Raios De Luz

Planos Lua e do Sol


Depois daquela revelação toda de Falk, fomos dormir, digo, eu fui dormir. Ele só foi para o seu quarto ficar andando de um lado para o outro.

Coloquei uma calça de moletom, o casaco do conjunto e deitei na cama. Era muito confortável e tinha um cheiro de pinho, imaginei que a cama de Falk teria o cheiro da floresta, o cheiro dele.

Em suma, quando descobriram que minha família era essencial para a sobrevivência de todos, pararam de caça-los, porém quando a minha própria família descobriu que não poderiam ter filhos com outros focos se não eles mesmos – e acho que eles não cometeriam tal atrocidade -, pararam de se reproduzir, dedicando suas vidas para proteger do tempo àqueles que eram mais necessários.

Minha dinastia era da Luz. Não sei o que isso significa, não sei se é algo físico como a luz do sol, ou algo menos prático. Eu queria respostas, queria soluções, coisas que Falkon não me dava tão fácil.

Eu, sendo o resultado de um foco com um humano, imaginei como seriam os focos. Meu pai parecia normal, mas agora que sei, lembro que sempre imaginei certa aura dourada em volta dele.

Lembro que Falk já falou algo sobre meu pai ser um príncipe. Então ele tinha poder, né, talvez pudesse criar alguma casca, alguma aparência falsa. Mas não quis me agarrar a essa ideia.

Acabei dormindo, pensando em como seriam os focos. Será que eles tinham asas longas e brilhantes?

...

No dia seguinte, acordei me sentindo mal. Estava nevando um pouco, abracei meu corpo e fui até a cômoda onde eu tinha colocado as minhas roupas. Coloquei um casaco e puxei o capuz para cima de minha cabeça, tapando os meus olhos. Enfiei qualquer calça jeans que vi, percebendo depois que era uma calça de um jeans escuro. Enfiei minhas botas de cano médio, transpassei a bolsa e desci as escadas me arrastando, segurando o corrimão.

Falk estava sentado debruçado no balcão, com a cabeça enterrada nos braços. Estranhamente, depois que entrei no mesmo recinto que ele, me senti melhor. Falk levantou a cabeça e me observou apoiada no corrimão.

Ele se levantou e correu até mim, me abraçou pelos ombros e a onda de arrepios, dessa vez veio com menos intensidade, mas mesmo assim ela ainda me fazia ceder. Falk me abraçava com carinho, mas mesmo assim eu não aguentava o peso do meu próprio corpo. Falkon deixou eu me apoiar em seu peito enquanto ele arfava.

Separei-me dele e me apoiei no balcão, arrastei meu corpo até a cadeira onde ele estava sentado e o encarei. Falkon estava com as mãos nos bolsos do jeans e seu suéter folgado e vermelho estava desarrumado, mas ele estava radiante com um sorriso animado.

- Bom dia, Fox.

- Bom dia, Falk.

Estávamos com um humor bem melhor, parecíamos descansados.

Falk foi para trás do balcão e esquentou água para nos dois. Nesse meio tempo, peguei meu café importado e preparei o coador que achei debaixo da pia. Falk me despejou água e o cheiro de café inundou a casa, ele despejou água em sua xícara com pó de chocolate quente, mas o cheiro do chocolate não era tão forte quanto o do café. Nos sentamos e tomamos café lentamente, esperando o tempo passar.

...

As primeiras três aulas do dia foram completamente normais, ninguém estranho apareceu e tentou me raptar, como Falkon esperava. Alias, Falk mudou quase todas as aulas para os meus horários, só não conseguiu mudar para as minhas aulas de geometria.

Todos os momentos, nos arrumávamos desculpas para nos tocarmos, o que era meio cômico para alguém que nos visse.

Passei o recreio com Falkon, Finn e Hiver. Falkon comendo suas balas coloridas e cobertas de açúcar; Finn comendo sua salada de queijo branco, tomates e rúcula; Hiver com seu prato de nachos de queijo e eu comendo minha maça e tomando meu café.

Conversamos sobre os professores e sobre os deveres de casa. Não tínhamos muito assunto naquele dia, pois praticamente todos olhavam para aquela estranha mesa que sentávamos.

Eu mexia no meu cabelo freneticamente, penteando-o com os dedos, jogando-o de um lado para o outro e contando os fios. Eu ficava nervosa com tanta gente me olhando, pois mesmo estando frio do lado de fora, algumas mesas estavam cheias.

