Raios De Luz

Despertar da Lua


Depois de jantarmos e conversarmos mais sobre tudo isso que eu vivia agora, fomos dormir. Hiver queria que eu dormisse na cama dela, e que ela dormisse no chão, mas eu não deixei e acabamos as duas dormindo na cama.

- Hiver? – Estávamos de costas uma para outra, deitadas na cama.

- Sim?

- Porque Falkon disse que devo ter mais vergonha? E porque ele disse que deveriam manter a promessa de não prosseguir com a geração?

- A sua dinastia, Fox, é muito complicada. Ela tem acesso a um dom que trás muitos problemas aos humanos e causa muito estudo... Ninguém quer ser descoberto pelos humanos comuns e ser rotulado como bruxo, de novo. Por tanto, a sua dinastia fez um pacto de não prosseguir com o foco. Mas seu pai teve você.

- Então, eu sou um foco. Falkon me caça, você me protege dele. Meu pai foi assassinado por um caçador, e Hans é o tutor de caça de Falkon.

- Sim.

- Mas algo eu não entendi... Se Falkon foi predestinado a me caçar, porque Hans o fez?

- Porque Falkon não queria te matar. Ele te conheceu e não achou certo, até que em seus 9, 10 anos, ele mudou de ideia e decidiu caçar você. Seu treinamento foi atrasado e ele teve que voltar ao inicio.

- Acho que entendi.

- Podemos dormir? – Hiver bocejou.

Ri.

- Sim, Hiver.

Fechei os olhos e dormi. Sem sonhos estranhos.

...

Fui acordada pela Hiver. Nossa aula começa as oito e as sete ela me chamava.

- Separei algumas roupas minhas. Vou fazer o café lá embaixo.

- Tudo bem... – Levantei da cama.

Hiver tinha colocado três conjuntos diferentes de roupa. Um deles era o que o personagem que ela inventou – Como disse noite passada, ela tinha inventado um personagem para ficar de olho em mim -, outra era uma roupa totalmente simples, de ficar em casa e por último, uma calça jeans, uma blusa simples e um cardigã branco que ia até um pouco mais da minha coxa. Achei melhor tomar um banho e entrei no banheiro que era – supreendentemente – todo branco. Tomei um banho e refiz o curativo no meu pescoço. Hiver tinha acordado no meio da noite para troca-lo e quando fui eu mesma examinar, não parecia muito profundo, era apenas um pouco extenso. Se quisesse, Falkon poderia me matar.

Suspirei. Não sabia o que eu iria fazer, minha vida parecia que estava acabando, como eu ia estudar? Como eu ia ter amigos? Como eu ia viver com uma pessoa como Falkon me caçando dia e noite. Aquilo não parecia justo para mim.

Vesti as roupas que Hiver separou e coloquei o saco plástico que continha minhas roupas, dentro da bolsa.

Me olhei no espelho antes de descer. Tinha posto minhas botas e agora parecia até bonitinha, se não fosse o curativo enorme do meu pescoço e os arranhões no meu rosto que só podiam ser localizados de perto. Eu sempre tive uma cicatrização boa e Hiver tinha passado remédios neles à noite toda.

Tirei meu cachecol branco da bolsa e o enrolei em meu pescoço.

Desci as escadas e encontrei Hiver sentada no chão da cozinha. Parecia que ela estava procurando algo, mas tinha parado e sido consumida por seus pensamentos.

- Hiver você esta bem? – Perguntei correndo para ajuda-la.

Pus minha mão em seu ombro e a ajudei a ficar de pé.

- O que foi?

Quando ela virou, lágrimas escorriam por seu rosto.

- Como eu pude deixar Vossa Alteza se ferir?! – Ela soluçou.

- Não foi sua culpa. Eu devia ter te encontrado, eu fiquei cega por ele...

- A culpa não foi sua... – Ela cessava o choro – Eu devia ter avisado sobre ele. As caças são seduzidas por seus caçadores, às vezes de forma sensual, às vezes amigável. Tenho certeza que ele te seduziu de forma sedutora.

- Hum, sim. – Fiquei sem graça.

Hiver puxou um lenço do bolso e secou suas lágrimas.

- Coma, Fox.

Sentei em frente mesa da cozinha e fiquei indecisa entre todos os pratos que ela tinha preparado.

- Vocês fez tudo isso?

- Mais ou menos. Eu tenho uma empregada e pedi para ela fazer o café da manhã pela semana toda... Coma, Fox.

Hiver queria que eu comesse aquela comida toda... Ri sozinha.

...

A aula foi normal, tirando o fato de que Falkon não foi, e que Hiver rejeitou o grupinho dela para ficar comigo. Ela me disse que eles eram só uma fachada, que na verdade, ela só queria é parecer normal.

- Bom, eles não parecem ser muito amigáveis... – Disse.

- Não são! – Ela riu.

