Rock Forever

O lance era não sentir.


" O coração não é um controle remoto, o qual você pode desligar quando preferir, na verdade, o coração é interessado em conteúdos impróprios, como se apaixonar por pessoas erradas. "

Apartamento do Zapata/São Paulo

Pov Alicia Gusman

Senti a luz do sol invadir os meus olhos e um ardência incômoda embaçar minha visão, e claro, acompanhada de uma adorável dor de cabeça e um ronco na barriga, me sentei na cama e cocei os olhos, logo pude reconhecer o apartamento do Daniel.

Vários flash da noite anterior retornaram a minha mente, fazendo meu coração se apertar e minha visão voltar a ficar embaçada, dessa vez pelas lágrimas teimosas que molhavam a minha bochecha, eu havia sido fraca novamente, depois de tanto tempo, meu Deus, depois de tudo eu ainda fui capaz de ter uma recaída, que tipo de idiota eu sou? Senti como se estivesse nadado pra morrer na praia, as minhas mãos coçavam e uma vontade incontrolável de provar aquela maldita substância dominou o meu corpo, aquele vício me mataria aos poucos.

Eu deveria saber que seria assim, bastaria um simples click para que toda aquela horrível dependência voltasse, me sentia presa em um buraco sem fundo, me enforcando com as minhas próprias mãos, e por mais que eu insistisse em me manter viva, o vício pela cocaína era mais forte que qualquer razão, suspirei limpando as lágrimas e tentando eliminar meus pensamentos, só então me dei conta de que Daniel não estava no quarto, dominada pela minha típica curiosidade sai pela porta, entrando na cozinha e dando de cara com uma cena surpreendente.

— Bom dia. – Daniel disse logo notando a minha presença, ele sorriu retirando um avental sexy que cobria seu corpo.

Encarei tudo aquilo assustada, finalmente voltando para a realidade, o Zapata estava parado na minha frente com um sorriso enorme no rosto, um perfume inebriante que invadia toda a cozinha e os cabelos molhados, indicando que havia acabado de sair do banho, uma calça de moletom cinza e o peitoral desnudo, ao seu lado estava a mesa, cheia dos mais variados tipos de pães, bolos e sucos, enfeitada com um jarro de flores e algumas frutas, queijo, presunto, manteiga, nutella, geleia de uva e outros mais complementos, seria bizarro dizer que meu estômago sorriu vendo tudo aquilo?

— Bom dia. – levei as mãos a boca surpresa. – O que significa isso? – falei ainda observando a mesa.

— Bem, está perguntando sobre a mesa ou sobre a minha incrível beleza matinal? – Daniel perguntou risonho e se aproximando de mim.

— Sobre a sua incrível beleza matinal. – falei revirando os olhos e ele envolveu a minha cintura com as mãos.

— É, acho que está perguntando sobre a mesa. – Daniel disse rindo sobre a curva do meu pescoço e senti meu corpo arrepiar. – foi só um agrado que eu quis fazer, mas, não ouse se acostumar ou ficar se sentindo. – disse irônico.

— Tarde demais, já estou me sentindo. – joguei os cabelos para o lado e me soltei dos seus braços. – estou arada de fome, também. – falei caminhando até a mesa e pronta para atacar.

— Nada disso mocinha, primeiro vá fazer suas higienes matinais, você está horrível. – Daniel disse ficando na minha frente.

— Obrigada pelo elogio. – falei me fingindo de ofendida.

— Eu estou brincando, pra mim você sempre está linda, porém, essas roupas estão mexendo com a minha sanidade. – Daniel disse piscando para mim e eu gargalhei.

Só então percebi que estava usando apenas uma camisa social branca dele e as minhas peças íntimas, a camisa era grande e ia até a metade das minhas coxas, o Zapata riu ao ver a minha surpresa e deixou um beijo carinhoso na minha bochecha.

— Comprei aspirina, caso a sua dor de cabeça esteja muito forte. – disse Daniel sorrindo e indo até o balcão, onde preparava um sanduíche.

A mesa. A roupa. O remédio. O beijo. Nenhuma dessas coisas faziam sentindo para mim, adorava tudo aquilo, mas, não era assim que nos tratávamos, não era assim que ele deveria me tratar, aquilo era preocupação, cuidado e carinho, coisas desse tipo não são oferecidas a um simples objeto de prazer, há não ser que exista algo mais do que aquela enorme atração, aquela atração que costumava ser a única coisa que nos movia, já que hoje eu não tenho tanta certeza que as coisas ainda são assim.

Em silêncio, caminhei em direção ao quarto e me despi, coloquei uma toalha qualquer e entrei no box, ligando o chuveiro e ajustando a temperatura, minha cabeça estava confusa demais, dessa vez, por culpa de uma outra droga, a droga humana que sempre me viciou, Daniel Zapata. Uma coisa eu sabia, não fazia parte dos meus planos sentir ciúmes dele com a Maria Joaquina, tão pouco fazia parte dos meus planos sentir saudade, afeto e muito menos carinho por ele, e tenho certeza que não fazia parte dos planos de Daniel também, não podíamos nos envolver, não desse jeito, não dessa maneira.

