Eragon não sabia dizer se era dia ou noite. Passara aquelas ultimas horas no salão dos mestres, vigiando o estranho humano, ainda desacordado, e seu dragão recém nascido. A ligação entre eles, era diferente de todas as outras. Uma ligação forte demais, ele podia sentir, que afetou o dragão de alguma forma.

Em seu pescoço estava crescendo uma mancha negra e sem brilho, que fazia contraste com o resto de suas escamas brancas de um brilho cristalino. Aquilo não lhe parecia bem vindo, Eragon sentia, que naquela mancha, estavam os vestígios traumáticos de sua ligação com o homem.

Eragon entrara na mente do pequeno dragão, que ficava cada vez mais nervoso e violento à medida que a mancha crescia, para confortá-lo e, talvez assim, conseguir estabilizar seu conflito com o seu misterioso cavaleiro. O mostrara suas lembranças das montanhas Beor, do deserto Adarac, sabia que aquelas visões eram bem vindas e confortantes à mente dos dragões, os ambientes propícios para eles. Também despejou sensações de ondas de areia quente cobrindo o corpo do dragão à luz do sol do meio dia.

Só assim o dragão relaxou, e adormeceu.

O salão dos mestres nunca estivera tão agitado. Junto de Eragon, estavam Blödhgarm e Oriúmos, cantando uma canção para o dragão pequenino. A canção era um encantamento, cuja finalidade era retirar a consciência estranha que o habitava por meio da mancha e fazê-lo lembrar de onde veio e quem era, para que não se perdesse dentro de sua própria consciência confusa.

Os mestres Obtiveram sucesso em resgatar a consciência do dragão, mas a mancha ainda permanecia lá.

Blödhgarm foi o primeiro a parar com o encantamento.

– Não iremos conseguir remove-la. – Disse com o rosto duro, como se refreasse uma explosão. – A consciência intrusa está tentando tomar o lugar da consciência verdadeira dele.

– Deve haver alguma forma de retirá-la. – Disse Eragon. De outra forma, o dragão não poderia permanecer ali.

Istalrí levantou-se de onde estava deitado, no canto do salão com Saphira e Awremöm, e juntou-se aos três mestres.

A única forma de o pequenino não enlouquecer é unir as duas consciências. Pode ser algo cruel, mas de outra forma ele não escapará. Declarou o grande dragão laranja.

– Pode funcionar. – Disse Oriúmos calmamente, concentrado na mancha. – Se o ensinarmos a controlar este seu lado, com o tempo, a consciência intrusa pode ser esquecida por sua mente.

– E quanto ao Cavaleiro? – Eragon olhou para a mesa onde o homem de cabelos brancos jazia. – Ele será um de nós?

Blödhgarm olhou ligeiramente para o homem, como se contempla-lo fosse algo perigoso.

– Teremos de convencê-lo de que queremos ajudá-lo. Teremos de mostrar a nossa ordem a ele.

Eragon apertou o cabo de Brisingr com força. Aproximou-se devagar da mesa, arrastando os pés pela superfície lisa do salão, se tivesse de falar com ele, seria agora. Pousou a mão na testa do homem e fechou os olhos.

Eragon vagou pelos caminhos escuros e vastos daquela consciência desconhecida. Até encontrar a essência de seu ser.

Era diferente e tenebrosa. O centro de seu ser era sustentado por melancolia, que estranhamente era o que o deixava vivo. A cada aproximação, Eragon era surpreendido por um novo desconhecido.

O homem não fez tentativa nenhuma de defender-se, então Eragon tocou sua consciência, que despertou como se tivesse levado um choque, revelando à Eragon todos os segredos daquele ser, Tudo o que vivera e presenciara. no rápido momento de desproteção da mente, Eragon absorveu tudo que pode, até o homem perceber que sua mente estava sendo invadida, e rapidamente fechar suas portas.

Era agora o momento.

Eu venho em paz. Disse Eragon na língua antiga.

Quem? Quem vem em paz? Perguntou o homem também na língua antiga.

Eragon ficou surpreso, O homem o respondera.

Sou Eragon, Matador de Reis, Líder dos cavaleiros de dragão. E você é um, agora.

