Sin Dolor

No hay nada que esconder


:- Não posso ir agora porque estou ocupado com uma reunião com os meus funcionários, mas depois eu encontro vocês e vamos para a casa dos meus pais. – Escutei esse áudio de Paco, apesar do barulho por estar na rua. Estava afastada dos outros e assim ninguém me viu revirar os olhos.

:- Eu te espero por aqui. – Foi o que eu respondi e confirmei se o áudio chegou a ele e guardei meu celular no bolso, voltei para a mesa onde estava pensando em como Paco estava caindo numa rotina monótona e o pior estava me levando consigo.

:- E aí, falou com o seu namorado? – Toni estava em pé bebendo sua cerveja sorridente, ele não tinha deboche ao falar de Paco comigo ou ao menos ele disfarçava bem. Ao contrário da vó Dolores.

:- Sim, ele vai passar aqui depois e vamos sair. – Eu respondi tentando soar bem com isso.

:- Que bom que vai ficar então pode pagar mais uma rodada de cerveja. – ele riu e a galera comemorou o fato de não pagar mais bebida, eu fiz careta mais aceitei afinal tudo estava divertido.

Eu entrei no bar para ir ao balcão e para pedir mais bebida, podia esperar para o garçom aparecer, mas queria ir por minha conta. Pensei em como foi bom ficar mais um tempo por aqui, eu gostava dos amigos de Toni, eles eram na maioria da sua faculdade e eu dava risada por ver a empolgação dos planos que faziam ou das reclamações quanto aos seus estudos ou seus trabalhos.

Quando me conheceram foi um caso a parte porque a maioria não acreditava que Toni e eu éramos irmãos, temos nomes diferentes por um erro de cartório, ele poderia mostrar fotos ou jogar uma pesquisa mais profunda no Google, só que ele preferiu fazer melhor, me convidou para ir assistir uma aula com ele na sua faculdade na Capital. Foi um alvoroço porque descobri que mesmo depois de tantos anos e por estar fora da mídia, eu ainda tinha muitos fãs, talvez o fato de viajar para cidades em que não me conheciam ou ficar por fora do que se passava no mundo virtual ou midiático ao meu respeito contribuísse para que eu fosse mal informada nesse assunto. Não tenho redes sociais pessoais e sim alguns fakes um perfil para o Tumblr, um para o Twitter e outro perfil no Instagram para meus gostos e desabafos com maior liberdade.

Um fato era engraçado quando se faz parte de uma banda como músico, geralmente você só fica conhecido entre os fãs da banda e a não ser que seja um dos monstros como ACDC, Aerosmith, Rolling Stones e entre outros, que tem fama mundial e assim ter os músicos mais conhecidos. Mas, mesmo assim geralmente famoso mesmo é o vocalista. Dificilmente o grande público sabe os nomes dos músicos.

Porém, pelo fato de namorar o vocalista da banda que eu fazia parte, eu fiquei tão famosa quanto, somando ao outro fato de que eu aprontava também por algumas vezes ter sido presa me fez ficar não só na boca dos fãs como do público em geral.

Desde que me distanciei desse meio quando a banda acabou e eu passei a me dedicar à fotografia, perdi esse contato com os fãs e realmente pensei que tivessem me esquecido. Só que ao chegar à faculdade percebi que não, os amigos de Toni e muitos que estudam no mesmo período me cercaram e me encheram de elogios dizem que escutam minha música. Grata surpresa num mundo onde hoje o rock não é o centro e sim o pop.

Tem algumas horas que estamos num antigo bar bebendo, rindo, me perguntam muito sobre histórias da minha carreira como guitarrista, eu contava o que achava inofensivo, não para eles e sim pra mim. Existe uma parte do meu passado que eu evito voltar por ter me destruído.

Mudando um pouco de assunto antes que eu comece a ficar estranha com vocês, tenho que revelar que não gostei da ideia de ter que sair para ir para a casa dos pais de Paco. Ou ficaríamos vendo um programa chato e sensacionalista de televisão ou jogando dominó como era o costume entre eles, uma vez? Tudo bem! Agora Paco querer fazer disso uma rotina era o mais cansativo. E isso estava começando a me saturar nesse relacionamento.

