Central City – O Primeiro sinal.

Eu deveria saber, é o que concluo olhando para trás. Mas a juventude é linda e colorida. Ninguém se importa de verdade com o amanhã, por que ele é apenas mais um começo, e o fim está tão distante de nossos dias infinitos. Então qual o motivo uma garota no auge de seus vinte e cinco anos teria para se preocupar com uma terrível morte prematura?

-Acha que vamos sentir falta de toda essa luz? -pergunto a Barry, enquanto caminhamos pelas ruas em que crescemos, pela última vez.

A cidade parece estar disposta a ostentar toda a sua beleza, talvez estivesse nos dando adeus, ou muito agradecida por se livrar de uma só vez de dois dos seus moradores mais azarados. O céu estava muito mais azul do que o normal, o sol brilhava exultante e pássaros podiam ser vistos migrando ao sul. Muitos deles, observo encantada, aproveitando ao máximo a vitamina D, antes de me enfiar naquela cidade que só tem sombras para onde me mandaram.

-Vive reclamando que Central tem a pior hora do rush que existe! -debocha e eu o ignoro, não pode só ser nostálgico um pouco? - Poderia ser pior, poderia ser Gotham. -acrescenta acabando com minha chance de réplica.

Barry Allen, é a definição de leveza. Um cara em seus vinte e cinco anos, com olhos verdes incrivelmente expressivos, e a capacidade de minimizar qualquer tipo de problema. O típico nerd fofo, e uma das pessoas de caráter mais integro que existem. Nos conhecemos a cinco anos no trabalho. Sou analista de TI do departamento de Polícia de Central City, ele é um especialista forense. Até tentamos sair uma vez, mas é estranho namorar alguém tão parecido, não que a paquera e passar o tempo juntos não tenha sido bom, por que foi, tão bom que resolvemos fazer isso como amigos. E dessa forma seguimos nossas vidas felizes. Ele tem uma paixonite por sua irmã adotiva também, o que contribuiu com o lance de não tentar. Ninguém gosta de embarcar em canoa furada e sinceramente, vivo falando para ele que isso é quase incesto.

Agora o Capitão Frye, jura que nos deu uma promoção. Nos convocaram a chefiar os respectivos departamentos que trabalhamos, mas quando o presente reluz, certeza que é uma latinha amaçada que esqueceram de reciclar. Fomos mandados para a segunda pior cidade desse país, promoção uma ova! Aposto que ninguém mais aceitou e sobramos Barry Allen, o carinha legal que não sabe dizer não para nenhuma autoridade e eu. Não, eu não vou enumerar meus problemas. Sou mais do tipo que protela até que o outro esteja completamente apaixonado e incapaz de viver sem minha presença, a partir daí é só queda livre!

Entramos na estação ferroviária e vejo uma pequena aglomeração próxima a plataforma. Mas Barry me puxa para a fila onde validaríamos nossas passagens, e escuto meu estômago roncar. Ignoro a primeira vez, e fico olhando uma velhinha contando moeda por moeda como se o tempo do mundo fosse eterno. Me pego tentada a ir ajuda-la quando meu estômago reclama novamente, ganhando a atenção do meu amigo.

—Você não comeu antes de viajar! -me olha em choque, um tanto exagerado, mas Barry trata comida como crianças do primário tratam suas próprias mães. Sabe, quando um diz “A sua mãe que é!” e o outro moleque fica com fogo nos olhos.

—Ah, me desculpa se você marcou um horário em frente a DPCT e chegou cinquenta minutos depois, eu não queria te incomodar com meu estômago. -ralho fazendo seu semblante se tornar culpado. -Tem uma máquina de doces ali. -aponto para o inicio de um corredor próximo aos banheiros.

—Me dá, eu pego sua passagem. -passo o papel de nossa reserva de acentos, que comprei na internet. Barry puxa minha mala de rodinhas para ficar mais perto dele. -Não demora, vou ficar te esperando aqui mesmo.

—Claro, claro. -sorrio para ele que não demora a desfazer a carranca.

O que eu vou querer? Fico entre batatinhas e uma barra enorme de chocolate. Nenhum dos dois é saudável o suficiente. Sempre tem esses biscoitinhos sabor pizza, não Barry vai comer todos antes que possa puxar um de dentro. Barrinhas de cereais talvez...

—Precisa de ajuda? -escuto uma voz masculina atrás de mim.

—Ou! -meus olhos devem estar arregalados, certeza. Se controla Felicity. -Queen? Oliver? Desculpe. Oliver Queen?

