Uma Chance para Recomeçar

Capítulo 4 - Os preparativos


A lista era formada por vinte e um alunos no total cujos pais aceitaram os termos do concurso e da escola, tendo uma boa turma para organizar uma apresentação que, segundo Dulce, ficaria incrível. Para que saísse da forma que eles esperavam, algumas medidas deveriam ser tomadas, e isso envolvia o trabalho duro das crianças em se comprometer nos ensaios, dela de estar ali para ensiná-los, da escola de conseguir tudo o que precisariam e, obviamente, dos pais, motivando as crianças a fazer o seu melhor.

Dulce saiu de dentro de seus pensamentos quando notou que recuperava uma lembrança mais. Essa rotina que preparara para as crianças foi parte de sua vida desde começou a fazer parte de grupos musicas, tinha suas obrigações em relação à escola, mas sua maior responsabilidade era de fazer sua parte na equipe, saber as músicas, a coreografia, saber seu lugar nas apresentações. Estas eram rápidas, o resultado final de todo um processo. Era isso que precisava ensinar às crianças.

— Meninos, a partir de hoje até acontecer o concurso, as coisas serão diferentes nas nossas aulas. — Ela notou que as crianças ficaram confusas, então tentou ser o mais clara e objetiva possível para que não houvesse dúvidas. — Nós não deixaremos de fazer o que sempre fazemos em aula, afinal alguns de vocês não poderão participar da apresentação e não podem ficar sem as aulas por conta disso. Mas os que vão participar ficarão mais um tempo ensaiando e aprendendo sobre apresentações.

As crianças não se opuseram. Era visível que as que participariam da atividade extra estavam bem mais animadas que normalmente, agitadas, ansiosas. Elas queriam ser parte de tudo aquilo.

— Então vamos começar a aula normal, quando o sinal bater aqueles que não vão estar no concurso serão dispensados e poderão ir para as outras atividades. Os que vão se apresentar, ficam. Certo?

Eles assentiram.

A aula ocorreu um pouco mais lenta que o normal, claramente porque as cabecinhas das crianças estavam preocupadas demais com o futuro. No entanto, Dulce compreendeu essa sensação de que o final seria tão grande que deixava difícil a tarefa de se concentrar no presente. Ela havia, com o tempo, aprendido a controlar isso e viver um passo de cada vez no âmbito profissional, eles ainda estavam no início.

Finada a aula, o sinal bateu e ficaram apenas as crianças que se apresentariam. Todas formaram uma roda, como sempre faziam nos inícios de cada aula, e esperaram as ordens da professora.

— Meninos, agora que estamos começando essa aventura nova, eu preciso que vocês se comprometam, primeiramente, em não faltar. É muito importante que vocês ensaiem juntos aqui comigo, porque vocês são uma equipe. Sem qualquer um de vocês, a equipe não funciona, porque cada um tem seu lugar e só vão saber se souberem onde o resto da equipe está. Também vamos combinar mais uma coisa: os ensaios serão cansativos e bem cheios, vamos ter as músicas e também coreografias e nessa parte eu preciso que vocês façam também a lição de casa.

— Eu odeio fazer lição de casa — um dos alunos mais novos comentou. — É muito chato.

— Eu sei. Mas a nossa lição de casa é diferente. Vocês precisam ensaiar no tempo que não tivermos aula, ou então demoraremos muito para aprender tudo. Posso contar com vocês?

Nenhum deles respondeu.

— Esse acordo é fundamental. Para que a gente possa competir, a gente precisa trabalhar para isso. Se vocês não se comprometerem, não vamos para o concurso, seria perda de tempo.

As crianças começaram a fazer sinais positivos com a cabeça, indicando estarem de acordo com os termos de Dulce.

— Muito bem. Vamos começar então. Meninos, nós teremos três meses para nos preparar da melhor forma possível e por isso eu coloquei esse acordo que acabamos de fazer. É muito pouco tempo — ela notou que as crianças não concordavam com ela nesse aspecto, mas continuou explicando. — Tem projetos musicais que levam quase um ano de preparação até que possam sair a público. Mas nós temos apenas três meses, então vamos fazer com que essas semanas sejam bem aproveitadas.