Ah, pois é agora é um relacionamento! Esse namoro começou tem um mês exatamente, depois do jantar em que meu pai estragou eu fiquei com tanta raiva que fui encontrar Paco na sua loja, queria esquecer a raiva, transei com ele ali na mesa nos fundos da loja mesmo. Agressivamente, eu deixei marcas no corpo dele que duraram semanas, consegui o que eu queria, tive alguns orgasmos e foi maravilhoso. No último deles que foi múltiplo enquanto pensava no gemido alto que tinha dado e como meu corpo estava prazerosamente cansado sentido alguns espasmos com meu coração batendo fortemente, Paco me pediu em namoro.

Se lembra da minha impulsividade? É, ela entrou outra vez no comando, eu não pensei realmente e o que veio na minha cabeça foi: Se esse homem te deu orgasmos como estes, você tem que namorar com ele! Pensei com a cabeça de baixo que, aliás, eu não tenho! Quer dizer, eu tenho uma teoria maluca de que se existe mesmo esse lance de outras vidas, com certeza eu fui já homem em alguma delas. De qualquer maneira, voltando para essa. Eu aceitei o namoro achando que seriamos um casal que transaria todos os dias, que teríamos aquela rotina gostosa de fazer algo diferente e prazeroso constantemente fora que meu pai odiaria esse namoro, mas me enganei com o passar do tempo a meu ver viramos um casal de namorados que fazem programas chatos!

Tenho certeza que a mãe de Paco deve ter influenciado ele a mudar nossa rotina pelo falatório que estávamos gerando por nós sairmos sempre e sermos sexualmente ativos. Qual é? Como se ninguém desse vilarejo transasse. Ás vezes eu me esqueço como os habitantes de Lagoa Azul tem um lado hipócrita gigante.

:- O que vai querer? – Meu pensamento foi interrompido pelo barman mal humorado.

:- Quero mais uma rodada de cerveja para a minha mesa. – Eu apontei para onde todos estavam. Observei ele buscar as garrafas mais geladas, e me trazer. – Obrigada, soma a conta, por favor. – Eu sou bem educada quando o assunto é cerveja.

Voltei para a mesa com as garrafas e literalmente fiz a festa de todos, que comemoraram.

:- Dulce eu estava comentando com Katherine e tenho que falar com você, eu amo o seu estilo de se vestir! – Naomi, amiga de Toni, veio falar comigo empolgada. – Você poderia dar uma entrevista para o meu blog! – Eu gostava da confiança dela, não foi uma pergunta e sim uma afirmação. Eu era assim antes, quer dizer, eu ainda costumo ser assim.

:- O que tem demais na forma como eu me visto? – Olhei para a minha roupa e depois para ela quase num desafio não era para ela se intimidar e sim me provar o porquê eu tinha que dar essa entrevista. Naomi parecia ter entendido o recado.

:- Pode até parecer algo simples, mas não é. Esta usando coturnos pretos, uma jaqueta jeans que era moda nos anos oitenta e está grande para o seu tamanho provavelmente deve ser considerado para homens, o que poderia te deixar esquisita com o seu corpo pequeno, mas não porque esta usando um vestido branco com estampa de mini caveiras coloridas que traz doçura e feminilidade, logo essa que é quebrada porque está usando uma toca grande preta mais um elemento masculino, e de novo nesse look é quebrado essa afirmação porque está usando uma maquiagem feminina batom vermelho, olhos bem marcados com delineador preto e forte. Todo o seu look é montado por contrastes, que poderia dar muito errado, mas que ao contrário dá certo. Eu quero isso no meu blog. – Touche! Ela me impressionou e isso só me fez abrir um sorriso de lado porque meu irmão estava andando com pessoas de bom senso crítico.

:- O que está acontecendo? - Toni perguntou me olhando.

:- Naomi estava analisando, de novo, a roupa da sua irmã. – Thomas, outro amigo de Toni respondeu. E então eu percebi que todos estavam prestando atenção em nós duas.

