Na manhã do dia seguinte, a minha cara de sono era nítida na mesa do brunch que Mrs. Cohen havia preparado. Eu tinha dormido muito pouco depois de ler e reler incontáveis vezes as mensagens em meu celular de Tito e Tom, lia e relia, na vã tentativa de entender o que estava nas estrelinhas das mensagens de Thomas, e a declaração de Tito. Eu sempre tive um faro perceptivo para tudo, apesar do meu ostracismo, o que de certa forma, só me serviu mais ainda para salientar meu dom observador. Entretanto aquelas mensagens trocadas fugia de toda a minha copreensão. Eu definitivamente, e em uma das poucas vezes na minha curta vida, não sabia o que pensar.

– Devo dizer que estou decepcionada com vocês dois! Sammy e Pim. Disse minha mãe à mesa iniciando um sermão. – Apesar das minhas tentativas de conter a bebida a vocês, vejo que foi em vão, já que fui informada que ambos, e, sobretudo você Crispin, beberam ontem à noite! Minha mãe lançou um olhar severo para mim e para o Sammy, se fazendo saber por todos na mesa.

– Eu não bebi mais que três copos mamãe. Disse Sammy me dando a deixa.

– E eu não bebi mais que um, aliás, exatamente um! Salientei.

– Três copos, um copo, meio copo, aliás, senhor Crispin, para você nem 100 ml, o Sammy, ainda consigo dar algum desconto, já que tem alguns anos à sua frente, mas enfim, não eram para beber e pronto! Fixando o olhar sobre mim e meu irmão.

– Ann, são meninos apenas sendo meninos! Não ficaram bêbados e nem deram trabalho, isso é o mais importante! Disse Charles em resposta a minha mãe.

– Sim querida, não se preocupe, estamos em família! Aqui não há espaço para conservadorismos, apesar de sermos judeus – entre risos – todavia, como disse Charles, meninos sendo meninos! Mrs. Cohen apesar do perfil de senhora da alta sociedade, com aquele peso de mulher moralista montada em um pedestal de valores, na verdade só tinha tudo isso mesmo de aparência, era ela, uma doce lady.

– No meu tempo, fazíamos muito mais do que tomarmos bebidas alcoólicas às escondidas – disse Mr. Cohen – fazíamos coisas muito mais caprichosas – entre risos, e salientando um olhar malicioso a Mrs. Cohen, fazendo-a corar, e a todos na mesa entender que tipo de capricho era, e até minha mãe, naquele momento toda sisuda, riu compenetradamente a fim de suavizar o cenho franzido.

– Bom, esta conversa esta ficando um tanto descompromissada. – Disse Mrs. Cohen levantando-se e arrumando a fina camisa de seda rosa que usava, passando as pontas dos dedos em alguns fios de cabelos soltos sobre a orelha – o brunch estava maravilhoso Dorita, acredito que o almoço não será necessário hoje, mas pode antecipar o chá das cinco para as quatro hoje, tudo bem?! Direcionando-se a copeira que estava a postos do outro lado da sala do café da manhã. – Vou fazer uma caminhada queridos, me acompanha Ann?

– Claro Dona Cohen! Minha mãe rapidamente então se levantou e seguiu-a em passos leves.

– Meninos, o que acham de uma partida de tênis no country club? Arqueei a sobrancelha direita como quem quisesse dizer, que furada, mas respondi com gentileza depois de sua intervenção ao nosso lado, para com nossa mãe. Sammy mais do que depressa se animou para algo, que ele nunca na vida dele, havia feito. – papai gostaria de nos acompanhar?! Perguntou Charles ao Mr. Cohen.

– Jamais, estas coisas de jogos e esportes já não são para mim! Prefiro meu brandy e meu charuto à beira mar. Disse Mr. Cohen levantando-se e direcionando-se para o fumoir.

– Acho então que somos só nós três meninos, vamos!

...

– Desisto! – Respondi com uma voz sôfrega e cansada – isso definitivamente não é pra mim!

– Que isso Pim, você mal rebateu a bola, vai vamos lá, mais algumas tentativas!

– No, I’m out, really I can’t do this anymore – respondi me encurvando lançando a raquete ao chão e colocando as mãos nos joelhos – vou pegar uma água!

– É só pedir ao garçom – disse Charles se aproximando – você tá bem mesmo? – entre risos – para um adolescente de 16 anos, você esta com um belo preparo físico de um octogenário – entre risos – Vêm Sammy, sua vez!

