Eu me lembrava de tudo, mas haviam falhas em minha memória, falhas grandes demais, maiores que o normal.

Gritei horrorizada quando uma cabeça rolou até meus pés, meu choro se tornou de horror e eu explodi de vez, não parei de gritar pelo contrário tornei a urrar de desesperadamente atraindo atenção de outras crianças que me olhavam assustadas, Tereza minha mais nova amiguinha correu até mim.

-Clara!- Ela tocou meu rosto. Seus olhos cor de mel estavam arregalados e assustados. - O que foi? Clara?- Ela me sacudiu e eu me encolhi mais chorando, ela me envolveu em um abraço gostoso e solidário, beijando o topo da minha cabeça com carinho. Ela era responsável demais pra quem era apenas uma criança.- Para de chorar calma, tá tudo bem.- Ela disse suavemente como sua mãe fazia quando ela acordava de um pesadelo.

Ela estava cuidando de mim.

-Eu vou chamar alguém.- Ela levantou rápido me deixando encolhida perto daquela cabeça que só eu podia ver. Ela correu até porta gritando com sua vozinha por ajuda, não havia nenhum professor no local.

Naquele momento as crianças se aglomeraram a minha volta comandados por Michaela, ela tinha cachinhos ruivos e olhos verdes brilhantes, uma pele clarinha pintada de sardas e um sorriso faltando um dos dentes da frente. Me encolhi controlando os gritos e passando a grunhir nervosa, eu estava com medo.

-Louca.- A primeira bolinha de papel veio seguida do primeiro grito comandado por Michaela.- Louca, louca, louca, louca,louca.- E assim a sala toda se juntou.

E eu gritei, gritei por ajuda, gritei por socorro, gritei pela minha vida, pela minha cabeça que doía, pela visão que me deixava louca, por medo, eu gritei por Tereza e ela veio.

Furiosa como um furacão ela abriu a porta e agarrou o que lhe veio primeiro a vista, uma cadeira, era cruel demais da parte de uma criança lançar uma cadeira em outra, não quando a criança que iria ser atingida era Michaela, bom eu pensava assim, mas me assustei quando a estrutura de ferro atingiu sua nuca fazendo-a cair para frente. Dessa vez o grito não veio de mim, veio das outras crianças da sala que gritavam de pavor do sangue que escorria escarlate e escuro da nuca da ruiva que chorava de dor no chão.

-Amiguinha.- Tereza me chamou e veio até mim, ela me abraçou novamente.- Me desculpa, eu te deixei sozinha!- Ela parecia se culpar por ter cometido o pior pecado do mundo em me deixar só com aqueles abutres.- Eles são muito maus, eu vou sempre te proteger deles, eu prometo.- Ela ergueu o dedo mindinho e eu fiz o mesmo.

-Eu prometo que… - Olhei para os lado vendo os monstros que atornentavam-me voar de um lado para o outro. Eu não me sentia mais amedrontada, Tereza me fazia sentir segura e eu faria o mesmo com ela.- irei te proteger de monstros maus e se eles te machucarem, eu vou caçar eles até o fim do mundo.- Eu disse enlançando meu dedo ao seu sorrindo, ela gargalhou.

-Monstros não existem.- Ela disse rindo e eu dei de ombros.

Fomos interrompidas pela professora que finalmente deu sinal de vida. O resto todos já sabem.

Soltei -me do abraço.

E ela me olhou nos olhos antes de os esbugalhar.

-C-clara s-seus…- Ela apontou para meus olhos trêmulas.- S-seus o-olhos, e-eles..- Ela não conseguia terminar a frase, estava ocupada demais quase morrendo de surpresa.

Eu não entendi direito, peguei meu celular e pus na câmera frontal, minha imagem estava escura exceto por um detalhe, os dois pontos luminosos e azuis que iluminavam meu rosto. Olhei perplexa para a imagem eda minha pessoa e jurei que rápidamente o meu reflexo na câmera não foi compatível com o meu ato, não tardou para que a cor perdesse de pouco a pouco a tonalidade se tornando cada vez mais claro até chegar a real tonalidade, preto.

Pisquei abismada e vi que Tereza compartilhava da mesma surpresa que eu, mas o que diabos estava acontecendo?

-Cê acha que tem a ver com sua parte sereia?- Ela perguntou engolindo em seco, dei de ombros.

-Minha parte sereia é uma incógnita até para mim.- Eu disse e vi Tereza bocejar.- Eu acho melhor deixar você ir, amanhã tem aula.

Ela concordou se levantando, ela caminhou em direção a sua casa mas parou e se virou rápido.

-Não acha perigoso você ir embora sozinha?- Perguntou e eu sorri de lado me pondo de pé.

- A terra não é minha única opção Terê.- Caminhei até a ponta do cais sentindo o frio da noite bater contra meu rosto. Cruzei os braços sorrindo e esperando ela ir para casa.

-Exibida.- Ela disse rindo e se virando para ir para casa. Não nos despedimos, às vezes fazíamos isso não nos despediamos porque era nossa forma de dizer até logo, nossa forma de dizer que a conversa não tinha acabado e que a qualquer momento voltaríamos a falar.