:- Naomi, eu vejo que é uma pessoa bem observadora. – Ela deu um sorriso que confirmava o meu comentário. Eu olhei para os outros que acompanhavam a conversa, vi que Thomas acenderia um cigarro e antes que ele colocasse na boca o roubei e dei um trago. – Eu penso da seguinte forma. – Continuei e fiz uma reverência com o meu vestido como agradecimento por ter pegado “emprestado” o cigarro de Thomas e apenas riu enquanto pegava outro cigarro. – O fator principal nisso tudo é. Não é a roupa que te define e sim quem você é, a roupa que você veste reflete o que você é. Não existe roupa para homem e roupa para mulher, usamos pano, tecido, couro. – Dei meus os ombros olhando para o agora meu cigarro. – O que impede Toni de usar um vestido? Nada! O que me impede de usar cueca? Nada! Mas, não o fazemos por outras diversas razões. Eu posso usar qualquer roupa “categorizada” como masculina e ficar feminina, depende de como eu me porto. De quem eu sou. Entende a minha linha de raciocínio? - Perguntei para todos que confirmaram com suas cabeças. – Você não tem que se vestir conforme as revistas te mandam ou por que esta numa vitrine, tem que vestir o que você quiser, fazer a porra que você quiser. – Eu traguei o cigarro para depois soltar a fumaça para cima.

:- É isso que eu quero no meu blog! – Naomi parecia que iria explodir corações coloridos, se isso aqui não fosse uma história e sim um desenho animado japonês, ela estaria com uma cabeça maior que o corpo e no lugar dos olhos dois corações grandes pulsando.

:- Então porque não colocar o que eu disse? - Eu tive que soltar um riso pelo meu último pensamento.

:- Jura? - Ela arregalou os olhos e eu olhei bem para ela, cabelos loiros platinados extremamente curtos, alargadores, desde que a vi pela primeira vez mudou o modo de se vestir, não sei se tenho influencia nisso. Entretanto, ela passou a usar um estilo mais largado de roupa, próximo do que os skatistas usam. Isso era curioso.

:- Claro! – Confirmei.

:- Está saindo no lucro, Naomi, minha irmã não costuma fazer isso quando o assunto é moda. – Toni disse para a amiga, indo se sentar do lado de Thomas e eu observei para ver se ele fumaria ou não e de certa forma para o meu alívio ele foi encher outra vez seu copo com cerveja.

:- Pois é, pode colocar o que eu disse no seu blog. – Eu voltei a falar. – Com uma condição!

:- Qual é? - Ela agora pareceu ficar confusa por eu voltar a atrás, mas eu vendo Toni de tão perto e não conseguindo controlar o meu lado chato de pegar no pé por ser irmã mais velha, me lembrei de algo importante.

:- Não quero que me use como exemplo. – Ela pareceu surpresa. – Há anos pessoas do meio da moda me abordam quanto a ser uma estilista, lançar meus produtos ou dar entrevista para falar do meu estilo, ser até uma dessas pessoas que ganham roupa e para falar dela. Não quero nada disso! Não tenho esse interesse, eu não quero ser exemplo de ninguém, convenhamos eu sou na verdade um mau exemplo. – Eu dei risada e todos riram. – Eu gosto quando me elogiam, não vou ser mentirosa nesse sentido, mas eu não quero ter o peso de ser esse tipo de influenciadora. Não quero ter que dizer o que é legal ou não para se vestir fazer parte dessa indústria que quer muitas das vezes nos fazer ser o que não somos, só porque está na moda. Não importa se está confortável ou não, cada uma e cada um têm que encontrar o seu estilo por si só se conhecendo. Respeito o pessoal desse ramo tenho vários amigos nele, mas eu não quero ser uma delas. Você entende diretamente para quem ou o que estou fazendo essa crítica, certo? - Olhei seriamente para Naomi e ela assentiu, confiava que ela faria um bom post em seu blog sobre o que eu disse.

:- Sua irmã é muito foda. Na moral! Uma caixa de surpresas, melhor do que muito dos nossos professores da faculdade. – Noah, comentou olhando para Toni que só me estendeu o seu copo de cerveja. – Mulher rock in roll mesmo! – Ele fez com a mão o gesto da mão-chifrada, que se popularizou no mundo do rock com Ronnie James Dio, quando foi vocalista da Black Sabbath, e depois mostrou a língua no maior estilo Kiss. Eu dei risada. Porque ele estava mais para o estilo reggae do que para o rock, diversidade era tão bom nesse quesito.

