Inglaterra – 1845

Edward

— Bom dia senhor. – meu secretário entrou em meu escritório fazendo uma pequena reverência antes de colocar as correspondências em cima da mesa. Sorri vendo a carta de Tânia, foi a primeira que peguei. Coloquei próximo ao rosto sabendo que ela gostava de ter seu perfume nas cartas, abri com o abridor ansioso para ler suas palavras de carinho.

“Meu amado,

como sinto falta das nossas manhãs. Acordar com a cama vazia tem sido um desafio a minha sanidade. Tenho pensado muito em nossos passeios nos parques e nos bailes que fomos na última temporada. Como fui invejada pelas moças por tê-lo ao meu lado.

Tenho é claro tido algumas noites divertidas com alguns de nossos amigos nas noites mais quentes, mas todos sentimos a sua falta.

Obrigada pelo cordão que enviaste como símbolo de sua saudade, usarei com o vestido novo que me deu.

Eternamente sua,

Tânia.”

Olhei novamente a carta sentindo falta de sua risada e sorrido quando estávamos em algum momento íntimo e como ela era o centro de alguns bailes mais abertos quando poderia levar ela sem que isso causasse escândalo. Tirei de uma gaveta uma caixa e entreguei ao meu secretário que me olhou com um questionamento silencioso.

— Faça com que chegue a senhorita Tânia por favor. – havia escrito uma carta anterior e selado. Ele os pegou com uma seriedade típica. Era apenas uma pulseira de brilhantes que combinaria perfeitamente com o colar, não conseguia controlar a ansiedade de vê-la usando.

— A amiga de sua mãe senhor.

O olhei tentando lembrar, mas não consegui de imediato e ele percebeu minha confusão.

— Sua mãe avisou que uma amiga dela irá morar com ela em Berkshire com ela mês passado. Elas irão passar algumas semanas aqui enquanto tudo da moça chega.

Eu estava em Gloucestershire em nossa casa de campo, mamãe amava essa casa. Ela e papai tinham tido ótimas temporadas de repouso longe da agitada Londres e seus infinitos compromissos, como Duque de Devon e primo de terceiro grau da Rainha ele tinha vários compromissos. Quando ele morreu há uns anos ela se refugiou aqui.

— Chame minha mãe por favor. Ainda não entendi como isso funcionará já que essa é uma das propriedades mais distantes que temos e ela ama essa casa.

— Claro senhor. – ele saiu com uma reverência simples.

Vi algumas notas de pagamentos, assinei algumas cartas e a porta de abriu mostrando mamãe sorridente como há tempos não havia. Ela usava um vestido claro muito caseiro e simples, mas seus cabelos estavam bem arruamos em um coque muito bonito.

— Edward, estou ocupada querido. – ela disse fechando a porta e nem se sentando.

— Queria saber de sua amiga. Pensei que fosse apenas uma temporada, mas pelo que vejo você vai se mudar.

— Querido se passasse mais tempo comigo e não em Londres festejando o quê eu não sei, saberia que me sinto solitária.- olhei para ela estranhando esta informação, ela vivia bem aqui. Foi escolha dela se mudar e ela realmente conseguia ter uma vida bem movimentada para quem morava numa casa de campo - Isabella é filha de uma grande amiga minha. Ela ficou viúva há alguns meses e trocando correspondências a chamei para morar comigo em Berkshire.

— A propriedade mais distante que temos. Sem contar como ela é grande e a senhora sempre reclamou do exagero dela.

Mamãe parou para pensar, me lembrou um pouco de algumas conversas que ela tinha com meu pai, de como ela fazia essa mesma expressão para convencer ele de algo.

— Edward a propriedade ainda é da família? – disse séria.

— Claro que sim mãe. E está muito bem cuidada. – tentei parecer o menos ofendido possível.

— Então não vejo motivos para ficar aqui.

— A senhora ama essa casa.

— Isabella já enviou suas bagagens para lá. Pedi ao seu secretário semana passada para enviar empregados para ajudar no que fosse necessário. Você pessoalmente assinou uma carta permitindo a contratação de novos empregados e de uma reforma.

Eu precisava ler melhor o que assinava. Me ajeitei na cadeira respirando um pouco mais pesado.

— Reforma?

— Sim.

— E essa sua amiga.... aceitou morar há cinco dias Londres?

— Sim. – ela disse vitoriosa. – Iremos fazer companhia uma à outra.

— Na maior propriedade de nossa família.

— Qual seu problema com a propriedade? – ela disse cruzando os braços. – É distante, estaremos há cinco dias de Londres, uma viagem relativamente curta daqui e ainda poderemos ter a paz que ela precisa.

— Paz? Ela não gostaria de conhecer nossos amigos e até mesmo frequentar uns bailes?