Pulei no mar quando a vi passar pelo portão de sua casa, a água de primeira me fez sentir um calafrio e eu senti que não era o frio que me fizera sentir assim, alguém me observava era como se a água me dissesse isso, tirei lentamente a cabeça para fora da água, deixei que metade do meu rosto continuasse submerso e a outra olhava atentamente para os lados, nadei um pouco para longe do cais olhando atentamente para o cais, Tereza morava na parte calma de Dovii, assim como eu, o lugar era recheado de casas e raramente se encontrava prédios naquele lugar.

No topo de uma casa pude ver que algo se mesclava a escuridão, a luz da rua parecia ter dificuldade em iluminar aquela parte da rua, mas eu via a silhueta de algo se destacar, abracei meu próprio corpo com força por debaixo da água, senti que era melhor sair dali rapidamente. Sem demora alguma mergulhei nadando em direção ao lado mais profundo e escuro do mar, seja lá o que estivesse me observando não conseguiria me seguir, não no mar.

Cheguei perto da praia que levava a minha casa e me arrastei pela areia rapidamente, ultimamente eu não estava tendo muita paz ao sair do mar, me sequei o mais rápido que meus poderes permitiam, a praia também estava vazia, algo completamente estranho, levantei-me limpando a areia do meu moletom.

O mesmo calafrio que me atingirá quando eu tinha entrado no mar veio com força, ainda tinha alguém me observando, eu me sentia desconfortável com isso, me sentia com medo, olhei para todos os cantos mas nada e nem ninguém vi, meu olhar novamente se fixou em um ponto específico da rua, lá estava escuro a lâmpada estava estourada e as outras em volta piscavam como se, o que seja lá que estivesse ali, lhe desse interferência, dois pontos luminosos me fitavam e eu sabia que eram seus olhos, me lembravam os olhos de Jefferson, mas não dava a mesma sensação de segurança e alegria que eu sentia quando estava com ele, me dava medo e vontade de correr, me dava vontade de nadar o mais rápido possível para Micaal e me esconder lá para sempre.

Me movi para trás um passo de cada vez, eu decidi que minha casa não era mais uma opção, o mar era.

Seja lá o que estivesse na escuridão decidiu que me seguiria e que me pegaria antes que eu chegasse no mar, eu escorreguei pelo asfalto quente da noite fugindo em direção ao mar, eu estava longe da praia, longe demais. O ar parecia estar faltando em meus pulmões, sufocando-me, a presença “daquilo” me fazia sentir fraca, escorreguei novamente no asfalto.-Inferno porque a praia tá tão longe caralho?—Pensei furiosa finalmente alcançando a areia, mas foi tarde demais ele me alcançou se jogando sobre mim me prensando contra o chão e grunhido para mim.

-Entregue a pedra pra mim.- Ele grunhiu para mim. Eu não vi seu rosto porque eu estava de olhos fechados, tremendo que nem uma máquina de lavar velha. Quando finalmente abri os olhos meu coração deu uma palpitada, ele, aquele que me prensava no chão, era lindo, tinha cabelos ruivos que caiam sobre seu rosto e pescoço, seus olhos brilhavam em vermelho vivo e me fitavam com fúria, sua pele era clara e não palida, apenas clara, a única coisa com cor em seu rosto além de seus olhos eram seus lábios entreabertos rodados e carnudo, pude ver escapar uma pequena prévia do que seus dentes eram, brancos e normais, exceto por quatro deles, dois dentes de cima e dois de baixo tinham um jeito estranho e afiado, afiado demais.

Arregalei os olhos, não podia ser!

Um vampiro!

Sem o mínimo de esforço o peguei desprevenido, era um vampiro mas não deixava de ser homem, canalizei minha força total em seu ponto precioso é quase o quebrei com uma joelhada, ele guinchou e caiu para o lado enquanto tremia, levou suas mãos ao local, sorri satisfeita, mas como eu não sou tão burra sai na velocidade da luz, não literalmente porque é fisicamente impossível, em direção a minha casa.

Eu não sabia exatamente se ele estava me seguindo porque não arrisquei olhar para trás, no caminho esbarrei com pessoas que faziam a famosa caminhada da madrugada e agradeci porque até chegar a mim ele teria muitos lanchinhos no caminho, isso é meio desumano mas primeiro: eu sei que você pensaria o mesmo na minha situação, qual é tem um vampiro atrás de mim, apenas estou prezando pela minha vida, segundo: primeiro.

Me arrisquei a olhar para trás com pernas bambas em mãos tremendo apenas quando finalmente alcancei o meu portão e o bati com força, a como eu fui burra, até o momento não havia passado pela minha mente que: eu tinha saído escondido e que qualquer ruído faria com que meus pais acordassem, mal sabia eu que estava errada.

