Beber e dirigir era uma ofensa séria em qualquer um dos mundos que tivessem meios de transporte controlados por humanos, mas Cana Alberona jamais imaginara ser pega e processada por uma lei que servia para manter os humanos na linha, ninguém tinha citado magos nesse acordo. Infelizmente é tudo questão de quem você atinge, certo? Em uma brincadeira infeliz, acabou atropelando Laxus quando estava andando com um carro mágico. Para a maga, a culpa era do Laxus. Primeiro, ele nem deveria andar de trem. Ele andou e saiu da estação todo enjoado. Segundo, como ele poderia ter se machucado? Ele é do tamanho de uma montanha, enfrentou coisas piores. Mas como ele é um mago poderoso e teve que ser hospitalizado, fizeram exames em Cana e comprovaram o alto teor de álcool em seu sangue. Mas isso existe? Alto teor de álcool? Para alguém que bebe como ela? Isso não parecia certo e sim um insulto em muitos níveis. Ela também poderia ter atropelado Laxus por pura vontade, porque os deuses sabem como ele merecia.

Como que ela ia imaginar que isso aconteceria? Erza comentou que era muito gostoso dirigir, apesar de exigir muito poder mágico, mas de acordo com a Primeira, ela tinha muito poder mágico latente, certo? O que poderia dar errado? Tudo bem que ela bebeu um pouquinho antes de começar, só pra dar um gás, uma coragem. Não que ela precisasse, mas era sempre bom. Agora estava presa nessa situação.

A triste consequência dessa brincadeira infeliz e basicamente indolor é que agora teria que fazer uma sessão semanal de terapia por 12 meses e ser afastada das missões. E quando tentou argumentar, considerando o comportamento dos outros em sua guilda, os conselheiros argumentavam que ela simplesmente não seria considerada responsável pelos atos e quem não é responsável, não pode ser responsabilizado, e se não pode ser responsabilizado, não é confiável. Essa era a escolha que ela tinha feito ao se embriagar daquele modo e subir no carro. O que Cana ignorava solenemente, é que vários de seus amigos já tinham observado que o que parecia um hábito questionável se tornou perigoso demais e não tentaram recursos para reverter essa pena. Antes ela tinha até considerado não fazer, mas a ameaça de perder seu registro de magia quando tinha acabado de se tornar maga S, não era algo pelo qual ansiava demais. Então apenas aquiesceu.

A primeira sessão foi em Magnólia mesmo. Tinha perdido a hora no Bar da Fairy Tail e só se deu conta quando o barulho da lacrima se tornara insuportável. Pegou aquele artefato amaldiçoado e jogou na parede, claramente para ser nocauteada um segundo depois. Claro que não poderia deixar de ser uma lacrima psíquica, o tratamento psicológico, logo a punição também deveria ser, certo? E nessa lógica bizarra, Cana saiu do bar, foi em um canto qualquer e atendeu essa espécie de telefone maléfico.

Uma senhora com aparência simpática apareceu na tela e se apresentou, mas seu nome foi logo esquecido pela maga. Cana começou a se apresentar, contudo estava tonta demais para concatenar um raciocínio mais profundo e a primeira sessão foi com ela dormindo sobre a lacrima. Esse comportamento não ajudou em nada a livrar a barra dela com o conselho. Uma advertência escrita foi feita e as consequências pareciam muito assustadoras então decidiu dar uma chance e fazer isso direito. Na verdade ninguém tinha falado que ela deveria parar de beber, mas ela tinha machucado alguém, então deveria ser punida de alguma forma.

Depois desta resolução definida, decidiu encarar a terapia como uma punição, o que ela sempre encarou de frente.

