Save Me

Sobre os escombros


— Combinamos um horário com o pessoal que está com o Batman – disse David de braços cruzados – vocês podem conversar no caminho entre Gotham e Metropolis.

Eram tantas coisas que estavam em minha mente para perguntar a meu pai, nem sabia por onde começar. Mas eu estava guardando tudo para perguntar a ele depois.

Todos já estavam na sala prontos para o tele transporte. Dinah segurava na mão o dispositivo que Victor entregara para realizar o processo, todos seguravam a mão um dos outros, de um lado eu segurava a mão de meu pai e do outro a mão do Hal, este segurava firme a minha mão e lançou-me um sorriso mostrando que ia dar tudo certo. O medo me rondava, mas eu estava confiante.

Dinah ligou o dispositivo, todos nós fechamos os olhos e eu senti uma luz muito forte nos invadindo. Quando abri os olhos já estávamos em um beco escuro de Gotham. O sol não havia nascido naquela cidade. O que podíamos ver é apenas algumas latas de lixo espalhadas naquele chão áspero e alguns camundongos rondando os cantos das paredes dos prédios que estavam próximos de nós. Um odor de urina subiu em nossas narinas me fazendo tampa-las. Aproximei-me de Dinah e perguntei:

— Quando sairemos daqui?

Lance olhou para o outro lado da rua e apontou para uma van velha e branca com um nome de um jornal não muito famoso em Gotham, que estava estampada na lataria do veículo e me respondeu:

— É naquela van que iremos para Metropolis.

— E onde encontraremos os outros? – perguntou Sub Zero com uma feição preocupada.

— Bruce pediu para que ficássemos na casa de Mary Batson que fica num apartamento próximo a entrada de Metropolis. – respondeu David – Ficaremos lá até o amanhecer.

Todos nós fomos até a van e entramos nela rapidamente. Hal foi para o volante enquanto David explicava com íamos atacar a sede do regime antes de eles saírem para atacar Atlantis.

(...)

Chegamos frente ao prédio onde morava Mary Batson. Entramos no edifício, que parecia bem antigo e de poucos andares. Ela morava no segundo andar e nem precisamos de elevador. David não precisou bater muito, ela logo abriu e deixou que entrássemos.

— Alguém viu vocês? – perguntou Mary fechando a porta atrás de si.

— A rua estava deserta – respondeu Dinah tirando o casaco – Não se preocupe.

Como não tinha muitos lugares para se sentar, a maioria sentou no chão como podia.

— Me perdoe por não acolherem vocês como eu queria – Batson se desculpou esfregando a mão uma nas outras e passando para nós uma sensação de nervosismo.

Eu estava me acomodando no chão quando ela cravou o olhar em mim e principalmente no símbolo em que eu carregava no peito. Ela engoliu seco e disse:

— Vou buscar algo para vocês comerem.

Em seguida ela saiu indo direto para a cozinha sem dizer mais nada. Encostei-me na parede e não conseguia tirar da memória o jeito que ela me olhava. Meu pai sentou-se ao meu lado e disse:

— É por causa do brasão.

— Do brasão? Como assim? – perguntei atônita.

Meu pai suspirou e respondeu olhando para o chão:

— Kal matou o irmão dela anos atrás. Ela é irmão do Billy Batson ou Shazam, como preferir.

Senti um aperto no peito, foram tantas as vítimas do meu primo que não imaginava que ela também fora vitima de Kal. Levantei-me de ímpeto, meu pai segurou meu pé e perguntou:

— Aonde vai?

— Preciso falar com ela!

Saí e fui para cozinha e a encontrei fazendo umas torradas. Aproximei-me dela e perguntei:

— Precisa de ajuda?

Ela secou as lágrimas com uma das mangas da blusa e respondeu sem olhar para mim.

— Não precisa. Obrigada!

Passei a mão pela pia que estava molhada e fiquei observando aquela água se deslizando e caindo no ralo. Voltei meu olhar para ela, mesmo sem ela me olhar e disse:

— Eu quero te pedir perdão...

Mary tossiu e disse com sarcasmo:

— Só deixei vocês entrarem no meu apartamento a pedido de Bruce.

— Mary – toquei o ombro dela, mas repeliu instantaneamente.

— Não toque em mim – respondeu com aspereza – sei do que vocês são capazes.

Afastei—me um pouco e disse:

— Nós... Nós não somos assim, nós kryptonianos...

— Era isso que seu primo dizia no começo de toda essa merda! – disse Mary se voltando para mim com uma feição de raiva – Ele prometeu que a violência ia acabar, as guerras teria fim e olha o que está acontecendo? Só porque meu irmão não concordava com as ideias malucas do seu primo ele foi morto! Uma morte estupida! Você tem noção do que Kal fez? Ele acabou com a vida de muitas pessoas que o idolatravam. Billy o admirava...