“Sendo assim, coloquei as semanas separadas por etapas. Acho que essas três primeiras semanas vamos usar para dedicar apenas às músicas. Tenho aqui uma lista de canções e temos que separar cinco delas para apresentar. O edital é bem específico: são cinco músicas dos anos dois mil, então eu trouxe algumas boas opções. Vamos escutá-las juntos e fazer uma votação. As cinco mais votadas serão as que vamos cantar, combinado?”

As crianças, na aula, pareciam muito agitadas, mas agora no ensaio escutavam as instruções quietas. Dulce pensou que elas estavam entendendo a necessidade de manter um foco e que elas não conheciam a forma correta de se ensaiar para um evento assim, queriam aprender. Elas apenas mexiam as cabeças em tom afirmativo, muito diferentes de alguns minutos antes. Eles aguardaram, atentos, a que Dulce colocasse as faixas uma a uma.

— Quem gostou da primeira música, levanta a mão.

Alguns levantaram. Dulce anotou, faixa por faixa, os votos das crianças, chegando rapidamente a uma lista final com as músicas da apresentação. Ela releu os nomes, repassou as músicas e, então, distribuiu para cada um deles uma cópia com a letra e a partitura de cada canção.

— Então essas foram as músicas campeãs e eu acho que isso vai ficar muito legal, foram ótimas escolhas. Só tem música conhecida da época, acredito que vocês vão fazer um trabalho incrível! — Dulce pegou a primeira das músicas na mão e prosseguiu. — Muito bem, agora já temos tudo. Vamos tentar cantar uma vez para que vocês aprendam o ritmo e entendam os sinais da partitura devagarzinho. Depois em casa, precisaremos ensaiar mais algumas vezes até a nossa próxima reunião. Posso contar com vocês?

Em resposta, as crianças se levantaram para iniciar a primeira passagem. Durante a primeira música, Dulce fez alguns comentários e dividiu o grupo em quatro partes, definindo quatro tipos de vozes. Ela foi mostrando como a entrada de cada grupo na hora certa fazia toda a diferença na hora de interpretar a melodia. A segunda música teve mais um arranjo interessante: Dulce escolheu os alunos que conseguiam chegar a notas mais altas para os solos e explicou para as crianças como havia decidido tudo, afinal, era um processo de aprendizagem, mais do que competição.

As cinco músicas foram ensaiadas nos moldes combinados e Dulce não poderia se sentir menos orgulhosa. Os meninos estavam focados, aceitando as críticas, os elogios e criando uma identidade interessante que fazia com que as músicas soassem muito bem, oferecendo uma prévia de qual seria o som final.

No final do encontro, ela reforçou novamente que as crianças deveriam ensaiar em casa, para que na reunião seguinte pudessem apenas corrigir alguns erros e deixar os sons lapidados e prontos. A etapa seguinte seria aprender a coreografia que Jorge levaria, unindo melodia, mensagem e corpo numa única linguagem. As crianças se despediram, levando consigo as músicas e as esperanças e deixando Dulce com a sala vazia.

***

Os almoços normalmente eram calmos, aconteciam no café de Lucas e contavam apenas com Dulce e Luísa num momento de mãe e filha que sempre acabava com algumas brincadeiras e um começo de tarde que Dulce valorizava muito. Não tinha sido tão presente durante os primeiros meses de Luísa, tendo ajuda do time que morava com ela, Paola e Jorge, os quais eram solícitos todo o tempo caso a bebê necessitasse ou mesmo ela durante sua recuperação.

Nesse dia as duas tiveram Paola como companhia. Ela vinha de uma assembléia de última hora da cidade, evento que estava sendo cada vez mais frequente, como nunca havia sido antes. A presença de uma pessoa externa na cidade estava deixando tanto os moradores quanto as autoridades em alerta todo o tempo, o que deixava Dulce também nervosa e apreensiva com a possibilidade de ser reconhecida, ainda mais depois do bilhete que havia recebido. Claro que não estava endereçado a ninguém, mas sabia que era para ela.

— Paolita, como foi a reunião? — Dulce não se conteve, perguntando antes mesmo de cumprimentar a amiga. — Souberam de mais alguma coisa sobre essa pessoa?

