Surreal - Art and Insanity

Capítulo 6 - Guernica


Na segunda sessão, senhora Fisher estava mais do que determinada a tirar algo de mim e eu estava ansioso por alguma ação, por causa dos três dias tediosos que tive, nos quais a única ação que tive foi olhar para o nada e ouvir trechos de conversas de loucos.

Ouvi falar de um individuo que também reside nessa clínica. Todos já ouviram falar dele...

Algumas vezes o chamam de Bloed-Vlees, significa algo como Sangue-Carne em Holandês (que é a descendência dele), não faz muito sentido, mas foram os loucos e a mídia que o apelidaram assim, a mídia deve ter escolhido esse nome por causa do impacto, os loucos por não entenderem direito o que estava acontecendo. O verdadeiro nome dele é Rutger Brunswichk.

É possível ouvir do meu quarto os boatos sobre ele, sobre seus crimes, sobre cada vítima...

Já o ví algumas vezes, poucas vezes. A maior parte do tempo ele passa na ala V13 , num quarto com paredes acolchoadas, como um castigo por ferir -se ou a algum residente.
Não podiam seda-lo como faziam com os outros, pois Rutger tinha uma alergia aos sedativos, sua garganta fechava e já até chegou a ter uma parada cardíaca.

O fato de ligarem se ele vive ou morre, me faz pensar que Bloed ainda tem uma família ou alguém que procura saber como ele está. Mesmo sendo o típico psicopata de filme trash, com diversos traços parafilia, quieto, olhando sempre para baixo e com ataques de fúria repentinos. Alguns enfermeiros tinham medo dele, pois já havia feito história como estuprador, torturador e diziam que ele praticava canibalismo.

Mas o assunto não é Rutger, pelo menos não hoje...

O assunto é doutora Fisher, que adentrou pela segunda vez meu quarto para segunda sessão de pergunte ao Sebastian até ele responder. Ela usava uma calça social preta, uma camisa azul e brincos laranja, aquelas cores podiam dizer algo, talvez ela soubesse disso e também sabia que eu entendia dos significados das cores.

Pintei em telas por muito tempo, por toda a minha infância e ainda faço uso da arte. Estudei arte e entendo os traços, as cores (Mesmo não as enxergando exatamente).

Os doutores da clínica sabem sobre meus conhecimentos, e tentam entender algo a partir do que mostro em meus quadros. Mas não conseguem, pois não tenho uma personalidade fácil de ser lida... Acho que já devem ter percebido isso.

De acordo com alguns estudos, sei que preto representa a ausência de cor, pode determinar tudo o que está escondido, velado e pode expressar separação, tristeza, morte, noite. Também possui sensações positivas como seriedade, nobreza e pesar. O azul é uma cor reservada e que parece afastar-se. Pode expressar confiança, reserva, harmonia. Já o laranja dos brincos da doutora, os que prenderam minha atenção tinham a cor do fogo flamejante, foi escolhido como sinal de precaução. Pode significar regozijo, festa, prazer, aurora.

Ela está jogando comigo, mas se fez isso de propósito, queria que eu interpretasse as cores, sendo assim, quer que eu tenha a ideia passada pela interpretação das cores e pelo comportamento dela. Ela é uma dissimuladora.

Um dissimulador conhece outro. Errei apenas uma vez quando...

_ Senhor Volkov, está me ouvindo?_ Perguntou a doutora, tirando-me se meus pensamentos, me trazendo novamente para meu mundo irreal.

Pisquei algumas vezes e olhei para a doutora que analisava minha expressão.

_Como estava dizendo... Faremos uma sessão diferente, Soube que você gosta de arte. Então usaremos obras para nossa sessão._ Ela dizia parecendo estar animada em quanto tirava algumas folhas com imagens de quadros de dentro da bolça.

Ouvi alguns barulhos, eram passos... Era Rita, a voz feminina na minha cabeça. Ela estava chegando, pude ouvir os sapatos de salto batendo no chão a cada paço, mas não pude vê-la.

Rita nunca deixou que eu a visse, mas a imaginava alta, talvez com cabelos negros, olhos cruéis, lábios vermelhos e uma postura arrogante.

Estão brincando novamente com você, eles não cansam. Por que você não sai desse lugar? Sei que é capaz... Ela falava com a voz sedutora, sempre que queria induzir-me a fazer algo usava essa voz. Mas ela podia saber o que eu estava pensando e sabia que não sairia dali até a hora certa.

Doutora Fisher mostrou a primeira obra, era Guernica de Picasso, o mais clichê impossível.

Guerra, dor, pânico, terror, carnificina, corpos distorcidos pela dor e a esperança da margarida na mão do soldado caído. Disse Rita que também devia estar observando a imagem.

_O que você entende por esse quadro?_ Perguntou a doutora.

_É Guernica de Picasso._ Falei entediado, sem querer dar muito a ela.

A doutora estava contendo a felicidade de ter tirado algumas palavras de mim, ela devia pensar que aquilo era só o começo de um monólogo.

_Sim, mas o que podemos entender através das imagens? _ Ela perguntou, queria mais.

_Pelo que lembro ele fez essa obra em 1937, por causa da Guerra Civil Espanhola._ Respondi da forma mais superficial possível, mais alheio ao que ela queria que eu dissesse.

_De fato, mas...

_E o que a Doutora consegue ver?_ Interrompi, olhando-a parecer surpresa.

_Não se trata do que eu consigo ver, mas sim do que você consegue._ Ela respondeu calma, mas podia ver a agitação de seus olhos.

_ A senhora disse ...mas o que podemos entender através das imagens?, achei que trabalharíamos juntos._ Falei fingindo estar um pouco decepcionado, e olhei para outro lado, qualquer lado que não fosse na direção da doutora. Minha intenção era parecer uma porta se fechando, como se ela tivesse perdido a chance de tirar mais alguma palavra de minha boca.

_Trabalharemos juntos._ Ela disse deixando um pouco do nervosismo transparecer, contive-me para não sorrir.

Doutora Fisher estava caindo no meu jogo.

Rita gargalhava alto e batia palmas.