Prólogo

A ideia de viajar para a Coreia foi da minha irmã.

Eu particularmente nunca tive muito interesse na Coreia do Sul, e o pouco que sabia se restringia às músicas animadas e dançantes que minha irmã e minha cunhada escutavam. Mas a passagem foi presente de Jane e, mesmo sem conhecer quase nada sobre a cultura daquele país, não pude negar a viagem que caiu no meu colo.

— Você nunca mais se divertiu, Greta – Jane falou assim que, estupefata, retirei o comprovante do voo do envelope cor de rosa. — Nem tirou férias e nem se permitiu conhecer novas pessoas. Só vive presa nessa livraria e remoendo mágoas.

Jane não estava errada – e talvez foi essa verdade tão duramente jogada na minha cara que me fez aceitar ir para um país estranho, completamente sozinha.

Não sei porque Jane e sua namorada não quiseram me acompanhar na aventura, já que elas eram tão aficionadas ao universo coreano. Jane nem mesmo quis me explicar a razão, então subtendi que ela queria que eu me redescobrisse, numa jornada de autoconhecimento que precisava acontecer na mais completa solidão. Enquanto andava pelas ruas coreanas, bebendo um copo de Starbucks e lendo um dicionário de coreano para turistas, pensava no quão eu queria que minha irmã estivesse errada.

Remoer o passado doía, e perceber que eu apagara o pouco brilho que existia em mim era ainda mais doloroso. Não que minha vida não valesse a pena, longe disso. Gosto de morar no interior da Inglaterra, cuidando da livraria que vovô me deixou de herança, acompanhada dos meus três gatos e minhas plantinhas. Levo uma vida tranquila e não espero muito mais além disso – mesmo tendo um diploma em Literatura Inglesa e uma oportunidade de lecionar numa das mais renomadas universidades britânicas. Porém, no último ano, eu criara um casulo e me escondera dentro dele. Não tecia mais sonhos, não fazia planos, não deixava as pessoas se aproximarem – vivia para meus livros, meus gatos e meu jardim.

O dia estava razoavelmente quente, então parei minha caminhada para prender meus cabelos. Percebi, não sem um punhado de vergonha, que algumas pessoas me observavam curiosas. Não era de se admirar, porém. Eu, com meus longos e ondulados cabelos castanhos; minha franja sobre meus olhos grandes e escuros; meu rosto quadrado; meu corpo curvilíneo e cheio de gordurinhas localizadas; e minhas sardas que despontavam da minha pele branca, chamava certa atenção. Não dava para passar despercebida pelas ruas coreanas, e eu acabava atraindo alguns olhares. Infelizmente, não poderia dizer o mesmo em relação à amabilidade. O fato de eu não saber nada da língua local fazia com que os nativos não fossem tão receptíveis comigo.

Cabelos presos, peguei meu copo de Starbucks, pronta para recomeçar a minha caminhada. Jane havia me ajudado a montar a minha rota turística naquele meu mês de mochileira. Minha irmã tinha o espírito aventureiro infinitas vezes maior do que o meu, então precisei lhe pedir socorro. Eu nem sabia por onde iniciar a minha jornada em terras coreanas.

— Em rumo ao sexto dia das incríveis aventuras de Greta – murmurei, como se para me incentivar a investir naquele passeio.

No momento em que dei meus primeiros passos, meu celular vibrou. Olhei no visor para saber quem havia me mandado a mensagem: número desconhecido.

“Olá?”

Movida pela curiosidade, acabei respondendo.

“Quem é você?”

Mas teria sido bem melhor se eu não tivesse dito nada e apenas ignorado o pedido que aquele estranho me fez.