Todos já nos esperavam na entrada da casa. Eu podia ver todos eles, minha família, a quem eu infligiria uma dor insuportável caso permanecesse. Nós paramos a poucos metros deles. Jake se pôs na minha frente, como se quisesse me proteger. Eu tentei me lembrar de como consegui me comunicar com Jake a distância da última vez. Queria poder dizer a todos que eu sinto muito. Me imaginei pedindo desculpa a cada um deles. Imediatamente eles me olhavam com expressões espantadas, parecendo ter entendido a minha mensagem. Queria poder abraçá-los e dizer o quanto seria difícil ficar longe.

–-Isso é impressionante Nessie! -- meu pai me dizia com um sorriso.

–-É mesmo querida. Isso só começou depois... do que aconteceu? -- vovô perguntou.

–-Sim. -- respondi envergonhada. Mas depois me lembrei da conversa com a minha mãe hoje mais cedo. -- Mas antes, pela manhã falei com mamãe sem querer, e foi antes disso tudo.

–-Interessante. -- falou meu avô. -- Eu examinei o sangue e se trata mesmo de uma... descamação do endómetrio.

–-O que? -- Emmet perguntou. Ainn... cada vez mais constrangedora aquela situação. Tentei mostrar ao meu pai como estava envergonhada, lhe enviando algumas imagens, antes que ele pudesse responder a pergunta do tio Emmet. Ele logo entendeu o que eu queria dizer, mas mesmo assim continuou. Ficaria brava com ele, mas acho que minha família merece algumas explicações, eles devem ter ficado preocupados.

–-Nessie está menstruada. -- ele soltou as palavras de uma vez. Mamãe segurou a minha mão, e Jake se virou para olhar pra mim. Ele não parecia surpreso, mas me olhava profundamente. Gostaria de poder ler a mente dele agora.

–-Isso... quer dizer que ela vai poder ter filhos? -- Tia Rose perguntou exaltada.

–-Talvez, mesmo sendo praticamente impossível, o lado humano da Nessie parece ter aflorado com a puberdade. -- meu avô respondeu.

–-Por que seria tão impossível Carlisle? -- minha mãe perguntou -- Ela pode mudar, crescer...

–-Seres com pais de espécies diferentes são invariavelmente estéreis meu amor. -- meu pai falou com pesar, como se tudo aquilo fosse culpa dele.

–-Mas como eu posso ver o futuro dela agora? -- tia Alice se pronunciou depois de todo aquele tempo calada, perguntando diretamente pro vovô.

–-Eu não sei explicar Alice. Talvez ela seja mais "humana" agora. -- ele pensou um pouco e continuou. -- Vamos entrar. Precisamos decidir o que fazer.

Todos seguiram para a sala de visitas, enquanto Jake pôs seu braço esquerdo na minha frente, tentando impedir minha passagem. Ele olhava diretamente pra tio Jasper, e recebia um olhar repreensivo do meu pai. Mamãe tocou o ombro dele, os dois se olharam ternamente e isso o fez relaxar.

–-Ela não é tão indefesa Jake. Ela esta ainda mais forte agora, vamos. -- ela falou pra ele.

–-Tudo bem, mas a mantenha longe, o cheiro ainda é forte. -- ele tinha aquele mesmo tom de antes. Parecia ser outra pessoa.

Seguimos para sala com os outros, mas eu permaneci em pé próximo a janela com Jake e mamãe a minha frente o tempo todo. Tio Jass também ficou distante, perto da escada. Todos se acomodaram nos sofás e começaram as especulações. Eu já estava cansada de tudo isso, só queria comer alguma coisa e subir pra o meu quarto.

–-Você não almoçou, não foi? -- meu pai me perguntava. Pelo visto mamãe retirou o escudo.

–-Não, eu estava esperando o Jake e a Leah. -- eu respondi meio envergonhada. Eu precisava tentar não pensar no Jake por enquanto. Já tinha muita coisa acontecendo no momento, e eu não precisava de uma crise de ciúmes do meu pai.

–-Eu vou esquentar a comida pra vocês -- Esme se ofereceu.

Eu e Jake seguimos para a cozinha e nos sentamos a mesa. Ele parecia estar atento a cada movimento da minha vó, como se ela fosse um inimigo. Depois de colocar nossos pratos no micro-ondas, ela se voltou para mim e se aproximou. Jake ameaçou se levantar, mas desistiu quando lhe enviei imagens pedindo que ele parasse. Finalmente meu dom serviria para alguma coisa. Vovó tocou meus cabelos, e me deu um beijo na testa.