:- Você fala demais, mas é bom em beber Noah? - Eu comentei sorrindo. E os seus amigos começaram a zoar ele. Foi involuntário da minha parte, eu juro, sem desafios com as crianças, afinal elas não tinham como competir comigo, não sustento o apelido de poço sem fundo há anos a toa.

:- Já estou na minha segunda garrafa. – Ele abraçou uma delas e fingiu que estava bêbado.

Toni terminou sua cerveja e se levantou me encarando, ele tinha mudado a expressão de rosto, notei ele vir caminhar até mim.

:- Podemos conversar? - Eu terminei meu cigarro concordando, pensei se fiz ou falei alguma bobagem para ele querer falar comigo justamente agora. Nós nos afastamos da nossa mesa e fomos para a esquina da rua que ficava do bar. Ali era uma das regiões mais barulhentas de Lagoa Azul.

:- Eu não estou te envergonhando na frente dos seus amigos, não é? - Perguntei logo assim que paramos de andar. – Porque eu estou conversando numa boa com todo mundo, só vim aqui para pagar a conta das crianças. – Fui me defendendo.

:- Não é nada disso, porém parece que alguém tem culpa no cartório. – Ele me olhou desconfiado, eu fiquei calada tentando esquecer que ensinei ontem para Naomi e Noah como fazer um baseado. Toni é careta nesse sentido, e eu tenho que admitir gosto disso porque assim temos um equilíbrio na família. Era eu que dava as dores de cabeça!

:- Claro que não! O que quer falar comigo? – Aprendam, mudar de assunto, nesse momento é a melhor tática.

:- Você não precisa mais ajudar a vó Dolores com a fazenda, tudo esta saindo bem, só que vejo que você está diferente de novo. Com aquele incomodo que sente quando fica parada por muito tempo.

Será que dava para perceber que eu estava incomodada com o meu namoro monótono? Eu acho que devo ser mais expressiva do que eu demonstro ou Toni aprendeu a me ler como a vó Dolores.

:- Pretende ir embora de novo? - Toni me perguntou um pouco mais sério. Ah então era isso, ele sabia que tinha algo errado e estava tentando descobrir o que era.

:- Não tenho ideia Toni, eu confesso que ando pensando em algumas possíveis rotas, mas não tenho nada decidido. E agora tenho que pensar por outros lados. – Respondi.

:- Talvez não seja o momento certo, mas eu quero te fazer uma proposta. – Ele foi direto. E o rumo da conversa estava mudando.

:- Faça. – Incentivei, porque estava curiosa.

:- Se lembra quando éramos mais novos e passávamos férias aqui em Lagoa Azul, teve uma época em que vivemos nesse bar porque ele tinha fliperama e sinuca e outros jogos? - Ele comentou e se virou para o bar. E eu dei um sorriso.

:- Sim, teve uma vez que fizemos uma competição entre as crianças daqui, nossa mãe percebeu que não sairíamos nem arrastados e trazia comida para cá. Gastávamos toda nossa mesada em fichas. – Eu sorri pela lembrança. – Eram outros tempos, era divertido vir para cá quando criança ou jovem, tinha de certa forma um encanto pelo lugar render boas lembranças. Agora o dono mudou e o bar adquiriu um ar mais sério, não existe mais os jogos, a qualidade do serviço caiu drasticamente. – Eu falei para ele como uma confidência.

:- Isso, eu quero resgatar isso Dulce! – Ele falou para mim. Mas, o olhar dele estava voltado para o bar, o seu olhar era diferente. – Quero comprar esse bar e fazer dele um negócio nosso! – Ele revelou. – Eu quero resgatar esse encanto que tinha, quero reformar o local para trazer o público mais jovem, nós não temos muitos lugares para beber aqui e temos que competir com os moradores mais antigos, quero renovar esse local reinstalando os vídeos games, colocando a mesa de sinuca, fazendo um palco para uma banda de pequeno porte se apresentar ou para festas com caraoquê. É um ponto bem localizado, aqui é uma zona do vilarejo mais afastada dos reclamadores de barulho e fica mais próximo da estrada que da para a nossa fazenda, então por essas e outras seria um point entre os jovens de Lagoa Azul. – ele deu uma pausa para depois voltar a falar - Aquele lugar que parece uma casa que ninguém mora, - ele apontou para o lugar que ficava do lado ao bar, sempre fechado desde que eu cheguei aqui – faz parte do bar, é do terreno, na verdade o dono não usa esse espaço, ali podemos fazer algo para as crianças. Sou adepto do politicamente correto e claro são outros tempos, bares não são lugares para crianças, mas um local com vídeos games sim. Podemos fazer como antes fazer dali um espaço para as crianças, fazer uma lanchonete com um local para brincar com jogos.