Balbucio feito uma idiota, olhando um homem louro com uma barba bem-feita e olhos incrivelmente azuis. Usando um terno preto alinhado, o playboy que voltou para Star City depois de cinco anos sabe-se Deus onde, virou dono de boate, CEO e parece estar tentando política agora. Enquanto pesquisei sobre a cidade, seu nome aparece em praticamente tudo, bom, não o seu nome especificamente, mas o de sua família. Os Queens controlam boa parte da economia de Star City, são basicamente realeza. Agora entendo o aglomerado de pessoas que vi mais cedo, algumas “fãs” o observavam com celulares em mãos, como se ele fosse o Brad Pitt.

—Ah, oi! -sorri com simpatia. -Nos conhecemos?

—Não, sim. -o que estou fazendo? -Eu te conheço, claro, todo mundo conhece. Mas por que está falando comigo? -só um meteoro, é tudo o que quero, ou um raio. Parece mais fácil o raio, e de preferencia na minha cabeça. -Sr. Queen. -acrescento, na tentativa de não soar tão rude.

—Só pensei que precisasse de ajuda, estava parada a algum tempo e não escolheu seu lanche. -diz. -Fiquei esperando minha vez, mas vou precisar embarcar. -aponta para o trem que já estava na plataforma.

—Ah, claro. -dou um passo para o lado. -Fique à vontade, não consegui escolher ainda.

—Obrigado, é muita gentileza sua. -agradece com um sorriso de propaganda de cueca box, se inclinando sobre a máquina. Uau! Que nada querido, eu quem agradeço!

—Felicity! -Barry vem correndo em minha direção com um sorriso radiante no rosto, arrastando nossas malas e me desperta dos meus pensamentos. -Nos deram passagens de primeira classe!

—O que? Não! -pego as passagens de sua mão. -Tenho certeza que comprei duas poltronas no último vagão. -confiro os lugares. -Nossa, é mesmo a primeira classe! -murmuro chocada. -Essa é oficialmente a primeira vez que nós dois temos sorte em alguma coisa.

—Eu sei! -concorda contente. -Disseram que venderam duas vezes as mesmas poltronas e queriam nos compensar.

—Acho que posso viver com isso. -sorrio, então Bear olha para minhas mãos vazias.

—Pelo amor de Deus. -reclama indo em direção a máquina, escolhe as batatinhas um chocolate e os biscoitos de pizza. -Sempre fica horas para pegar as mesmas coisas. -me entrega tudo. -Vamos acabar não embarcando se demorar mais.

Odeio quando ele quase está certo. Quase, pois conseguimos entrar no ultimo segundo. Procuro nossos lugares, e me sinto em um vagão a caminho de Hogwarts, só que completamente moderno é claro. As cabines tinham quatro lugares, com poltronas brancas reclináveis, um regulador de luz e fones de ouvidos para assistir algum filme nos pequenos monitores a nossa frente.

—Nossa, nunca pisei em uma primeira classe antes. -Barry se senta e testa todas as funções da cadeira, antes de soltar uma risada de animação.

—Seria ainda melhor se fosse o último vagão. -me sento ao seu lado na janela. -Apesar que estou adorando não morrer de calor em meio aquelas poltronas apertadas da econômica. -dou de ombros.

—Sabe que se sofrermos um acidente, estar no último vagão só vai nos fazer morrer mais rápido, não é? -implica com um sorriso de lado, estava prestes a responder quando a cortina se abre e vejo que toda a sorte que não tive em minha vida parecia estar sendo compensada naquele dia.

—Licença. -Oliver nos olhava com a passagem em uma das mãos e uma mala de mão na outra. -Parece que estou nessa cabine também. -aponta para o lugar em minha frente.

—Claro. -Barry sorri naturalmente para ele. -Fique à vontade!

Tento não encarar enquanto ele se estica para colocar sua bagagem no suporte, tento, mas não tenho nenhum sucesso. Barry disfarça o riso com uma tosse e me entrega um guardanapo, sussurrando que deveria limpar minha baba. Me pego tentada a pôr língua feito uma criança, mas decido ignorar.

—Você é a garota da fila. -Oliver parece se lembrar quando senta.

—Isso, retardei seu embarque. -sorrio abobada.

—Diz seu nome. -Barry sussurra baixinho para mim.

—Ah, é. -balanço minha cabeça tentando recobrar a consciência. -Garota da fila. Eu. -limpo a garganta e Barry revira os olhos, desistindo. -Felicity. Smoak.

—Felicity. -repete meu nome com um pequeno sorriso. Gosto de como soa em sua voz.

—Barry Allen. -Bear estende a mão para ele que aceita o cumprimento. -Fiquei fascinado com os avanços que Curtis Holt fez com os nano chips para ajudar paralíticos! -elogia com os olhos brilhando, Oliver parece não entender sua animação.

—Claro, é realmente um grande avanço. -comenta vagamente, e já percebo que nem deve saber do que se trata direito. -Ray Palmer é quem cuida dos assuntos da empresa, não costumo me envolver mais. Sabe como é, mãos capazes evitam que enfrente a falência. -brinca.

