Tudo O Que Sabemos

Tempo para Processar


Eles tinham sido chamados para comparecerem ao lugar onde Peggy Odell, a menina da cadeira de rodas, tinha causado um acidente. Exatamente como Mulder se lembrava de ter acontecido antes. A única diferença foi que, desta vez, estivera tão envolvido em sua conversa com Scully sobre sua teoria da viagem no tempo que não conseguiu se lembrar de que Peggy seria quase atropelada naquela mesma noite. Mas, a partir daí, lembrava-se perfeitamente do que aconteceria depois - o telefonema que recebeu avisando a respeito era uma distração para tirá-los do hotel e queimarem o lugar junto com todas as evidências que tinham colhido até então no caso de abduções de adolescentes da cidade.

De modo que Mulder pediu que Scully recolhesse seus pertences e as provas colhidas na investigação e colocasse tudo no porta-malas do carro antes que ela fosse até o local do incidente ver Peggy. Ele permaneceu no hotel enquanto isso, esperando por uma visita que, sabia, apareceria naquela mesma noite.

Assim que Theresa Nemman bateu à sua porta dizendo que precisava de proteção, Mulder saiu com a garota até uma lanchonete não muito longe dali e avisou a Scully que o encontrasse lá. A parceira chegou lívida, sussurrando que Peggy Odell fora vista andando a pé na frente de um caminhão, causando um acidente. Scully estava nitidamente surpresa por ter descoberto que Peggy fora vista andando, assim como pela presença de Theresa no Diner com Mulder.

Scully notou que o parceiro, por sua vez, não parecia nem um pouco surpreso com nada disso. De fato, ele parecia mesmo esperar que tudo aquilo estivesse acontecendo. As palavras dele, horas atrás, voltaram com força à sua mente. Sabia ser impossível o que ele propusera, viagens no tempo não existiam a não ser em filmes de ficção científica. Mesmo assim, desde que invadira o quarto dele, preocupada com as marcas em suas costas, algo a impelia a confiar nele com uma força que nunca sentira antes na vida. Tentando deixar essa sensação que ainda não sabia como explicar de lado, procurou focar no caso e seguiu o parceiro até a mesa onde Theresa Nemman se encontrava.

Diante do evidente transtorno emocional em que a garota se encontrava, Mulder a conduzira gentilmente até uma das mesas do Diner a fim de que pudessem conversar. Depois de algum tempo e algumas explicações de Theresa, ela foi levada a força pelo pai, que apareceu intempestivamente no lugar e, obviamente, não queria que ela falasse mais nada com os agentes.

No presente momento, Mulder encarava Scully do outro lado da mesa da lanchonete após a saída de Theresa com o pai. A parceira estava inconformada com os rumos do caso. Continuava se negando a aceitar prontamente as teses que ele oferecia e até mesmo muito do que Theresa tinha contado a eles minutos antes, mas o que estava realmente ocupando a mente de Mulder agora já não era a investigação em si.

Sentado ali, encarando Scully, Mulder percebia que tinha sido providencial a interrupção de meia hora atrás, quando estava prestes a falar do futuro que tinham juntos. Olhando para ela agora, tão jovem, tão inocente e pura em suas intenções de resolver aquele caso, ele se lembrou inevitavelmente de como ela se transformaria ao longo dos anos seguintes. De como passaria a sorrir menos - e ter cada vez menos motivos para isso - e de como se tornaria tão descrente como ele nas instituições e nas pessoas. E de como ela sofreria. Perdas familiares, doenças, esterilidade, para depois conceber miraculosamente e ter que abandonar o filho.

Olhando para a Dana Scully de agora, ele sentia um nó se formar no peito. Não queria nada daquilo para ela. Embora não entendesse ainda como era possível e nem as razões para esse retorno no tempo, talvez pudesse dar algum sentido a isso.

Quando ela olhou para ele com preocupação, chamando-o pelo que parecia não ser a primeira vez, Mulder foi arrancado de seus pensamentos.

“Vamos embora” ele disse, levantando-se e dirigindo-se ao caixa para pagar a conta.

Depois de informá-la que tinha feito o chekout do hotel em que estavam por motivos de segurança, o trajeto até um novo hotel foi feito em silêncio, cada um ruminando seus próprios pensamentos resultantes daquela noite tão confusa. Quando estacionaram, depois de se registrarem numa hospedaria, Dana parou do lado de fora dos quartos e o encarou.

“Mulder, pode vir ao meu quarto?” Ela rapidamente emendou ao ver o olhar do parceiro cair sobre si, “Quero terminar a conversa que estávamos tendo antes de sermos interrompidos.”

Ele suspirou.

“É melhor deixarmos para depois, Scully. Já é bem tarde.”

Ela pensou em insistir, mas estava física e mentalmente cansada demais para isso. Talvez fosse melhor mesmo. Quem sabe no dia seguinte, depois de algumas horas de sono, sua mente conseguisse extrair algum sentido do que ele já tinha dito? Ou, de repente, percebesse que tudo não tinha passado de um sonho maluco?

“Está bem. Boa noite.” Scully caminhou para seu quarto, desejando como nunca deitar-se numa cama macia.