Will:

Os meus olhos se abriram lentamente, mas torneio a fecha-los, pois a luz me cegava, e assim fiquei por um tempo até os meus olhos se abrirem por completo, a primeira coisa que enxerguei foi um teto com luzes florescentes, olhei para os lados, paredes brancas, aparelhos, logo percebi que eu estava em um hospital, que estava deitado em uma cama, com soro nas veias.

Tentei me levantar, mas minhas pernas pareciam fracas, na primeira vez quase cai no chão, parecia que fazia anos que eu não caminhava. Minha cabeça estava uma confusão, tentei relembrar os últimos acontecimentos, como eu tinha ido parar ali, naquele quarto? Aos poucos, tudo começou a vir lentamente, a rave, o encontro com Peter, as brigas, os acidentes, a luz do farol do carro, Frank sendo atingindo, carro capotando os gritos de Sarah.

–PORRA NÃO! - as palavras voaram de minha boca com um grito desesperado, lembrar de tudo, era como estar vivendo de novo - MÃE?! SARAH?! FRANK?!

Comecei a gritar e me deixei cair no chão gelado do hospital. Em poucos segundos, minha mãe entrou na porta do quarto, e ficou parada na porta do quarto, com os olhos arregalados, parecia não crer no que estava acontecendo.

–Obrigado Deus! -foi à única coisa que ela disse, depois foi até mim, e me abraçou, começando a tremer descontroladamente, e a chorar.

–Mãe? O que está acontecendo? Onde está Frank e Sarah?

Ela não me respondia apenas me abraçava, e chorava, dizendo que me amava, e agradecendo a deus. Eu não estava entendendo nada, e estava começando a ficar com medo. Tentei me levantar, novamente minhas pernas bambearam e eu cai no chão, minhas pernas pareciam não ter força, mal conseguia me mexer, teria sido alguma sequela do acidente?

–Mãe, pare de chorar, pare... O que está acontecendo? - tentei afastar a minha mãe, de perto de mim, mas foi em vão, ela me abraçava como se nunca mais fosse parar.

Olhei para um espelho na parede do quarto e não reconheci o meu rosto, que estava pálido, minhas bochechas murchas, pareciam sem vida. Afastei minha mãe de mim, estava começando a ficar assustado, algo horrível começava a tomar conta de mim, um pressentimento ruim invadia o meu corpo.

–Mãe, á quanto tempo eu estou aqui? - perguntei lentamente, com os lábios tremendo.

As lágrimas corriam pelos olhos de minha mãe, que também parecia bem abatida, com profundas olheiras. Eu temia a sua resposta para minha pergunta.

–Há muito tempo filho... - respondeu ela com rouquidão.

O medo começou a tomar conta do meu corpo, muitas perguntas sem respostas surgiam em minha mente.

–Sarah, Frank, onde eles estão?

Minha mãe começou a tremer mais, e a chorar, balançando a cabeça negativamente. Naquele momento eu senti que algo de muito errado tinha acontecido.

***

Sarah:

O celular ao lado da minha cama vibrava, por mais uma vez, outra das repetidas vezes que Juliet me ligava, mandava torpedos, porém eu não tinha coragem de atender, de conversar com ela, de mergulhar em outra história, eu estava muito ferida em relação a sentimentos.

–Sarah! - gritou, minha mãe da cozinha.

–O que foi caralho?!

–Ligação para você! É do hospital!

Meu coração pulou instantaneamente, ao ouvir a palavra ''hospital''. O hospital nunca tinha ligado para minha casa, algo devia ter acontecido. ''Será que Will morreu?'' foi meu primeiro pensamento.

–Santo Deus, não! - gritei para mim mesma, afastando aquele pensamento horrível.

Desci as escadas correndo e fui até a cozinha, praticamente arranquei o telefone da mão da minha mãe.

–Alô? - quase cuspi as palavras, elas mal conseguiam sair da minha boca.