— Isabella definitivamente não precisa disso.

Aquilo me intrigou.

— Ela morava onde com o marido? Não me recordo dessa filha de sua amiga.

— Na França. O marido dela era francês e ela casou com ele muito nova. Foi algo que talvez ela nunca supere a perda dele. – a voz de mamãe soou um tom mais baixo e pensativo no final.

— A família dele não a quis abrigar? Deve ser uma viúva rica.

— Todos os bens foram confiscados pela família dele. Jacob era um homem...

— Confiscados? – me assustei com isso. – Por que a família a deixaria sem nada?

— Eles não tiveram filhos Edward, pelas leis francesas ela ficaria apenas com bens pessoais. O que no caso deles era nada.

— Isso é ridículo. Ele não cuidou de nada para assegurar a ela uma vida depois de sua morte?

— Acho que ninguém espera e se programa para morrer aos vinte e quatro anos Edward. – disse mamãe séria. – E ela é minha protegida a partir de agora.

— Protegida? Tem ciência do que isso significa?

— Que ela tem um ducado inglês para fazer da vida dela algo mais que agradável.

Eu olhei os olhos de minha mãe. Ela tinha a proteção de um animal. Seus olhos ferviam em palavras que ela não ousaria me dizer.

Olhei para o lado tentando imaginar como isso funcionaria.

— Ela tem quantos anos?

— Vinte.

A olhei.

— Ela tem vinte anos?

— Sim.

— Ela é uma jovem viúva.

— Isso está se tornando repetitivo querido.

— Ela será sua protegida, tem vinte anos. Acha que ela não será cortejada mesmo sem dote?

— Isabella não precisa Edward. – ela disse sem paciência. A porta se abriu depois de duas batidas. Meu secretário abriu e nós dois relaxamos.

— Os empregados precisam da senhora Condessa, as flores silvestres chegaram e os lençóis também. O marceneiro que contratou também está esperando suas instruções.

Levantei rápido.

— Mamãe não estamos recebendo a Rainha.

— E nem somos miseráveis que não possa gastar com o que bem entender.

Ela saiu sem ao menos esperar mais alguma palavra.

— A caçada senhor, as confirmações chegaram.

Tinha me esquecido que estava com esse evento marcado. Vários de nossos amigos viriam para uma caça em nossa propriedade.

— Minha mãe ajeitou tudo que era preciso?

— Sim, os quartos, os empregados, a louça para cada refeição, os cozinheiros extras chegaram e também alguns ajudantes.

Fui até a janela olhando a entrada da nossa residência. Ela era o orgulho de papai, ele fez várias reformas ao longo dos anos fazendo questão de mantê-la sempre linda para mamãe. Os vasos mais caros, os quadros mais raros e alguns de nossos aniversários foram comemorados aqui. Ela foi uma Condessa exemplar, sendo elogiada por tantos motivos e inesquecível para uma corte de sua época. Lembrei de quando papai faleceu de como ela ficou semanas apenas trancada no quarto olhando para tudo que pertenceu a papai, como sua beleza se desfez nos primeiros meses. A ver hoje foi com reviver um dos seus melhores dias.

Fiquei parado olhando a paisagem deixando meu secretario esperando as próximas ordens, uma carruagem se aproximava e alguns empregados se alinharam. Percebi que mamãe também estava ali parada mais a frente esperando ansiosa. Não sabia nada dessa mulher que iria agora ser nossa protegida.

— Sabe algo sobre essa Isabella?

Não me virei ainda olhando a cena curioso.

— Ela casou com um francês de uma família renomada, segundo consegui descobrir, viviam uma vida discreta e um casamento bem harmonioso. A família ficou com tudo que pertencia a ele e ela voltou para Inglaterra apenas agora pelo que soube. Não havia notícias dela por meses.

— Nada mais?

— Ela é uma pessoa pouco conhecida senhor. Ninguém fala muito dela. O marido que era conhecido por seus estudos. Publicou muitas coisas em vários lugares, as universidades lutavam para uma visita dele.

— Ele então era um estudioso que vivia da fortuna da família. – falei o encarando.

— Provavelmente.

— E ela ficou sem nada. – refleti vendo a carruagem parar. Dela saiu uma mulher vestida de preto. Não tinha como ver seu rosto, ela usava um traje muito fechado e preto.

Viúva. Mamãe a abraçou apertado, talvez vendo nela sua própria dor.

— A quanto tempo é viúva? Sabe dizer?

— Há mais de sete meses senhor.

Olhei a roupa estranhando.

— Ela ainda veste preto. O luto fechado é de três meses.

Olhei para ela tentando ver seu rosto, mas não consegui. Ela estava ainda falando com mamãe e apenas sua pele pálida se destaca. Isabella.

Copy