Na outra semana, estava no local marcado, com roupas que destoavam do que gostava de vestir e decidida a impressionar. Caso conseguisse convencer essa senhora que terapia era um exagero, ela poderia dizer ao conselho que estava apta a voltar ao trabalho. Podia ser multada, achava essa uma saída muito melhor. Tinha certeza que poderia convencê-la. Só que precisava de um pouco de coragem, então achou por bem beber um pouco antes de sair, certo? Nada demais, só um golinho de vinho. Resultado: chegou completamente embriagada na sessão.

A terapeuta estava embasbacada. Quando aceitou o caso de Cana, tinha pensado que seria simples, geralmente magos eram muito cientes de si mesmos e sob o poder que tinham, eram pessoas menos complexas, embora achasse que fosse um preconceito interno, mas preferia lidar com magos do que com humanos que só dependiam de si mesmos para poder seguir em frente, contudo nada a preparou para a desolação que era observar a senhorita Alberona. Já era a segunda vez que ela estava completamente embriagada e não poderia ignorar essa situação já que uma maga cujos poderes poderiam chegar aos níveis de Gildarts Clive e sendo de onde era, o perigo era iminente. Respirou fundo e foi acordar a moça que roncava sonoramente em seu divã.

“Senhorita Alberona, vamos começar?”

“Ah, vamos? Precisa mesmo? Porque eu entendo perfeitamente que foi muito grave o que eu fiz e eu espero ser punida exemplarmente..exemplartente, mente, né? Exemplarmente? É isso que fala? Ah, é isso” Cana falava de forma arrastada.

“Senhorita, sua terapia é de modalidade compulsória. Acredito que tenha sido informada que passar e completar todas as sessões é mandatório para que possa sair da sua suspensão. Compreendo como pode ver isso como uma punição, mas espero que com o passar das semanas consiga ver de outra maneira. Não posso liberar uma maga para missões, sendo que você ainda não consegue fazer o mínimo que é manter a sobriedade antes de um compromisso importante. Essa terapia é essencial para que volte às atividades, o que de acordo com seu relatório, é a única coisa que ama fazer. E se você não consegue se comprometer com a única coisa que ama fazer, é aí que temos que prestar atenção, não é mesmo?”

A impressionada no final foi a senhorita Alberona que não conseguiu responder de forma alguma, então ficaram ambas mudas até a sessão acabar. No horário devido, a terapeuta disse: ‘espero você aqui na semana que vem, um pouco mais consciente. Quem sabe isso pode ser menos ruim do que você espera?”

Durante aquela semana, Cana chegou a refletir sobre o compromisso que a senhora tinha dito. Claro que poderia se comprometer com a magia, era uma maga, a essência do seu ser. Só porque tinha bebido um pouco antes? Isso não poderia sequer ser levado em consideração. Cana bebia, todos sabiam, ela sabia, era algo que também tinha se tornado a essência do seu ser. Ultimamente mais do que em outros momentos, mas não fazia mal a ninguém a não ser você mesma, certo? Tudo bem que tinha esquecido de uns compromissos e sido inconveniente com outras pessoas e algumas a achavam não confiável, mas isso não era motivo para repensar sua postura em relação à bebida.

Sua magia não era tão constante quanto seu hábito de beber e não sabia o que podia fazer caso aquilo desaparecesse de sua vida também. As pessoas precisavam de constância, era óbvio. Tentaria chegar menos alcoolizada na sessão, talvez sua terapeuta entendesse que ela era uma mulher normal e que bebia só em alguns momentos: alguns quase todos os que eu estava acordada, mas ainda sim momentos. Não parecia nada de mais beber um pouco antes de fazer T.O.D.A E Q.U.A.LQ.U.E.R coisa. Aquilo não era um caso de adicção, claro que não. Podia se dizer que ela era uma maga melhor por conta disso. Embora não soubesse firmemente destacar os benefícios da bebida para sua magia. Estava em uma agonia mental então provavelmente o melhor era beber um pouco para que pudesse clarear um pouco as ideias. Mas chegando ao bar, deu-se conta que o que ela amava era mesmo beber e não ser uma maga e isso era desolador. Não conseguia distinguir de onde vinha esse desespero e se lembrou que não foi visitar Laxus nenhuma vez e nem quis saber se podia, o que dizia um pouco sobre a mulher que ela estava se tornando.

