The price of evil...

Suicide Memories.


-Vernet, quer ter essa honra? –O rapaz no banco de passageiros perguntou.

-Acha mesmo que precisa? Ela não seria estúpida de tentar nada, nós estamos armados. –Riu.

-Outra pessoa não tentaria, mas ela com certeza sim.

-Ok. Tenha faça isso você mesmo.

Jace virou para trás onde eu estava jogada, pediu que eu erguesse os pulsos e eu o fiz. As algemas eram apertadas e machucavam, mas nada que eu não pudesse suportar.

Alguns soluços foram incontroláveis, mas eu não daria aquele prazer para eles, não iria chorar enquanto estivesse ali. Meu estômago estava embrulhado e meu corpo inteiro doía. Sentia-me doente. Vozes e risadas ecoavam na minha cabeça como uma música de fundo e depois o nada. Escuro, frio e uma forte pressão contra minha cabeça, como se eu houvesse caído. Talvez tenha sido isso que tenha acontecido. Eu já não me lembrava mais de nada, como se minhas memórias estivessem se apagando com o tempo, mas eu ainda sou muito jovem para me importar.

Xx

O líquido que eu havia bebido de uma só vez agora rasgava e queimava minha garganta. Esquecer. Era isso que eu mais queria agora. Tudo havia acabado.

As imagens da noite em que eu conheci Lisa... Ou Clarisse, tanto faz, continuavam martelando em minha mente, mas eu precisava esquecer, eu queria esquecer.

Seu jeito presunçoso quando sugeriu que eu tocasse guitarra e bateria ao mesmo tempo -acabei rindo com a lembrança- ela era sempre assim, meio estourada, falava as coisas sem medo pra quem quer que fosse e não se importava... Talvez isso tenha me atraído. Aquele desprezo, o fato de ela não ter sido como as outras e ter se jogado imediatamente em meus pés. Mas depois eu percebi que tinha algo a mais. Quando invadimos sua casa, foi diferente, as coisas fluíram naturalmente, sem nenhum esforço.

“Você matou alguém?” Foram as palavras que a fizeram congelar. Ótimo, ela havia matado alguém.

Eu já sabia há muito tempo, apenas não queria acreditar.

Deixei algumas notas no balcão e sai do bar.

Algumas coisas precisavam ser concertadas.

Xx

-Acorda, isso aqui não é hotel cinco estrelas, gata. Vamos, Clarisse!

Clarisse. Ninguém se referia a mim com esse nome há um bom tempo, soava até um pouco estranho.

Fui abrindo os olhos aos poucos e percebi que já não estava mais dentro de um carro.

-Você dormiu a viagem inteira, ou desmaiou, não sei e também não me importo. –Jace deu de ombros.

-Onde nós estamos?

Analisei bem a cena, era um aeroporto. Um aeroporto que eu conhecia bem.

Eu estava de volta àquele lugar. Aquela cidade.

-Estamos em casa, gata. Bem vinda de volta à Garden Grove. Agora levanta. Não aguento mais você em cima de mim. Tive que tirar você do carro, colocar no jatinho, carregar da área de pouso até aqui... E você não é muito magra, sabia?

Eu estava jogada de qualquer jeito em um dos bancos do aeroporto e as algemas ainda apertavam meus pulsos.

-Aposto que você ganha à atenção de muitas mulheres quando as chama de gorda.

-Não preciso agradar, querida. Tenho meu charme natural. –Piscou. –Desculpa, mas todos estão olhando, preciso te tratar como uma fugitiva. –Agarrou meu braço com força e foi me arrastando até o estacionamento. Jogou-me com mais força do que necessário no banco de trás da viatura onde Vernet nos esperava.

Xx

A porta estava aberta e a única coisa que eu encontrei dentro da casa foi um coração partido cercado de bebidas.

-E aí, Zacky. –Disse de forma cuidadosa.

-Fala, Gates.

-Ainda sobrou alguma coisa com álcool pra mim? –Ri sem jeito e ele apenas esticou o braço com uma garrafa pela metade de whisky.

Permanecemos em silêncio. Como eu poderia consolar alguém se por dentro estava sentindo a mesma dor?

-Em pensar que nós quase brigamos por ela...

-Relaxa cara. Ela foi embora. Pra sempre. Não a veremos mais. Nunca mais. –Como eu queria que aquilo fosse mentira.

-Gates, vá até o meu quarto, procure a mochila dela e todas as coisas que você possa achar que tenham a pertencido e tire daqui, até mesmo as minhas blusas que ela usava. –Não falei nada, somente assenti.

Subi as escadas e fui até o quarto de Zacky, era incrível como toda a casa cheirava à Lisa. Droga.

Com dificuldade encontrei a mochila que estava bem escondida e peguei as camisas jogadas no chão que eu sabia ela usava. Voltei para a sala e a cena continuava a mesma. Somente uma frase e fui embora, com a mochila e as roupas.

-Queime. Bem longe daqui, ela está morta. –Foram únicas as palavras que Zacky pronunciou. –Para mim ela está morta.

