True Colors

Capítulo 1


True Colors

Capítulo 1

Você, com olhos tristes,

Não fique desanimada.

Oh, eu sei,

É difícil criar coragem,

Num mundo cheio de pessoas

Você pode perder tudo de vista,

E a escuridão dentro de você

Pode te fazer sentir tão insignificante...

— Sandra, pode me dar uma mãozinha aqui? — Daniel Grendha apareceu na sala da mulher ruiva, apressado.

— Estou ocupada, Dan. — Sandra não retirou os olhos do que estava fazendo. Aquele hardware não poderia ser descuidado, já que a empresa contratante pagara muitas parcelas adiantadas. — Não consegue resolver sozinho?

— Se eu entendesse de montagens e manutenções, acha que estaria aqui? — Ele disse ácido, rolando os olhos quando a escutou bufar. Essa era uma mania irritante de Sandra mostrar que as conclusões dela o taxavam de menino mimado. — Ande logo, mexa esse traseiro enorme!

Sandra Working, uma excelente engenheira da computação, levantou-se e retirou o jaleco, colocando-o nas costas da cadeira giratória. O sapato de salto alto ecoou ao dar os primeiros passos para fora da sala junto com Daniel. Será que ele não percebe que sou uma pessoa ocupada? Questionou-se consigo enquanto entravam no corredor esquerdo. A ala responsável por manutenção e montagens de equipamentos danificados.

— Sabe, você precisa fazer um curso. Só pra variar e me deixar trabalhar em paz de vez em quando. — Sandra cutucou, passando por ele e indo se encontrar com os técnicos ao redor do equipamento. Um modelo exclusivo que acabara de chegar com sistema de rastreamento. — Nosso chefe vai me promover enquanto você assiste a tudo chupando dedo.

— Cale essa boca e conserte logo. Não é para isso que te trouxe aqui? — Daniel cruzou os braços, observando-a pegar algumas ferramentas e abaixar-se a altura do sistema. Por mais estressante que fosse lidar com Sandra, ele admitia que adorava vê-la assumir o comando de alguma coisa.

— Claro, porque você não é capaz... Passe-me aquela chave. — Ela pediu a um dos técnicos, que prontamente a atendeu. Cortou alguns fios, retirou a capa de proteção e ligou-os nos furos destinados. — Não é por mal, Dan, mas você sempre monta nas minhas costas. Acha que sou desocupada como você? Viu o tamanho da placa que estou projetando?

— Ah, nossa, mil perdões senhora multifuncional! A culpa é toda sua por ser a melhor. — Ele sorriu ao vê-la retribuir e, finalmente, deixou-a terminar com o objetivo.

As vozes que se seguiram encontravam-se distante de Daniel, pois ele analisava milimetricamente as curvas de Sandra. Uma mulher bonita, de cabelos ruivos e olhos verdes, jamais ele a desprezaria. Ruivas eram suas preferidas. Entretanto, Daniel sabia que Sandra jamais lhe daria outra oportunidade, o que ele considerava infantil da parte dela. Ora, ele não era de se jogar fora, que mulher não se entregaria ao charme de um moreno alto, bonito e sensual de olhos azuis?

— Prontinho, obrigada pela ajuda. — Sandra agradeceu e passou por Daniel, chamando-lhe a atenção ao segurar-lhe pela gravata. — Vamos indo, eu tenho muito trabalho. Por que não faz um agrado e pega um copo duplo de café para mim?

— O quê? — Daniel arqueou as sobrancelhas. — Qual é, Sandra, seu horário já estourou há uma hora. Não me diga que vai querer impressionar o senhor Mtek?

— Se não percebeu, ele me paga. — Ela sorriu largamente, mostrando a carreira de dentes brancos. Adentrou sua sala especial, contendo os mais diversos utensílios, que vulgarmente Sandra apelidou de brinquedinhos. — Pode ir para casa, Daniel, e quando estiver assistindo ao filme pornô que você alugou ontem, vale ressaltar, pense em mim.