Bom, poderia ir ao hospital e pedir pra visitá-lo e como foi ela quem o atropelou, isso não seria permitido. Ela ficaria em paz com a sua consciência, convenceria a senhora que era um ser humano funcional e poderia voltar para a sua vida de forma plena.

A roda da fortuna girou ao contrário e Cana se deparou com Laxus no leito hospitalar. Não sabia remotamente o que dizer, estava completamente sóbria e basicamente muda. O fato que não se lembrava da última interação que tiveram em que ela estivesse sóbria era apavorante também, mas ele parecia bem, mas os pinos que saíam de sua perna davam outra impressão.

Laxus não esperava que ela viesse visitá-lo, mesmo sendo o azarado da vez. Ele acreditava que ela tinha feito de propósito e não poderia culpá-la, certo? Contudo não podia prever esse ar de desalento nos olhos dela. Ficou sabendo da punição e achou exagerada. Quantos magos da Fairy Tail destruíam tudo pela frente no andamento das suas missões. Natsu fez muito pior e ele era considerado um herói e Cana o tinha atropelado e estava destituída de sua profissão. Ele até tentou ver se não era possível reverter, porque ele estava bem. Só uma fratura em duas partes, mas ele já tinha enfrentado coisas piores. Todos ali já tinham, então não entendia muito bem esse tipo de punição. Só que o avô veio tentar explicar.

Laxus, não é somente pelo seu atropelamento. São várias coisas que estão impedindo Cana-chan de seguir em frente. Ela tem uma magia latente que até a Primeira reconheceu, é da mesma geração que você, pode-se dizer que tem tantos poderes quanto você e ela mal conseguiu ser maga S. E ela tem poderes para isso, ela tem muitos poderes para isso e não conseguimos ser o que ela precisa. Gildarts não conseguiu ser o que ela precisa e não sabemos o que fazer, entende? Não é algo fácil pra ninguém e muito menos para ela.”

“Não precisa se preocupar, eu estou bem.”

“O que são esses pinos? Eu achei que tinha trombado de leve com você. Como que aquele encontrinho deixou você desse jeito?”

“Encontrinho? Acho que ela não chegou a ver como o carro ficou. Incrível como ela não ficou hospitalizada.” Alberona, você foi ver como o carro ficou?”

“Não fui. Eu não sei onde ele está. Me diga onde está.”

“Está no pátio do conselho. Eles que tem a jurisdição sobre os veículos e como foram eles que deram a sua advertência, funcionou como prova.”

“Você deve estar se divertindo muito com isso, não?”

“Oi? Como assim? Você acha que eu quis isso?!”

“Eu sei que o nosso lance não foi o melhor do mundo mas isso não era necessário!”

“Espera, você acha que eu quis ser atropelado por você e conspirei para que o conselho te forçasse a fazer um tratamento para o seu alcoolismo?”

“Alcoolismo? Quem é alcoólatra aqui? Ninguém é e eu nem sei se esses pinos são de verdade mesmo. Você me largou! VOCÊ ME DEIXOU ENTÃO POR QUE ESTÁ FAZENDO ISSO? VOCÊ PODIA FALAR QUE EU NÃO TE ATROPELEI, QUE VOCÊ CAIU NO CHÃO!”

‘VOCÊ DEVE ESTAR MAIS INSANA DO QUE DE COSTUME, EU SOU UM DRAGON SLAYER, EU TENHO MAIS DE 2 METROS DE ALTURA E SOU FORTE COMO UM DRAGÃO, COMO EU VOU QUEBRAR A PERNA EM 2 PARTES EM CAIR NO CHÃO CANA?”