–-Você está tão linda Nessie. -- Porque elas não paravam de dizer isso?

–-Obrigada vó. -- eu agradeci a abraçando. Jake parecia incomodado com o contato.

Ela seguiu para a sala e se sentou ao lado do vovô. Eu e Jake permanecemos lá, ouvindo o barulho do micro-ondas.

–-Você deveria tomar cuidado. -- Jake falou criticamente.

–-Ela é minha vó Jake. -- respondi secamente.

–-Todos eles estão incomodados Nessie, eu posso sentir.

–-Todos estão sofrendo também, mas nenhum deles me fez nenhum mal até agora, não é.

–-É perigoso de qualquer forma. Nem devíamos ter vindo aqui.

–-Eles são minha família Jake! -- Eu gritei irritada. Os vampiros na sala silenciaram. Até tio Emmet parecia sério agora.

–-Me desculpe -- ele respondeu cabisbaixo. -- Mas você deveria vir comigo pra La Push. -- eu já imaginava que ele me pediria isso, e talvez fosse a melhor coisa a ser feita, mas eu não queria me separar deles agora, eu me sentia tão perdida.

–-Eu não sei Jake -- falei, mais calma.

–-Ela não vai -- meu pai falou determinado. Ele devia estar prestando atenção a toda a nossa conversa, e agora se aproximava da cozinha.

–-Eu não posso defendê-la de todos vocês. -- Jake respondeu desafiador.

–-O que te faz pensar que eu atacaria minha própria filha? -- meu pai falou, soltando um rugido entre os dentes.

–-Eu posso me defender sozinha, está bem? -- eu interrompi antes que eles se alterassem ainda mais. -- E eles não vão me atacar Jake, dá um tempo. Bip!Bip!Bip! O forno de micro-ondas apitou, abrandando mais a tensão que se formava. Me levantei e peguei os nossos pratos. Coloquei na mesa junto com os talheres. Nós comemos sem falar mais nenhuma palavra. Meu pai voltou a sala pra discutir o que fazer comigo, como o resto da família. Neste momento tia Rose se oferecia pra procurar Nahuel, e tentar falar com alguma de suas irmãs.

–-Eu quero ir. É importante que ela saiba. Ela pode levar uma vida normal. -- tia Rose falava exasperada.

–-Eu acho um risco desnecessário Rose. -- tio Emmet discordava. -- Um dia ela vai descobrir, não vai? -- ele falava sarcasticamente. Como ele podia brincar numa hora dessas?

–-Nós não sabemos o que ela pode gerar. -- meu pai falou, entrando na discussão. -- E não precisamos de mais problemas com os Volturi. -- Tia Rose sorria pra o meu pai, como se agradecesse o apoio. - Além disso, precisamos saber quanto tempo isso pode durar e a freqüência com que acontecerá.

–-Se a Rose for, eu também vou. -- afirmou tio Emmet. O que não foi surpresa pra ninguem.

–-Eu também vou. Eu sei onde encontrá-lo. -- Tio Jasper falava do canto onde até então permanecera. Tia Alice, que apertava as têmporas, tentando descobrir o resultado daquela viajem, parecia sair de um transe.

–-Eu não consigo ver nada. -- ela falava aborrecida.

–-Sinal de que encontraremos Nahuel. Não se preocupe. E nem pense em ir. A Nessie vai precisar de você agora que pode vê-la. – Tio Jasper fez uma pequena pausa e continuou meio envergonhado. -- E vai ser bom eu ficar um tempo fora. O lobo aqui vai ficar mais sossegado.

Me senti culpada por provocar o afastamento dos dois, eles nunca se desgrudavam. Ficou decidido, então, que Rose, Emmet e Jasper, iriam pra América do Sul procurar Nahuel, e descobrir se alguma das suas irmãs passou pelo o que eu estou passando. Eu lamentava novamente estar dando tanto trabalho, mas se aquilo ia tranqüilizá-los, eu não podia tentar impedir. Pra mim, pouca diferença faria saber se eu podia ter filhos ou não. Isso era a última coisa que me preocupava agora.