— Nenhuma pista. Na reunião de hoje, todos conversaram um pouco sobre ações para encontrar essa pessoa e formas de a gente se proteger — Paola não explicou mais detalhes, apenas mudou de assunto. — Esquisito mesmo foi aquele bilhete que o Jorge falou que deixaram aqui naquele dia. O que será que queria dizer?

Dulce não queria ter que abrir tão cedo mais coisas de seu passado, que pouco a pouco voltava à memória, porém se via em dívida com Paola e Jorge, depois de tanto que a ajudaram.

— Bem, digamos que eu tenho muitas coisas para conversar com você e Jorge hoje à noite. Mas adianto: aquele bilhete era para mim, eu tenho certeza. Era uma ameaça sobre a mídia.

— E o que você tem a ver com isso, amada?

— Por isso vamos conversar à noite, para que eu possa explicar a vocês. — Dulce deixou de lado a comida e olhou para Paola. — Seja quem for que está aqui na cidade causando esses problemas, essa pessoa está atrás de mim. Precisamos ficar atentos. Precisamos saber quem é e por que veio nesse momento.

— Não vejo o porquê de uma pessoa estar atrás de você. Mas se você diz, estaremos do seu lado como sempre, vamos te ajudar com isso. Jorge adora um mistério. — Paola e Jorge se conheciam há muitos anos, estudaram juntos e além de tudo eram vizinhos de porta na infância. Ninguém conhecia um ao outro tão bem como eles. Dulce sabia que uma hora a conheceriam também e isso talvez os afastasse. Paola, no entanto, interrompeu os pensamentos da amiga seguindo com os acontecimentos do dia. — Durante a reunião, o prefeito até chegou a apontar você, mas como um exemplo de pessoa que veio de fora e que nunca levantou suspeitas de que causaria algum problema. Eles disseram que você era mais confiável que muita gente nascida aqui — Paola comentou, rindo.

— Eu sinceramente estou com medo — Dulce rebateu. — Com esse concurso agora, ficaremos mais expostos ainda.

— Fique tranquila, amiga. Duvido mesmo que seja algo pessoal, é só mais um doido no mundo. Além disso, vamos começar a ter vigília nos bairros, principalmente no hospital, na clínica, na praça e na escola, que têm bastante fluxo de gente.

— Espero que assim alguém consiga pegar esse cara antes que faça coisa pior.

Paola assentiu. Permaneceram alguns minutos mais em silêncio, apenas auxiliando Luísa na difícil tarefa de aprender a comer sozinha com os talheres.

— Essa tarde você trabalha? — Dulce nunca sabia os horários de trabalho de Paola, eram bastante flexíveis e dependiam do movimento da cidade.

— Hoje sim. Precisa de alguma coisa?

— Não, nada. — Dulce juntou a louça em uma pilha para facilitar a vida de Lucas quando ele fosse retirar tudo da mesa e começou a se levantar, sinalizando que seu horário de almoço ia chegando ao fim. — Vou levar a Lu de volta à escola, mas hoje estou dispensada para ir ao médico. Você pode ficar encarregada de levar essa pequenininha para a casa mais tarde?

— Claro! — Paola nunca se isentava de passar um tempo com Luísa. — Ficaram prontos os exames?

— Ficaram, e eu espero que eles estejam ótimos. Não aguento mais fazer nenhum tratamento.

— Vão estar! — Paola desejou, também levantando-se e dando um abraço de despedida na amiga. — Te encontro em casa mais tarde.

Dulce saiu do local com Luísa no colo, fazendo o caminho como planejado: deixou a filha na sala de aula, saiu da escola e foi para o consultório médico, que ainda estava “em recuperação” depois dos recentes acontecimentos.

Sentada no que sobrou da sala de espera, observava e refletia. Uma pessoa vinda de fora chegara até Paraíso Real do nada e começara a buscá-la? Ou teria sido alguma pista que levou até Dulce? Sendo ao acaso ou não, ela estava preocupada com seu futuro e com o de sua filha, uma vez que quando pensava nos anos seguintes já não se via na Capital. Antes do acidente talvez não visse outra alternativa senão seguir como já estava vivendo antes; mas agora não, aquela vida agitada não fazia mais parte de seus planos. Era assustador ver-se novamente na iminência de mudar tudo por causa de uma pessoa.