Mesmo com o estrondo do portão tudo parecia inabalado, eu caminhei pelas escadas como podia tentando não fazer barulho, entrei pela porta de casa e suspirei aliviada, até o momento a casa permanecia do jeito que eu a deixara, silenciosa e escura, subi as escadas e um sentimento ruim se apoderou de mim, algo ruim aconteceria essa noite. Minhas entranhas se contorciam e afirmavam que esse sentimento era verdadeiro.

Decidi que meu quarto seria o último lugar onde eu passaria, o primeiro quarto que passei foi o de Lucas tal dormia com sua pelúcia da Rainbow Dash, ele amava pôneis e ninguém podia julgar, o segundo foi o da minha mãe e Fernando estava tudo escuro e me senti estremecer, eu me lembrei de quando era criança e o escuro tinha domínio sobre mim, quando eu ficava noites sem dormir por medo, suspirei aliviada ao ver na penumbra a silhueta de minha mãe aconchegada em lençóis, mas ela estava sozinha fiz uma careta ao ver que a cama estava vazia ao seu lado. Não queria imaginar com quem Fernando estava e nem onde.

Suspirei prestes a fechar a porta mas a voz de minha mãe me fez estremecer e voltar:

-Onde você estava?- Era rígida como de uma mãe normal, mesmo ela não sendo uma mãe normal.

Engoli em seco andando lentamente até ela e sentando na ponta da cama com um sorriso torto no rosto.

-Eu…- Não sabia o que falar exatamente, nem mesmo pensei na possibilidade deles me pegarem, caramba eu sou muito burra.

Ouvi ela suspirar e sentar na cama, ela não estava de mal humor estava brava, porque um eu saí sem sua autorização e voltei às...Voltei o olhar pro relógio que sempre ficava em cima do criado mudo, às duas e cinquenta e ainda por cima quase destrui o portão ao entrar, eu ficaria brava também.

-Você só me preocupa Clara.- Ela revirou os olhos.- Quer bolo? Eu fiz agora de noite enquanto você estava trancada no quarto.- Eu assenti. Era engraçado essa nossa mania de comer não importava o horário.

Ela levantou da cama sonolenta deixando escapar um leve bocejo, acompanhei-a mesmo eu não estando com sono era força de hábito, minha mãe era particularmente linda, eu nunca mencionei, mas eu não puxei a ela e nem a Fernando, mamãe tem olhos castanhos tão claros que toda vez que os vejo eu tenho uma inveja profunda por ela o ter, seus cabelos são longos e ondulados de cor também castanha, mas as vezes quando o sol bate contra seus fios quase sempre presos em penteados discretos eles se tornam vermelhos, mamãe é uma mulher jovem ela me teve com seus vinte e dois anos, agora com seus trinta e um o tempo pareceu ter parado para ela, eu não sabia exatamente o que ela fazia, mas seu corpo parecia ter parado nos vinte, seus seios eram avantajados por conta da genética, que não herdei, mas seus quadris largos por conta da gravidez, era alta como eu mais não em exagero. Mamãe era linda na medida certa.

Pisquei saindo dos meus pensamentos ao ouvir um barulho no quarto, no meu quarto, mamãe pareceu ouvir também porque parou no meio do caminho que levava para a cozinha nos olhamos e ela levou o dedo indicador em frente aos lábios em sinal de silêncio, assenti e ela correu até a cozinha sem fazer barulho algum, momentos depois ela voltou com…Uma frigideira?

Ergui a sobrancelha deboxada. Aquilo era sério? Uma frigideira? Pelo amor de Deus. Revirei os olhos enquanto ela entrava em modo defesa com a frigideira em mãos, assentimos uma pra outra a e subimos a escada com delicadeza e sutileza.

Paramos na porta do meu quarto e eu preparei meus punhos, e secretamente o que eu sabia dos meus poderes, para enfrentar quem fosse, minha mãe quase arrombou a porta com um chute exagerado, e partimos para cima.

Mas quando entramos no quarto eu tive certeza que encontrar um ladrão seria melhor que presenciar o que presenciamos.

Eu estava estacada no chão e minha mãe do mesmo jeito, o quarto estava completamente claro, um cheiro nojento predominava o local o cheiro daquele perfume, sobre minha cama cena mais grotesca acontecia, sem vergonha alguma Fernando estava sem camisa e com os cabelos soltos grudando sobre e o ombro e pescoço, exceto por um lado o esquerdo onde Danyelle estava afundada a momentos beijando, ela ainda estava vestida mas com seus cabelos roxos completamente desalinhados e desgrenhados, ela e ele nos olhavam assustados.

Meu olhar caiu sobre Fernando e meu interior rugio de ódio, eu era uma sereia mas por momentos me senti um leão, olhei para Danyelle e ela se encolheu, diferente da primeira vez que nos vimos, não me senti pequena, nem com medo, eu não queria fugir, ela queria, pisquei furiosa e vi ela se arrastar em minha cama até a parede, um passo iria ser dado por mim, eu não deixaria barato, na minha casa, no meu quarto, na minha cama.

Mas minha mãe foi mais rápida, vi de relance quando ela apertou o cabo da frigideira em sua mão e partir em direção aos dois com fúria em cada canto do corpo.