O lance era não sentir.

Daniel e eu não daríamos certo, o máximo que poderíamos ser era o que já éramos, ou seja, um casal movido por puro sexo e prazer, sem compromisso algum, nós não poderíamos ser nada além disso, nossos sentimentos não podem ser misturados, é como duas substâncias químicas que exigem um certo limite, porque ficar perto demais pode causar uma explosão ou um dano irreversível, é como encaixar uma figura redonda em um buraco quadrado, não poderia se emendar, a menos que uma das duas se deforme, mude, mas, elas não poderiam ser encaixar sendo as duas da forma que são, acho que essa é a comparação mais lógica e descritível que encontrei, ela literalmente se encaixo no nosso caso, Daniel e eu não poderíamos ficar juntos, sendo nós dois o que somos, é como um cálculo friamente calculado.

Mansão RF/São Paulo

Pov Valéria Ferreira

Paulo e eu tomávamos café da manhã em silêncio, volta e meia sorriamos tímidos um para o outro, o lado esquerdo do meu rosto e bem abaixo do meu olho latejava, foi difícil acordar antes de Paulo e cobrir o machucado com uma maquiagem, eu tinha medo que ele percebesse, na verdade, a vontade que eu tinha era de acabar com tudo, contar logo de uma vez o que havia acontecido ou até mesmo ir a uma delegacia, mas, eu não podia fazer isso, iria acabar com tudo, e não era dessa maneira que eu queria que as coisas fossem descobertas, na verdade, eu não queria que as coisas fossem descobertas de jeito nenhum.

Saber que o garotinho dos cabelos encaracolados que um dia havia gravado as nossas iniciais em uma árvore havia me batido era como sentir uma facada profunda em meu peito, doía tanto que eu sentia que a qualquer momento iria desmoronar, Davi havia feito com que eu me sentisse humilhada, fraca e quebrada, uma pessoa que eu não era, que não fazia parte de mim, e ele? Bem, eu o via frio, possessivo e agressivo, uma pessoa que ele não era, Deus, nós mesmos nos destruímos daquela maneira, aquele relacionamento deveria ter acabado a tempo de sentirmos coisas boas em relação um ao outro, não daquele jeito, cheio de culpa e angústia, era algo tão bonito que se transformou em um caos.

— Está tudo bem? – ouvi a voz preocupada e doce de Paulo me chamar, e encarei seus olhos buscando algum tipo de conforto.

— Sim, está. – sorri fraco e ele segurou a minha mão por cima da mesa.

— Me diga, nós estamos bem? – Paulo perguntou sem desviar seus olhos do meu e borboletas dançantes apareceram no meu estômago.

— Eu não sei, me diga você, estamos bem? – perguntei encarando suas órbitas castanhas e ele sorriu lindamente.

— Só se você quiser. – Paulo disse ainda com aquele sorriso que eu tanto adorava.

— Sendo assim, eu quero.— falei sorrindo de volta.

E sem mais delongas, o Guerra se levantou e segurou minhas mãos, me impulsionando a levantar da mesa também, Paulo segurou a minha cintura com uma das mãos e com a outra segurou a minha nuca, aproximando nossos lábios e me tomando em um beijo carinhoso e cheio de saudade, me senti segura e leve em seus braços, aos poucos, fomos aprofundando o beijo e nos perdendo naquele mar de desejo, não queria questionar tudo que estava acontecendo conosco, eu só queria senti-lo e saber que ele estava comigo, porque em seus braços era onde eu queria estar.

Pov Maria Joaquina

Abri os olhos com cuidado, logo me arrependendo assim que senti a forte luz do sol refletida pela janela embaçar minha visão, fechei os olhos com força e me virei para o lado oposto da cama, pude sentir minha cabeça latejar um pouco e culpei as malditas bebidas que consumi ontem à noite, abri os olhos devagar e me surpreendi com o que vi, Duda estava dormindo calmamente em uma poltrona branca em frente a cama, fique em êxtase, ele havia passado a noite ali?

Desci da cama com cuidado e corri para tampar a enorme janela de vidro com a cortina, logo me sentindo aliviada por não ter toda aquela luz dentro do quarto, o bom de tudo era isso era saber que eu tinha o meu próprio quarto na mansão, com algumas roupas providenciadas por Cirilo e tudo mais, já que eu passava bastante tempo na mansão e tinha até meu próprio estúdio para compor, era agradável.

— Bom dia. – escutei a voz rouca de Duda e me virei em sua direção, ele coçava os olhos com as costas das mãos e os cabelos estavam perfeitamente bagunçados.

— Bom dia. – falei sorrindo e ele pareceu surpreso.