“OUTRA COISA, EU SOU UMA MAGA, MAGOS NÃO PODEM SER VICIADOS EM ABSOLUTAMENTE NADA. VOCÊ ACHA MESMO QUE SABE TUDO???? SEU IDIOTA!!”

"SABER TUDO EU NÃO SEI, MAS TEM VÍCIOS PSICOLÓGICOS E ESSES OS MAGOS PODEM TER E O TÊM!!! É ISSO QUE VOCÊ É! UMA VICIADA! Ai droga, Cana, não. Espera!!!!!”

Cana não podia mais ficar ali. Não podia acreditar na audácia do fodido. Não sabia o motivo pelo qual o tinha visitado. Por ela que morresse seco ok, não precisava morrer, mas ele merecia ser punido por algo, não? Ele tinha tudo. E eu? O que eu tenho? O que está acontecendo com a minha vida? Talvez deva ser isso que aquela mulher queira me mostrar.”

Saiu correndo do hospital e com um temor em ser perseguida que não sabia ao certo de onde vinha, sentiu-se sufocada, o ar não entrava nos pulmões, começou a sentir uma tontura, um mal estar e caiu desmaiada ao chão. Retomou a consciência e estava ironicamente deitada ao lado de Laxus Dreyar porque a roda da fortuna decidiu que toda a humilhação era pouca para ela e que a punição plena começasse.

“Eu não acredito que me colocaram aqui junto com você.”

“Essa é a ala para magos. O único aposento disponível, Cana, escuta, eu queria..”

“Não fala nada Laxus, vamos fingir que ao menos aqui, não nos conhecemos, a gente não precisa se falar, eu nem sei o que aconteceu, eu não quero falar com você. Pode ser? Você é bom em não falar quando precisa, então não fale nada agora, minha cabeça está zunindo, fica quieto”

“Então você deveria chamar a enfermeira porque você bateu a cabeça e pode…”

“VOCÊ NÃO OUVIU NADA O QUE EU FALEI? EU NÃO QUERO OUVIR A SUA VOZ, INFERNOOO CALA ESSA BOCA! COF COF COF…”

A médica entra no quarto, claramente desesperada em ouvir essa comoção e já rezando para que os deuses fossem piedosos. “Senhorita Alberona, o que está sentindo?”

“Estou tonta, sentindo um pouco de falta de ar, não sei bem o que aconteceu.”

“Bom, pelos resultados dos exames, aparentemente você teve um ataque de pânico.”

“Pânico? Mas como assim pânico? Eu sou muito corajosa, não saio por aí tendo ataques de pânico.”

“Ataques de pânico não possuem conexão com a sua coragem em si, com a sua personalidade, mas com um estado de agonia mental em um determinado momento.”

“Agonia mental? Mas como assim agonia mental? Eu sou uma maga. Não deveria ter esse tipo de coisa.”

“Muito se confunde entre a constituição dos magos e humanos comuns. A questão maior é que magos são humanos, com o adicional do reservatório de poderes mágicos. A constituição física de vocês é mais resistente que a nossa em relação à muitas doenças, tem a questão da quase impossibilidade de vícios físicos, mas isso não significa que cerebralmente vocês são diferentes de nós. Claro que ter uma constituição física muito resistente pode dar a impressão da invencibilidade total, o que é um erro muito comum e magos padecem, sofrem, se emocionam, se apaixonam e se confundem igualzinho aos outros seres humanos, então senhorita, você pode sim, estar em agonia mental.”

“O que desencadeia isso? A senhora sabe?”

“Inúmeras coisas, pode ser um conflito, uma situação que engatilhe algo no seu inconsciente, complexo de culpa por algo que você não podia controlar, são inúmeros caminhos que a nossa mente utiliza para avisar que existe algo errado. Eu vou lhe encaminhar ao psiquiatra para podermos investigar melhor.”

“Psiquiatra não é o médico de loucos? Eu não sou louca.”

