LUHAN

Está frio no laboratório, os cientistas ligaram o aquecimento, porém não é páreo para o frio que estava fazendo esses dias, mesmo sendo um laboratório subterrâneo. Faz muito tempo que o clima está desregulado, porém nos últimos dias tem estado firme em um frio intenso, todos têm coisas a fazer, porém a TV ainda está ligada no noticiário. Sempre ficamos de olho nas notícias, algo que possa nos chamar atenção também pode chamar atenção de quem nós não queremos.

- “...e hoje mais um jovem foi dado como sequestrado, já são cinquenta e seis rapazes que sumiram sem deixar rastros e nenhuma informação foi dada ou descoberta sobre seus paradeiros, as únicas coisas que se sabem sobre eles é que são homens, jovens rapazes com idades entre dezesseis e vinte e um anos...”

— Já chega, desligue essa TV, Tiffany. – Digo para minha assistente. – Já não basta todos os problemas, saber que estão investigando os desaparecidos não ajuda em nada. Temos que tomar mais cuidado ainda, estão deixando muitas pontas soltas, ao que tudo indica.

— Sim, senhor. – Ela diz e desliga a TV.

Os vários monitores estão fazendo vários testes e avaliando todos os dados os quais eu coloquei e avaliei, nesse laboratório tenho doze telas e geralmente tenho ao menos um assistente para cada computador, mas hoje apenas Tiffany está comigo. Alta, cabelo preto em cascata e óculos finos, minha assistente mais leal e essencial.

Meus experimentos já são complicados demais e muito vitais para ficar me distraindo com coisas desse tipo. Eu mesmo não queria ter que estar fazendo isso, mas preciso me focar. Estou praticamente com o futuro do mundo em minhas mãos aqui.

Sobreviver ao fim do mundo não é tão glamoroso como se pode pensar, na realidade é a pior coisa que se pode vivenciar. Primeiro foram as doenças. A vacina contra o câncer finalmente foi descoberta, filas e mais filas de pessoas se vacinando contra esse mal que assolava a sociedade e o mundo durante vários e vários dias. Pessoas deram até o seu último centavo, venderam carros, casas, tudo que podiam para obter essa cura miraculosa.

Não demorou nem mesmo dez anos e os efeitos começaram a aparecer. Doenças, mortes, quarentenas, caos. A população foi dizimada e quase extinta ao redor de todo o globo. A vacina não deu certo, pelo contrário, ela matava o câncer, mas desenvolvia uma doença muito pior e agressiva além de ser alta e facilmente contagiosa.

Ironicamente chamada de peste cancerígena devido sua origem, matava o portador em aproximadamente vinte dias, as defesas internas eram destruídas, hemorragias muito intensas e falha múltipla dos órgãos, principalmente pulmão e cérebro.

Centenas e mais centenas de anos e a população continuou pequena e extremamente frágil, peste cancerígena sendo uma doença ainda existente e sem vacina, mas tratável, eram muitos os casos de pessoas que escaparam da morte pelos efeitos dessa praga, mas sempre haviam efeitos colaterais. Pessoas ficavam cegas, surdas, perdiam membros, não conseguiam mais respirar direito ou simplesmente perdiam sua sanidade.

Se tornou uma doença tratável, sim, mas ainda cobrava um preço.

Um preço muito alto.

Isso não impediu os países de entrarem em conflitos ridículos e por puro ego de seus governantes, uma população já debilitada e doente foi colocada em guerra, mais de uma vez, porém agora, com armas químicas e biológicas.

Não é necessário ser muito inteligente para imaginar o que houve depois. Cidades se tornaram territórios radioativos e inóspitos, países dizimados, solos contaminados, plantações e florestas destruídas, comida ficou cada vez mais escassa e mesmo as que existiam, nunca tiveram a mesma qualidade.

A área de florestas diminuiu drasticamente, sem elas para fazerem fotossíntese e nos oferecerem oxigênio, a atmosfera ficou cada vez pior e efeitos de aquecimento global aumentaram exponencialmente.

Então vieram os avanços tecnológicos e a tentativa de consertar os efeitos do aquecimento global. Mais um erro.

O clima do planeta ficou absolutamente instável e em algumas áreas do mundo, simplesmente inóspito, os países diminuíram tanto em território quanto em população, alguns até mesmo sumiram, tamanho o estrago.

E mais uma vez a cura para o câncer nos assolou.

Mais um surto de disseminação do vírus da praga cancerígena, ninguém sabia dizer como aconteceu, mas a doença se espalhou pelos, já debilitados, países restantes do mundo a um ritmo galopante e dessa vez com resultados ainda piores, se é que era possível. O estado da saúde das pessoas continuou muito debilitado e os efeitos da cura do câncer continuaram a atingir as pessoas conforme elas foram tendo filhos e os sintomas foram passando de geração em geração.