—Isso é verdade. -penso nas reportagens que li, e os números horríveis que a empresa apresentou quando ele era CEO. Percebo os dois me encarando e estava prestes a me desculpar quando tudo parece tremer. Agarro a mão do Barry por reflexo, olhando pela janela a procura de algo que justificasse o tremor. -O que é isso? -murmuro me sentindo a banana da vitamina.

Oliver se levanta e abre a cortina da nossa cabine, as pessoas estavam em pânico por todos os lados. Nos levantamos e vejo uma garotinha de cabelos escuros e pele morena, com os olhos marejados sendo jogada de um lado a outro pelas pessoas que não se davam conta da sua existência ali.

—Barry. -aponto para a garota ele sai sem esperar mais nada.

—O que ele está fazendo? -Oliver olha em desespero enquanto meu amigo desaparece na multidão.

—Tinha uma garota sendo arrastada. -justifico, e percebo que minhas mãos tremem um pouco menos, minha cabeça começa a analisar a situação.

—E agora ele está sendo arrastado. -revira os olhos prestes a sair também, quando agarro seu braço.

—O que está fazendo? -grito o parando.

—Por que não fez o mesmo com o garoto! -grita de volta, me olhando irritado.

—Nós trabalhamos na polícia, temos treinamento. -tento soar firme. -Não posso deixar um civil sair sem proteção no meio dessa manada humana!

—Você é minha proteção? -ele parece segurar o riso, como se eu fosse a pessoa mais inocente do mundo, mas já estou acostumada.

—Sinto muito, Sr. Queen, mas é o que tem. -estendo uma mão espalmada em sua direção e olho pelo corredor, encontro Barry próximo a uma cabine entregando a criança a um casal. -ele aponta para a porta do vagão, precisávamos descobrir o que estava acontecendo. -Isso não é um terremoto. -olho para a janela e tirando o caos do trem, todo o resto gozava da mais plena paz. -É melhor se sentar. -Oliver estava inquieto, o que me irrita muito mais. Tiro meu tablet e começo a invadir o sistema do trem.

—O que está fazendo? -escuto sua voz, mas não posso responder enquanto alguém ficava me expulsando do sistema. Merda, isso é um ataque! -Felicity! -grita.

—O que é! -respondo no mesmo tom, discando o número do Barry no meu celular.

‘Eu disse que estar no último vagão nunca traz nada de bom.’ Barry reclama quando atende o telefone. ‘Cinco homens, estão intimidando um cara engravatado.’ Sussurra. ‘Precisamos evacuar as pessoas, ele usou um tipo estranho de dispositivo que acoplou no chão, e está fazendo o trem tremer. E um deles está com algo muito semelhante a uma bomba.’ Posso sentir o nervosismo em sua voz. ‘Felicity, meu estômago está revirando.’

—Eu tenho uma ideia, as pessoas deixaram o último vagão? -olho para Oliver que parecia muito mais inquieto agora.

‘Sim, mas não tem como separar esse vagão dos outros, se é o que está pensando, não sem tirar o homem que está sendo interrogado por eles de lá.’

—Merda, Barry Allen! -reclamo. -Sempre sendo o herói! -olho para o Queen. -Pode nos ajudar a acalmar as pessoas? Soube que está tentando política, deve ter jeito para isso.

—Claro. -ele desaparece, antes que possa instruir qualquer coisa mais, como se só estivesse esperando uma forma de sair correndo da cabine.

—Que idiota. -murmuro sozinha.

Não tem jeito, preciso encontrar alguma caixa de força dentro do trem, ou convencer o maquinista a pará-lo. Por que logicamente ele não deve estar sendo intimado por um bandido super mal, ou ele mesmo não vai ser um bandido. Okay, preciso me concentrar, não tem saída vou ao maquinista. Pego uma arma de teaser e me deixo ser levada pela multidão.

Outra coisa irritante nesse trabalho, não escolhi TI pela emoção de ser empurrada e jogada para os lados em meio a uma multidão muito sem noção. Por que sempre é mais seguro andar pelo trem correndo feito louco do que permanecer no maldito acento, não deveria ter uma equipe para fazer isso, tipo as aeromoças?

Ajeito meus fones de ouvido e tento discar o numero do Barry. A medida que vou avançando o numero de pessoas espremidas nos vagões aumenta. Vou murmurando alguns “desculpa”, “licença” e “foi mal”. Segundo vagão, merda Barry atende essa merda de celular. Posso sentir o cheiro quente de sangue antes de chegar lá. Claro que estavam mortos. Argh!

‘Felicity, onde você está?’

—Barry! -me escondo em uma espécie de armário, onde vejo alguns uniformes e bens pessoais dos funcionários mortos.

