Já era de noite, a Caravana do Dragão tinha parado em uma cabana, que pertencia a um necromante que os atacou. Eles já haviam se livrado do corpo e organizado a cabana, além de terem removido suas armaduras e armas estarem apenas com roupas normais, sendo Lydia a única ainda equipada.

— Muito bem, pessssoal. Temosss apenasss uma cama de sssolteiro. Trêsss de nósss terão de improvisar uma cama com osss tapetesss da casa.

— Eu não me importo. Vou dormir perto do pé da cama não importando quem também for dormir nela.

— Bem, eu me importo e irei dormir na cama pelo meu direito de líder.

Ao ouvir aquilo, Inigo, Derkeethus e Barbas se surpreenderam.

Essspera, Nur. Quem desscidiu que vosscê é o líder?

— Bem… Eu pensssei que vosscêsss concordasssem com isssso. Meusss objetivoss ssão a alma da nossssa jornada, e sssou eu que ando tomando asss desscisõesss.

Aquilo colocou os três pra pensar brevemente. E ao chegarem na conclusão, o argoniano de chifres exclamou.

— Por Hist, Nur! Vosscê é realmente o líder!

— Não falei? E como líder eu fico com a cama.

— Bem, eu não me imporrto muito na verrdade. Nós passamos porr tantos lugarres antes de chegarrmos aqui. Fomos naquele acampamento de bandidos caçadorres de mamutes ao norrte de Whiterun. Depois passamos naquela rruina que a Lydia quis nos mostrrarr porr causa do murro com palavrra drracônicas que tem lá, enfim… - Enquanto falava, ele colocava o pote de Mr. Dragonfly em cima da mesa de encantamento no canto do lugar - Eu tô cansado e só hoje quase ganhei novas cicrratrrizes. Eu prreciso descançarr. Sinto que se eu me deitarr em uma prreda eu vou dormirr.

Aliásss, Inigo. Como foi que vosscê conssseguiu essssasss cicatrizesss? Elasss não essstavam aí quando nosss conhesscemosss.

— Ah! É uma longa histórria.

— Bem, nósss essstamosss indo dormir. - comentou Derkeethus enquanto ainda acariciava o próprio braço dolorido - Então não faria mal uma hissstória antesss.

vendo que o grupo insistia, Inigo se viu sem escolhas a não ser contar sua história. Os quatro então foram até uma mesa no andar de baixo da cabana, que era pequena e possuia apenas duas cadeiras. O khajiit e o Argoniano mais escuro se sentaram nas duas cadeiras, a nórdica puxou uma terceira cadeira que estava em uma escrivaninha perto da escada, enquanto o argoniano mais claro puxou uma outra cadeira, essa longa e sendo tirada de mesa maior escorada na parede, enquanto Barbas se sentou no chão perto da mesinha.

—Bem, tudo bem. Essa histórria começa depois do nosso contrrato com Dupan irr prro saco. Depois de… - ele pareceu hesitar quanto a essa parte.

Depoisss de vosscê me trair?

O khajiit desistiu de resistir em falar isso.

— Er, Sim… Sinto muito porr isso, de novo.

— Tudo bem. Apenasss continue.

— Bem…

***

Depois que o nosso negócio com ele azedou, eu comprrei um pouco de skooma no meio da estrrada. Passei a noite usando-a enquanto olhava parra as estrrelas, pensativo. Descidi que no dia seguinte eu irria acabarr com minha vida. Achei que erra melhor se eu me fosse depois de tudo que eu fiz a você, Nurr, e ao Felix.

***

— Fico felizzz que ainda esssteja ressspirando.

— Fico feliz tambem. É bom ouvir isso de você.

— Eu não teria coragem fazer isso. Acho que você é mais corajoso que eu. - comentou Lydia.

— Aquilo não foi corragem, minha amiga. Foi corrvadia. Achei que morrrerr serria a solução menos dolorrosa a meus prroblemas. E de fato pode até serr mesmo. Mas é na dorr que aprrendemos. Continuando…

***

Eu assisti o nascerr sol e fiz um laço em uma corrda. Eu então a pendurrei perrto da borrda de um penhasco, a prrendendo em um galho de árrvorre. Bebi minha última garrrafa de Skooma, coloquei a corrda em meu pescoço e pulei.