Um problema muito mais sério e difícil de tratar ou contornar, uma falha genética, não uma doença, mas uma falha em nossa constituição como pessoas, humanos mais fracos, mais suscetíveis a doenças, a peste cancerígena ainda está viva no planeta e agora seus efeitos são ainda mais intensos e mais rápidos, algumas pessoas não passam de dois dias.

O controle ficou quase impossível por anos, mas aconteceu, zonas de quarentena ainda mais apertadas, várias e várias cidades evacuadas e pessoas sendo colocadas em colônias para um controle mais rígido.

Até que as pessoas começaram a desenvolver os sintomas de maneira espontânea mesmo sem ter contato com alguém infectado, o vírus estava cada vez mais se aprofundando em nossa genética e existindo de maneira latente e adormecida nas pessoas, esperando um momento para se manifestar, simples assim, sem nenhuma explicação.

Por sorte, casos espontâneos estão cada vez mais raros, mas ainda existem.

Os estragos são sempre incontáveis todas as vezes.

Esse é o cenário atual.

Estamos morrendo.

Nossa espécie está morrendo.

Por isso eu faço os experimentos que eu faço.

Embora essa falha genética seja o motivo de estarmos morrendo, se ela for explorada e trabalhada, pode se tornar outra coisa, muito mais promissora.

Podem me chamar de monstro pelo que faço, mas eu quero achar uma cura tanto para essa falha que vem conosco a tanto tempo quanto para essa doença, para toda a vida humana que está sendo perdida ao redor do mundo e também...para um bem maior, um bem maior para toda a humanidade, tudo isso, todo esse processo pelo qual eu estou passando e fazendo-os passar também, trará novos dias e nova esperança para nossa raça.

Seres superiores nascerão de toda essa dificuldade, de todo esse caos.

Seres iguais a mim. Imunes a todo esse caos e essas doenças.

Pelo menos é isso que digo para mim mesmo. Não posso parar agora, pelo contrário, já foram tantos sacrifícios e passei por tantas perdas e dificuldades, o problema com Namjoon, tantas vidas jogadas fora, tantas oportunidades de estudo desperdiçadas, todo o massacre que aconteceu e eu não pude fazer nada, apenas assistir enquanto eles se matavam, preciso fazer isso dar certo, todo esse sacrifício deles não pode ser em vão.

Não sei porque ou como, mas eu sou imune a doença que até hoje não tem cura ou um estudo conclusivo, ninguém conseguiu sequenciar o genoma, porém mata toda nossa população mundial, meu corpo simplesmente nasceu com uma falha genética, uma diferença que toda a população, ou quase toda, possui, contudo, desenvolvida e isso conferiu a mim um intelecto maior e mais desenvolvido que a grande maioria das pessoas, assim como esses poderes, essas habilidades de telecinésia.

Tudo aqui, fui eu que estudei e desenvolvi, como estimular e desenvolver a falha genética no corpo das pessoas e dela tornar as pessoas imunes a doenças, inclusive a peste, eu consegui criar uma cura para o vírus, mas ainda não consigo isolar o agente que nos fazer ser imunes para desenvolver uma vacina, existem muitas variáveis e toda vez que avanço um passo, volto dois com alguma nova dificuldade, é frustrante.

Eu não aguento mais ter que tirar pessoas de suas vidas, não aguento mais tanto sangue em minhas mãos.

— Prepare a próxima cobaia a ser inserida. – Digo para Tiffany e indo em direção à sala de preparação – Qual o nome dele?

— Senhor, este é Choi Minki, acreditamos que ele desenvolverá uma natureza semelhante as de Chanyeol e Kris, relacionada ao fogo, porém não conseguimos saber qual delas será desenvolvida.

— Droga, não era exatamente essa natureza pela qual eu estava procurando, já temos dois desse tipo, eles desenvolveram particularidades bem distintas, porém...ainda são a mesma. Precisava de alguém da décima segunda ou da terceira. São as naturezas que estão faltando. Estou muito otimista quanto a esse grupo, eles podem conseguir interagir e desenvolver tudo...desculpe, acabei me perdendo em pensamentos. Quais foram os resultados, a porcentagem?

— Os resultados estão cada vez mais baixos, devido às circunstâncias e dificuldades em se conseguir cobaias. – Ela informou olhando em sua prancheta.

— Tiffany?

— Quarenta e três por cento, senhor.

— Como é? – Sou pego de surpresa pela resposta.

— A falha genética está cada vez mais forte na população, senhor – Tiffany informa – o corpo está cada vez mais fraco e...

— Se infiltra mais e mais em um nível celular conforme as pessoas crescem... – começo a andar e ela me segue – eu sei bem como estão nossas cobaias e pelos problemas pelos quais estamos passando.

— Exato senhor.

— Jesus, nem mesmo cinquenta por cento, em qual sala ele está?

— Trinta e dois, senhor.

Ao entrar na sala de preparação me deparo com o casulo de metal onde as cobaias ficam imersas e desacordadas.

É um rapaz de rosto delicado e cabelos castanhos flutuando no líquido fazendo uma nuvem em sua cabeça.

