Pretty

Festa e… Teri?


— Adam! Saia de cima dela, seu imbecil. Vai matá-la asfixiada. – Teri gritou, puxando com esforço o garoto de cima de mim.

O ar então voltou com tudo para os meus pulmões, deixando-me um pouco zonza, e, ao me levantar, quase cai outra vez, mas as mãos do garoto que me atropelou se apressaram em me segurar. Tratei de me desvencilhar rapidamente delas.

Todos no refeitório nos assistiam, de forma divertida ou confusa, e pensei ter visto, também, dois ou três olhares de descontentamento. Encarei novamente o garoto que me derrubou e me vi surpresa por me sentir tão envergonhada. Ele era o maluco desastrado, mas estava um pouco difícil de me concentrar nesse fato agora que eu podia realmente vê-lo e também analisá-lo. Ele era bem alto. Quase 1,90, deduzi. Pele clara, com um toque de sol, e seus olhos eram tão azuis quanto os mares da Polinésia Francesa. Os cabelos tinham um perfeito castanho-claro e seus músculos definidos apareciam, saltando, mesmo por debaixo da blusa. Mas o mais impressionante era, certamente, aquele sorriso que, caramba, podia iluminar um quarto escuro. Aquele garoto era, com certeza, a pessoa mais bonita que eu já havia visto pessoalmente em toda a minha vida.

Quando voltei completamente aos meus sentidos, tive medo de ser pega olhando como uma descarada. Mas percebi, um pouco tarde demais, que ele também me encarava sem muita cerimônia, então desviei o olhar.

— Você é mesmo muito idiota. Precisa ficar correndo por aí? – Reclamou Teri, visivelmente irritada.

— Ei. Para de gritar, maluca. – O garoto replicou. – Só queria te dar isso. – Expressou, entregando um molho de chaves para ela. – Vou ter que ir para a casa do Kyle e ajudá-lo com a festa.

— Tá. Mas acho que não vou para casa, de qualquer forma. – Deu de ombros. – Vou mostrar alguns lugares para a Amanda. – Ela apontou na minha direção. Não entendi bem, mas acho que era isso que ela havia tentado me dizer antes de sermos surpreendidas. – Não se esqueça de esconder algumas garrafas!

Ele sorriu e piscou de maneira cúmplice para ela.

— Certo. Prazer em conhecê-la, Amanda. Eu sou Adam. Irmão desse doce de gengibre. – Apresentou-se, sorrindo irônico para a irmã. Ele estendeu a mão e eu a apertei, leve, mas cordialmente. – Á propósito, me desculpe pelo atropelamento. E, a festa da qual estamos falando, está super convidada. Valeu, irmãzinha. – Completou e saiu correndo, para perto do grupo de Dave, Ryan e Kyle, ao qual ele, por associação, também devia pertencer.

Teri e eu voltamos para o nosso caminho e, no trajeto, ela me explicou sobre a festa de Kyle, na qual ela obviamente iria justamente por ser uma das festas de Kyle. Perguntei-me se a namorada dele estaria lá, mas, pelo o que pude perceber, Teri era meio masoquista quando se tratava de sentimentos. Ela reforçou o convidou feito pelo irmão e eu disse que gostaria de ir. Seria a minha primeira oportunidade de ir a uma festa de verdade, tirando as de família ou as supervisionadas que fazíamos no colégio. Então eu realmente queria ir.

— Seus pais não vão encrencar? Tenho a impressão de que eles devem ser do tipo rígidos. – Teri demonstrou preocupação quando entramos na sala de aula.

— Acho que eles têm mais com o que se preocupar. – Afirmei.

Literalmente, tudo o que não fosse eu.

Durante a aula pude perceber o porquê de toda aquela malhação a professora de história. Usando um coque grisalho e um par de óculos quase menores que seus próprios olhos, ela era mesmo uma figura bem pouco simpática. Parava a cada cinco minutos para apontar coisas erradas que nos alunos, sem que eles houvessem sequer se movido, e até gritou comigo, me acusando de ser desordeira, dizendo que eu, por ter acabado de chegar, deveria pôr-me no meu lugar de aluna nova. Apenas a encarei, perplexa. Sinceramente, eu mal havia aberto a boca para perguntar ao aluno do lado em que página do livro eu deveria abrir. A gota d'agua para ela foi quando Teri, na minha frente, virou-se para me perguntar algo, não sei se relacionado a matéria, já que ela não teve nem tempo de dizer.

— Escutem bem, suas meninas metidas a besta. Este é um local de ensino. Se querem tanto conversar sobre suas trivialidades de mocinhas bobocas, fiquem em suas casas e não venham importunar os outros! – Ela vociferou exaltada.

Eu não tinha sangue de barata também e honestamente não estava acostumada a ser tratada daquela forma. Levantei-me e encarei-a, na frente de todos.

— Escute bem a senhora, professora. – Eu disse, imitando seu tom autoritário. – Se não tem paciência para lidar com os seus alunos, e tudo o que sabe é reprimi-los por conta de coisas absolutamente pífias, creio que quem deveria ficar em casa é a senhora. Esta é uma escola, não uma ditadura.