“Nada disso. Ele é o médico das mentes doentes. Quando você quebra o braço ou como seu amigo aqui, quebra a perna em duas partes, as pessoas não hesitam em buscar cuidados médicos. Ou curas mágicas, então porque no momento onde a parte mais importante, aquela que nos define, está padecendo, existe uma gama de preconceitos em relação aos cuidados? Isso não parece estranho para você?”

“Se eu estiver fazendo terapia, eu ainda preciso ir ao psiquiatra?"

“O bom seria se estivesse indo ver os dois. O psiquiatra não fará uma investigação tão completa quanto um terapeuta por conta do tempo, mas caso precise de uma medicação. O bom é ir em ambos. Mas se você está fazendo terapia, é ótimo! Vou pedir para a enfermeira dar uma passada aqui e conferir se vocês precisam de mais cuidados.” E com isso a médica saiu.

Depois que ficaram sozinhos, Cana ficou remoendo alguns pensamentos e entrou em uma corrente nebulosa de sensações e lembranças se sobrepondo umas às outras e ela simplesmente não conseguia distinguir o que era realidade, o que era ilusão e até que ponto a sobriedade ou a ebriedade eram responsáveis por aquela situação. Ela ouvia a voz de Laxus ao longe, mas não sabia onde ele estava.

“Cana, você está bem? Você está me assustando, quer que eu chame alguém???”

“Oi? Não. Não quero. Quero que você fique quieto. Só isso. Está tudo bem. Vai ficar tudo bem. Só preciso dormir um pouco.”

O pouco que ela dormiu foram 2 dias e o ataque de pânico foi potencializado pela abstinência que ela estava passando. A terapeuta dela foi chamada e parecia que o tratamento que nem havia começado, deveria seguir outro caminho. O caso parecia mais sério do que ela havia imaginado.

Cana acordou se sentindo miserável e desorientada, nem sabia onde estava direito e seu pai estava ao seu lado. Ficou muito ressabiada e questionou o motivo pelo qual ele estava ali.

“Bom, você teve uma espécie de colapso nervoso filha. E eu estava chegando e como sou seu único parente, vim te ver. Eu estava preocupado. A doutora falou algumas coisas. E também tem a sua punição sobre o atropelamento do Laxus. Eu precisava dar minha permissão para algumas coisas, mas como não vivemos juntos, eu queria conversar com você sobre isso.”

“Você nunca me criou, como pode permitir algo sobre mim?”

“Esse foi meu argumento exato, filha. As coisas com o atropelamento revelaram muitas outras coisas e eles querem que você tenha uma espécie de tratamento intensivo.”

“Intensivo, como em internação?”

“É. Internação como um retiro.”

“Mas por que eu preciso ser internada? Eu não preciso disso, eu estou perfeitamente bem. O acidente com o Laxus não foi tudo isso pai. Eu juro! Ele está bem, ele está bem. Eu não estou entendendo isso.”

“Filha, o acidente do Laxus foi mais que isso. Não foi somente ele quem foi atropelado. Você atropelou mais duas pessoas que ficaram bem machucadas. Você ficou bem mal também e o seu nível de intoxicação era altíssimo. E você não anda se lembrando de algumas coisas. O conselho anda preocupado com o seu nível de magia latente. A Primeira garantiu que você tinha uma magia equivalente à minha de força. A falta dessa liberação pode ser desastrosa para você e para todos à sua volta.”

“E agora todos estão preocupadíssimos comigo, como se eu fosse uma viciada? Eu não sou viciada. Ninguém nunca se importou com o quanto eu bebia. O senhor é um hipócrita de marca maior, velho cretino, se achando no direito de dizer o que eu devo ou não fazer?”

“Eu não disse o que você tem ou não que fazer. Estou explicando o que estão cobrando de você. As expectativas que estão sendo criadas sobre você e a preocupação que você está dando aos seus amigos e ao seu namorado.”