Eu imaginei tudo o que ele estava me dizendo na realidade ele estava falando de dois negócios distintos que poderia dar muito certo.

:- O que eu quero te propor é sociedade, eu tenho o sonho de ter esse bar desde garoto, tenho muitas ideias podemos até fazer adaptações nesse projeto, podemos conversar sobre isso, mas eu preciso de dinheiro para investir. Talvez pense que eu seja muito novo para algo dessa magnitude, afinal sou só um universitário, mas eu tenho certeza que dará certo. Além do mais podemos vender aqui os vinhos da nossa vó. O que acha?

:- Você iria num bar chamado Los Hermanos? Ou não podemos colocar esse nome porque já tem direitos autorais, é um nome de uma banda. Talvez devêssemos fazer como aqueles admiradores que mesclam o nome de personagens ou de pessoas reais porque shippam elas. Podemos ser fazer isso e ser além de um brotp usar como o nome do nosso bar? - Eu sorri animada com a ideia e Toni que antes estava apreensivo, agora estava mais leve e entendeu que eu estava dentro dessa.

:- Obrigado por confiar em mim. – Ele disse e veio me abraçar. É o meu caçula, como não vou apoia-lo? Se o que eu tenho é só orgulho dele, por mais novo que seja é alguém tão competente e talentoso.

:- Vamos comprar esse bar sim e agitar esse lugar começando assim podemos comprar toda a Lagoa Azul? – Eu pisquei para ele brincando. – Não tem que me agradecer de forma alguma, eu estou dentro porque acredito em você, porque me orgulho de quem você é. Pode ir atrás disso, que eu vou investir nesse projeto.

:- Quando estiver em casa eu te mostro todas minhas pesquisas. – Ele sorriu empolgado com o que viria.

:- Ah não Toni, não quero saber de papelada chata, só me mostra onde tenho que assinar. Sou só a moça que paga a conta, está bem! – Sorri para ele fazendo a referência ao começo da nossa conversa. – Vem vamos voltar e beber para comemorar isso.

Ele riu e foi comigo e percebi que ele foi contar a novidade para os amigos, eu estranhamente me sentia muito a vontade entre eles, não sentia diferença de idade mesmo sendo praticamente dez anos mais velha. Eu me sentia mais solta aqui do que em reuniões familiares!

Noah me passou o cigarro dele para eu tragar enquanto justamente vó Dolores chegava ao local. O olhar torto que ela me deu foi tão sinistro que se ela tivesse poderes tinha partido o cigarro no meio com uma visão de raio lazer.

:- Oi, amor da minha vida! – Eu a cumprimentei enquanto tragava o cigarro.

:- Oi, minha neta. – Ela caminhando até onde eu estava em pé e me deu um beijo. Vó Dolores poderia estar com a vontade de atirar a sandália dela na minha cabeça por me ver fumando e pior me ver fumando e bebendo com os amigos do meu irmão, mas ela não demonstraria nada até que estivéssemos sozinhas! Porém, é como eu disse, não sou um bom exemplo, mesmo.

:- Olá meu neto. – Ela foi abraçar Toni e depois olhou a mesa em que todos estavam sentados. – Olá, meus netos postiços! – Ela cumprimentou a todos e isso causou comoção entre eles, minha vó era querida, não esperava menos para alguém da nossa família. Claro que tirando meu pai dessa lista de pessoas queridas.

Quando eu voltei a me aproximar da mesa vi que todos estavam conversando com a minha avó.

:- Thomas eu vim com sua tia, ela logo chega está estacionando o carro, sabe como é com vagas, especialmente como faz baliza. Eu desci do carro antes por que não tenho paciência. – Dolores arrancou risada de todos.

:- Nem eu tenho vó Dolores, mas não tenho a liberdade para sair do carro como à senhora. – Ele comentou como se lembrasse de outros momentos.