A pele da mulher passou a mudar de tom várias vezes em alguns segundos, até atingir um vermelho vibrante. Parecia um vulcão em plena erupção.

— Muito bem, senhorita respondona. O que acha de fazer esse mesmo discursinho para o diretor?

Ela soltava fogo pelas ventas.

— Eu adoraria. – Desafiei.

— Certo. – Ela assumiu uma posição arisca. – Fora da minha aula! Fique sabendo que irei mandar um comunicado a diretoria sobre seu comportamento, Srta. Rees.

— Muito obrigada. – Eu disse, dirigindo-me para fora.

Enquanto todos me olhavam, fiquei um pouco constrangida, mas sai com toda como se fosse um desfile em minha homenagem. Imitei a pose da minha mãe para parecer confiante e a professora quase me chutou porta a fora.

Vaguei pelos corredores, pensando comigo mesma. Por mais que eu quisesse enterrar certas lembranças, mesmo do colégio antigo, me peguei fazendo diversas comparações. As diferenças eram tantas. No colégio interno, éramos obrigados a vestir uniformes e as proibições eram infinitas, sobre namoro, barulho e até comida. Tudo o que comíamos tinha de ser inspecionado e atestado como saudável. Eu, por exemplo, só cheguei a tomar um Milkshake de verdade aos quinze anos de idade, quando, finalmente, ganhei permissão para ir a um shopping sozinha com Lucy. Na época, nos pareceu um grande pecado capital, pois eles sabiam bem como fazer lavagem cerebral nos alunos. Quando dei por mim, já estava do lado de fora do prédio escolar, observando de longe um dos campos esportivos da escola.

— Ei. O que está fazendo?

Tomei um susto com a voz, vinda de trás de mim, e voltei-me para ela, aturdida. Era Adam, o irmão de Teri. Sem camisa, suado, e sorrindo. Tive absoluta certeza de que minhas bochechas parecial narizes de palhaço naquele momento. Eu tinha sempre que ter reações ridículas perto de caras bonitinhos?

— Fui expulsa. – Disse, me recostando na parede.

— Sério? Eu nunca adivinharia que é uma encrenqueira. Não parece mesmo. – Ele sorriu divertido.

— Acho que a professora de história tem alguns problemas com a opinião alheia. – Expressei.

— Claro. Só podia ser aquela histérica. Mas, e aí? Você vai a festa hoje a noite?

— É. – Comecei, percebendo a mudança brusca de assunto. – Acho que sim. Sua irmã me chamou.

— Eu te chamei primeiro.

— Claro. Obrigada por me convidar. É a minha primeira festa de verdade. – Falei, sem pensar.

Ele não precisava saber que eu era uma leiga nessa coisa de ter vida social.

— Isso porque acabou de se mudar. Mas aposto que te chamavam para muitas festas onde você morava. – Ele disse, sem entender o que eu realmente quis dizer.

Maldita honestidade que me compelia a falar a verdade e desfazer um mal entendido.

— Não. Essa não é a minha primeira festa aqui. É a minha primeira festa de verdade sem supervisão familiar ou de monitores. Uma festa normal. Sabe?

— Está falando sério? – Ele indagou, meio cético.

Assenti, envergonhada. Agora ele pensaria que eu era uma completa imbecil.

— Não sei nem o que vestir. – Confessei, sorrindo.

Gostaria de abrir um portal para Júpiter nesse exato momento.

— Está brincando, não é? Se você for com uma cortina enrolada no corpo e um capacete na cabeça, ainda vai ser a garota mais bonita da festa. – Ele disse, como se fosse muito óbvio.

— Obrigada. – Agradeci, mas fiquei verdadeiramente encabulada. Então tratei de sair logo dali, antes que não soubesse mais o que dizer e estragasse tudo. – Tenho que ir para a direção.

— Ok. – Ele concordou, desconcertado. – E fique tranquila. O diretor sempre pega leve quando se trata das reclamações da Srta. Bloody Mary. – Ele sorriu.

— O que? – Pedi, confusa.

— Depois eu te explico.

Assenti e caminhei até a direção.

Realmente o diretor foi bastante condescendente com a minha atitude, mas me advertiu sobre responder um professor. Da próxima vez eu pensaria duas vezes, acho. Com o tempo livre antes da próxima aula, dei uma volta pela escola, a fim de ver o que ainda não havia visto, e avistei um pequeno jardim, onde algumas flores plantadas me chamaram a atenção. Sempre adorei flores, principalmente os crisântemos brancos, mas a última vez que recebi um ramo fora quando tinha nove anos e levei um tombo na escada. Michael mandou entregar no meu quarto de hospital e foi mais ou menos quando ele e minha mãe começaram a prosperar muito nos negócios e a se afastar de mim, até me trancarem naquele lugar. No jardim, peguei uma pequena margarida, solta no chão, e carreguei-a comigo para a sala de aula. Durante os longos minutos de álgebra, notei o garoto do refeitório, Dave, me encarando o tempo todo do outro lado da sala e me pus inquieta.