Me lembrro de cairr, como o barrulho da corrda esticada vibrrando com meu peso, e então uma dorr seguida de um estalo. Pensei que era meu pescoço. Porrém eu continuei caindo, e uns pássarros passarram porr mim. Nesse momento eu pensei “Bem, a corrda não funcionou. Mas o chão vai”.

O chão amplo estava a meu encontrro. Pouco antes do impacto, fechei meus olhos. Houve um rruido esmagadorr, e então eu estava na água.

***

— Espera, espera aí! O que?

— Eu estava embaixo d’água. O quão difícil é entenderr isso, Barrbas? Tente prrestarr atenção. Eu tinha caído porr uma fissurra que dava em uma caverrna.

— parece que você teve muita sorte, não?

— De fato. E vocês ainda não virram nada…

***

Nesse momento eu pensei “ Bem, o chão não me matou, mas ainda posso me afogarr”. Mas parrece que os deuses tinham outrros planos.

A corrrente da água me arrrastou até uma beirrada de terrra. Eu estava cuspindo e tossindo água até pelos ouvidos, parra que tenham ideia. Até que eu ouvi.

***

— Falmersss?

— Aranhas?

Draugrsss?

— Antes fosse qualquerr uma dessas sugestões. Terria sido ótimo se fosse uma arranha.

***

Eu estava na beirra de um rrio, na entrrada de uma grrande caverrna, ouvindo os cacarrejos delas. Apesarr de estarr um tanto escurro, eu podia verr muitas gaiolas à marrgem. As galinhas caminhavam um pouco forra das gaiolas, e podia sentirr cheirro de magia. Então eu me arrrastei parra longe da água rreunindo todas as minhas forrças.

Dentrro das gaiolas, haviam algumas pessoas amarrradas e amorrrdaçadas. Eu corrri e tentei abrrirr a prrimeirra gaiola, ignorrando as galinhas. Porrém ela estava trrancada.

De rrepente, senti uma dorr em meu pé. Uma Galinha estava me bicando! Dei um chute nela, mas assim que fiz isso ela trouxe amigas.

***

Essspera, essspera aí, Inigo. Tem sscerteza que vosscê não essstava ainda sssob efeito de Ssskooma?

— Ouça, Derrky. Confie em mim: não erra o Skooma em mim. Eu saberria a diferrença.

— É messsmo?

— Sim… Eu terria sonhado com arranhas com cabeças de galinha voando em nuvens corr de rrosa em um vislumbrre das Arreias Atrrás da Lua.

Os cinco riram com a resposta descontraída.

— Bem. Continuando…

***

Quando o grrupo de galinhas veio até mim, acabei caindo em um pesadelo de bicadas. Enquanto eu tentava voltarr para a água, acabei não resistindo, e perrdi a consciência a poucos passos dela.

Acorrdei amarrrado em uma cadeirra. Havia um homem fedido a minha frrente, me estudando. Eu até podia ouvirr o som da água corrrente de antes, mas aparrentemente eu estava em uma crripta. Ao nosso rredorr, haviam galinhas e coelhos em cada canto, saindo de trrás do homem mal-cheirroso. Ele então disse “irei lhe tornar útil" em um tom desagradavel a mim.

***

— E o que você fez? Eu teria arrancado a cabeça dele.

— Bem, Lydia, eu também. Mas lembrre-se: eu estava amarrrado. Minhas opções erram limitadas. Deixei minhas arrmas em meu acampamento, então eu estava desarrmado. Mas felizmente o homem gostava de falarr muito, então eu tinha um pouco de tempo.

***

Começei a usarr minhas garrras parra corrtarr minhas corrdas enquanto deixava ele falarr. E ele parrecia terr muito a dizerr.

Ele disse serr um mago muito poderroso que aprrendeu a trransforrmarr pessoas em animais, e que uma vez trransforrmado, eu irria querrerr apenas ajudá-lo em seu planos. E ele dizia terr uma rrede de espionagem de coelhos e galinhas em toda Skyrrim.

***

Ao ouvirem aquilo, os dois irmãos argonianos se entreolharam. Os outros três nem repararam nisso, mas era como se eles soubessem do que se tratava. O irmão de penas então perguntou.

— E vosscê acreditou nisssso?

