Seth estava sentado na ponta do sofá branco, com os cotovelos apoiados nos joelhos e o queixo apoiado nas mãos, acompanhando Summer com os olhos, enquanto ela andava de um lado pra outro na sala de espera do hospital, esperando, aflita, notícias de Cal e Marissa. Já estavam lá há mais de uma hora e ninguém lhes dizia nada, nem os deixava entrar por aquelas portas duplas.
- O meu pai trabalha nesse hospital, sabia? – Summer gritou para a enfermeira quando ela lhe deu as costas dizendo apenas que não podia dar nenhuma informação.
- Summer, relaxa, se não você vai acabar tendo um troço.
- Como você pode ficar calmo, Seth? É a Marissa! E o Cal. E porque o Sr. e a Sra. Nichol puderam entrar e nós não?
- Ah, porque eles são o Sr. e a Sra. Nichol? – Ryan chegou, entregou um café a Summer e foi sentar no sofá com Seth.
- Obrigada, Ryan.
- Alguma coisa? – perguntou enquanto entregou um copo de café ao irmão; Seth balançou a cabeça. – Ela está bem. Ela tem que estar bem. – duas enfermeiras passaram conversando entre si, sem dar qualquer atenção a eles. – Alguém poderia dar alguma notícia.
Depois de mais dez minutos sem nenhuma notícia, Summer continuava impaciente, Seth e Ryan mais quietos, mas os três passavam a mesma coisa, aquela demora toda não poderia ser boa coisa. Summer atirou o quinto copo de café no cesto de lixo; nesse instante Julie e Caleb Nichol entraram, a agonia aumentou ainda mais ao ver os rostos sérios.
- Oh meu Deus, Sra. Nichol, o que aconteceu? Como eles estão?
- A Marissa está bem, Summer. – disse Julie dando um suspiro aliviado.
- Eu posso vê-la? – Summer perguntou e Ryan também se levantou com expectativa.
- Não, hoje não, Summer. Obrigada por ter ficado aqui, agora pode ir, amanhã vocês vão poder ver a Marissa, ela vai passar a noite em observação. Vocês devem ir pra casa descansar.
- Espera, e o Cal, como ele está? – Summer reparou que o Sr. Nichol não parecia tão aliviado quanto Julie, mas não se preocupou em responder, ou a dar qualquer atenção aos amigos do filho.
- Eu vou pegar um café, Julie. – disse à esposa e saiu.
- Como ele está?
- Ele está na UTI, o estado é um pouco grave.
- Oh meu Deus. Ele corre risco de morte?
- O melhor que vocês tem a fazer é ir pra casa.
***
Sandy apanhou o jornal e assim que abriu viu a notícia do acidente estampada na primeira página; ele já sabia, pois tinha ficado acordado até os filhos chegarem em casa, mas o jornal trazia detalhes novos que Seth talvez tenha esquecido de mencionar, como o fato de Caleb estar alcoolizado e o motorista do outro carro envolvido no acidente estar em coma.
- O Caleb Junior vai ficar encrencado se esse cara morrer. – disse para si mesmo, mas Seth vinha entrando na cozinha no mesmo instante.
- O Caleb vai ter sorte se sobreviver.
- Ele está tão mal?
- Estava na UTI ontem quando nós saímos do hospital. – o telefone tocou e Seth atendeu; era Summer e ele falou com ela por um minuto. – Tudo bem se eu faltar o primeiro tempo para ir ao hospital? – Ryan entrou na cozinha e também serviu-se de café.
- Alguma notícia? A Summer ligou? – Ryan perguntou. – Aconteceu alguma coisa com a Marissa?
- Não, mas ela pode receber visitas. Eu vou lá com a Summer.
- Eu vou com vocês.
- Ok, tudo bem, acho que vocês podem faltar a primeira aula, eu ligo pra escola.
- Valeu, pai.
Marissa estava realmente bem, de fato tinha saído do acidente apenas com um pequeno arranhão na testa e algumas escoriações, o que naquela altura era uma verdadeira dádiva. Summer deu um abraço demorado na amiga.
- Oh, Coop! Graças a Deus que você está bem.
- Hey, Sum, você está me sufocando. – Marissa disse rindo e Summer a soltou.
- Desculpe, eu tive tanto medo.
- Eu sei, eu também. Ahm, você trouxe flores pra mim, Ryan! – Ryan se aproximou da cama, entregou o buquê de flores e deu um beijo na testa de Marissa. – Obrigada.
- Você me assustou, sabia?