“Eu não tenho namorado algum e provavelmente nem meio amigo, considerando que você é a primeira visita que eu vejo. E você nem fica perto o suficiente.”

Cana não sabia de muitas coisas à sua volta. A vinda de Gildarts não era uma coincidência. Ele tinha sido convocado pelo mestre para poder dar alguma atenção para a filha. Essa filha que tinha perdido a consciência várias vezes por conta da bebedeira e resultou em vários desastres. A questão é que o comportamento de Cana estava cada vez mais irascível e ela não tinha noção do que estava acontecendo. Ela era agressiva e às vezes o corpo dela simplesmente não dava conta de manter a mente dela funcionando. Foi o que aconteceu no caso do carro. Ela o manteve funcionando por horas em sua capacidade máxima e o poder mágico não diminuiu. Foi a intoxicação alcoólica que reagiu de forma estranha com o poder e fez com que ela perdesse a noção do tempo e espaço.

Claro que isso surpreendeu a todos que conviviam com ela. Nunca houve um momento em que Cana não bebesse. Provavelmente só quando ela era criança, mas, como adulta, jamais. Ela sempre estava minimamente alcoolizada. Não era para o corpo ter se acostumado já? Essa ruptura era estranha e por isso começaram a especular o que poderia ter acontecido para desencadear esse processo.

Já corria na boca miúda que Laxus e Cana vinham se encontrando constantemente para fazer coisas adultas juntos. Era isso que ele dizia para sua tribo do trovão e ela diria para alguma amiga caso perguntassem, embora ninguém soubesse como perguntar a ela. Mas um dia Laxus sem mais nem menos terminou o acordo de adultos que tinham e em um primeiro momento, Cana tinha aceitado, embora seu emocional já estivesse bagunçado o suficiente para que pudesse ter controle de seus poderes latentes.

A maga não era muito de lidar com as emoções de forma direta, na verdade dificilmente magos eram confrontados assim, já que o que se esperava deles era sempre algo conectado com o seu poder, com a sua capacidade de fazer magia, contudo, nesse caso, a magia era um veneno, apesar de ser a essência de Cana. E por ser filha de quem era, todos estavam muito preocupados. Verdade seja dita, que se fosse outra maga com problemas, não teria toda essa atenção.

Só que nada disso fazia sentido para ela, já que os episódios de descontrole funcionavam como apagões ou sobreposições da realidade. Tanto que o término com Laxus não foi da maneira como ela pensa que foi. Ele sofreu muito porque ele tinha consciência que ele estava fazendo mal a ela, na verdade ele ainda estava sofrendo, já que tinha se apaixonado e se afastar dela foi muito doloroso. Só que era uma confusão sem igual e ele também precisava de tempo para pensar se o que sentia era apenas um tesão incontrolável ou se realmente gostava dela como pessoa. E não era justo com ela, essa confusão em um momento tão complexo.

Depois dessa explicação mental de eventos que passou pela cabeça de Gildarts em fração de minutos e Cana o olhando com um ódio jamais visto, considerando que ele é um pai completamente relapso, provavelmente ela percebeu que ele estava distraído enquanto ela estava reclamando e deve ter dito algo que a desagradou sem saber. Que complexa a vida do pai presente, não?

Cana, ignorando esse monólogo mental do pai, ficou estática o observando. Ele jamais viria caso não fosse sério. E se era sério, por que não estavam lhe contando nada? A marca do feitiço coçava em seu antebraço, uma irritação que vinha acontecendo já fazia algum tempo. Sempre que existia uma possibilidade de Cana ter uma espécie de ausência, a marca coçava até o ponto de sangrar, como se fosse uma alergia profunda. Quando a coceira começava, ela sentia como se desprendesse do corpo. “Aff, já que você está aqui, pode me dizer então o que está acontecendo? Por que estão todos prestando atenção em mim desse jeito? E por que tem toda essa equipe pronta para supostamente me concertar?”