— É um tiro no escuro, se me permite dizer, senhor. – Tiffany fala.

— Não perguntei. Prepare-o e envie-o para o campo de testes conforme o programado. Se ele desenvolver natureza de fogo, daremos um jeito de nos livrarmos dele ou dos outros dois, a fênix e o dragão.

— Sim, senhor.

Já está próximo das oito da noite e a cobaia será enviada ao labirinto. Estou em meu laboratório próprio terminando de preparar os últimos protocolos e terminando os últimos testes com a nova cobaia quando percebo a queda de energia que só pode significar uma coisa.

Estão enviando a cobaia sem mim.

Algo está errado.

Me apresso até a área de lançamento no andar mais profundo do complexo e quando chego vejo Kim Heechul no comando, um módulo de envio de cobaias acabou de ser enviado e outro está sendo colocado no carrinho de envio e nos trilhos para o labirinto, a câmera está focada no rosto da cobaia exibindo-o nos monitores, como de costume, o líquido que garante seu sustento e sono está esvaziando e conforme ele some eu me desespero.

Adentro a área de lançamento furioso - Que palhaçada é essa?! Porque ele está sendo enviado, quem autorizou essa...

— Fique calmo, Luhan, eu autorizei isso, ele é a melhor cobaia que temos em meses. – Heechul fala com aquele sorriso metido que eu odeio.

— Ele é meu irmão! Está fora de questão mandá-lo! Tire-o de lá agora!

— Ele é também uma grande oportunidade para ser desperdiçada, você mesmo disse que sacrifícios são necessários nesses tempos. – Ele se aproxima de mim em seu terno branco e seus guardas de costume estão ao seu lado.

O sorriso metido, o rosto de maçãs cheias, o cabelo preto brilhante, grande e com as pontas enroladas apontando para fora, ele podia ser o governante de todo o país, ser um dos homens mais importantes e poderosos do país e ser da dinastia mais antiga da nação, mas não mudava o quanto ele era desprezível, frio, calculista e o quanto eu o detestava.

Seu dinheiro é o único motivo de eu aceitar trabalhar para ele.

Sem ele, minhas pesquisas e testes não teriam saído do papel.

— Meu irmão mais novo está fora de cogitação, eu já disse! Cancele isso agora ou...

— Ou o que?! – Ele grita apertando o botão de lançamento.

Não tenho escolha.

Meu irmão não será lançado naquele inferno. Projeto minha telecinésia e seguro a capsula de lançamento com uma mão e tento fechar os portões com a outra.

— Eu sabia! – Heechul gargalha. – Você é exatamente como essas pessoas que você testa! Você descobriu isso tudo!

Uso a mão que segura o portão e o empurro com força e ele sai rodopiando pelo ar, bate nos monitores e cai no chão, espero que tenha quebrado alguns ossos.

Quando direciono minha atenção de volta aos portões sinto uma picada no pescoço e o mundo começa a ficar turvo e escuro.

Um dardo tranquilizador.

Guardas estão aqui para me conter, eu nem mesmo os vi chegando, estou muito descuidado.

Me concentro e direciono minha telecinésia em meu corpo, consigo achar o tranquilizante e retardar seu movimento pelo meu corpo.

— Atirem de novo! – Heechul se levanta com dificuldade.

Projeto minha telecinésia de novo e o empurro contra a parede com força. Expando um campo de força mental para identificar tudo ao meu redor. Heechul caído, seus dois guardas preocupados demais em ajuda-lo, três agentes com armas de dardos tranquilizantes. É tudo que tenho aqui comigo. Posso dar conta disso.

Um dardo voa em minha direção e eu o desvio para um dos brutamontes e o acerto bem no olho esquerdo.

Menos um.

Me projeto no ar em direção ao guarda derrubo outro brutamontes o prensando contra a parede e aumento o peso do meu soco, com apenas um ele cai desacordado. Sinto uma perturbação no meu campo de força mental, outro dardo voando em minha direção. O quebro no ar e o tranquilizante cai no chão.

Fazer tudo isso está me cansando, o módulo ainda está preso por minha força, não vou aguentar por muito tempo. Puxo as armas de dardos dos agentes tranquilizadores para longe deles e os empurro para longe fazendo-os desmaiar também.

— Sehun. – Corro para a plataforma de lançamento para cancelar o envio o quanto antes.

Começo a digitar todos os códigos de cancelamento e me permito relaxar um pouco. É aí que eu erro.

Sou alvejado por não sei quantos dardos e dessa vez o seu efeito é imediato, logo começo a sentir dificuldade em ficar de pé, minhas pernas bambeiam e eu caio com a imagem do casulo de lançamento com meu irmão dentro sendo a última coisa que eu vejo.

— Sehun... – Eu deixo escapar antes do mundo ficar completamente escuro.

— Por sorte ele não viu onde as jogou. – Ouço um dos brutamontes falar e então apago.