— Mas é clarro! As prrovas estavam pulando ao rredorr dele. Pensem bem: Quantos galos vocês já virram em Skyrrim? E mesmo assim há galinhas em todas as fazendas. Você mesmo semprre diz, amigo: nunca confie em um Dunmerr ou em uma galinha.

— Ou em cogumelosss— completa o dragonborn.

— Masss cogumelosss sssão realmente mausss. - contrapôs o ladino.

A nórdica e o khajiit se entreolharam estranhando-os, se perguntando o que eles sempre queriam dizer com aquilo. Porém o arqueiro optou por continuar sua história.

— B-bem, continuando...

***

Perrguntei a ele então porrque ele escolherra galinhas e coelhos. Ele disse que ninguém suspeitarria de mim uma vez que eu me torrnasse uma galinha. Animais grrandes, como mamutes ou urrsos chamam muita atenção. Animais pequenos são os que fazem bons espiões.

Então perrguntei se ele me trransforrmarria em uma galinha, parra que eu pudesse bica-lo. Ele rriu e disse que minha trransforrmação não serria só física, mas mental também. Eu farria apenas o que ele mandasse, e nada mais. Ele dizia que estava usando essas inforrmações parra espalhar o caos no Mundus. Ele se alimentava de ódio e isso o fazia mais forrte.

Parra escaparr, eu perrcebi pelo canto do olho uma porrta de madeirra que cheirrava a podrre. Assim que me soltei eu pulei da cadeirra em dirreção a porrta. Eu estava livrre!

O feiticeirro ficou furrioso e atirrou um feitiço em minha dirreção. Mas consegui desviarr e corrri sob o túnel de pedrra. Porrém pude ouvirr o mago começarr a rrirr maleficamente.

“Você vai morrrerr de qualquerr jeito!” ele gritou, voltando a garrgalharr. Eu então rrespondi “Que bom! Estou tentando fazerr isso o dia todo!”

***

— Deixa eu adivinhar: você estava em uma ruína Draugr?

— Boa intuição, Lydia. Sim, eu estava. O cheirro de ossos e poeirras atorrmentavam meu narriz.

Todos coçaram seus focinhos e narizes só de imaginar o tal cheiro, que provavelmente era semelhante, senão igual, ao que eles sentiram em outros lugares já visitados.

— A essa alturra, o feiticeirro não me seguia mais.

***

Corrri pelo que parreceu uma eterrnidade. Eventualmente eu fui parrarr em uma vata câmarra com uma escada em espirral. Haviam centenas de corrpos secos pelo chão. Deviam estarr morrtos há anos. Mas como não sairram de lá, ainda estavam mal-humorrados.

Enquanto eu corrria em dirreção as escadas, os morrtos começarram a se mexerr. Eu pulei sobrre eles para subirr os degrraus.

***

Espera, espera aí— interrompeu Barbas - Você não estava querendo morrer? Porque não deixou que te matassem?

— meu pai me disse que qualquerr um que morrrerr em uma crripta dessas se torrnarrá um morrto vivo e passarrá a defenderr o lugarr. Algo ainda piorr que a morrte.

***

Haviam Drraugrrs demais parra lutarr, então me concentrrei apenas em sairr dali. Na metade do caminho avistei uma aberrturra no teto. O arr parrecia frresco lá em cima. Porrém acabei trropeçando e caí de volta parra a base da escada, e os morrtos logo se aglomerrarram acima de mim. Eles me segurrarram e me arrranharram no rrosto. Seus dedos secos rrasgarram meu rrosto e me derram essas cicrratrrizes. Eu quase desisti.

Mas então algo incrrivel aconteceu.

***

— Era um sonho?

— Lydia, essas cicrratrrizes parrecem frruto de um sonho prra você?

— Então o Mago te sssalvou?

— Isso terria sido bem legal da parrte dele, Derrky. Mas não.

— Todosss elesss viraram pó.

Nurr, isso terria sido bem util na horra. Mas também não foi isso…

***

Eu perrcebi que eu querria viverr! Perrcebi que minha vida ainda valia algo. Perrcebi que eu poderria sim voltarr a serr aquela pessoa que minha família se orrgulhava. Perrceberr isso me deu forrças que eu nem sabia que tinha. Eu estava lutando contrra eles e grritando “não!” de novo e de novo.

