Sorts: A alma perdida

Mas o que está acontecendo aqui?


A semana passou rápido. Até chegar na quinta-feira, Trevor não fez muita coisa, apenas estudou, jogou RPG e pensava em duas coisas com bastante frequência: por que Amber parecia tão distante e nervosa? E o que aquela carta queria dizer?

A carta de uma tal de Carolin ainda estava na gaveta com fechadura. Trevor, na quarta-feira depois da aula, procurou por esse nome na internet, no entanto, não encontrou coisas úteis. Pelo menos não coisas sobre uma mulher que pedia ao irmão para matar a filha e deixar o filho em paz.

Enquanto juntava os brinquedos da Nala da sala, o telefone tocou.

— Trevor.- A mãe dele parecia ofegante e assustada. - Filho - disse, estabilizando a voz -, como você está?

— Bem... - Trevor ficou em alerta. - Aconteceu alguma coisa?

— Querido, eu tenho uma notícia, não é muito boa: seu pai e eu vamos ter que ficar aqui até o fim de semana.

— O que? Por que?

— Ah... - ela suspirou, tensa. - Seu pai começou uma pesquisa aqui, muito importante... - Ele ouviu a voz do pai ao fundo. - ... Ele pode terminar em casa, mas precisa começar aqui.

— Mas não tenho mais dinheiro para comida. - O tom de desconfiança na voz de Trevor era palpável.

— Eu liguei para a mãe de Scott. Você pode ficar lá até a gente chegar. Por favor, tente não sair de casa com ele.

— Tudo bem - ele disse, em um suspiro. - Tchau.

— Tchau, querido.

Extremamente desconfiado, ele subiu para arrumar suas coisas e as de Nala. Trancou tudo, entrou em seu Chevy Black Bean e dirigiu até a casa de Scott.

— Olá, querido! - Julliane Thompson, mãe de Scott, praticamente gritou quando o viu na porta. - Entre, entre, Scott está o esperando lá em cima, pode acomodar essa garotinha no quarto dele mesmo.

Nala balançou o rabo, feliz como sempre, enquanto Trevor subia as escadas até o quarto do melhor amigo.

— Oi, cara - disse ele ao entrar no quarto.

— E aí, bro - respondeu Scott. - Olá, Nala. - A pegou no colo. - O que seus pais estão pesquisando por lá?

— Eu não faço ideia, minha mãe não parece estar falando a verdade.

— Bro... O que acha que eles podem estar fazendo? Acha que eles podem estar pesquisando uma maneira alternativa de impedir o mal de invadir a nossa cidade??

Ao ouvir a fala de Scott, Trevor congelou e gaguejou.

— M-mal? - Sorriu nervoso. - Mas que mal há nessa cidade de fim de mundo? Claro, eu seriamente acredito que Billy Ernest não pode ter entrado pro time de futebol como capitão tão rápido sem um pacto, mas só isso.

Scott riu.

— Ah, sabe o que eu descobri sobre Amber Wayne? - instigou Scott.

Trevor se ajeitou na cama, preparado e curioso para ouvir.

— Ela mora naquela casa esquisita da esquina. Com os padrinhos.

Trevor automaticamente pensou na possibilidade de ir espiar a casa de Amber, mas retirou o pensamento da cabeça, Scott jamais toparia, e a mãe o aconselhou a não sair.

— Tem uma árvore em frente à casa, perfeita para olhar o quarto dela - prosseguiu Scott.

E foi o que bastou. Ambos sorriram cúmplices. Scott deu à mãe a desculpa de que iriam na casa da garota para terminar um trabalho e foram o mais silenciosamente possível para o enorme casarão na esquina.

Conseguiram subir na árvore e no exato momento viram a luz do quarto dela se acender. As paredes cinzas ficaram à mostra, bem como Amber, visivelmente estressada.

— Amber, você não se esconder no seu quarto para sempre! - Uma mulher de aproximadamente 45 anos entrou em seguida.

— Sim, eu posso! - Amber gritou. - Na verdade, eu poderia me esconder em qualquer lugar que eu quisesse, porque eu sou uma (alguma palavra de Scott e Trevor não conseguiram compreender) condenada e você só me conta isso agora!

— Amber, nós precisávamos manter você em segurança pelo máximo de tempo possível! Mas está ficando mais forte, a sensação de que algo ruim está próximo é visível.

— E como planejavam me manter segura? - A voz dela parecia embargada. - Ma mantendo presa em casarões empoeirados e me privando de qualquer vínculo social?

— Querida, nós só tentamos dar o nosso melhor, prometemos aos seus pais.

— Que diferença faz? Eles morreram mesmo.

— Amber... Querida... Eles não estão mortos.

O que veio em seguida Trevor não conseguiu explicar. Um clarão tomou conta da janela do quarto de Amber e a madrinha da garota gritou.

Os padrinhos correram para fora da casa e Trevor percebeu que Amber não estava mais lá.

— Mas o que está acontecendo aqui? - a voz, em um sussurro assustado, de Amber foi ouvida em um galho. - O que os dois estão fazendo aqui?

— A-ah... Amber - Trevor disse, trêmulo -, n-nós sempre... Nós sempre viemos a essa árvore!

— Isso, isso, é nosso lugar - continuou Scott. - Nós é quem perguntamos o que você faz aqui.

— Não me venha com esse seu ar de superioridade, Thompson - Amber respondeu. - Podem, por favor, sair daqui?

— Por que? - perguntou Trevor. - O que... foi aquilo na sua casa? Aquele clarão?

Amber congelou.

— Vocês viram? - Seu tom era de desespero. - O que vocês viram? Escutaram alguma coisa?

— Não - mentiu Scott. - Nem estávamos prestando atenção.

Amber pareceu aliviada.

— Por favor, só saiam daqui.

Scott revirou os olhos e desceu. Trevor se demorou um pouco mais.

— O que houve, Amber?

— Trevor, apenas saia daqui. Não se preocupe comigo.

E assim, ele desceu e seguiu Scott de volta para a casa dele.

Trevor e o amigo ficaram boa parte da noite acordados, pensando em alguma explicação para aquele clarão e tentando entender o que vinha antes de "condenada". Alguma coisa com "s", mas nenhum dos dois pôde ouvir o suficiente.

Já bem tarde, Trevor foi o primeiro a dormir. Seu sonho foi o mesmo desde terça: a menina da cabelos curtos pedindo por ajuda. Mas dessa vez, ela não estava simplesmente parada pedindo por socorro. Estava presa, amordaçada, o pedido de socorro não vinham de sua boca, mas perfurava a mente de Trevor.

— Trevor! Me ajude! - rugia a voz em sua cabeça. - Trevor, ela quer me pegar, por favor, ajude-me, depressa!

O garoto, suando frio, levantou-se o mais silenciosamente possível, abriu a janela e desceu pela árvore do quintal de Scott, correndo em direção a casa de Amber. Algo o dizia que ela não estava em uma situação muito boa.

Chegando lá, Trevor viu os padrinhos de Amber, muitas pessoas vestidas de verde, preto e cinza. E também viu os pais.