- Foi um pouco estúpido entrar no carro com o Caleb, eu sei, eu estava com medo de que ele fosse atrás do Seth e eles brigassem, sei lá. Tentei pedir para ele parar o carro e me deixar dirigir, mas ele não me escutou, quando eu me dei conta já tinha acontecido. – Julie entrou no quarto e parou surpresa quando viu os três amigos da filha, ela também trazia um buquê de rosas.
- Bom dia, crianças. Dormiu bem, querida?
- Sim. – Julie colocou as flores num vaso na mesinha ao lado da cama.
- Eu falei com o médico, ele disse que você pode ir pra casa.
- Que bom. Você ligou para o papai?
- Claro, ele vem te buscar. Como você está bem, eu vou trabalhar, tudo bem? O seu pai também quer cuidar de você um pouquinho.
- Ok, tudo bem. Mãe, como o Caleb está?
- Ele está fora de perigo agora. E não, ninguém vai poder vê-lo hoje, só a família. – acrescentou antes que alguém perguntasse. – Vocês não tem escola?
- A gente pode ficar mais um instante, Sra. Nichol?
- Bom, a minha garotinha precisa ser paparicada um pouco, mas não se atrasem para a escola. – Julie beijou o rosto da filha e saiu.
- Nada como um acidente para deixar a sua mãe tão boazinha.
- Cohen!
- Você não deixa de ter razão, Seth. Graças a Deus o Cal está bem.
Marissa voltou pra casa, Jimmy foi buscá-la no hospital e passou a tarde na mansão dos Nichol cuidando dela, embora se sentisse muito bem, ela não recusou tantos cuidados; Summer e Ryan telefonaram e ela aproveitou o tempo que precisou ficar de repouso para navegar na internet. À noite Jimmy teve que voltar ao trabalho e Julie assumiu o posto e até levou o jantar de Marissa no quarto.
- Acho que eu vou ficar mal acostumada, mãe.
- Imagina. Você deu um susto muito grande na gente, Marissa, eu precisei ligar para a Katilin porque ela viu no noticiário, enfim.
- O Caleb está no hospital?
- Aham, ele está muito preocupado com o filho.
- O Cal não está bem? Você disse que ele não corria risco...
- O Cal está bem e não corre nenhum risco de vida, mas o homem que estava no outro carro ainda pode morrer.
- Oh! Você quer dizer que...
- O Cal é responsável pelo acidente, Marissa, ele estava em alta velocidade, embriagado, drogado e tem a ficha suja. As coisas podem se complicar muito pra ele.
Marissa voltou para a escola no dia seguinte e pôde ver por si mesma o que Summer já tinha lhe avisado, a escola toda estava falando do acidente, era como se não houvesse mais nada e a possibilidade de Caleb ser preso não estava sendo ignorada, principalmente porque os Nichol voltaram a sair no jornal. Ela sabia que o padrasto já tinha acionado os advogados e faria tudo que fosse possível para que o filho não fosse para a cadeia, mas provavelmente se o homem morresse não conseguiria impedir, por isso a expectativa era para que o cara saísse do coma. Cal continuava no hospital e só depois de três dias pôde receber visitas; Summer, Seth e Marissa encontraram-no com uma perna engessada, curativos na cabeça e uma expressão abatida no rosto.
- E aí, cara? Como você está? – Seth perguntou, embora sempre achasse aquela pergunta um pouco idiota, afinal o cara quase tinha morrido, era possível imaginar como ele estava.
- Bem. – Cal respondeu sem levantar os olhos.
- Nós ficamos muito preocupados. – disse Summer.
- Sinto muito por ter estragado seu aniversário, Summer e, vocês sabem... Eu estraguei tudo, sinto muito.
- Ah, na verdade nós já esquecemos, tudo. – Summer disse e Seth concordou.
- E obviamente você já teve o que merecia. – disse Seth sorrindo.
- É óbvio que eu não mereço amigos como vocês.
- Hey, Cal, esquece, ok?
- O que importa é que você está bem, cara. O mesmo não se pode dizer da sua Ferrari.
- Essa foi por pouco, mesmo. – Cal disse e voltou a baixar os olhos e ficar quieto.
- Ei, porque tem um policial lá fora? – Summer perguntou depois de um instante, tentando parecer natural; Cal deu um sorriso sem humor.
- Eu tenho duas costelas e uma perna quebradas e eles acham que eu vou fugir. É, eu já sei, agora eu preciso rezar para que o cara não morra, não é? Bem, não é que eu esteja torcendo para ele morrer, de qualquer forma, é só uma razão nobre pra ele viver.
