Eu não poderia descansar antes de ver aquele pôr do sol maravilhoso que eu tinha certeza que só era daquele jeito ali, em Themyscira. Meu corpo estava cansado, eu estava suada e possivelmente com alguns hematomas por debaixo daquela armadura linda e pesada em formato de vestido, mas nada disso me incomodava, de fato. A única coisa que eu conseguia pensar, era que fazia exatamente um ano que estava ali, sendo treinada por mulheres incríveis e fortes, sem nenhuma comunicação com o mundo exterior. Não lembrava quem eu era e muito menos de onde tinha vindo. Tudo o que eu sabia era que havia acordado na praia daquela ilha, com várias mulheres me olhando e verificando se eu ainda estava viva. E sim, eu estava. Ou pelo menos renasci, tendo a certeza apenas de uma coisa: que meu nome era Hermione Granger.

Ainda me sentia um pouco perdida acerca de minhas crenças, meus sentimentos e sobre tudo, mas procurava não demonstrar. Aquele lugar paradisíaco, com aquelas amazonas incríveis, havia me recebido tão bem que seria injusto tentar reviver um passado que foi tirado de mim de forma natural. Hipólita, minha rainha e razão da minha eterna fidelidade, sempre dizia que eu era a resposta de uma súplica dela feita diretamente a Zeus. Levei alguns dias para me acostumar com tudo aquilo: o isolamento do local, a calmaria, uma aldeia cheia de guerreiras que diziam ter sido criadas pelo rei dos deuses para trazer paz e equilíbrio entre os homens… Mas mesmo que eu não tivesse entendido no primeiro momento, nunca ousei desconfiar de nenhuma palavra. Aquele lugar tinha um ar de mistério, poder e força. Era incrível de diversas formas e eu queria mais do que tudo fazer parte dali, mas sabia que não era, mesmo que não entendesse minhas próprias razões para isso.

— Hermione, aí está você!

— Minha rainha! — Disse assim que reconheci aquela voz, já inclinando a cabeça em sinal de respeito. Um respeito que ela provou merecer desde o início.

— Assim que vi que o treinamento havia acabado, lhe procurei. E assim que percebi que não estava entre as outras, soube exatamente onde achar. Você não cansa de admirar esse pôr do sol todos os dias, depois de um ano completo?

— Sinceramente, acho que nunca irei cansar. Às vezes ele é a única coisa que me prova que é tudo real.

— Ainda não se sente parte de tudo isso? Não se sente uma amazona?

— Não irei mentir para você, minha rainha… Sou feliz aqui, me sinto bem ao lado de minhas irmãs. Me sinto cada dia mais preparada para viver como a guerreira que estou destinada a ser.

— Mas…

— Em meu coração, sinto que não faço parte desse lugar, ou que pelo menos não deveria fazer. Eu sei que tenho que salvar alguém do outro lado dessa barreira criada pelo próprio Zeus, mas é como se eu soubesse que não deveria estar aqui.

— Hermione, já lhe disse muitas vezes que você é a resposta de minha súplica ao próprio deus dos trovões. Pedi a ele alguém que pudesse ajudar a encontrar a minha filha. E ele te enviou para ser a guerreira que irá salvar Diana, aonde quer que ela esteja nesse momento. Como te disse, a barreira não se abre para ninguém que não seja uma verdadeira amazona, e você transpassou essa barreira. E o melhor de tudo isso, vindo do mundo dos homens. Sua missão é tão grandiosa e importante que até mesmo sua memória foi resguardada por Zeus, para que só lembre e decida se fica aqui ou volta para a sua vida depois de cumprir com seu dever.

— Nunca duvidei de suas palavras. Mas me pergunto se eu, uma simples mortal, seria capaz de salvar uma deusa, sua filha com ele.

— Hermione, não vê? Todas nós treinamos você com o maior afinco possível, mas a verdade é que nenhuma pessoa comum consegue chegar ao nível que você chegou em apenas um ano. Não é toda amazona que consegue tal feito!

— Isso é um grande elogio. Obrigada, de coração.

— Tem mais alguma coisa afligindo você, não é?

— Na verdade, não chega a afligir. Eu só fico me perguntando quando chegará a hora certa. Essa, que nós tanto esperamos para que eu volte e consiga achar Diana.

— Isso é uma ótima pergunta, mas não cabe a mim respondê-la. Tenho certeza de que na hora algo vai acontecer. Algo grandioso e nós saberemos que é hora de agir.

E foi naquele momento que dali de onde estávamos pudemos perceber uma movimentação estranha na praia. Não sei explicar exatamente o que aconteceu, mas eu tinha uma certeza: quem estava ali era um homem.

A agitação foi instantânea enquanto várias amazonas armadas iam na direção do homem, o rendendo imediatamente. Eu continuava a olhar para a cena, totalmente incrédula. Como um homem havia conseguido passar a barreira se apenas uma amazona tinha esse acesso? Minha pergunta obteve resposta sem que eu precisasse verbalizar as palavras.

— Minha rainha. — Mérida, uma das guerreiras mais fortes, apareceu um pouco aturdida e ansiosa em nossa frente.

— Mérida, o que está acontecendo? Eu realmente estou vendo o que acredito estar?

— Sim, minha rainha. Ainda não sabemos exatamente quem é esse homem ou o que ele quer, mas ele diz ter informações sobre Diana. Está com o Laço da Verdade e pediu para lhe falar.

— Por Zeus… Vamos agora mesmo falar com esse homem. Hermione, venha comigo.

E eu fui. Parte do meu cérebro, a que comandava meu sistema nervoso e o permitia dar a ordem para que meu corpo se mexesse, já estava acostumado a reagir sempre que Hipólita dava-me uma ordem, por menor que fosse. Mas naquele momento, não era simplesmente o ato da obediência. Eu estava indo por livre e espontânea vontade. Aquele acontecimento despertou uma curiosidade maior do que eu gostaria de admitir.

Nos aproximamos com alguma cautela do local em que um grupo de guerreiras já estava segurando o homem envolto no tão famoso Laço da Verdade que eu só conhecia pelas histórias contadas por elas. Percebi que o rapaz parecia maravilhado com aquilo, e não com medo, como era a intenção das minhas ditas irmãs. Também percebi que ele procurava algo entre elas. Pude admirar sua beleza. Músculos sutis sobre aqueles grandes casacos demonstravam que ele era naturalmente forte. Os cabelos tão loiros pareciam deixá-lo ainda mais pálido do que o homem realmente era. Mas havia algo nele que mexeu diretamente comigo, e eram aqueles olhos incríveis. Eles me lembravam uma tempestade, um mar agitado, e ao mesmo tempo que traziam calmaria. O cinza daqueles olhos analisaram tudo a sua volta. Ele era alto também. Maior do que todas as mulheres que o cercavam e ali eu pude ter outra certeza: ele havia se deixado capturar por elas, porque por mais fortes e incríveis que nós éramos, os homens não sabiam disso. E ele poderia muito bem ter tentado retaliar, mas não o fez. Parecia aceitar sua derrota com grande satisfação. Pude analisar tudo isso antes mesmo que chegássemos perto o suficiente. E então ele me viu e sua expressão mudou e aquilo me atingiu da forma mais inesperada possível.

— Hermione! Eu sabia que te encontraria aqui, meu amor. Estou te procurando feito louco há um ano.

E então, como em um passe de mágica eu compreendi aquela familiaridade e o fato de ele estar procurando algo entre nós. Não era algo, era alguém. E esse alguém era eu. Porém, eu não fazia ideia do porquê.