True Colors

Capítulo 5


True Colors

Capítulo 5

Não me lembro

A última vez que vi você sorrindo

Se este mundo te deixa louca

E você deu tudo o que você pode suportar

Me chame

Porque você sabe que eu estarei lá

Depois de lutar bravamente para deixar Sandra calma, House conseguiu fazer com que a mulher dormisse na sala. O jantar há muito esfriara e ele degustava do fricassé nas condições em que se encontrava. Não estava ruim, pelo contrário, Sandra cozinhava muito bem, o problema era a sensação de lar que ela lhe proporcionava. Até aquele momento ele não se preocupara se a impressão entre eles abrangessem o sentido de casal, agora isso lhe perturbava tanto que manteve distância considerável da mulher.

Os cabelos espalhados pelo estofado claro deixavam-na com um ar inocente, quase angelical, o corpo demarcado pelo tecido do roupão era um deleite para seus olhos observadores. E o memorial teria continuado se a campainha não ecoasse pela casa desesperadamente. House desejou que Sandra não tivesse escutado e, se tivesse, tratasse o barulho como um sonho. Fora muito complicado fazê-la chegar naquele estado, pois ela andara pela casa inteira com uma cadeira nas mãos atrás da tal formiga gigante.

Mancou até a porta e a abriu, deparando-se com um homem alto, moreno e de olhos azuis. O estranho inspecionava por cima de seus ombros o interior da casa, logo achando o que tanto procurava. Passou por House sem ao menos dirigir-lhe um cumprimento e aproximou-se de Sandra, acordando-a de supetão. A imagem da mulher despertando afobada seria engraçada se a situação não fosse séria.

— Daniel, o que está fazendo aqui?

— Eu que devo perguntar o que um homem estranho faz na sua casa?!

— Se não reparou a casa é minha e eu coloco quem eu quiser aqui. Agora, vá embora. Não estou me sentido bem e quero dormir. — Sandra limpou o suor que se acumulara na testa, os olhos voltados para House que apenas sentou-se no sofá ao lado como se nada estivesse acontecendo.

— E quem é você? — Daniel voltou-se para o médico, indignado com a presença dele.

— Os pequenos me chamam de tio Greg, mas para você eu sou o marido de Sandra. — Ele sorriu divertido, vendo que os olhos de Daniel piscavam confusos.

— O quê?! Do que ele está falando, Sandra?

Entretanto, cansada demais para rebater qualquer coisa, a mulher apenas levantou-se do sofá e rumou para o quarto ignorando os dois homens presentes. Sua cabeça ainda doía e, seja lá o que House lhe havia medicado, seu corpo encontrava-se extremamente mole.

— Eu acho melhor você ir embora. — House sugeriu, barrando a passagem de Daniel com a bengala. — Se gosta dela, vai entender.

— Não vou deixá-la sozinha com você. — Daniel rosnou, contrariado. Na verdade, ele temia aceitar que o que House lhe dissera fosse verídico.

— Nossa lua-de-mel pode esperar e ela está mais segura aqui comigo do que com você. — O médico piscou debochado, erguendo-se do sofá. Apesar de o rapaz a sua frente ser alto, não lhe alcançava o nariz. — Eu te ligo amanhã quando ela acordar.

— Eu vou, mas não porque você está me pedindo. — Irritado, o rapaz empurrou House para o lado e rumou para a saída, antes de lançar-lhe um olhar perigoso.

Suspirando pesadamente, House seguiu os passos invisíveis de Sandra e encontrou-a deitada desajeitamente na cama. O quarto era amplo, de janelas grandes, com uma única parede pintada de vermelho e a cama de casal tentadoramente confortável. Adentrou devagar e sentou-se, encarando a mulher. Ele não poderia ficar o tempo todo à mercê de Sandra, seria mais fácil mantê-la no hospital sem precisar fazer parte daquela realidade absurda. No entanto, a brincadeira estava se tornando divertida. Provocar os outros era seu hobby preferido, abrir mão disso seria voltar a sua vida chata e sem graça.

— Pare de olhar para os meus seios. — Sandra exclamou de repente, os olhos abertos e fixos no rosto do médico. — Daniel já foi? — Ajeitou-se entre os lençóis e travesseiros.

— Ele é bem possessivo. — Comentou displicente, fugindo da imagem de Sandra. Evidente que de ambos os lados todo o cenário contribuía para pensamentos ávidos.

— Daniel acha que sou propriedade dele só porque tivemos um caso alguns anos atrás. Depois disso, ele age como se fosse o meu dono. Não ligue para ele, prometo que Daniel não irá perturbar você.

— Não estou preocupado com isso. — House ralhou convicto. — Ele parece ser mais novo do que você, que falta de classe!

— Ei, apenas um ano mais novo e isso não faz de mim uma fanática por garotões! — Ela riu divertida, sonoramente agradando os ouvidos do médico. — Vai passar a noite aqui?

— Você acha que eu não tenho nada melhor para fazer? — House rebateu em um misto de deboche e seriedade. — Quero que vá ao hospital amanhã para alguns exames e...?

Me sinto estranha, House... — Sandra sussurrou agitada, sentando-se na cama.— Meus braços estão dormentes e não consigo enxergar direito.

— Braços para frente, como se estivesse segurando uma pizza. — Ele ordenou e quando ela não conseguiu fazer a simples tarefa, House pegou o celular e chamou uma ambulância.

(...)