- Você ainda consegue ser sarcástico, isso é ótimo.
- Tem alguma coisa que a gente possa fazer? – perguntou Marissa.
- Seria ótimo ter o meu computador e Iphone, alguns filmes e alguma coisa melhor pra comer também não seria nada mal.
- Ok, verei o que eu posso fazer por você.
Enquanto conversava com os amigos, Cal não se dava conta nem mesmo das dores; depois que eles foram embora, no entanto, teve que ficar sozinho com os próprios pensamentos e admitir para si mesmo todas as besteiras que tinha feito, que agora, querendo ou não, teria que enfrentar as conseqüências; ficou imaginando o que aconteceria se o cara que ele atropelou morresse, mesmo todo o dinheiro do seu pai não o impediria de passar alguns anos na prisão. O Sr. Nichol não ajudou muito quando foi ao hospital e ficou falando sobre o assunto; enquanto o pai falava sobre as suas chances dele sair do hospital livre, Cal virou o rosto e tentou fingir que estava dormindo.
- Você pode me ignorar, Caleb, mas isso não muda nada, eu estou tentando te ajudar, estou fazendo de tudo para que você saia daqui em liberdade, usando todos os meus contatos e influência, mas isso não significa nada para você, não é?
- Eu agradeço os seus esforços e sinto muito causar tantos problemas, talvez eu devesse ter morrido para poupá-lo de tanto trabalho, mas que bom, a sua influência vai servir pra alguma coisa.
- Porque você é desse jeito, Caleb? O que foi que eu fiz pra que você me odeie tanto? – Caleb encarou o filho por um instante, como sempre havia uma certa mágoa naqueles grandes olhos castanhos; Cal voltou a virar o rosto e não falou mais nada, não diria ao pai que lhe odiava por ele ter lhe abandonado, por nunca ter lhe dado um mínimo de carinho, que o odiava porque, por sua culpa, a família tinha acabado, porque ele nunca foi capaz de ser um bom pai ou um bom marido, por passar mais tempo ocupado em construir o seu império imobiliário enquanto sua própria casa desmoronava. Não era algo que pudesse ser dito ou precisasse ser dito, porque ele sabia, no fundo ele sabia que por trás do bem sucedido homem de negócios, ele era um fracassado sozinho.
- Como você quiser, Cal. Talvez você queira saber que o rapaz que você atropelou está quase fora de perigo, mesmo assim você ainda pode ser preso, nossos advogados irão tentar negociar um acordo com o promotor. O médico acha melhor que você fique mais alguns dias. A Julie e eu precisamos ir a um jantar, mas a Marissa vem ficar com você amanhã à noite. Feliz Natal.
Ficar no hospital durante o feriado não era exatamente a ideia de “Feliz Natal”, mas a notícia de que o cara não morreria acabou sendo um bom presente. Marissa voltou a visitá-lo e levou as coisas que ele tinha pedido.
- Acho que eu vou me divertir bastante. – disse ele ligando o notebook; ainda sentia um pouco de dor quando sentava, por isso pediu para Marissa colocar mais almofadas atrás de suas costas. – Obrigado, Marissa.
- Eu posso ficar com você amanhã.
- Não, não precisa. Você deve querer passar o Natal com o seu pai ou o Ryan.
- Mas você não pode ficar sozinho.
- Eu vou adicionar amigos no Facebook. Por favor, eu já estou me sentindo muito culpado por tudo, não vou querer que ninguém perca o Natal por minha causa.
- Como diria a Summer, você precisa parar de achar que é a causa de tudo. Enfim, tem uma coisa que você vai querer. – Marissa pegou uma sacola de papel que deixara em cima da cadeira e tirou uma torta. – A Summer fez, é de morango. Aliás, ela queria saber o que comprar de presente de Natal. – Marissa cortou uma fatia de torta e serviu Cal.
- Mais disso aqui estaria ótimo.
- Eu darei o recado. Preciso encontrá-la agora no South Coast Plaza, eu volto depois. – Marissa deixou a torta na mesinha próxima a cama, de modo que Cal poderia pegar sozinho quando quisesse e também deixou o controle da TV e o celular ao alcance; ele passou a tarde intera sozinho e assistiu ao mesmo filme três vezes – “Velozes e Furiosos” – já que não podia levantar para ir trocar o disco; só no fim da tarde o enfermeiro veio lhe ajudar com o banho e trocar os curativos.
- Como o senhor se sente, Sr. Nichol?