‘Alguém pulou lá dentro, ele bateu nos caras e está com o dispositivo sem saber como desativar, estou trancado do lado de fora, pode tentar abrir a porta?’

—Sei que não é hora de perguntar quem é esse alguém. -tagarelo, mexendo no meu tablet. -Só um segundo e vou abrir isso. Estou escondida no primeiro vagão, mataram os funcionários. Olha, se chegarmos a Star City, vamos ter muito trabalho. -ele solta uma risada nervosa. -Pronto, toma cuidado.

‘Não sai dai, vou te buscar quando acabar de desativar essa bendita bomba e claro, preciso que me diga como fazer.’

—Me manda uma foto, preciso ver o modelo. Mas sempre é o fio azul, na dúvida corte o azul. -olho pela janela pequena falando muito rápido. -Barry, tem alguém a caminho. -Ah merda, sabia que era muita sorte para dois azarados como nós.

‘Felicity!’ grita, mas um brutamontes chuta a porta, me espremo atrás dela, sentindo a maçaneta machucando meu abdômen, e pego a arma em meu bolso. Sou descoberta de imediato e tenho meu corpo prensado contra o armário.

—Muito enxerida. -um homem grande, com o que tenho certeza ser o rosto perfeito para um psicopata. Seus olhos loucos me medem e uma de suas mãos se prendem ao meu pescoço e começo a perder o ar. Me debato e consigo chutar sua virilha, o que afrouxa um pouco o aperto e disparo o teaser nele.

—Felicity! -um Oliver esbaforido me olha assustado da porta do vagão, empurro o homem inconsciente para fora e o puxo para dentro. -É você sabe se cuidar. -sussurra, mas a descrença em sua voz ainda é ofensiva.

—Deve ter mais deles, tem uma bomba no trem. -conto e por um segundo Oliver não parece surpreso, mas talvez seja efeito retardatário do pânico, por que aí está uma bela expressão de surpresa, só um pouquinho atrasada. Mas ele é tão lindo que não faz mal ser um tantinho lerdo, acho até que é a forma do mundo compensar.

—Seu pescoço. -talvez por instinto, ele ergue sua mão e toca a base do meu pescoço, mas aquilo era muito perto para duas pessoas que já ocupavam um lugar incrivelmente pequeno, sem falar no quando seus olhos são claros e Deus, que cheiro bom. Posso sentir as pontas ásperas de seus dedos, o que não condiz em nada com um riquinho, mas o toque é bom.-Felicity?

—Hum? -Oliver me olhava preocupado e com algo mais por trás de seus olhos azuis que queimavam sobre mim.

—Acho que está em choque. -conclui em um sussurro quase inaudível. Bom, não estou, mas gosto muito mais dessa explicação do que da verdade. Algo dança freneticamente em meu estômago e começo a tagarelar, a fim de disfarçar como ele parecia atraente naquele instante.

—Podemos explodir se Barry não puder desativar a bomba. -tento soar casual, mas não é a possibilidade mais feliz de todas. -Talvez devesse ligar para sua família, alguém que queira se despedir. -muito perto, é só o que consigo pensar com meus olhos presos nos dele. Vejo calmamente Oliver engolir em seco, humedecer os lábios e uma covinha surgir em sua bochecha quando ele parece travar o maxilar.

—Bom, tenho uma irmã fora da cidade que já tem traumas o suficiente, e meus pais estão mortos. -sussurra para mim. -E você, alguém que queria dizer adeus?

—Essa é a conversa mais estranha que já tive. -murmuro, coçando a testa e Oliver me empurra para um ponto cego muito estreito ao lado da porta. E pede que faça silencio. Então vejo dois caras passando, um deles é atingido por algo na cabeça e um tiro é disparado.

—Felicity! -escuto do outro lado da porta a voz de Barry e me desvencilho de Oliver correndo para abri-la. -Era mesmo o fio azul. -abre um pequeno sorriso e me jogo nos seus braços feliz por não explodir. -Está tudo bem agora.

—Espera! -me afasto o olhando. -Atirou neles? -questiono chocada olhando para os dois lados antes de sussurrar. -Nós somos CSI’s, não podemos atirar em pessoas!

—É o tranquilizante que Cisco desenvolveu. -revira os olhos. -Você deveria ter aceitado o presente ao invés de ficar o zoando. -me limito a encará-lo como resposta. Chego a escutar uma tosse vindo do cara muito gato que estava preso no armário comigo, mas meu melhor amigo sabe como me tirar do sério.

—Olha, não quero atrapalhar isso... Bom, isso aí de vocês. -Oliver chama nossa atenção, interrompendo a nossa luta muda. -Mas não deveriam amarrar esses caras e pedir alguma ajuda? Não sei se perceberam, mas ninguém está conduzindo esse trem.

Ah que merda!