– Vai, vai, vai! – Flávius disse, fazendo o gesto com as mãos para apressarem o passo.

Rick, Jean, Philip e Henry corriam entre o caos. Marcelo e Flávius os rondavam com armas, tomando o cuidado de sempre matar algum monstro quando se aproximavam de algum. Ainda que não restassem tantos, havia uma quantidade considerável. Marcelo até que era ágil quando não carregava sua imensa mochila.

O plano era de seguirem até a capela de arenito que existia na aldeia. Lá era o lugar mais alto e se conseguissem subir até o segundo andar era praticamente garantida a segurança total. Em casos como esse ataque, só era permitido a entrada nos pisos superiores quando o indivíduo não tivesse outra opção – ou senão ficaria muito aglomerado.

Rick até conseguia ajudar com a sua pouca habilidade com a espada de ferro. Estava no canto da formação, então de vez em quando a enfiava na cabeça de um zumbi qualquer, sem olhar pra trás para ver se ele realmente fora derrotado.

Vocês são lentos em comparação ao Mestre.

Sentiu uma friagem no corpo e olhou para o lado. Rápido como um raio, o homem apareceu novamente, perto o suficiente para se reparar mais detalhes. Com a sua veste esvoaçando com o vento, dava-se para ver seus músculos definidos nos braços. Tinha a barba castanha por fazer, seus olhos brilhavam e lhe mandava um sorriso sinistro. Antes que Rick parasse de correr ou qualquer coisa parecida, o homem misterioso desapareceu novamente nas trevas.

Rick olhou para frente engolindo em seco e continuou correndo.

– Estamos chegando! Rápido! – Marcelo disse, decepando uma cabeça.

Viraram mais uma rua e se depararam com a humilde capela de arenito. Ela parecia uma torre e não tinha mais de três andares, mas era o lugar mais seguro que conseguiam imaginar. Philip foi o que foi na frente e abria a porta quando os dois adultos disseram:

– Meninos, subam e estejam preparados para companhia. Vamos ajudar os que mais necessitam pela vila. Voltamos já! – Flávius falou, acenando corajosamente e correndo para as outras casas, junto com Marcelo.

– Vamos! – Philip disse, abrindo a porta e deixando todo mundo passar antes de fechá-la.

Dentro não era mais interessante do que por fora. Só havia alguns degraus para o “palco” e uma escada de madeira presa na parede para os outros pisos. Henry subiu primeiro, com o resto do pessoal logo atrás.

Chegando ao segundo andar, todos pararam um pouco para respirar. Agora que a adrenalina se extinguia, percebiam como essa nova brincadeira cansava. Pelas janelas, conseguiam ver vários zumbis, que hora e outra eram mortos por alguém.

– Espero... Que tenham... Aprendido algo com isso tudo. – Rick falou entre arquejos.

– O que... Por exemplo? – Philip perguntou – Como bater com um balde na cabeça de um monstro?

– Todos estão vulneráveis à morte a qualquer instante. – Rick respondeu, olhando-o fixamente. – Mesmo vocês dois, que se acham os melhores na nossa idade.

Philip olhou para baixo. Obviamente estava com a consciência pesada.

– Otávio... – Henry murmurou, também encarando os pés. – Ele morreu por causa de vocês! – terminou a frase mais alto, apontando para o Rick e Jean.

– Mas... Hã? – Jean falou, franzindo a sobrancelha.

– Quem estava nos expulsando da casa? VOCÊS! Ele somente saiu por...

– Se sugere que ele saiu da casa porque estávamos mandando, pode calar a boca. Otávio nos contrariou o tempo todo e só saiu para mostrar-se forte. – Rick respondeu semicerrando os olhos.

– Não se esqueçam de que vocês queriam que nós saíssemos também...

– Nós queríamos que achassem outro abrigo, não que ficassem vagando tranquilamente em um ataque de zumbis! – Rick respondeu mais alto ainda.

– E claro que não estávamos gostando de vê-los! Vocês transformam nossa vida em um inferno por nenhum motivo aparente! – Jean entrou na discussão.

Esse último comentário roubou o próximo de Henry. Philip somente continuou quieto.

– Otávio morreu pelas suas próprias escolhas e sua extrema idiotice. – Rick disse enfim. – Não nos culpe por uma coisa que não fizemos.

Henry decidiu se calar. Brigar com aqueles dois não adiantaria em nada. E afinal de contas, eles ajudaram a protegê-lo quando estavam fora da casa.

Ouviram a porta abrindo logo abaixo. Philip resolveu espiar pelo espaço da escada e viu novos aldeões chegando, todos feridos. Chamou os outros e todos foram ajuda-los a subir.

* * *

Pareceram séculos, mas finalmente conseguiu conter todos os zumbis que apareciam. Os que sobravam naquele instante estavam na aldeia, mais nenhum vinha de fora.

Mestre Eddard correu para as casas. As poucas que foram invadidas estavam somente com monstros, não moradores. Ele os exterminava antes que eles se virassem para encará-lo.

Dos lugares que não foram arrombados as pessoas não se atreviam a sair. Depois de um tempinho derrotando as aberrações restantes, Eddard encontrou os poucos defensores que sabiam lutar terminando o trabalho no centro da aldeia.

– Só restaram esses? – o Mestre perguntou, decepando outra cabeça sem nem olhar para trás.

– Pelo que sabemos, sim. Esperamos. – um deles respondeu, virando-se para ele. Eddard se surpreendeu ao reconhecê-lo.