Na sala especial de House, sua equipe discutia as possíveis causa do derrame que Sandra sofrera na ambulância a caminho para o hospital. Fizeram todos os exames mais precisos, e em um deles Chase alertou para uma massa pequena que pressionava lóbulo frontal, responsável pela atividade motora, articulação de fala e pensamentos. Uma parte dos comportamentos estranhos de Sandra poderia ser explicado pelo descobrimento da massa no cérebro. Agora a causa do derrame ainda deveria ser analisada.

— Como não vimos isso antes? — Chase exclamou, confuso. — Qualquer coisa seria revelada com uma ressonância magnética. Por que só agora?

— Talvez porque era pequeno demais para aparecer no exame. — Cameron respondeu, também curiosa. — Agora que atingiu um tamanho considerável, foi possível enxergá-lo.

— Ao menos sabemos que ela tem um tumor no cérebro, isso explica a psicose. — Foreman iniciou a conversa, um tanto aliviado. — O derrame pode ter sido apenas um acidente, como o próprio nome já diz, devido ao invasor.

— Está ignorando as causas do AVC da paciente? — Cameron interrogou, confusa. — Eles não acontecem porque simplesmente decidiram, tem uma razão lógica. Pode ser predisposição genética, diabetes, dislipidemias, hipertensão...

— Certo, guardem o dicionário. — House interrompeu o discurso médico de Cameron. — Marquem logo a cirurgia para a retirada do tumor.

Enquanto Chase e Foreman acatavam a ordem do chefe, Cameron permaneceu na sala, observando o semblante nada aliviado de House. Não era mais segredo que nutria sentimentos pelo médico ranzinza, portanto foi impossível ignorar o desconforto que sentia. Soube por James Wilson que House havia assinado termos de responsabilidade para cuidar de Sandra longe do hospital e, pelo tempo que trabalhava para o médico, jamais o vira preocupado com algum paciente àquele ponto. Então, aquilo só poderia significar que Sandra havia despertado em House uma extrema curiosidade.

— Você se envolveu com ela? — Cameron perguntou, os olhos claros fixos em House, que se distraía rodando a bengala entre os dedos.

— Isso importa? Você não deveria estar se mostrando tão fraca perante esse assunto, afinal, eu sou livre. — Cessou os movimentos, destinando atenção a mulher a sua frente. Ela era tão frágil quanto patética, sendo irracional ao ceder as especulações e dizê-las em voz alta sempre se tornava um erro. — Seu amor platônico por mim não me influencia. Agora, que me lembre, acho que mandei você para a sala de cirurgia.

— Certo...

(...)

Quando Chase e Foreman chegaram ao quarto que Sandra ocupava, depararam-se com um homem sentado displicentemente no leito de hospital. Aquele hábito era inadmissível, ele ignorava todos os requisitos de conduta higiênica. Chase adentrou primeiro, lançando um olhar reprovador ao homem moreno.

— Não deve sentar aí. — Advertiu, incitando-o a se levantar.

— Doutor Chase... — Sandra disse baixo em contraste com um sorriso. — Pelo visto, eu preciso assinar alguma coisa.

— Você tem um tumor no cérebro, que por sorte é operável. Ele é a causa de todos os seus sintomas mentais. Quanto ao derrame, nós não sabemos. Pode ser que isso tenha acontecido por...

— Minha mãe morreu por causa de um AVC. Infelizmente o atendimento demorou muito. — Sandra confessou, interrompendo a explicação do médico. — Não sabia que eu também teria uns anos mais tarde. Onde eu assino?

Chase ofereceu a autorização e caneta, e assim que obtiveram a assinatura ambos os médicos fizeram menção em sair do quarto, contudo Sandra os chamou:

— Eu poderia falar com o doutor House antes?

— Vamos chamá-lo. — Foreman fez questão em respondê-la.

— Você gosta dele, não é? — Daniel começou contrariado, sentindo-se quase traído. Ele era bonito, jovem, o que aquele médico tinha que o diferenciavam? — Ele é tão velho, deve ter o dobro da sua idade.

— Não exagere, a idade não importa. E ele é interessante. — Sandra sabia que estava dando informações demais ao colega chato de trabalho, mas talvez fosse produtivo deixá-lo saber sobre suas decisões. — Só quero agradecê-lo, mesmo que ele não se importe.

— Tem razão, na verdade, não sei por que eu vim. — House pronunciou-se na porta, logo virou comprimidos de Vicodin na boca.

— Acho que eu tenho o direito de me despedir do meu marido. — Sandra levou na esportiva, entrando na brincadeira. — Afinal, nesses últimos dias você aguentou minhas loucuras e, o melhor, não perdeu o emprego.

— Valeu à pena, consegui tirar uma casquinha enquanto você dormia. — E, novamente, a risada de Sandra o agradou profundamente. — Você vai ficar segurando vela até quando? — House dirigiu-se a Daniel, que com o rosto vermelho optou por sair do quarto. — Cara abusado.

— Daniel quer que eu me apaixone por ele, mas isso nunca vai acontecer. Ele não soube me conquistar. — Sandra afastou as pernas, permitindo que o médico se sentasse ao seu lado. — Sei que eu tenho pouco tempo, mas... — Ela aproximou-se de House, ficando tão perto que era capaz de sentir a respiração dele contra seu rosto. — Eu realmente gostei de te conhecer. Depois da cirurgia, eu vou me lembrar de você?

House limitou-se a responder, apenas uniu os lábios aos lábios dela em um beijo breve, afinal esse era o desejo de Sandra desde o momento em que abrira espaço para ele. Embora não admitisse, sentia-se da mesma forma que Sandra em relação a esse curto relacionamento.

— Eu realmente espero que não.