:- Naomi, faz tempo em que não te vejo.

:- Pois é eu estava doente fiquei de cama um tempo. Mas, já estou de volta. – ela respondeu minha vó.

:- Toni me contou, mas já está melhor ainda bem! E como está aquele seu namoradinho, Daniel, o nome dele?

Pausa nesse momento para eu fazer uma análise da cena que eu presenciava, eu senti vontade de rir, mas me controlei. Vó Dolores perguntou ou na maior da inocência ou na maior da ironia, como já disse a vocês, ela usar o termo namoradinho é para se ficar em alerta. Mas, vendo a situação claramente houve um desconforto em todos ao mencionar o tal Daniel, eles se entreolharam antes dela responder.

:- Nós terminamos tem um tempo, vó Dolores. – Naomi por fim respondeu para ela, e depois de olhar Toni profundamente, ela me encarou. E eu notei algo, primeiro que ela estava mentindo e segundo, aquela menina estava dizendo aquilo praticamente para mim. Então ela era no mínimo bissexual.

:- Ás vezes a senhora me surpreende vó Dolores! – Eu comentei já que ninguém falou mais nada. E ela me encarou, era incrível eu estava confusa, não conseguia me decidir se ela estava sendo inocente ou irônica vou chutar que os dois ao mesmo tempo. Acho que Toni já entendendo o que eu queria dizer, resolveu contornar a situação.

:- Então vó o que veio fazer aqui?

:- Ah sim, eu vim conversar com Dulce. – Ela se explicou provavelmente já se esquecendo do meu comentário. E eu fiquei surpresa, duas conversas sérias no mesmo dia? O que seria dessa vez. – Mas, deixe a Elizabeth chegar e... Aí está ela. – Vó Dolores parou de falar porque viu a amiga dela chegar.

:- Ótimo, vocês estão tomando cervejas e eu estou morrendo de sede. – Ela chegou ofegante, deve ter tido trabalho para fazer a baliza, eu pensei. Ela roubou o copo de alguém e virou num gole, impressionante! – Olá a todos. – Por fim ela sorriu, cumprimentando. Um sonoro e único “olá” foi dito de volta.

:- Elizabeth, aqui está Dulce! – Eu me aproximei delas, depois de jogar a bituca do cigarro fora e ajeitar minha toca na cabeça. – Mas, uma vez vó Dolores me fuzilou por estar fumando, mas essa não é uma conversa para agora.

:- Dulce eu não te vejo há tanto tempo! É um prazer revê-la! – Ela veio me abraçar. – Está linda. – Me olhou de baixo para cima. – Do jeito que é. – Não sei o que ela quis dizer com isso, se é o que parece ou pode ir além, mas na minha dúvida eu decidi ignorar.

Olhei para o lado involuntariamente e Toni e os amigos já estavam entretidos entre eles.

:- Obrigada, senhora Elizabeth, também é um prazer revê-la!

:- A senhora está no céu. Pode me chamar de você, - gostei disso, foi direta – eu que na verdade queria conversar contigo. Sabe Dulce, faz tempo que não vem até Lagoa Azul então talvez não se lembre, mas minha filha Ana Luiza, a do meio vai se casar, está uma loucura a correria para organizar todo o casamento por si só, agora imagine você que a fotógrafa que tínhamos contratado, não vai poder cumprir o contrato porque estava grávida e a criança resolveu vir mais cedo. Ela não vai mais poder ir, eu estava conversando sobre isso com a sua vó e ela me disse que você é fotógrafa. Eu resolvi vir aqui te pedir para fotografar o casamento da minha filha!

Eu não deixei de ficar surpresa olhei para vó Dolores que deu um sorriso sugestivo. Eu já deveria saber que tinha dedo dela nessa história, desde que meu trabalho com ela na fazenda diminuiu o ritmo, ela arruma vários trabalhos temporários para que eu fique mais tempo em Lagoa Azul. Ela parece sentir quando eu quero abrir minhas asas e voar, aliás, não só ela como Toni também, olhei para ele rapidamente que agora estava conversando com Noah animadamente.

:- Elizabeth, eu não tenho experiência com esse tipo de trabalho. – Comecei a me desculpar, mas fui interrompida.