–Sarah?! Sarah, você está bem? Pelo amor de Deus, me diga o que esta acontecendo, ninguém me diz nada nesse hospital, eu tive que te ligar escondido... Sarah?

Era a voz de Will, senti o meu estomago revirar, aquilo era real? Estava acontecendo? Will tinha acordado do coma?

–Sarah? Você está ai? Frank ele está bem? Porra! Responde alguma coisa garota!

Eu tremia, as únicas coisas que conseguiram sair da minha boca foram:

–Eu estou indo ai, Will não durma pelo amor de Deus!

***

Will:

Eu fiquei olhando para o médico tentando absorver tudo o que ele tinha me falado, eu estava chocado, eu não conseguia acreditar naquilo.

–Você esta brincando não é? Como eu posso ter ficado em coma quatro meses e só acordar agora?

–Nós não temos a resposta para essa pergunta também, isso é praticamente um milagre - respondeu ele - Agora vamos fazer uns exames, para vermos a situação do seu corpo, você não conseguiu ficar de pé, seus músculos estão meio atrofiados, por ficarem tanto tempo sem locomover... Você também perdeu peso... Vai demorar, mas você ficará novinho em folha em um ou dois meses.

Eu ainda continuava olhando de boca aberta para o médico, nem nos meus sonhos mais loucos eu conseguiria imaginar uma coisa dessas. Eu estava em coma há quatro meses, a vida tinha continuado sem mim, fiquei imaginando quantas coisas eu tinha perdido quanto minha mãe, meus amigos, e Frank tinham sofrido. Minha mãe apertava minha mão, e falava sem parar, do nada me veio a cabeça, algo que há muito tempo eu não pensava.

–Ele veio me ver mãe? - perguntei

Minha mãe parou de falar e me olhou por um instante, ela percebeu na hora de quem eu estava falando, eu e minha mãe não falávamos muito nisto, nós nos referíamos ao meu pai a ''ele''.

–Não querido, ele não veio.

Eu suspirei, nem sei por que tinha perguntando aquilo se no fundo eu sabia da resposta.

–Mas ele pagou todo o seu tratamento aqui, mas ele achou que seria demais te ver do jeito que você estava - continuou ela.

–Você aguentou mãe. E qual a diferença, eu não vejo a ele há nove anos, eu não me importo, ele não se importa.

Eu abracei minha mãe.

–Mãe eu te amo.

–Eu também te amo filho.

–Obrigado por ficar o tempo todo comigo.

Eu podia sentir, mesmo sem saber, que minha mãe nesses quatro meses que eu estava em coma, tinha ficado o tempo todo comigo, ela devia ter sido a única que acreditava que um dia eu acordaria. Parei de abraçar minha mãe, e me surpreendi, ao ver Sarah parada na porta do quarto, estática, com uma lágrima grossa escorrendo do olho esquerdo.

***

Sarah:

Ao ver Will acordado, reagi tão rápido, eu apenas pulei pra cima dele, o abraçando com toda a minha força. Eu tremia, e chorava silenciosamente, não conseguia dizer nada, eu apenas estava grata por ele estar acordado, vivo.

–Você esta acordado... - eu disse quase não acreditando, em minhas próprias palavras.

–Sim eu estou, e não aguento mais ouvir está frase.

Parei de abraçar Will, e o beijei na bochecha.

–Você não sabe o quanto fez falta? O quanto às coisas ficaram fudidas sem você?!

Will, me olhava apenas. Para ele devia ser tão irreal aquela situação, quanto para mim.

–Frank onde ele está Sarah? - perguntou Will, o tom de voz dele tinha uma pitada de medo, acho que no fundo ele já sabia o que veria em frente.

Eu não queria ter que dar a notícia da morte de Frank, seria difícil, principalmente porque o drama todo voltaria, enquanto eu e os outros já estávamos há quatro meses sem Frank, Will só ficaria sabendo naquele momento. Vendo o meu silêncio, os lábios de Will começaram a tremer, e os olhos a se encherem de lágrimas.