— Dulce!

A recepcionista chamou, fazendo com que ela parasse de pensar naquilo tudo e entrasse diretamente no consultório.

— Boa tarde! Veja se não é minha paciente mais recuperável!

Doutora Rosa se levantou para recebê-la, apertando sua mão e voltando a se sentar. Dulce estava nervosa como sempre ficava quando o assunto era ver resultados dos exames, porque não tinha um bom histórico mesmo antes de tudo acontecer.

— Bom, me refresque a memória, Dulce, por favor. Estou sem os prontuários ainda, depois daquela bagunça que aconteceu por aqui. Da última vez que você veio, ainda estava muito ruim o seu quadril, não é mesmo? E eu pedi alguns exames para você repetir para dali seis meses e você fez tudo na semana passada, certo?

— Sim. Quanto ao quadril, a ferida ainda dói, mas tem doído com menor frequencia que o normal. Mas a intensidade continual grande.

— Vamos seguir com as fisioterapias. — Drª. Rosa anotava em uma ficha que Dulce acreditava ser uma versão provisória do prontuário. — Ainda precisamos encontrar uma forma disso parar para que você possa seguir sem tratamentos. Os seus exames estão bem melhores que da última vez, pelo que me lembro. A única coisa mesmo que resta é o quadril. E sua memória, como está?

— Relembrando devagar, mas relembrando.

— Ótimo. E você tem conseguido dormir bem? Ou ainda anda tendo sonhos?

— Quando não sinto dor, durmo bem, doutora. — Dulce respondeu. Há poucos meses ela ainda sonhava com coisas que não sabia se eram reais ou não, pois não conseguia se lembrar. Com o tempo tinha conseguido diferenciar as experiências que de fato tinha passado e as que sua cabeça inventou para fazê-la assustar-se.

— Está ótimo. — Ela abaixou os papéis e continuou. — Alguma queixa? Como você tem passado?

— Estou bem — respondeu, sem ânimo.

— Eu estou vendo que você não está muito bem — a doutora rebateu.

Dulce suspirou.

— Estou voltando à rotina, tem bastante coisa em que pensar. E essa pessoa a solta não está ajudando.

— Se você quiser, podemos pedir outros atendimentos para você. Não tem que lidar com tudo sozinha, Dulce.

— Eu não queria mais tratamentos — Dulce respondeu, delicadamente. — Eu estou conseguindo fazer as coisas. Não faço tudo sozinha, tenho bastante ajuda, mas estou voltando devagar.

— Bem. Então vamos manter seus retornos e exames para cada seis meses, certo? E continue a fisioterapia. Te vejo logo mais!

Dulce assentiu e agradeceu. Saiu do consultório ainda perdida em pensamentos. Deveria ligar para Gabriel e conversar sobre a consulta e isso implicaria em estar focada em outra coisa além da ameaça que recebera. Era exatamente o que precisava. Agarrou o celular e discou o número do namorado.

— Dul?

Ela instantaneamente sorriu. Gabriel foi uma das surpresas que ela recebeu por viver em Paraíso Real. Ela pensava que estando ela numa cidade desconhecida e estando numa situação de saúde tão crítica, ninguém se daria ao luxo de acompanhá-la em lugar nenhum. Estava enganada: Gabriel fazia trabalho voluntário no hospital, visitando pacientes que estivessem sem acompanhantes. Foi assim que ficaram amigos. Foi assim que se tornaram cúmplices.

— Oi Gab.

— Como estão as coisas por aí? Ouvi falar que tem um doido à solta agora. Vocês estão bem?

— Estamos bem. — Dulce não queria confessar seu medo a Gabriel estando no meio da rua. Resolveu mudar de tema até que pudesse chegar em casa. — Eu te liguei para falar dos exames, você pode conversar agora?

— Como foi? O que a doutora disse?

— Disse que está tudo bem — ela respondeu, ofegante pelos passos mais rápidos. — Só o quadril que continua ruim, mas vou continuar fazendo a fisioterapia.