Depois da aula, Hiver me deixou em casa e minha mãe tinha saído para encontrar com a editora do livro dela.

Eu estava em casa sozinha com um possível caçador a minha volta. Ótimo.

Quando li a carta que ela tinha deixado em cima da mesa, decidi ser o mais cuidadosa possível, Falkon podia estar na minha casa.

Olhei em todos os cantos, procurando-o, quando percebi que ele não estava, ri. Deixei minha bolsa no quarto e fui almoçar na cozinha. Depois disso, montei todos os móveis da casa, tudo para tentar me ocupar. Durante a tarde, assisti a um filme que estava passando na TV, acabei adormecendo, sonhei que eu saia pela porta de casa e pétalas de flor brancas voavam no ar. Ao acordar, fiquei assustada, eu queria ir até a porta e ver o que tinha lá fora, ver se meu sonho seria real. Levantei do sofá e fui até a porta, tirei o trinco e sai na noite. Estava escuro e uma cigarra cantava.

- Olá?

A cigarra parou. Não tinha nenhum carro na rua, as luzes das casas estavam acesas, tudo parecia normal. Desci as escadas e fui até a calçada.

- Olá? – Repeti.

- Boa noite, Foxie. – Uma voz grave disse entre meio as folhas do bosque em frente a minha casa.

Minha respiração voltou a ficar ofegante.

- Precisamos conversar. – Falkon saiu das folhas e atravessou a rua.

- Não precisamos, não. Saia daqui.

- Eu só quero conversar.

Dei um passo atrás, corri para dentro de casa, fechei a porta com força. Encostei na porta e quando me dei conta, Falkon estava sentado na janela.

- Acabe... Com isso logo.

Virei o pescoço para ele e fechei os olhos. Mas rápido do que o vento ou assim como o vento, pude sentir suas mãos e seu braço envolvendo meu pescoço e um corte metálico subindo do meu colo até minha garganta.

- Só quero que saiba, que não sou responsável pelos atos do meu pai, nem pela minha dinastia. – Engoli em seco. – Você vai me matar injustamente.

Ainda com os olhos fechados, pude sentir a lâmina se descolando de minha pele.

- Eu... Acho que os caçadores só devem ser acionados, aos focos que usam seus dons mal. Não me importa o que os que tiveram meu sangue fizeram... O meu sangue é puro.

As mãos de Falkon já não encostavam a mim. Abri os olhos e me deparei com um garoto de sobrancelhas franzidas em pena de si mesmo. Ele não me olhava, apesar de seus olhos estarem em mim. Ele não estava na minha frente, apesar de seu corpo estar lá. Falkon parecia estar sendo levado por suas memórias.

- Você... Você... – Falkon tentava.

Eu ia tentar dizer alguma coisa também, mas rápido como o vento, Falkon me atirou no chão e saiu pela porta. Fiquei muito tempo deitada do jeito que cai. Só me mexi quando estava com frio e fechei a janela. Deitei no sofá e desliguei a TV que estava ligada presenciando o nosso encontro esquisito.

Era para eu ter fechado o acordo hoje com Hiver, mas acho que ela ficou tão sem graça quanto eu. Não a culpo, porém.

“Ele devia ter me matado... De novo”.

Hiver tinha posto seu número em algum lugar dentro da minha bolsa. Subi as escadas e entrei no meu quarto, sentei na cama e peguei a bolsa jogada no chão. Liguei para Hiver, mas quando fui contar para ela o que tinha acontecido... Não consegui.

- Você está bem?

- Estou.

- Amanha temos que selar o contrato, Fox. Você me encontra no recreio?

- Sim, te encontro lá.

Desligamos o telefone. “Porque eu não contei a ela?”

...

Dormi cedo e acordei mais cedo do que de costume para trocar o curativo. O corte tinha aberto um pouco por causa da noite passada, mas minha pele já estava quase totalmente pronta. Uma casquinha fina se formava ao redor.

Coloquei uma calça branca e um longo cardigã de lã vermelha. Peguei minha bolsa, uma maça e fui andando até o ponto de ônibus que ficava na esquina da rua. No caminho, ouvi um carro derrapar, meus movimentos pararam. Ouvi o mesmo carro correr no asfalto e olhei para a rua, Falkon descia do carro e vinha em minha direção. Soltei a maça e ela se quebrou no chão, me precipitei a correr, mas Falkon me agarrou e me puxou para o carro, ele colocou o cinto em mim e prendeu minhas mãos com uma corda. Eu me recusava a ficar parada, mas ele era muito forte. Nada adiantava. Falkon olhou para mim.

- Fique quieta! Eu não vou te machucar. – Era a primeira frase verdadeira dele.

Pude ver em seus olhos que ele falava a verdade. Fiquei imóvel enquanto ele batia a minha porta, dava a volta e saia com o carro. Ninguém da vizinhança ouviu meus gritos ou percebeu meu desaparecimento.