:- Não há a menor importância, por que para tudo tem uma primeira vez, sua vó me mostrou seus outros projetos fotográficos, eu sei da sua competência. Fará mais um lindo trabalho, fora o desafio de fazer algo novo, não é verdade?

Olhei imediatamente para vó Dolores e tentando arrancar dela se essa conversa foi algo combinado, porque como que Elizabeth tocaria logo no meu ponto franco, eu adoro um desafio. Nunca fotografei casamentos. E essa proposta aparece logo quando estou precisando. Bem estranho, não é?

Antes que eu pudesse responder Elizabeth, eu vi Paco chegando caminhando, por eu ter ficando um tempo olhando para trás dela, Elizabeth voltou o olhar na mesma direção que a minha e entendeu eu ficar sem falar nada. Esperamos ele chegar para nos cumprimentar.

:- Oi, tudo bem? - Ele chegou sorridente e eu que tinha até me esquecido que ele viria aqui me buscar. Cumprimentou a Elizabeth e minha vó com beijos e os amigos de Toni e meu irmão com um aceno de mão. Veio me dar um selinho. – Eu te mandei algumas mensagens e você não me respondeu mais! – Comentou com certo tom de cobrança.

:- Desculpa, eu me esqueci completamente do celular. – Esqueci mesmo. Pensei. – Quando a companhia está boa isso acontece. – Fiz uma brincadeira para deixar o clima mais leve.

:- Nisso ela tem razão, não gosto de sair com alguém que fica o tempo todo no celular. Perde a graça. – Elizabeth comentou muito mais para minha avó do que conosco. Paco ficou do meu lado e me abraçou a cintura com um dos braços e as mãos. Dona Dolores muda de postura quando Paco está presente eu nem sei se ele percebe isso, ela fica mais retraída, só que nunca o destratou apesar de não gostar realmente dele.

:- Paco, estava comentando com sua namorada que minha filha vai casar, e infelizmente a fotógrafa que tínhamos não vai poder mais fazer esse trabalho. Estou aqui propondo para que Dulce aceite ser a nova fotógrafa do casamento, você concorda?

Espera aí, concorda? Porque ele tem que concordar se sou eu que vou fazer o trabalho? Paco não tem nada a ver com isso, por mais que seja o meu namorado. Quer dizer, que se ele falar que não concorda, eu não aceito o trabalho? Esse tipo de coisa, me irritava num grau tão alto que só me fazia ser, isso, impulsiva.

:- Na verdade. – Eu comecei falando antes que Paco abrisse a boca. – Eu aceito o trabalho, será bom para mudar e aprender a fazer algo novo. Eu aceito sua proposta, Elizabeth. – Cortei a resposta de Paco nessa conversa? Sim. Me arrependo por isso? Não!

:- Ah que ótimo! – Elizabeth começou a bater palmas como comemoração e depois às segurou unidas, como um sinal de agradecimento. – Você não sabe a boa notícia que está me dando.

Eu sorri de lado, tentando esquecer a pergunta que ela fez para Paco anteriormente, olhei para vó Dolores e ela parecia plenamente satisfeita. O seu plano de me fazer ficar mais tempo estava dando muito certo e isso sim me fez da vontade de rir.

:- Thomas, ela aceitou fotografar o casamento da sua prima, querido. – Elizabeth deu a notícia para a mesa dos mais jovens. E ele olhou na minha direção e piscou.

:- Mais uma boa notícia que devemos beber para comemorar. – Noah comentou contente porque tudo era motivo para ficar mais por ali com todos e vivendo momentos bons.

:- Agora só falta resolver a questão do padre, não é tia? - Thomas perguntou para ela e eu fiquei confusa, como assim questão do padre?

:- O que aconteceu com o padre? - Eu perguntei por que parecia se a única a não saber desse assunto.

:- O padre Marcus foi transferido para Chicago, chegará um novo padre para substitui-lo e ficar a frente da nossa paróquia. – Paco me explicou.

:- Ah mais isso é questão de tempo nada atrapalhará o casamento, porque tudo está na mão de Deus e ele tem o seu tempo certo. Eu tenho certeza que logo ele nos manda o novo padre. – Elizabeth comentou e eu fiquei incomodada, quando as pessoas falam de religião e Deus daquela forma beirando o fanatismo. Será que devo me arrepender de ter aceitado o trabalho?