E por que vem em paz, Matador de Reis? Provavelmente eu deveria estar com medo de você. E você deveria provar que não quer me fazer mal. Assim eu desconfiaria por um momento, e logo em seguida o Matador de Reis se tornaria totalmente confiável. Ou seria o contrário? Caso contrário eu não poderia saber.

Aquele não era o momento para jogos de palavras, mas Eragon entendia o que ele queria. Era a única forma de manter um diálogo e talvez chegar a um acordo.

Sim, mas de acordo com situação, é mais propício você confiar em mim. Já que conhece a minha língua, deve saber que não há com eu estar mentindo.

Ele tinha de ser tão complicado?

Então a consciência do homem explodiu em uma dor, que obrigou Eragon a retirar-se. Quando abriu os olhos, viu o dragão branco berrar de dor, enquanto Blödhgarm e Oriúmos cantavam um encantamento. Era o processo de fusão da consciência intrusa com a consciência do pequeno dragão.

À medida que os Elfos cantavam, a mancha negra no pescoço do dragão ia crescendo, junto com seus berros. E crescendo, e crescendo, até que seus gritos alcançaram todo o salão, e a mancha envolveu todo o corpo do dragão, tornando-o negro.

Por favor, acabem logo com isso. Desejou Eragon.

– Não! – O homem abriu os olhos arquejando – Faça parar, faça... – Disse na língua antiga.

Então a mancha no pequeno dragão começou a encolher e tornou-se de novo a listra preta no pescoço semelhante a um sulco de uma garra. e ele parou de gritar.

O humano ainda arquejava.

– Calma – Disse Eragon pondo a mão no ombro do homem – iremos cuidar de você.

O humano o olhou com seus olhos totalmente brancos a não ser pelo ponto minúsculo que era a pupila, mas fraco demais para dizer algo.

Quando avistou o dragão, levantou-se rapidamente e correu para o chão.

O cavaleiro envolveu seu dragão nos braços. O pequenino abriu os olhos.

E para a surpresa de Eragon, eram iguais aos de seu cavaleiro, totalmente brancos a não ser pela minúscula pupila, que também era um ponto, não uma fina linha preta como nos outros dragões.

Veja, este é seu dragão. Disse Eragon mentalmente. Sentia-se mais seguro conversando com ele assim.

O homem olhou curiosamente para o dragão que, também, olhava-o, com seus olhos grandes bem abertos, inocentemente.

– Bem vindo cavaleiro de dragão. – Disse Eragon com cautela, tentando mostrar-se o mais amigável possível.

Saphira que até agora estava observadora quanto aquela situação, levantou-se e foi até os novos.

Que as estrelas o protejam, cavaleiro e dragão. sejam bem vindos.

Todos ali tinham de agir da mesma forma, mais amigáveis possíveis.

– Sei que é difícil para você, assim como é para nós, entendemos a estranheza do desconhecido. – Disse Eragon devagar na língua antiga para que ele compreendesse. – Por isso sejamos verdadeiros, nos estamos desconfiados. Eu de você e você de mim. Porém somos agora iguais – disse ele acariciando o pescoço de Saphira. – E seja quem você foi no passado... Eu não me importo. o que importa é o que você é agora. E agora você é cavaleiro de dragão. olhe para seu dragão. vê? ele é parte de você agora, como o meu.

O homem nada disse. mas deixou levar-se por Eragon. o que dava a entender que ele concordava.

– Agora me diga. qual seu nome? – Perguntou Eragon.

O humano nada disse. apenas apertou o dragão, que mordeu seu braço brincando, inocentemente como se nada tivesse acontecido à alguns minutos.

– Bom... Você deve estar cansado. e também precisa banhar, vamos sair daqui.

Disse Eragon sem esperar uma resposta. Escalou a perna de Saphira e montou seu dorso.

– Vamos – Disse estendendo a mão para o homem.

Ele hesitou, mas acabou segurando a mão de Eragon que o puxou para o dorso de Saphira, que abaixou a cabeça e a colou no chão, bem na frente do dragão recém nascido que escalou a cabeça do dragão azul, passou por seu pescoço até chegar nos braços de seu cavaleiro.

– Segure-se – Preveniu Eragon.

Saphira ergueu-se cuidadosamente e caminhou até ao portal mágico da entrada da sala, seguida pelos outros mestres e seus cavaleiros.