“Bom, acho que isso é um pouco minha culpa. O conselho está de olho e você desde que descobriram a nossa relação sanguínea, também teve o fato de você conseguir conjurar o Fairy Glitter, nem que seja de forma incompleta..”

“Mas foi a Primeira que deu esse feitiço para mim pai, ele não significa que eu sou forte.”

“Minha filha, o poder mágico toma muito do corpo e da alma da pessoa e feitiços lendários como o Fairy Glitter, o Fairy Law não são para todas as pessoas. Você sabe que até mesmo Laxus, que é da linhagem direta do Makarov não conseguiu conjurar direito.”

“Só que o feitiço foi certo, ele não nos via como inimigos na época pai.”

“Mas mesmo assim filha. Você não é da linhagem direta da Fairy Tail. Sua mãe era cartomante, mas a magia dela era de outro tipo. E você é uma maga que precisa de instrumentos. Você não deveria ser apta a conjurar um feitiço desses e muito menos empunhar a marca assim. Você só consegue transitar por esses feitiços tão variados porque tem uma força latente muito grande.”

“Eu só uso cartas pai. Nada além disso. Esse feitiço é apenas genérico, eu não sou tudo isso.”

“Minha filha, é exatamente essa a questão. Você realmente é uma maga mediana, mas não deveria ser. Eu morro de orgulho de você, mas estou com medo de que algo aconteça. Algo que vai te ferir muito. O conselho veio falar comigo, sobre alguns pequenos trabalhos que você estava fazendo e que tiveram alguns momentos complicados, momentos nos quais você aparentemente não sabia o que estava acontecendo, a marca estava agindo de forma estranha. A questão do atropelamento do Laxus que você acha que foi tranquilo mas não foi filha. Não foi. A forma como ele se machucou e as outras pessoas que você machucou no caminho e nem se lembrava. A força do carro vem do seu poder mágico, inclusive a velocidade. Então tente assimilar o quão instável seu poder estava para que você quase matasse o Laxus. E você não ia nem saber.”

“E qual é a ideia? Para saber porque tudo isso está acontecendo?”

“Bom, o conselho gostaria que você ficasse 3 meses reclusa em uma casa de tratamento.”

“Reclusa por que?”

“Porque seus poderes vêm aumentando, seu corpo vem se fortalecendo, mas eles disseram que pode ter a ver com a bebida que você toma.”

“Mas você bebe também. Isso é completamente desproporcional. Eu sempre bebi.”

“Então..pode ser que esse sempre esteja cobrando seu preço.”

“Eu nem quero ser forte. Não quero. Por que eu tenho que parar de beber, é a única coisa que eu gosto.”

“Então é por isso que você precisa ir filha. Não é bom uma menina com tanto potencial, tanta magia, tanta experiência ter a única alegria em um hábito deplorável. Eles estavam a ponto de te considerar incapaz. E claramente é uma decisão muito drástica, por isso me chamaram e eu estou aqui para conversar com você. Sei que a nossa relação é nova e que não tivemos tanto tempo de convivência. Só que desde que nos reencontramos, o meu maior desejo é construir uma relação de pai e filha com você. Então eu imploro, tente o que eles estão sugerindo. Para que nós dois possamos ter uma chance. Faça isso pela sua mãe.”

“Não use o nome da minha mãe dessa maneira. Isso não é certo.”

“Estou usando porque eu sei que ela quer o mesmo que eu. Ela quer que você fique bem, foi por isso que ela te criou, que ela lhe ensinou a magia. Faça isso por ela.”

“Isso é uma chantagem emocional sem igual. Não tem a menor necessidade. Só que vou fazer. Pela minha mãe eu vou fazer. E você vai enfiar nessa cabeça e na cabeça de todos que eu sou uma maga mediana e que não precisa de absolutamente nada disso. E que não faz mal eu beber sempre.