Todos foram se preparar pra partida. Enquanto Emmet, Rose e Jasper faziam as malas, com a ajuda da Tia Alice obviamente, Esme providenciava as passagens. Meu avô preparava algum material medico, ele queria tentar tirar meu sangue. Minha mãe foi para o meu quarto para preparar minhas malas, tive vontade de segui-la, mas meu pai foi mais rápido e eu preferi deixá-los a sós.

Fiquei na sala com Jacob, que se sentou numa poltrona assim que os vampiros deixaram a sala. Eu olhava a paisagem pela janela. Nossa casa tinha uma vista linda do mar e aquela paisagem de alguma forma me confortava. O sol já estava se pondo e um raio de sol alcançou a janela, eu então pude ver minha nova pele ao sol. Olhei para minhas mãos, minha pele não brilhava como a da minha família, como milhares de diamantes, brilhava como a superfície de um lago quando tocado pelo sol. Era translucida, de um brilho irregular. Vi também, no meu pulso, a corrente que minha mãe me deu. Lembrei-me da minha caminhada pela manhã, e do que ela falou a respeito do Jake, de como eu devia aceitar esse sentimento. Me virei instintivamente na direção dele, e ele também olhava os reflexos da minha pele. Seus olhos encontraram os meus, ele me encarava de um jeito diferente agora, parecia intrigado e ao mesmo tempo maravilhado. Eu senti uma onda de calor queimando toda minha pele, como se eu estivesse nos seus braços. Voltei-me novamente pra janela, tentando esquecer aquele olhar. Meu pai certamente estava nos ouvindo agora. Agucei minha nova audição, tentando ouvir o que eles conversavam no quarto. Tive que prestar muita atenção, pois eles falavam tão baixo e rápido que se eu não tivesse me "transformado" esta tarde, com certeza não conseguiria ouvi-los.

–-Ainda não é o momento Bella.

–-E quando será? Ela já esta crescida agora, não está?

–-Mas ela está muito confusa. Eu queria que ela pudesse conviver com os humanos antes, e tentasse ter uma vida normal.

–-Ela nunca vai ter uma vida normal Edward, você sabe que não. Porque adiar?

–- Shh! Ela pode nos ouvir.

–-Vamos então. – Minha mãe bufou.

Eles demoraram mais um pouco e saíram do quarto trazendo duas malas pequenas. Do que eles falavam? Meu pai parecia repreender minha mãe por algo. Pensei que pudesse ser pela conversa que agora a pouco eu me recordava.

Eles pisavam o último degrau da escada quando vovô apareceu de algum lugar com uma seringa. Aquilo parecia inútil pra mim. Eu me sentia muito mais forte agora.

–-Isso não vai da certo vô.

–-Não custa tentar. Se eu conseguir mais pouco do seu sangue eu posso fazer uma análise mais detalhada e descobrir até onde vão essas mudanças.

Ele me fez sentar no sofá e se posicionou na minha frente. Meu pai se afastou, mas minha mãe veio até mim, ficando do meu lado. A agulha a primeira vista, pareceu que não perfuraria a minha pele, mas com algum esforço ela conseguiu romper o que parecia uma couraça, chegando até minha veia, de onde meu avô conseguiu extrair uma boa quantidade de sangue. Eu não senti dor alguma, só uma pequena picada quando a agulha atravessou a pele espessa. Meu avô parecia muito contente com a quantidade de sangue que ele conseguiu. Claro que não contente como um vampiro ficaria.

O resto da família descia as escadas segurando algumas malas na mão. Tio Jass levava algumas a mais que os outros. Eu e Jake nos preparamos para ir embora. Eu não queria ficar pra vê-los partir. Doeria menos pensar que eles ainda estavam só a algumas milhas de mim. Nos dirigimos para a porta. Tia Alice foi a única a se aproximar. Ela me abraçou e ficou na ponta dos pés para me dar um beijo na testa.

–-Como você cresceu! Amanhã eu e a Bella vamos sair pra comprar algumas roupas novas pra você.

–-Obrigada tia. -- eu estava realmente precisando, depois da faxina que eu fiz no meu closet não me sobraram muitas peças. E agora com essa mudança as roupas que me sobraram mal me serviam.

Abracei meu pai e minha mãe, me despedi de todos e segui pra o chalé com Jake, que não me dirigiu nenhuma palavra todo o caminho.