— Certo — ele fez uma pausa, e Dulce pode ouvir um motor alto ao fundo. Gabriel devia estar em um de seus descansos no aeroporto. — E você está com dor hoje?

— Não, hoje não doeu nada — respondeu, indiferente.

— Você está estranha. Parece fechada.

— Acho que sim.

Dulce ainda não tinha chegado em casa, mas alcançou um local mais deserto antes de começar a falar sobre o que a preocupava. Ela não sabia que estava assim tão nervosa com tudo isso, mas sentia as mãos tremerem e a vontade de chorar subindo pela garganta.

— Eu… — começou a explicar. — Eu estou com medo.

Notando o tom de voz diferente, Gabriel voltou a colocar atenção na conversa.

— O que aconteceu? Tem a ver com os exames? Você não me contou alguma coisa.

—Não, Gab, dos exames era só isso mesmo. Prometo. — Ela baixou um pouco a voz, tendo dificuldade em acreditar que estava incomodada nesse nível. — O medo é por causa dessa pessoa que tem causado um monte de problemas por aqui…

— Aquele que falaram na assembléia? Ele fez alguma coisa? Vocês realmente estão bem? — Gabriel perguntou um pouco mais alto que o normal.

— Aconteceu uma coisa. Esses dias estávamos eu, Jorge e Luísa no café. Estava uma bagunça, uma gente reunida na praça comentando sobre o cara, todo mundo no café falando alto. O Lucas expulsou a maioria, mas nós ficamos. E de repente alguém colocou um bilhete na porta, não vimos quem foi, mas falava sobre a mídia ficar muito impressionada se soubesse o que ele sabia.

— Ou seja, um bilhete nada a ver. Será que é dessa pessoa?

— Só pode ser. Não era um bilhete nada a ver, era para mim, Gab. Era uma ameaça — Dulce disse, tentando respirar fundo em vão.

— Para você? Não entendi.

— A mídia não sabe onde eu estou.

— E deveria? — Gabriel perguntou confuso. Dulce pôde escutar ao fundo uma voz, provavelmente da equipe do aeroporto avisando sobre algum voo. — Meu bem, eu preciso ir. Depois você me explica tudo isso, pode ser? Até eu chegar, talvez seja melhor você não andar sozinha por aí. Anda sempre com alguém. Vai ficar tudo bem.

— Certo. Estou com saudades.

— Eu também...

Dulce desligou antes de que Gabriel pudesse de fato se despedir. Ela ainda precisava chegar em casa logo e se preparar para ter uma conversa séria com Jorge e Paola, ela sabia que eles dois iriam entender depois que ela explicasse. Iniciou novamente a caminhada em direção à casa, mas um movimento estranho na rua fez com que ela parasse de novo. Pessoas vindas de casas mais distantes vinham correndo, e Dulce percebeu que do outro lado da praça também. Eles não tinham uma cara muito amigável, estava mais para desespero.

Ela desistiu de ir para casa, precisava saber o que tinha acontecido. Andou no mesmo sentido que as pessoas iam até chegar na praça central. Então ela pôde ver qual era o destino. De dentro da escola da cidade, a única que tinham e onde Dulce trabalhava, saía uma fumaça escura. Ela imediatamente entrou no lugar, ignorando outras pessoas que também se espremiam na porta para passar, e viu um espaço arruinado e empoeirado. Olhou para todos os lados e não podia enxergar, porém precisava encontrar Luísa. Em meio aos destroços do que antes era o pátio, Dulce encontrou a diretora, que parecia desesperada.

— Onde estão as crianças, Margaret?

— Não tinha ninguém no pátio quando aconteceu. Foi uma bomba, Dul, olha o estrago! Vamos, vamos para dentro, vamos sair dessa poeira. Pedi aos inspetores que organizassem as crianças para sair pelo outro lado hoje. Vá na frente, vou avisar aos pais que dêem a volta para buscar as crianças. Os professores foram instruídos a ir para a sala de professores, vamos todos conversar.

Dulce acompanhou a diretora com os olhos enquanto caminhava até o corredor que dava acesso às salas de aula. Mal podia acreditar. Ele sabia até onde ela trabalhava e colocou todos em risco por isso.