:- Espera aí, quer dizer que o casamento tem fotógrafa, mas não tem padre? - Eu não podia perder essa piada, ela tinha que ser feita. Não seria eu se não tivesse feito, eu arranquei os risos de todos ali, até de vó Dolores.

Estávamos falando sobre o casamento, na verdade os outros eu estava apenas escutando, curiosamente um fato estranho aconteceu naquele momento. Nós estamos num bar que dava acesso uma estrada de barro antiga que por ela dava para ir a algumas propriedades particulares geralmente os donos moram logo no local, dessa estrada também dava para chegar pelo vilarejo por mais que seja mais longa e difícil do que a estrada principal, asfaltada, por esse caminho em tempos de chuva, é quase impossível por conta de buracos e lama. Só é para quem tem uma boa máquina nas mãos seja carro ou moto, ou no caso de muitos, cavalos.

Lagoa Azul pelo local por si tinham muitos viajantes e por ter um zona rural grande e forte, não era incomum ver alguém andando de cavalo, e certa vez em meio a conversa eu vi ao longe da estrada a forma do que era um cavalo. Conforme a figura foi ficando perto, dava para ver que um viajante chegava a Lagoa Azul, ou seja, mais um, o que geralmente é normal teve um fato curioso foi quando o viajante se aproximou ao bastante aonde nós estávamos começou um burburinho. O que eu não entendi, diga-se de passagem.

Ele desceu do seu cavalo que por sinal era lindo, um belo animal. O homem fez uma carícia no pescoço do cavalo como agradecimento e isso me chamou a atenção, acho que não só a minha como a de todos. Ele amarrou o cavalo num toco de madeira e então entrou no bar, chamando a atenção para si.

Eu não gostava dessa mania feia de cidade pequena e também de vilarejo de encarar uma pessoa como estávamos fazendo agora, por mais curiosos que estamos isso ainda era constrangedor e intimidador. Todavia, tinha algo de diferente porque tinha um burburinho baixo ainda a respeito do viajante, algo que eu não estava entendendo absolutamente nada.

O homem que até agora eu não consegui ver o rosto direito porque ele estava usando um chapéu que fazia sombra em seu rosto, entrou no bar e saiu com água ele foi dar água também ao seu belo cavalo, foi nesse instante que ele tirou o seu chapéu e num ato que eu diria involuntário mexeu no seu cabelo, e passou a mão no rosto, na barba por fazer, estava pingando de suor o que é compreensível por que estava galopando.

O que passou a seguir foi uma conexão, ele virou o rosto para olhar para o lado nossos olhares se encontraram. Uau! Não sei explicar o que aconteceu nesse instante. Eu estava com todos meus sentidos voltados a aquele homem.

:- É ele. – Elizabeth falou próxima a mim. Involuntariamente eu me afastei da mão na minha cintura que Paco tinha colocado no meu corpo.

:- É sim, é ele. – Agora era a voz da vó Dolores.

:- Eu disse que era ele e que tudo tem o seu tempo aos olhos de Deus. – Elizabeth comentou, mas eu não conseguia tirar os olhos do tal viajante e ele só deixou de me olhar quando percebeu a senhora se aproximar. – O seu nome é Alfonso filho, não é? - Ela perguntou quando parou ao lado dele, que se aproximou mais da onde estávamos isso depois de conferir que seu cavalo estava tomando a água que ele trouxe.

:- Sim, meu nome é Alfonso. – Ele confirmou seu nome para Elizabeth e ela voltou a falar agora que tinha atenção dele, e todos também prestavam atenção na conversa, deveria ser esse o burburinho que começou, era uma discussão para saber se era ele ou não. Afinal, quem era ele?

:- Mas, é claro, você é filho mais novo de Alfonso que mora desde garoto em Lagoa Azul, você que saiu daqui para estudar para ser padre, seu pai falava que você só voltaria quando estivesse encontrado o seu caminho, então você é o novo padre do vilarejo? – ela perguntou contente por pensar no casamento da filha.

E eu não jamais poderia explicar como aquela pergunta me causaria tanta ansiedade por saber uma resposta.

Whoa, i need a man to love me.

Don't you understand me, baby?

Why, i need a man to love.

I Need A Man To Love – Janis Joplin