– Flávius. Que surpresa vê-lo por aqui. – falou com um sorrisinho. – Quando chegou? Não havia te visto.

– Praticamente agora. No meio da invasão. – disse cansado de tanta luta. – Eu e Marcelo ajudamos os que estavam sendo atacados e levamos todos que precisavam para a capela. Parecia a única opção.

– Obrigado. Estava tentando conter os que vinham, mas a situação era complicada. Ainda não entendo de o porquê tantos vir de uma vez. – Eddard falou, coçando a cabeça com a mão ensanguentada.

– É o que gostaríamos de saber. – outro adulto respondeu, o qual pelo jeito estava atento à conversa. – Nunca aconteceu algo desse tipo. Por isso se tornou um caos.

– Não tenho certeza, mas parece que Rick e Jean sabem de algo a mais. – Flávius falou.

– Devem saber mesmo – Eddard disse raciocinando – Eles que avisaram sobre o ataque chegando. Se não fosse pelo aviso, teríamos mais perdas.

É melhor falar com eles.

– Conseguem dar conta por aqui? – perguntou aos dois e aos companheiros próximos que escutavam a conversa.

– Agora está mais tranquilo. Conseguimos manter o controle. – um deles respondeu, tirando a espada que havia prendido em uma rachadura na parede ao detonar um monstro.

Eddard saiu a passos largos. Queria saber logo que inferno acontecera ali. E também, estava um pouco preocupado com os dois. Flávius os ajudara, o que significava que poderiam estar machucados.

Foi na sua casa antes, temendo o resultado. E vendo o estado que ficara, confirmou os seus temores. A porta fora arrombada, havia uma das crianças morta ali na frente, irreconhecível, dentro da residência três zumbis e tudo estava bagunçado e jogado no chão. O que o deixou mais irritado ainda foi ver as suas pesquisas bagunçadas.

Lembrando-se do que Flávius disse, foi em direção à capela. No caminho, encontrou muitos zumbis mortos pela segunda vez e vários rastros de sangue frescos, todos levando a um só lugar.

Chegando à capela, viu várias pessoas no último andar, que era descoberto, vendo no que resultava toda essa agitação e comentando entre si. Bateu na porta e uma mulher abriu-a. A sua mão estava enfaixada.

– Mestre Eddard! Está tudo bem agora? – ela perguntou, abrindo um grande sorriso ao vê-lo.

– Acreditamos que sim, Anastácia. Tem muita gente aqui?

– Não tantas, para ser sincera. Estamos ajudando os feridos no segundo andar e o resto do pessoal, que não precisa de ajuda, está ou no primeiro ou no terceiro andar.

– Rick e Jean estão por aqui? – o Mestre perguntou, não os vendo ali por perto.

– Os vi agora pouco no segundo andar. Vou chama-los.

Enquanto ela saía para procurá-los ali de baixo mesmo, saber onde estavam só aumentou sua preocupação. Eddard poderia não demonstrar, mas se importava com as pessoas.

Nem um minuto depois e já viu os dois descendo rapidamente as escadas. Rick estava completamente encharcado de sangue, com o seu braço esquerdo enfaixado, embora o ferimento fosse menor em comparação ao de Jean.

– Mestre! Como está a situação? – Rick perguntou preocupado.

– Estamos matando os últimos. Vocês estão bem? – Eddard questionou vendo o estado dos dois.

– Um pouco dolorido, mas sim. – Jean respondeu, abrindo um sorriso e com Rick confirmando com a cabeça – Estamos vivos.

Tão novos, mas já sabem o que realmente importa.

– Venham aqui. Precisamos conversar.

Trocando olhares, Rick e Jean o acompanharam para fora da capela. Pararam em uma das plantações, ao lado de vários zumbis inanimados.

– Conversei com Flávius há pouco, e ele diz que vocês sabem o que houve aqui, além de que foram vocês que avisaram sobre a invasão. O que aconteceu? Vocês são os culpados?

– Não! – Rick disse na hora – Nós não somos os culpados! Somente sabemos de onde vieram os monstros e como surgiram, então avisamos todo mundo! Antes que fosse tarde demais.

– E como surgiram tantos? – Eddard perguntou.

Rick olhou para baixo.

– Mesmo se falássemos... Você não acreditaria na gente.

O Mestre lhe lançou um olhar feio.

– Depois dessa noite... Acredito em qualquer coisa. Digam.

– Eles... Foram invocados por um homem.

– Invocados? O que? – ele perguntou, franzindo as sobrancelhas.

– Eu e Jean estávamos conversando sobre o vulto de mais cedo exatamente aqui. – Rick revelou – E eu vi o homem de capa que sempre aparece em meus sonhos, e resolvemos segui-lo. O persegui até o lago, e logo após descobrirmos que ele tem os olhos completamente brancos, simplesmente surgiu exércitos de zumbis na sua frente. Então saímos correndo e te avisamos sobre o ataque.

Olhos brancos...? Zumbis em seu comando? Espere um pouco...

– Rick, me responda mais uma coisa: quando Altos Terrenos foi invadido, foi por uma quantidade muito maior de monstros do que a defesa do reino estava acostumada?

Rick arregalou os olhos.

– Sim, provavelmente foi por esse motivo. Nunca havia visto tantos monstros de uma vez no castelo.

Era o que eu temia.

– A destruição de Altos Terrenos e a quase daqui estão conectadas com esse homem. – Eddard concluiu temeroso. – Mas ele não quer parar na “quase destruição”.