Daniel abriu e fechou os lábios várias vezes, procurando palavras para rebater àquela piada. Na verdade, não era de todo uma piada, já que havia mesmo alugado o filme. O que lhe intrigava era a maneira com que Sandra sempre o desvendava, sempre estava dois passos a sua frente. Ele escutou a risada dela preenchendo seus ouvidos de uma maneira deliciosamente maliciosa e aproximou-se do corpo feminino, passando as mãos pela cintura fina e bem marcada.

— Não comece, Daniel. — A engenheira afastou-se rapidamente, olhando seriamente para o homem. — Já passamos dessa fase, evoluímos.

— Só porque você quis. — O encarregado de supervisionar os equipamentos revidou, sorrindo maroto. — O sexo era bom, qual o problema em matar as saudades?

Sandra preferiu não prorrogar a conversa e sentou-se, esquecendo-se do homem inconveniente. Ele sempre estragava a amizade que tinham, o que fora muito difícil convencê-la a aceitar. Para Sandra, manter contato com ex-namorados ou ex-casos — no que se dizia respeito a Daniel a última opção — não poderia acontecer. Romper relacionamento era esquecer-se de tal pessoa. Contudo, Daniel não compartilhava de seus pensamentos e constantemente tentava levá-la para cama, alegando ser pelos velhos tempos. A personalidade fútil de Daniel Grendha a irritava profundamente.

— Por que ainda está na minha sala? — Ela interrogou de mau humor, anotando em sua agenda todos os movimentos que fazia com a placa. Se tivesse sorte, poderia terminá-la ainda hoje. — Saía, não tenho tempo para lidar com você agora.

Sentindo-se extremamente confortável por ter conseguido abatê-la, Daniel retirou-se como ela ordenou. Já não havia mais meios de transtorná-la, pois o principal motivo sempre se repetia. Estava bem claro do quanto Sandra se arrependera por ter compartilhado duas ou três noites há um ano com ele, porém, mesmo tendo ciência do detalhe, em nada o incomodava.

O único objetivo de todos os homens que trabalhavam na Mtek Gênesis consistia em levá-la para cama, e claro, Daniel se vangloriava por ter sido o primeiro a concluir seus desejos. O marco do final do relacionamento, se é que ele se encaixava nessa classificação, apenas serviu de âncora para seu ego, afirmando que a decisão partira dele.

Por um longo período, Sandra tornou-se a atração principal da Mtek Gênesis. Tanto seu nome como sua vida pessoal faziam parte do vocabulário dos funcionários, e embora ela não se importasse com as opiniões alheias e suas falhas suposições, depois de um tempo passou a se sentir incomodada. Nunca rebateu nenhuma das intrigas que Daniel criara, no entanto, conservou sua integridade segura e limpa. O assunto perdeu o sentido, pois quando alguma coisa é repetida várias vezes se torna extremamente maçante.

O trabalho rendeu efetivamente, levando-a a um nível de satisfação. Quem sabe seu chefe não lhe adiantasse as férias? Com um sorriso de tarefa cumprida, Sandra reuniu seus pertences, certificando-se de guardar os dados da placa com muito cuidado, e repousou a bolsa nos ombros. Olhou o relógio de pulso, que ela ganhara da irmã no ano passado, e surpreendeu-se com a hora. Faltavam poucos minutos para as oito da noite, o que significava que poderia se aproveitar de uma noite tranquila na cafeteria perto de sua casa. Em outras palavras, depois de semanas se empenhando no término do trabalho, enfim, relaxaria.

Caminhava pelo corredor quando uma súbita dor de cabeça a assolou. Escorou-se a parede, a tontura repentina pegando-a fortemente. A imagem do local mostrava diversas formas difusas e Sandra percebeu que a planta de plástico possuía olhos e boca, que lhe direcionava um sorriso de dentes afiados. Fechou os olhos e esfregou-os, voltando a reabri-los. Entretanto, a planta continuava sua intensa observação, convidando-a a temê-la.