Fora do salão, estavam cercando a entrada, uma dúzia de cavaleiro acompanhados de seus dragões. Todos olhavam curiosos para quem estava no dorso de Saphira.

– O que fazem aqui, curiosos? vocês precisam de disciplina! – Disse Blödhgarm aos alunos com seu olhar severo. – Deveriam estar estudando. acham que teriam a chance de enfrentar Galbatórix dessa forma? – Disse ele com desdém. – Vamos, saiam daqui, vão fazer algo útil.

Os alunos se dispersaram pelo pátio , outros voaram para longe, deixando o caminho livre.

– Segure-se bem. – Disse Eragon pouco antes de Saphira saltar para o ar.

Awremöm e Istalrí seguiram para o mesmo rumo, o norte. Provavelmente estavam indo para a floresta da costa.

Saphira subiu declinada então ficou paralela ao chão quando já passava das nuvens. Era noite, mas era possível ver as nuvens mais claras que o céu, Saphira voava sobre um mar de nuvens brancas. Das grandes construções de Venora era possível ver apenas o topo, a superfície estava submersa. Dali era possível ver o topo das quatro montanhas que formavam o vale sem sol. Saphira bateu as asas cinco vezes para ganhar velocidade, então deixou que o vento as sustentasse no ar. O dragão conhecia bem aquela rota, mesmo com o mar de nuvens cobrindo o chão, ela sabia onde era seguro mergulhar.

Quando o dragão azul adentrou o mar de vapor, Eragon pode sentir o homem contendo seu medo.

Dali a vista era incrível como sempre. O lar que Eragon escolhera, era uma caverna no meio de uma montanha, O rochedo cinzento. rodeada pelas gigantescas – Eragon diria até maiores que as de Du Weldenvarden. – Árvores de tronco cinzento que cresciam como grandes cabos torcidos em espiral, com folhas brancas maiores que um anão. eram as árvores da floresta branca.

Saphira pousou na entrada da caverna, que era várias vezes a sua altura, arrancando lascas de pedra da beirada do precipício. Eragon desceu pela perna do dragão, e estendeu a mão para o homem, mas ele não precisou. com um salto ele desceu e pousou graciosamente no chão rochoso.

Eragon estava com as pernas cansadas, assim como todo o corpo. mas especialmente as pernas.

– Bom... aqui estão meus aposentos. – Disse Eragon fazendo a mão estendida, apontando para dentro, viajar cento e oitenta graus.

A caverna era imensamente oca, tao grande, que era possível Saphira voar dentro dela. Embutida em uma das paredes, uma prateleira repleta de livros, estendia-se até onde as curvas da caverna permitia. No meio da caverna havia uma mesa redonda com vários livros E pergaminhos, abertos. Uma lareira em forma de arco, esculpida na parede, assim como estante. A lareira era gigantesca, maior que tudo ali, embora tudo fosse gigantesco. Deixava vivo um fogo magico, azul safira, que formava alongadas sombras em todos os moveis. Embora fosse uma colossal parede de chamas que erguia-se na lareira, não era quente, apenas iluminava a caverna com seu brilho magnífico.

A caverna tinha uma abertura ao fundo. Uma escada em forma de túnel que levava ao quarto de Eragon, que também era aberto para o exterior da montanha, um grande janelão natural.

– A direita daquele corredor está um quarto que dormem meus alunos quando necessitam vir aqui. – Eragon sentia-se estranho dizendo aquilo. era como se determinasse o destino do homem. e se ele quisesse ir embora naquele instante?

– Qual a necessidade disso? – Disse o homem com seu sotaque forte. – Porque tanta hospitalidade? eu entendo perfeitamente o que quer. Eragon matador de reis, líder dos cavaleiros de dragão, matador de espectros.

Matador de espectros? Eragon não dissera aquele título à ele. Saphira?

Também não entendo pequenino.

– Como sabe que...

– Como sei? eu sei tudo o que pensa. – Disse ele sorrindo, mostrando caninos anormalmente grandes. – Não... não fique com raiva de mim. mesmo que não quisesse, é inevitável, mas não direi que não queria.

O que mais impressionou Eragon, é que ele disse tudo no idioma comum dos homens.