– Eu vou lá em cima buscar mesmo, quero lavar meu rosto. Respondi. Sammy então tomou meu lugar rapidamente e iniciou uma nova partida com Charles, enquanto eu ia subindo alguns degraus até chegar ao bar do club. Foi neste instante que ouvi um cochicho bem próximo ao meu ouvido e uma mão apoiando em minha cintura.

– Você até que ficou bonitinho todo a caráter para o tênis! Olhei para trás assustado e era Thomas, rindo enquanto ajeitava o seu cabelo.

Porra que susto! Tá maluco chegar assim do nada?! Respondi entre risos. Na verdade eu havia arrepiado todo, e quando vi que era ele, os arrepios então tomaram mais ênfase ainda.

– Eu já tinha te visto! Mas estava aqui no deck conversando com alguns amigos, aí quando vi você subindo resolvi vir te cumprimentar Espirro. Fazia tempo que ele não me chamava de Espirro, e aquilo soou agradável aos meus ouvidos.

– É, bela maneira de se cumprimentar uma pessoa! Respondi entre risos.

– Amigos são assim! Mas e aí, sério isso do tênis, porque você não leva jeito nenhum. Disse ele rindo enquanto eu abaixava a cabeça levemente envergonhado.

– Na verdade foi ideia do Charles, ele quis nos trazer aqui, vim mesmo para não parecer um chato, afinal eu já sou taxado de chato.

– É isso é verdade! – entre risos levemente altos – mas eu acho bacana esse seu jeitão Caxias! Você já almoçou?!

– Já, bem, não era um almoçou, era um brunch, mas comi o suficiente para não comer tão cedo!

Foda-se! Você vai me acompanhar do mesmo jeito, porque meus amigos foram para outro canto, e estou esfomeado, já que você comeu, vai me olhar comendo e me fazer companhia – segurou no meu pulso e me arrastou para dentro do restaurante do club – pronto, pede algo para beber pelo menos! Não vai ficar aí com essa cara de bobo me olhando – risos – garçom, por favor!

– Pois não senhor? Deseja o cardápio?

– Não, obrigado! Eu já sei o que vou comer...

– Ah sim, pode falar:

– Confit de pato ao molho de amoras, e de entrada um salada de folhas e tomate cereja, ah e um suco de laranja, bem gelado! E você Pimmie, o que vai beber? – Fiquei olhando para ele por breves segundos fazendo aquele pedido extravagante e se portando como o cavalheiro que é, digo, bem nascido, berço de ouro, todo cheio de requinte, e por algum momento aquilo me fez sentir mal, muito mal, afinal eu era o oposto de tudo aquilo. – Pim? Vai beber algo!

– Sim! Desculpa uma água com gás, limão e gelo, por favor.

– De repente você foi à lua e voltou – risos – no que você está pensando?

– Nada demais! Respondi cabisbaixo.

Hey qual é? Do nada você ficou meio down, aconteceu alguma coisa?!

– Relaxa, eu sou bipolar esqueceu? E ri como quem quisesse mudar de assunto.

– Você quem sabe, mas me fala, e ontem, depois que saí, o Tito encheu muito seu saco?! Foi mal mesmo viu.

– Já te disse para você não preocupar com isso, não aconteceu nada demais, apenas alguns desentendimentos.

– Você esta gostando dele?! Perguntou um Tom curioso, enquanto ajeitava o cabelo, e me deixando constrangido, por estar tendo aquela conversa, aquele tipo de conversa com ele.

– É... Bem, eu acho meio estranho a gente falar disso! Respondi.

– Por quê? Por se tratar de dois garotos?! Relaxa, eu sou resolvido quanto a isso! Respondeu ele me olhando e dando um leve sorriso. E me deixando um pouco mais constrangido.

– Eu, eu prefiro mudar de assunto!

– Foi mal! Respondeu ele, com um olhar meio decepcionado. De repente, surgiu aquele momento constrangedor, aqueles longos, longos segundos sem haver um assunto, uma conversa, fazendo com que um olhasse para o outro perdido e sem reação.

Awkward. Disse Tom rindo.

Yeah! Respondi sucinto. E olhando para ele com admiração, olhar para ele, era como se a cada segundo a temperatura do ar condicionado caísse cada vez mais dentro do meu estomago, deixando ele frio, como se estivesse prestes a acontecer algo.

– Bom, coloca uma musica aí no seu iphone pra gente ouvir!

– Sério, mas e o piano do restaurante?!