“Não! Vocês não terrão a minha vida! Não! Não irrei morrerr aqui! Não!”

Lutando o tempo todo, me esforrcei parra colocarr forrça em meus pés. Naquela luta eu arrranquei olhos, parrti pescoços e quebrrei brraços. De alguma forrma eu consegui chegarr novamente na escada.

(Area do Desenho)

Consegui chegarr até o topo, forrcei as escotilhas e saí parra a luz do dia. Eu estava a apenas algumas centenas de passos de meu acampamento. Quando voltei, fiquei um bom tempo encarrando a arrvorre de onde parrti. Naquele dia eu perrcebi que ainda devia muito parra com esse mundo e jurrei que pagarria qualquerr dívida que pudesse.

***

— Quando descobrri que Nurr estava vivo, eu decidi que se alguém deverria tomarr minha vida, esse alguém serria ele. Na minha cabeça essa erra a forrma que eu poderria pagarr essa dívida. O rresto vocês já sabem.

— Bem - Lydia começou a dar suas considerações - Foi uma boa estória de fato. Mas aquela parte das galinhas me pareceu meio viajada.

— O que? - Inigo estranhou o que ela disse.

Poisss é. - complementou Derkeethus - Acho até que ssse não tivesssse a parte do tal mago a essstória ssseria melhor.

— Eu estou falando prra vocês! Isso rrealmente aconteceu!

Eu acredito! Sei muito bem que esse tipo de magia existe e é até facil da manipular. Até conheco um Daedra que é capaz disso.

Obrrigado, Barrbas. - Ele então se vira para Nur e pergunta - Nurr, o que você acha?

— Eu acho que foi uma exsscelente hissstória.

— Mas você acrredita?

— É claro que sssim! Fazzz bastante sssentido.

Vosscê esstá brincando, não é, Nur?

— Por que eu essstaria, Derky? É como dissssemosss antesss: a vovó sssempre disssse…

— Cara, eu não acho que ela queria dizer isssso. A nossssa avó com sscerteza é maisss velha que esssse sssuposssto mago. Sssem falar que ela nunca falou em coelhosss! Ela falava de dunmersss e de cogumelosss, masss não de coelhosss.

— Bem, então isssso sssó sssignifica que é algo resscente. Então temosss que tomar maisss cuidado. Vamosss pressstar maisss atenção nasss galinhasss e coelhosss de agora em diante, sscerto pessssoal?

— Certo - os outros quatro responderam. Alguns com certo receio, achando essa ideia louca. Porém Barbas e Inigo deram essa resposta com determinação.

O argoniano mais escuro então se levanta e diz.

— Okay, pessssoal, acho que deveriamosss dormir agora. Eu vi um dragão na montanha ao norte. Assssim que acordarmosss vamosss ir atrásss dessssa besssta. Quero tessstar meu grito novo que conssseguimosss naquela tumba que a Lydia nosss levou maiss sscedo.

— Me pergunto que palavra você aprendeu, senhor Nur.

— Bem, ao que eu entendi, essssa palavra é quente. hehehe.

Após a conversa, o grupo começou a se organizar para dormirem. Enquanto Nur fora dormir na cama do quarto, com Barbas em seus pés, o resto do grupo arrumou os tapetes e as roupas de cama extras de forma a improvisarem sacos de dormir no mesmo cômodo da mesa onde conversaram.

Apenas um deles não conseguia dormir. Inigo estava no meio do saco, com Lydia e Derkeethus a sua direita e à sua esquerda respectivamente. Com as velas apagadas, a única luz presente era a das luas, escapando pela janela. E na janela sul da cabana, de frente pros três, uma figura fazia sombra nos feixes dos corpos celestes. A figura sobre a janela aberta não se mexia, nem fazia som algum. Ela ficava apenas lá, observando. Mr. Dragonfly no bidê atrás da cabeça do cathay era outro que tremia com o que via. Talvez a história tenha o convencido também. Talvez fosse apenas o mero medo de ser predado. Os seus olhos inexpressivos se encontrando com os do khajiit, esvaindo dele qualquer sono. As franjas de pele chacoalhando pra baixo toda vez que ela movia a cabeça de forma brusca, junto das penas de um marrom meio dourado se desprendendo de vez em quando e caindo sobre a madeira.

(Aviso abaixo. Favor lerem)