–Sarah, por favor, me responda, ele está bem não está?

A mãe de Will comovida só assistia a cena, acho que ela também não estaria pronta para falar. Não tinha jeito fácil de falar aquilo, então eu apenas falaria, sem enrolos, eu sei que neste momento Will sentiria como se tivessem enfiado uma faca no peito dele, eu já tinha passado por isso e sei como seria horrível.

–Ele está morto - respondi, e o abracei novamente.

***

Will:

Eu acho que bem no fundo eu já sabia, já sabia que algo muito ruim estava por vir, que algo muito ruim tinha acontecido. Eu olhei para a janela do carro, o dia estava cinza, o seu nublado, um vento frio, e uma fina garoa caia. Minha mãe dirigia até o cemitério, logo quando Sarah me deu a noticia, a primeira coisa que eu pedi foi que me levassem até o Frank, até a sepultura dele. No inicio ninguém queria me deixar ir, mas eu implorei ao médico, depois eu voltaria ao hospital e ficaria lá até quando fosse necessário.

Do meu lado estava Sarah, ela pegou minha mão.

–Você esta bem?

Era uma pergunta idiota.

–Sim... - eu respondi eu não queria conversar, eu só queria que aquilo fosse apenas uma mentira, que eu chegasse no cemitério e o Frank não estivesse lá.

–Tudo ficará bem Will.

–Eu duvido muito disso Sarah.

Quando mais o carro se aproximava, do cemitério, mais o meu coração ficava apertado, e a garganta seca, as lágrimas teimavam em não cair, o que me deixava mais sufocado ainda. Ao descer do carro eu peguei as flores que minha mãe tinha pego no caminho. Sarah e ela vieram atrás, mas eu pedi:

–Eu quero ir sozinho, se não for ser muito rude...

Minha mãe me abraçou.

–Claro que não querido.

Sarah me olhou, ela parecia estar sofrendo junto comigo. Eu andei pelo cemitério sem pressa alguma, enquanto eu caminhava, me lembrei que eu não sabia onde era o túmulo dele, não tinha como eu saber, mas por um motivo qualquer eu apenas continuei andando aleatoriamente, procurando pelo túmulo de Frank. A alguns metros eu vi, um, com algumas flores murchas, e outras novas, fui até lá, e como por um milagre era a sepultura dele. Agachei-me, e repousei o buquê de flores em cima da sepultura.

–Ei, Frankizão... - parecia idiota, eu ali falando para um túmulo, mas eu precisava - Eu queria ter podido ter dito adeus... Eu queria tanto...

Os soluços, e o choro começara a me invadir.

–Frank, eu te amei... Eu te amo - com raiva bati meu punho no chão - Droga isso é tão injusto tão cruel! As coisas não podiam acabar desse jeito!

O último momento meu com o Frank, foi de nós dois brigando, e depois... Depois veio apenas o caminhão, e a morte.

O vento começou a soprar com força, deixando a minha pele gelada, e secando minhas lágrimas. Naquele momento, eu pedi, que se por algum milagre eu pudesse ver o Frank, nem que fosse rapidamente, só velo e dizer que eu sentia muito, que eu o amava. Mas nada aconteceu, eu apenas senti um vazio.

–Adeus Frank, eu te amo, eu sempre te amarei, um dia nós estaremos junto de novo, eu tenho certeza.

***

Antes de ir para o hospital pedi para minha mãe passar na casa de Frank, ela relutou, mas eu precisava fazer aquilo, eu tinha que fazer. Antes de eu descer do carro, e ficar na frente da casa de Frank, Sarah puxou de dentro do seu moletom um envelope, eu olhei curioso para ela, mas ela apenas disse ''leia''. Minha mãe deu a partida no carro para levar Sarah em casa, e eu abri a carta.

A carta era de Peter, não era muito longa, uma página e meia, na carta ele falava basicamente que iria para Londres, que não sabia quando eu iria acordar, mas sabia que um dia eu acordaria, ele me pedia perdão por querer ficar comigo na Rave, e se sentia culpado.