Mary parou de falar, pegou um cigarro que estava na gaveta, acendeu-o e deu um trago. Eu encostei na parede e fiquei observando-a fumar e as lagrimas começaram a descer pelo meu rosto. Quando ela jogou a bituca de cigarro no lixo eu disse a ela:

— Eu também perdi alguém muito importante da minha família.

— Fora os que morreram na invasão de Brainiac?

— Sim.

— Quem?

— Meu primo Kal!

Mary se voltou para mim e ficou me olhando, suas lágrimas não paravam de cair e eu continuei:

— Quando eu o conheci ele já estava consumido pelo ódio e pela vingança. Ele já estava morto e... Sua alma já estava em decomposição avançada.

Aproximei-me dela e continuei:

— Em nome do meu primo eu quero te pedir perdão pela morte de Billy Batson. Tenho certeza que ele foi um cara incrível e teria sido para mim uma honra tê-lo conhecido.

Ela balançou a cabeça se afastando de mim dizendo:

— Vocês... vocês são todos iguais.

Afastei-me mais dela e disse:

— Vou deixar você em paz.

Em seguida saí da cozinha deixando-a só e parei numa janela, onde havia uma cortina cobrindo a minha visão para fora. Limpei o restante das lágrimas que ainda estavam em meu rosto. Meu pai se aproximou de mim e lamentou:

— Pelo visto não deu certo.

Dei um sorriso sem graça e disse:

— Eu tentei.

— A comida chegou! – gritou David chamando a atenção para a mesa, onde havia uma grande jarra de um suco alaranjado e uns aperitivos.

Quando estávamos terminando de comer um chamado foi ouvido no único rádio que o grupo tinha. E David se aproximou do aparelho, eu podia escutar a voz de Selina Kyle.

— Arraia! Preciso que monte um grupo pequeno para vir até o centro de Metropolis. Acabamos de receber a notícia de que Cyborg foi descoberto e está em cativeiro.

Todos os presentes pararam o que estava fazendo após ouvir sobre Stone. Arraia perguntou:

— Quem está no centro de Metropolis?

— Diana e Robin. É provável que Kal apareça logo mais, ele fará um pronunciamento. Eu estou no alto de um prédio antigo observando tudo. Alguns dos nossos já estão apostos, Barry auxiliará Victor a fugir.

O que eu temia é que tenham feito algum dano a Victor, mas a minha fé estava maior que o meu medo. Respirei fundo e disse:

— Eu posso ir.

David me olhou de relance, depois olhou para os demais e perguntou:

— Mais alguém?

Hal e Sub Zero se voluntariaram a me acompanhar.

(...)

Estávamos saindo do apartamento de Mary, Hal formou um constructo com o anel para levar o ninja. Perto de uns escombros abandonados vi um homem que caminhava sobre eles. Todos nós paramos e perguntei a Hal:

— Quem é aquele cara?

— Veja quem é – respondeu Hal pousando a mão em meu ombro – iremos à frente. Não se esqueça de ligar o comunicador que David colocou em você.

Arraia colocou em cada um de nós uma escuta para a comunicação

Fui em direção aquele homem enquanto ligava a escuta e eu me aproximava, estava reconhecendo-o. Sim era Kal. Pousei no chão e ele foi se aproximando de mim, sua capa balançava dançando com o vento e uma feição de ódio se formou em seu rosto. Ele não parecia tão carismático como ele se mostrava com o povo.

— Finalmente nos encontramos Kara! – ele disse lançando um olhar de fúria contra mim.

Estava frente àquele que por vontade própria se tornou meu pior inimigo, era o que eu menos queria, meu próprio primo. Aquilo doía em meu coração, mas eu não podia mais impedir o que estava acontecendo. Pela sua feição ele estava prestes a me enfrentar e se possível acabar comigo, como ele fez com tantos que se opuseram a ele.

Aproximei—me mais dele e perguntei:

— Por que não podemos resolver isso numa simples conversa Kal?

— Já tentei isso – Kal respondeu lançando um olhar frio em mim – pensei que você finalmente ia colaborar ao se casar com Arthur, mas fui traído mais uma vez por alguém que eu pensava que estava ao meu lado.

— Você faria isso como forma de punição para mim! Sabia que eu amo outro homem.

— Como você é tola! – exclamou Kal num tom e zombaria – Sabe muito bem que Jordan só quer transar com você e depois sair fora, como ele sempre faz!

Soltei o ar que tinha em meus pulmões e tentei não rebater, o que menos queria era estender esse assunto.

— Kal você está cego pelo rancor e pelo ódio – me aproximei dele com os olhos turvos pelas lágrimas que queria sair e meus cabelos desfiados cobrindo parte do meu rosto – Eu não pude conhecer você antes da bomba que explodiu Metropolis, mas eu imagino que você era uma pessoa bondosa e amiga de todos.