- Melhor se você me chamar de Cal, Wayne. – o sorriso alvo de Wayne e seu jeito descolado e a mania de ficar falando dos Yankees o tempo todo, diminuiu o desconforto que Cal sentia por ser acompanhado ao banheiro. – Então, quando eu vou poder ir pra casa? – perguntou quando o enfermeiro trocava as bandagens da sua cabeça.
- Você teve traumatismo craniano, Cal, não é assim tão rápido a recuperação.
- Mas eu me sinto bem.
- E precisa permanecer em repouso.
- Eu não posso repousar na minha casa? Eu já adicionei mais de cem amigos no Facebook.
- Bem, o Dr. Eliot acredita que é melhor você permanecer internado.
- O Dr. Eliot ou o meu pai? – como Wayne não respondeu, Cal deduziu que estava certo. – Pelo menos eu tenho a Miss Vixen.
- Ela está internada aqui?
- No Facebook, Wayne. – Wayne terminou de fazer o curativo e ajudou Cal a voltar para a cama.
- Ahm, você tem uma namorada na internet. – Cal pegou o notebook e ligou enquanto Wayne colocava as almofadas atrás de suas costas.
- Eu bem que gostaria que ela fosse minha namorada. Olha só... – Cal virou a tela do computador.
- Wow! Que garota, heim, cara! Ainda bem que ela não existe, você tem que repousar.
- Claro que ela existe, Wayne, e está online. – Cal começou a prestar atenção no computador enquanto Wayne terminava de arrumar seus objetos na maleta; houve uma batida na porta. – Entra. – disse Cal e Wayne deu um sorriso.
- Horários de visita existem por um motivo. – disse ele, em seguida a porta abriu-se e a tia de Cal entrou.
- Tia Patrícia!
- Cal, oh querido, como você está? – surpreso com a visita, Cal digitou “falamos depois” e clicou “enter” e guardou o notebook antes de receber o abraço cuidadoso de Patrícia. Wayne não se preocupou em relembrar que o horário de visitas tinha acabado; como os Nichol tinham construído o hospital isso não fazia muita diferença para eles, pediu licença e saiu.
- Obrigado por vir de Nova Iorque para me visitar, tia.
- E se eu disser que foi por acaso que eu soube que você estava no hospital? Eu cheguei ontem a Newport, o Jason veio para uma sessão de autógrafos numa livraria, eu ia te ligar, imagina a minha surpresa quando abri um jornal e vi a notícia! Você consegue imaginar como eu fiquei assustada, Cal? Eu liguei para casa do seu pai e a sua madrasta disse que você estava internado.
- Sinto muito, tia, pensei que o meu pai tivesse telefonado.
- Eu tenho certeza que se você morresse seu pai não telefonaria antes da missa de sétimo dia. – Patrícia ficou séria um instante, mas sorriu relaxando, Cal sorriu também, afinal ela era talvez a única pessoa que entendia o que ele sentia em relação ao pai. – Desculpe, eu pensei “Meu Deus, ele conseguiu fazer uma besteira irreversível”. Ah querido, foi tão difícil perder a sua mãe daquele jeito.
- Eu não tentei me suicidar.
- Cal, por favor, eu sei que não. Eu só... a cada dia que passa você fica mais parecido com ela.
- Eu não sou alcoólatra, se é isso que você quer dizer.
- Ok, tudo bem, não foi por isso que eu vim, você não precisa ouvir nenhuma cobrança nesse momento, me desculpe. O importante agora é você se recuperar. – Patrícia deu um beijo na cabeça do sobrinho, Cal entendia o que ela estava falando e não poderia ficar chateado por muito tempo.
- Você disse que o Jason está em Newport?
- Ah, sim. – ela olhou o relógio. – Agora mesmo ele está no South Coast Plaza.
Patrícia demorou mais de uma hora no hospital e prometeu voltar no dia seguinte, além de não contar a vó de Cal sobre o acidente, “ela talvez não agüentasse”. A primeira visita que Cal recebeu na véspera de Natal foi do médico, o Dr. Eliot levou-o para fazer uma nova tomografia e depois de dizer que ele ainda não teria alta, lhe desejou feliz natal e foi embora. Tia Patrícia voltou a visitá-lo, dessa vez acompanhada pelo marido, mas eles não demoraram porque queriam chegar à Nova Iorque a tempo de cear com a família de Jason. Summer e Seth o visitaram à tarde, e Marissa veio no início da noite levando os DVDs que Cal tinha pedido; ela se ofereceu novamente para ficar com ele, mas Cal insistiu que ela fosse ficar com o pai e ele passou o natal assistindo a “Esqueceram de mim”.