Isso me lembra alguém. Disse Saphira.

Elva. Afirmou Eragon.

Antes que Eragon pudesse falar algo ele disse:

– Você está com raiva de mim por eu ter contado a verdade a você? Se quiser lhe conto tudo que quiser saber.

– Então fale! Sabe o que eu quero, sabe que não confio totalmente em você. Fale quem é e resolvemos isto logo. – Disse Eragon irritado.

O homem franziu o cenho.

– Antes você poderia suportar não saber nada até um certo momento, não queria parecer inconveniente? – Ele balançou a cabeça, seus cabelos balançaram atrasadamente. – Acho que hoje não, estou cansado e preciso dormir.

O homem dirigiu-se até o quarto que Eragon indicara, o dragão branco o seguiu.

O homem deteve-se quando chegou à porta escura de carvalho.

– Ariän – Disse ele.

– O que disse? – Perguntou Eragon.

– Meu nome. – Respondeu ele. Ariän é meu nome.

O Cavaleiro branco entrou pela porta de carvalho junto de seu dragão.

Quando a porta fechou com um barulho grave, o silêncio invadiu a sala de pedra. O único barulho que e ouvia era o estranho eco provocado pelo vento nas gigantescas folhas das árvores da floresta branca.

Saphira estava deitada à beira do precipicio. Com as patas da frente cruzadas uma em cima da outra.

O que você acha? Perguntou o Cavaleiro ao seu dragão.

Acho que, ou ele tem alto confiança em demasia ou ele confia totalmente em você.

Eragon preferia a segunda opção.

Subiu a escada até seu quarto, onde outra lareira de fogo azul sufocava o brilho do luar entre as nuvens.

Com algumas palavras na língua antiga, o fogo extinguiu-se. Sua cama o chamava, tirou brisingr embainhada da cintura e a colocou do lado da cama. Deixou-se cair na cama.

Rajadas de vento vindas da janela o atingiram, era Saphira que entrava pela abertura.

Confesso que concordo com ele. Comentou Saphira a beira da janela, olhando para baixo, para as folhas brancas das arvores, que refletiam o brilho prateado do luar. As escalas do dragão faziam jus a seu nome. Saphira escamas brilhantes. Eragon via cada escama azul refletir finíssimos fios pratas, e o rio prateado que fluía pelo seu pescoço.

Como era belo seu dragão.

Concorda com ele? Em que concorda exatamente? Perguntou ele perturbado.

Ele apenas facilitou as coisas. E se ele falou tudo aquilo para ganhar sua confiança?

Eragon pegou Brisingr e a desembainhou, segurando-a acima da cabeça, à toa.

Não posso afirmar com certeza. Ele me parecia tranquilo demais.

De qualquer forma. Ele não é uma ameaça tão grande a você pequenino.

Eragon riu.

Você e sua autoconfiança. Sabe que não devemos subestimar nossos inimigos.

Ela bufou, fazendo sair fumaça de suas narinas.

Eragon olhou para cima da lareira, onde repousava, dentro de uma bainha azul escuro, tão escuro que podia ser confundido com preto, a espada de Brom, Cavaleiro de dragão, terror dos renegados, contador de histórias. Seu pai.

Runön tinha lhe dito que Brom perdera a espada, mas Eragon não imaginava que estava com Galbatórix, junta das outras espadas dos velhos cavaleiros.

Era uma espada de mão e meia, de lâmina maior, mais escura e mais grossa que Brisingr. Seu cabo também azul, tinha detalhes prateados e uma pedra desconhecida por Eragon, Mais brilhante e escura que qualquer pedra de Saphira para ser uma.

Undbitr era seu nome. A espada era de um azul escuro nítido e puro, mas não resplandescente, Apenas feita para matar, fria como gelo.

O que Brom faria? Perguntou ele olhando os poucos detalhes da espada.

Pequenino... Você tem que fazer aquilo que lhe for favorável. Brom resolveria as coisas à sua maneira. E você deve resolver de acordo com você mesmo.

Já estive pensando em uma solução, mas é provável que eu só piore as coisas.

Saphira mudou de posição, agora olhando para frente.

Se ficarem você resolverá. As coisas já estiveram muito piores uma vez.