— Mas eu ainda sou – Kal respondeu – numa forma diferente.

— Perdão, mas não consigo enxergar bondade em você. Matar inocentes é bondade para você?

— Não matei pessoas inocentes! – ele vociferou – são seres que mereciam tal sentença, eles prejudicaram o andamento de um projeto que ia acabar de vez com a violência desse planeta. Temos que eliminar as maçãs podres do cesto!

— Você está doente, Kal! Precisa de um tratamento urgente de um profissional!

Kal soltou uma risada esnobe e disse:

— Você chega a ser patética, sabia? Se eu tivesse esse pensamento que tenho hoje há mais anos eu teria evitado a perda de Lois e de tantas outras pessoas...

— Tenho certeza que Lois não casaria com um cara como você – eu disse com os punhos cerrados quase machucando a palma da minha mão com as minhas unhas – E alguém já teria dado cabo de sua vida!

Não sei de onde veio àquelas palavras, mas não me arrependi de tê-las dito!

Kal se calou, ficou com a boca entreaberta com a intenção de falar algo, mas logo a fechou voltando seu olhar para o chão. Naquele momento queria saber no que ele estava pensando.

Em seguida ele se voltou para mim e disse:

— Ok! Vamos conversar, mas iremos para a Fortaleza da Solidão.

— Como quiser!

De repente ouvi a voz de Hal Jordan em meio a uma rajada de tiros de metralhadoras no ponto que disse:

— Resolvi não ir atrás de você, pois imaginei que você e o Super tem muito para conversar. Só peço a Deus que você não se machuque. Boa sorte.

Não transpareci a meu primo que alguém falava comigo naquele momento. Apenas engoli seco.

Acompanhei-o num voo super sônico até o local onde deveríamos lutar – A fortaleza da solidão. Pelo menos ele tinha consciência de que não poderíamos lutar em Metropolis, aquela cidade já havia sofrido demais com os poderes dos meta humanos.

Chegamos lá e estávamos ali um olhando para o outro, naquela fortaleza gélida. O chão tinha a aparência de um gelo fino, mas estava bem firme sob nossos pés. Kal me encarou e disse:

— É uma pena que não queira se juntar a mim de uma maneira mais fácil.

— Sou contra a opressão que você quer fazer nas pessoas desse planeta. Você mancha a casa El!

— Como ousa falar tal coisa?

— Seu pai morreria de vergonha ao ver tudo isso – eu disse com lágrimas nos olhos.

— Vou acabar com você agora! Já me cansei disso!

Em seguida ele veio voando para me derrubar, mas eu levitei e desviei do seu caminho. Sem titubear fui ao seu encontro e me lancei sobre ele dando vários socos em seu rosto, a revolta pela morte de tantos inocentes viera a tona e quando percebi minha mão estava suja de sangue, o sangue El. Eu parei e olhei para ele com o rosto todo ensanguentado, ele sorria para mim e dizia:

— O Batman vai ficar chateado com você se me matar.

Engoli seco e lembrei-me do que Raiden tinha me falado algumas horas atrás. Sai de cima de Kal, me afastei para que ele pudesse se levantar e eu dizia:

— Vamos parar com isso!

— Eu trouxe você aqui não para conversar, mas para outra finalidade!

De repente ele voou numa velocidade e acabei indo ao chão. Kal estava sobre mim e segurava meus pulsos, seus olhos ficaram com o brilho vermelho e ele me disse com uma voz gutural:

— Você sentirá a dor de ter me desafiado. Sentirá o mesmo que Billy Batson.

Naquele momento passou um filme na minha cabeça sobre a dor que Mary estava sentindo ainda pela perda de seu irmão Billy. O que ele me disse naquele momento foi um insulto, um insulto esnobe e soberbo. Os raios de calor estavam para sair de seus olhos e atingir o meu crânio quando tomei um impulso e com a força o empurrei para cima. Eu achava que ele ia voar, mas percebi que ele estava caindo e caiu fazendo o formato de uma parábola de mim até o local da queda. Fiquei deitada por alguns instantes até ele voltar, mas ele não voltou. Levantei-me com dificuldade e fui até a beira do penhasco de cristal e fui ver o que havia acontecido com Kal. Será que ele fugiu? Desistiu? Ele não era um homem de desistir.

Quando cheguei a beira do penhasco eu consegui vê-lo. Mas não conseguia acreditar no que via. Ele caiu em cima de um cristal pontiagudo transpassando-o fazendo com que aquele cristal ficasse coberto de sangue. Os braços dele ainda balançavam, mas era para mostrar que ele lutou para sair dali, mas foi em vão. Sim, Kal-El estava morto.