Afastou-se, sendo incapaz de compreender o que acontecia com ela naquele momento. Esquecera-se de onde se encontrava e não soube dizer seu nome quando um guarda se aproximou dela, prestando-lhe ajuda. As palavras soaram embaralhadas e ininteligíveis, o homem inspirando-lhe desconfiança e medo.

— Não me toque! – Sandra gritou, estapeando o guarda. — Não vou deixar que me leve! Você quer me matar! Onde está meu marido?

— Senhora, por favor, acalme-se. — O guarda tentava a todo custo controlá-la. A unha comprida feriu-lhe o rosto, no lado esquerdo. — Quem é o seu marido?

— Eu não sei! — Sandra tinha o rosto banhado em lágrimas e as mãos repousavam na cabeça, como se segurasse algo que desejava sair. — Pare de falar na minha cabeça!

O guarda rapidamente pegou o celular e discou alguns números, logo já conversava com alguém. Aquela mulher não se encontrava em seu estado normal. Poderia ter pouco tempo de serviço na empresa e vira-a várias vezes perambulando pelo prédio, e ela sempre lhe sorria ao se despedir. Definitivamente, Sandra o assustara.

— Com quem está falando? — A jovem retirou o celular das mãos dele, e em instante atirou-o no chão, pisoteando-o com o salto. — Não vou deixar que chame seus companheiros! Eu...! – De repente, o acesso de loucura foi diminuindo, fazendo com que Sandra retomasse sua consciência lentamente. — Por favor, não estou me...? — E ela não chegou a terminar a frase. Sua visão escureceu e desabou nos braços do homem, desmaiada.

(...)

— Doutor House! – Lisa Cuddy, diretora e médica do Hospital Princeton-Plainsboro chamou o homem alto, que mancava até a saída do estabelecimento. — House!

— Podemos deixar a brincadeira para mais tarde? — Gregory House, um brilhante diagnosticador, voltou-se para a mulher de olhos azuis. Observava-a com completo desinteresse, impaciente para poder ir logo para casa e escapar de suas horas devedoras na Clínica. — Não está vendo que estou com pressa?

— Sandra Working, vinte e nove anos, chegou aqui inconsciente. O guarda que a trouxe nos disse que ela estava tendo comportamentos anormais. Quase psicóticos. — Cuddy jogou as informações sobre House, cortando-o antes que ele dissesse mais alguma coisa irrelevante. — O caso é seu. — Entregou-lhe a pasta, contendo as informações da paciente, de maneira irredutível.

— E meus direitos? — Gregory gritou, apoiando o peso na outra perna com a ajuda da bengala. — Exijo um advogado!

Todavia, a diretora não lhe deu atenção e seguiu ondulando o quadril para o interior do hospital. House suspirou contrariado, regressando ao seu mais novo destino. Claro, ele jamais enfrentaria uma situação repentina sozinha, para isso serviam os amigos — vulgarmente intitulados de escravos ou equipe, o que ele não admitia considerá-los assim.

Encontrou os três médicos prontos para irem para casa, entretanto, deteve-os ao cruzarem o elevador. House balançou a pasta em suas mãos com um sorriso sacana.

— Não posso deixá-los fora dessa. — Juntou-se a eles, obrigando-os acompanhá-lo até o quarto da paciente.

— Qual o problema? — Allison Cameron interrogou, quase se podia ouvir um teor frustrado em sua voz. Embora gostasse de seu trabalho, tinha que reconhecer que merecia um descanso.

— E eu tenho cara de vidente por acaso? — House replicou, abrindo a porta do quarto e adentrando-o. Seus olhos azuis detiveram-se na bonita mulher ruiva, aparentando estar muito bem.

Contudo, ao vê-la sorrindo para si de forma cúmplice, House reviu internamente suas suspeitas.