- Fox, Falkon tentou te matar alguma vez? – Hiver me perguntou casualmente, me fazendo cuspir o café na neve do chão.

- Hiver!

- O que foi? – Ela perguntou, nem um pouco tocada.

- É claro que não! Nos fechamos o contrato... – Me arrependi profundamente de ter falado isso, pois eles sabiam o que isso significava.

- Vocês se beijaram. – Finn traduziu.

- É. – Falk disse.

- E algo aconteceu.

- Ai meu Deus! – Hiver tinha ativado sua adolescente interior – Vocês transaram!

Sinto que Hiver tenha falado muito alto, mesmo tendo falado baixo, mas era só que todos já estavam olhando para nos.

- Não! Claro que não! – Sussurrei.

- Então... O que aconteceu? – Finn ficou interessado.

- Eu dei a pedra para ela, depois que ela tocou-a... Depois tocou em mim, sentimos uns arrepios estranhos. Eles nos dão uma sensação de prazer enorme, nos fazendo ter...

- Espasmos! E ondas intensas! – Interrompi Falkon.

- Sim, e não temos ideia do que é. Mas parece que essas ondas tem diminuído um pouco...

- Você tinha a pedra?! Então era com você que ela estava?! – Hiver estava entusiasmada e meio ferida.

Finn a ignorou.

- Falkon nasceu para ser o caçador de Foxie... Foxie nasceu para ser o foco da Luz... – Finn pensava alto – Nenhum tipo de intimidade deveria existir entre vocês. Hiver, já ouviu falar disso?

- Durante o meu treinamento de guardiã, conheci um foco. Ela era um foco de Terra e me disse que durante a luta corpo a corpo, sentia estranhos arrepios, ondas elétricas e depois, quando retornava a encontrar seu caçador, mais fortes essas ondas ficavam.

- Falkon era um caçador até o momento em que selou o contrato, ou seja, no momento em que Fox tocou a pedra, ela representou que tinha plena consciência do fato de ser um foco e logo depois tocou em seu caçador, como o foco de Terra tocou em seu caçador.

- Mas isso não explica o fato de que quanto mais tempo eles passavam sem se ver, mais forte as ondas ficavam... – Falkon observou.

- Não é o tempo sem se ver, mas o tempo que se conhecem. Vocês já se conhecem há muito tempo, para um caçador e um foco. Já passaram muito tempo juntos, isso aumentou as ondas, presumo que seja como se elas se acumulassem. Elas provavelmente vão se aquietar, como você disse, elas diminuíram.

- Mas e o fato de eu ser um guardião? Não anula as vibrações de ser um caçador?

- Mais forte do que ser um guardião, é ser um caçador.

...

Falk disse para eu fazer o almoço, enquanto ele arrumava o treinamento do lado de fora. Fiz arroz com frango caipira e um suco bem doce de limão.

Falk ficou satisfeito, disse que adorava comida caseira e me deu um sorriso.

- Vá se trocar, vamos ter um treinamento intensivo. Deixei sua roupa em cima da sua cama. Me encontre do lado de fora.

Fiquei surpresa e subi as escadas correndo para ver o que ele tinha deixado.

Minha roupa era basicamente, um short de algodão verde musgo, com bolsos para os dardos e as facas, imagino. Uma camiseta preta fina e com um capuz. Minha roupa também envolvia longas botas cor de casco de árvore que passavam do meu joelho.

Passei a mão pelo tecido da bota e percebi serem de algodão, o que fazia sentido, pois eu precisaria correr e sentir minhas pernas livres. As botas eram incrivelmente leves, foi a primeira peça que eu vesti, depois o short e a camiseta. Desci as escadas fazendo um rabo de cavalo.

Encontrei Falk do lado de fora ajeitando a mesa de metal com um pano de lycra em cima. Pigarreei, chamando sua atenção.

Falk olhou para mim e soltou um assobio de uma nota só contínua.

- Venha cá. – Ele me chamou com um aceno de mão.

Eu o segui e me postei ao seu lado.

- A tática é... Não ter tática. Só mire e acerte, as marcas estão no chão, é só não perde-las.

Olhei para o chão. Linhas feitas com giz branco marcavam 10 metros, 20 metros, 30 metros, até 90 metros. O que parecia quase impossível para mim.

Me afastei 10 m do alvo e segui com o treinamento.