— Olha, eeeerr... você exagerou um pouco na bebida e eu te trouxe pra cá, acabei dormindo aqui na poltrona porque sou um desastrado, me desculpe, e antes que pergunte porque eu te trouxe pro quarto de hóspedes que foi preparado pra você, quero que saiba que não houve nenhuma má intenção... na verdade, eu só queria ajudar.... você estava fora de controle e tive medo que aqueles homens imbecis e tarados fizessem alguma coisa, você dançou em cima de uma mesa e eu... bem, resolvi te trazer para evitar que fizesse algo mais sério. – Duda disse coçando a nuca e antes que eu pudesse responder, ele continuou nervosamente, com a voz trêmula. – me desculpe, me desculpe mesmo.

— Você sempre acorda tagarelado assim? – perguntei arqueando as sobrancelhas e ele me olhou com um olhar confuso. – está tudo bem Duda, na verdade, eu tenho é que agradecer pelo que você fez. – falei e ele suspirou aliviado, sorri em adoração.

— Uh, e-eu... não precisa agradecer. – Duda disse de um jeito atrapalhado e eu estranhei seu nervosismo.

— Mas, me diga, quer dizer que eu dancei em uma mesa? – perguntei cruzando os braços e fingindo uma expressão surpresa.

— Sim, e ainda quis tirar a roupa. – Duda disse me olhando sério e eu arregalei os olhos, fingindo estar assustada.

— Oh meu Deus! aí que vergonha. – dramatizei, mesmo sendo péssima com mentiras. – então, eu fiquei pelada? – perguntei.

A expressão de Duda com a minha pergunta foi incrível, ele me olhou com os olhos arregalados e suas bochechas ficaram mais vermelhas que um pimentão, ele parecia raciocinar sobre o que responder.

— Não, de jeito nenhum. – ele negou com a cabeça. – na verdade, você só tirou a parte de cima. – Duda disse olhando para o chão.

— O que? Você viu meus seios? Seu pervertido! – falei indignada e soltando um gritinho baixo na última parte.

— Aí caramba... – Duda resmungou escondendo o rosto com as mãos e eu controlei minha voltando de gargalhar do seu desespero. – eu não vi, eu juro, você estava de sutiã, é sério Maria, eu não vi, eu realmente não vi os seus.... Ah meu Deus, você entendeu. – ele disse aflito.

Gargalhei alto, jogando minha cabeça para trás e tentando não apertar as bochechas daquela criatura fofa na minha frente, parecia uma criança envergonhada, aliás, fazia tempo que eu não ria assim, tinha até me esquecido como era isso, Duda me encarava com uma expressão confusa e cômica, o que só me dava ainda mais vontade de rir, porém, me controlei e fui recuperando o fôlego aos poucos.

— Duda, eu estou brincando tolinho... – falei segurando suas mãos e o impulsionando a levantar, Duda se levantou confuso. – eu me lembro de tudo, não estava completamente bêbada na verdade, só um pouco animada. – falei encarando suas órbitas carameladas.

— E aquelas coisas que você me falou? – Duda parecia cada vez mais confuso e eu sorri largamente.

— Eram verdade, você estava lá, me ajudando e eu queria desabafar com alguém, e também podia usar o pretexto da bebida e fingir que não lembrava de nada no dia seguinte. – falei sincera.

— Okay, e porque não continuou fingindo que não lembrava? – Duda perguntou confuso e eu sorri.

— Porque eu queria que você soubesse que eu confio em você, já que ontem você me deu provas suficientes de que tem consideração por mim, e eu quero poder contar com você. – falei encarando seus olhos e sorrindo largamente.

— E-eu não mereço a sua confiança, nem tão pouco a sua amizade. – Duda disse desviando seus olhos dos meus e encarando o chão. – me desculpe Maria Joaquina, me desculpe. – ele disse com a voz falha e embargada.

— Duda? O que está havendo? Você merece sim a minha amizade e confiança. – falei sem entender a sua atitude.

— Não, eu não mereço! – Duda disse negando com a cabeça e pude ver seus olhos marejarem e em seguida ele me olhou nos olhos. – você é uma pessoa incrível e mereço muito mais do que isso, e eu sou um babaca por nunca ter percebido isso, Maria, eu não mereço nada que venha de você e talvez um dia você entenda o porquê. – ele disse virando de lado e dando um passo em direção a porta.

Antes que Duda desse mais um passo eu segurei seu braço com força, fazendo o mesmo me encarar e o abracei pelos ombros, fazendo ele segurar a minha cintura e abaixar o rosto, estávamos próximos demais e eu apenas segurei cada lado do seu rosto com uma das minhas mãos, fazendo Duda me olhar nos olhos.

— Há algo que queira me contar? Me diga Duda, por favor. – falei quase em um sussurro e uma lágrima solitária desceu do rosto dele. – olhe nos meus olhos e me diga. – falei o encarando com o rosto quase colado no seu.

— Maria Joaquina, o Davi... – antes que Duda pudesse continuar a porta do quarto foi aberta brutalmente.

— Que porra está acontecendo aqui? – a voz raivosa de Davi soou pelo quarto e meu coração deu um pulo de susto.