Foda-se o piano do restaurante – risos – claro, só não coloque tão alto. Eu gosto de ouvir o que você ouve, nunca foi meu estilo, mas andei dando uma fuçada no youtube dia desses, e descobri alguns sons maneiros e parecidos com o que você ouve!

Cool, well! Let’s hear it something, but don’t judge me – risos – this one of my favorite.

– Play it! Respondeu ele me olhando.

Era incrível para mim, como o simples fato de ficar lhe olhando, me trazia calafrios, ele era lindo, em todos os sentidos, e quando conversava, ajeitava o cabelo, ou torcia o nariz para algo que eu dizia ou algo que via aquilo, cada simples gesto me fascinava cada vez mais, eu estava consumidamente apaixonado por Thomas Edward Green, o garoto da porta ao lado, hetero, inteligente, rico, tradicional, engraçado e impossivelmente alcançável ao meu amor de garoto para com ele, ou não, mas pelo menos até ali, só devaneios.

Calls Waiting... from City and Colour

A coma might feel better than this,
attempting to discover where to begin.
You're weighed down, you're full of something.
Of sickness, and desertion.
You're weighed down, you're full of something,
you're underneath it all.

So say goodbye to love,
and hold your head up high.
There's no need to rush
we're all just waiting, waiting to die.

Hoping a better place is all I need,
with moments of innocence and mystery.
Oh, it's the little things you miss.
Like waking up all alone.
Oh, it's the little things you miss,
when you're underneath it all.

So say goodbye to love,
and hold your head up high.
There's no need to rush
we're all just waiting, waiting to die.

All your friends seem like enemies
when you're broken down and empty.
All your friends seem like enemies
when you're broken down and empty.

So say goodbye to love,
and hold your head up high.
There's no need to rush
we're all just waiting, waiting to die.

– Uau, tough song! It means something to you?! Perguntou ele me olhando curioso.

– Well, it means everything! I know the words are tough, this song is not about Love – entre risos – but about life, true life

– You know, nothing in world is just roses Pimmie, you may think that I am a pretty rich kid who have everything, you not wrong in think this way, but sometimes I feel that emptiness too! You can say “poor spoiled rich kid, know nothing about real life” but I do! Trust me, I do.

Naquele momento, senti uma forte compaixão por Tom, percebi assim como na primeira vez, que ele de fato não mentia ou exagerava, ou tentava de alguma forma se comparar aos verdadeiros desafortunados da vida, mas assim como eu, ele, ainda que um garoto rico, e cheio de tudo o que sempre quis, também tinha seus demônios e incertezas para serem desbravados ou enterrados de uma vez por todas.

– Eu nunca pensei nada desse tipo sobre você Tom, claro que não posso negar o fato disso tudo o que você me falou, mas eu acredito que assim como eu, você, e qualquer um aqui dentro deste salão tem seus receios e anseios.

– Você é bacana Pimmie, juro! Neste momento o garçom chegou com sua entrada, e as nossas bebidas. Decidi então que pediria uma sobremesa.

– Por favor, você pode me trazer o cardápio de sobremesas?

– Não precisa! Juro vai por mim, pede o brownie de doce de leite com soverte de cream cheese, você vai me agradecer para o resto da sua vida. Rindo e dando uma piscadinha, me fazendo acenar um sim para o garçom.

– Se não for boa, você vai ficar me devendo. Eu odeio experimentar coisas. Respondi rindo.

– Aposto o que você quiser que você vai pirar nessa sobremesa! Vai fala aposta aí, mas aí você tem que aguentar a contra aposta.

– Eu não sei fazer apostas – risos – sempre fui péssimo nesse tipo de coisa.

– Eu sou bom, até demais, e dificilmente eu perco! Vai, da seu preço, sou movido a competições! Rindo enquanto mordia o lábio inferior, me fazendo rir de canto de boca me imaginando o mordendo.

– Não, para com isso vai!

– Bom, se você não quer lançar a aposta eu lanço! - Ele então me fitou com certa malicia e disse. – Se você gostar da sobremesa, você vai ter que... foda-se você vai ter que beijar aquela garota ali! E apontou com a cabeça disfarçadamente e rindo, a menina era terrivelmente horrível. – eu sei que é pecado falar mal dos outros, mas aqui eu não estou falando mal, estou apenas dizendo para beija-la.

– Tá maluco, a menina é capeta em pessoa! Respondi em voz baixa.

– Shhhhh! – respondeu Tom rindo – ela é judiada eu sei, mas você podia fazer a caridade do dia, e dar um beijo nela, a última vez que a Ammy beijou alguém foi na quarta serie, e foi ela quem roubou o beijo – entre risos – eu estudo com ela em Manhattan, ela é gente boa, mas muito pegajosa.