Xx

A estrada era escura. Vernet e Jace pareciam ser amigos, por que estavam rindo com muita naturalidade. Passei as duas mãos, devido às algemas, pelos vidros tentando ver algo do lado de fora. O que eu pude enxergar foram árvores bem próximas uma das outras e os pingos de chuva caindo com mais força sobre o chão.

Foi aqui.

Minha cabeça latejava com mais força agora, as memórias foram voltando com toda a velocidade, fhashs... Arregalava os meus olhos, mas mesmo assim não consegui ver nada além de borrões.

“Você é como eu. Uma vadia qualquer.”

-Eu não sou como você. Eu não sou como você. Você está morta. Morta! Eu não sou como você, sua puta!

-Clarisse! –A voz de Vernet ecoou no carro. –Você enlouqueceu?

-Para de dirigir. Para. Agora! –Levei minhas mãos até os ouvidos e comecei a me debater na tentativa de impedir as lembranças e as vozes que insistiam em me lembrar de cada detalhe daquela noite.

-Você ficou louca!

-Eu não sou louca, eu não sou louca. Eu não sou... Não sou louca! –Eu gritava repetindo cada frase que falava. O que estava acontecendo? –Mãe, volte pra mim! –Nesse momento joguei meu corpo em direção ao volante, fazendo com que Vernet perdesse a direção, levando o carro a chocar-se com uma árvore. Era difícil movimentar-me ainda com as algemas.

Minha cabeça bateu com toda a força no pára-brisa do carro e podia sentir o gosto de sangue na minha boca. Estava jogada agora por cima de Jace e Vernet que pelo visto pareciam estar muito bem, sem ferimentos, por que ao contrário de mim, usavam cinto de segurança.

Ignorando toda a dor possível, tentei voltar para o banco de trás e abrir a porta.

-Não saia desse carro, Clarisse! Você enlouqueceu!

Com dificuldade abri a porta e logo depois o vento frio me atingiu na forma de um soco no estômago. Gotas de água e sangue misturavam-se em eu cabelo.

Minhas pernas cederam e eu já podia sentir a pele de meu joelho rasgando em contado com o asfalto. As árvores chacoalhavam com o vento, exatamente como naquela noite.

-Mãe, volte para mim! –Levantei-me e corri para mais perto da floresta à beira da estrada. –Volte para que eu possa te matar outra vez! E garanto que eu não me arrependeria.

Meu comportamento claramente estava sendo infantil e impensado. Mas esse tempo todo eu me culpei pela morte de Lisa Wooden Brown, quando na verdade ela cavou sua própria cova.

Xx

Estava com uma meia calça preta rendada por baixo de meu short jeans e uma camiseta larga sem mangas totalmente da mesma cor e sem estampas. Minha maquiagem estava mais pesada que o normal, o cabelo agora com as pontas azuladas, solto e um pouco bagunçado. Olhei-me no espelho, realmente aquela não se parecia comigo. Ou talvez a garota que eu sempre fui é que não se parecia nada com quem eu era de verdade.

-Aonde você vai parecendo uma prostituta? –Lisa estava encostada na porta de meu quarto com os braços cruzados.

-Não venha querer bancar a mamãe. Você teve dezessete anos para isso e não o fez, gora é tarde demais. –Disse enquanto passava por ela.

-Clarisse, isso não está certo! Você não sabe com quem anda se metendo! Esses caras são perigosos, podem machucar você.

-Não mais do que você me machucou.

A conversa foi interrompida por uma buzina vinda do lado de fora.

-Tchau. –Abri a porta e encontrei uma BMW estacionada. Sara e Charlie me esperavam do lado de fora apoiados no carro.

-Você está linda! –Charlie disse enquanto colocava uma mão em minha cintura e a outra em minha coxa.

-Obrigada.

-Clarisse, você vai comprar as bebidas, não vai? –A pergunta veio de Sara.

-Vou sim, pode ficar tranquila.

-Larga a minha filha! –A voz de Lisa vinha de trás de mim e depois de gritar agarrou minha blusa, tirando-me de perto do garoto à minha frente.

-Você não é minha mãe! Minha mãe está morta!

-Clarisse, eu sei que eu errei, mas, por favor, agora eu estou aqui, deixei que eu concerte tudo.

-Concertar? Você está apenas esperando a próxima oportunidade para fugir. –Seus olhos se arregalaram. –É, mamãezinha, eu ouvi sua conversa no telefone com aquele cara. Eu sei que você quer minha confiança pra poder colocar suas mãos sujas no dinheiro da vovó. Mas isso não vai acontecer, não enquanto eu estiver viva. – Cuspi as palavras.

-Então eu terei que dar um jeito nisso, filhinha. Já que você prefere assim, então, assim seja. –A máscara de boa mãe querendo se redimir sumiu completamente, agora ela estava parecida com a vadia que sempre foi. A mulher que me abandonou antes dos meus dois anos, sem nem ao menos saber quem era o meu pai.

Dei as costas para ela ignorando a ameaça e entrei no carro.

-Vamos começar logo com a diversão. –Disse para Sara e seu namoradinho que estavam ao meu lado e os outros no banco da frente.