–Besteira, nada importa mais... - resmunguei, acabando de ler a carta, amassando ela e jogando fora.

Eu não culpava Peter. Respirei fundo e fui até a porta da casa de Frank, e toquei a campainha, cerca de quarenta segundos depois, ouvi passos e logo depois atenderam a porta. Era Eric, que ao me ver arregalou os olhos, e sua boca se formou em uma letra ''o''.

–Você acordou cara! - ele disse animado me abraçando.

Eu fiquei comovido naquele momento, Eric era tão novo, e já tinha perdido tantas coisas, sua mãe, e agora Frank.

–Ei amigão, onde está o seu pai?

O garoto parou de me abraçar.

–Ele está dormindo, na verdade é a única coisa que ele faz depois que Frank morreu - Eric olhou tristonho para o chão, o garoto estava passando por coisas difíceis.

–E você como esta lidando? - eu não tive coragem de acabar a frase, não tive coragem de dizer: ''Com a morte de Frank...''

–Eu sinto muita falta dele, ele sempre foi o meu melhor amigo e irmão... Mas eu estou indo bem.

O aperto no meu peito só aumentava.

–Eric eu vim... - nem eu sabia o que eu tinha ido fazer lá - Dar uma última olhada nas coisas do Frank... Tudo bem pra você?

O garoto balançou a cabeça.

–Eu ficarei na sala olhando tv - ele disse sorrindo.

Respirei fundo, e subi as escadas até o quarto de Frank, eu tinha que fazer aquilo, eu tinha que dizer um ''adeus''. Parei alguns instantes em frente à porta do quarto dele. Do Frank. Suspirei, e senti o cheiro dele, o cheiro que vinha da porta.

''Caralho porque isso tinha que acontecer... Estava tudo tão bem, nos estávamos tão felizes... '' encostei minha cabeça na porta do quarto e apenas deixei as lágrimas caírem.

Abri a porta do quarto lentamente, e sem muita coragem entrei. E lá estavam as coisas dele, a cama desarrumada, os pôsteres das bandas de rock nas parede, as roupas pelo chão o cinzeiro transbordando de cinzas, pelo o que eu percebi o pai dele não havia mexido em nada desde a morte de Frank. Deitei-me na cama, e me enrosquei, segurando em mãos um moletom que ali estava, cheirei a roupa, e comecei a chorar, eu nunca mais teria Frank comigo. E aquilo estava me matando, naquele momento desejei que eu jamais tivesse acordado do coma.

***

Sarah:

A luz forte dos faróis, o impacto, os gritos, as sirenes da ambulância, tudo voltou em um flashback. Voltei a mim, quando senti o meu celular vibrar, era Juliet, eu não aguentava mais aqueles flashback, da pior noite da minha vida. Respirei fundo, Will havia acordado, eu estava feliz, tudo ficaria bem novamente. Resolvi atender o celular, meio constrangida por ter evitado Juliet por tanto tempo.

–Oi Juliet.

–Ei Sarah, como você está? Você nunca mais me ligou... Nem atendeu minhas ligações.

Suspirei, eu não sabia como responder o que dizer sem magoar Juliet.

–Eu estou bem Juliet... Desculpe-me não ter te respondido e tal, mas as coisas estão conturbadas.

Houve um silêncio constrangedor por alguns minutos.

–Sarah está tensão toda é pelo que rolou? Se você não gostou, ou não quer mais é só falar, vamos apenas ser boas amigas.

–Juliet me desculpe, mas é que tudo está tão complicado e...

–Apenas diga - me interrompeu Juliet.

–Acho melhor sermos só amigas.

Houve outro silêncio achei que ela iria desligar na minha cara, porém ela só disse um fraco ''ok'' e se despediu.

Suspirei, com um certo aperto no coração, mas eu estava confusa, eu apenas precisava de um tempo para pensar melhor, um tempo para ver que rumo eu daria a minha bagunçada vida.