– Ah tá, e você quer que eu faça a caridade, porque não troca essa aposta, se não for boa você a beija. Nesse instante ele então respondeu.

– Bom, porque a contra aposta era melhor do que isso, mas você que sabe!

– E qual seria?! Perguntei devidamente curioso, enquanto ele ria de canto de boca, e me mandando um beijo no ar, me fazendo franzir o cenho como quem perguntasse – what?

– Eu te dou um beijo. Ele respondeu sucinto e rindo chacoalhando a cabeça.

Foi neste momento que eu então estremeci tipo, o que era isso, que tipo de aposta era aquela, e porque ele faria isso? Afinal o que estava acontecendo, esse moleque definitivamente tinha o dom de me atormentar. E dessa vez não era qualquer tormenta.

– Aqui esta sua sobremesa senhor! Disse o garçom a deixando na mesa – mais alguma coisa?

– Não muito obrigado! Tom então olhou para mim, e riu me dando uma piscadinha em seguida dizendo:

– Vai, experimenta! Mas não vale fingir que tá ruim – entre risos – eu sei que beijar a Ammy não é uma boa ideia, mas faz um esforço vai.

Experimentei o doce, e era divino, sim, era maravilhoso, provavelmente um dos melhores doces que já comi na vida, para a minha decepção, e alegria de Thomas, que começou a rir instantaneamente ao me ver revirar os olhos com a primeira colherada.

– Você tá fudido! Disse gargalhando. – Mas eu te dou um desconto, deixo para outro dia. Mas agora, é você quem esta me devendo.

Resolvi então dar uma indireta, em tom de brincadeira, mas eu estava a fim de ver a reação dele.

– É mesmo uma pena que esse doce seja maravilhoso, porque caso não fosse, eu cobraria minha aposta instantaneamente! E olhei para ele rindo.

– Bom saber disso, pessoa vingativa você! Bem, mais ao contrario da Ammy, eu te beijaria numa boa, mesmo pra um garoto, você ainda é bem melhor que ela – entre risos – e afinal te beijar não seria nenhuma novidade né. Disse ele se referindo ao beijo que lhe roubei, me deixando extremamente constrangido e vermelho, me fazendo por alguns instantes abaixar meu rosto para não ser observado. – Calma! – entre risos – você vai explodir de tão vermelho – entre gargalhadas – nossa você esta muito vermelho!

– Eu... Eu...

– Relaxa Pimmie, relaxa! – findando o riso – bom, onde estávamos antes de toda essa bobagem! Neste instante olhei para a porta de entrada do club que dava para o tênis e vi subindo Sammy e Charles.

– Meninos! Tudo bom Thomas? Pim, eu Sammy vamos tomar uma ducha em seguida iremos para um café aqui perto, quer ir, ou prefere ficar com o Thomas?! Antes mesmo de eu responder, Thomas disse:

– Ele prefere ficar comigo Mr. Cohen. E riu para mim.

– Bom! Então juízo garotos! E saiu ele e Sammy.

– Então você já sabe até o que eu prefiro agora?! Perguntei.

– Pimmie, você não vive sem mim. E riu suave. Naquele instante eu já não tinha mais o que fazer. Eu estava entregue aos seus feitiços, sim, seus olhares, gestos, postura, decisões me enfeitiçavam cada vez mais, e eu queria de alguma forma muito mais que aquele sentimento platônico que me dominava, eu queria desesperadamente beijar a boca dele, tocar nossos rostos um no outro e poder sentir a mão dele na minha cintura, como na dança que tivemos, como a pouco enquanto cochichava em meu ouvido, mas dessa vez, suas mãos não estariam apenas embaladas de um momento pueril, mas sim de um momento desejoso, foi então, enquanto o celular ainda tocava a minha playlist sobre a mesa, (Thomas Dybahl – Stay Home) que eu, involuntariamente soltei:

You confuse me! Disse-lhe olhando apertado, com um sentimento amargo na boca, e rapidamente arrependido pela fala. Ele então me olhou sério e desviando o olhar respondeu:

Don’t do that, not again! We don’t need to begin all over again. Olhando-me firme e rapidamente disfarçando o olhar para os lados, e transparecendo certa preocupação, nesse instante ele então olhou para mim de novo tão sério como antes, mas a voz dessa vez estava levemente embargada, e salientou – you confuse me too. Shit!