Que garoto inconveniente!”. – Pensei.

No fim do período, recebi uma mensagem de Victor, avisando que já me aguardava no estacionamento. Teri me parou na porta principal, dizendo que estava com o carro do irmão, e perguntou se eu queria que ela me mostrasse a cidade como havia prometido. Propus que fizéssemos isso no dia seguinte, pois eu ainda tinha que desfazer algumas malas e organizar o quarto.

— Tá legal. – Ela concordou, despreocupada. – Então, a festa é às oito e este é o endereço. – Ela disse, me entregando uma pedaço de papel.

— Obrigada. – Agradeci, sorrindo. – Vejo vocês lá!

Despedi-me de Teri, Jocelynn e Crystal e fui para o carro, onde Victor me esperava. Ele parecia tenso.

— Ei. Parece meio estressado. – Comentei.

— Seus pais me estressam um pouco. Mas não conte a eles.

— Tudo bem. Eles também me estressam, e você pode contar a eles! Não podem me demitir. Pelo menos eu acho que não. – Brinquei, colocando o cinto de segurança.

Victor riu sutilmente, dando a partida no carro.

— Eles te amam. Você sabe. – Ele disse, olhando para a estrada.

— Ah, claro que eu sei. Eu devo estar em algum lugar nas prioridades deles. Entre o jardim e a prataria, talvez. Não. Com certeza não acima da prataria.

— Eles só não sabem como expressar isso. – Proferiu, sereno.

Rolei os olhos.

— Podiam expressar me dando um carro. Para que eu pare de me sentir tão culpada por te usar como motorista particular. – Reclamei.

Ele riu.

— É um prazer. Você é uma boa companhia. Nem me sinto mais tão estressado, viu? – Ele falou, abrindo os vidros, antes completamente fechados.

Victor tinha uns 38 anos, uma expressão quase sempre preocupada e, muitas vezes, com olheiras. Acho que ele não costumava dormir direito e tinha certeza de que isso era absolutamente culpa dos meus pais e de suas pressões psicológicas. Talvez, em algumas noites, como eu, ele também prendesse a vontade de chorar ao se deitar.

Chegando em casa, vi minha mãe sentada em uma namoradeira na varanda da frente. Ela sorriu quando me viu e eu, involuntariamente, sorri de volta.

— Boa tarde, querida. – Ela me cumprimentou. – Como foi o primeiro dia de aula?

Seus olhos pareciam duas vezes maiores. Porque ela estava tão ansiosa para saber se eu tinha me dado bem no primeiro dia na escola pública? Ela nunca se preocupou em perguntar se eu estava feliz no internato. Quanta hipocrisia.

— Bom. – Respondi, breve.

— Alguma novidade? – Insistiu ela.

Não acreditava que Anne estava querendo bancar a mãe atenciosa agora. Era um pouco tarde para ela tentar este papel.

— Não. – Andei, com ela em meus calcanhares.

—E... – Ela começou, mas decidi que era hora de pará-la.

— Tenho que subir. Preciso terminar de arrumar o quarto. – Contei-a, direta.

— Ah. Tudo bem. Nos vemos no jantar, então.

— Vou sair mais tarde. Com umas amigas.

— Amigas? Já fez amigas? Claro que fez, você sempre foi muito popular. Isso é ótimo! – Articulou ela, sorrindo hesitante.

Fiquei um pouco indignada por ela ter dito aquilo com tanta propriedade. Como se me conhecesse profundamente. Tinha que ser uma piada.

— Vou subir agora, mãe. – Eu disse, subindo as escadas e deixando-a, sem checar sua expressão.

* * *

Em um piscar de olhos, já eram quase oito da noite. Eu havia me empenhado na arrumação do quarto naquela tarde e, agora, já estava quase tudo em seu devido lugar. Tomei um banho morno, para relaxar o corpo, e passei um creme de camomila e jasmim, sentindo-me renovada. Escolhi a roupa que usaria para a festa, vesti-me com ela e fiz uma maquiagem leve, restando apenas decidir o que fazer com o cabelo, que acabei deixando solto. Sei que aquela noite deveria parecer normal para qualquer garota na minha idade, mas não para mim. Naquela droga de colégio interno as festas que tínhamos eram sempre caretas e controladas, então esta seria a primeira vez que eu teria a chance de realmente me divertir.

Na saída, encontrei meus pais na sala. Minha mãe via algo no laptop e meu pai lia com concentração alguns papéis. Não sabia se eles ouviriam se eu avisasse que estava saindo, mas, pelo menos, eu teria feito a minha parte.

— Mãe, eu estou saindo! – Informei, já me dirigindo a porta.

— Eu estou aqui, Amanda. E ainda sou seu pai!

Caramba, ele lembrava?

— Sim? – Dirigi-me a ele.

— Aonde vai? – Ele perguntou, tirando os óculos de leitura.

— Sair com algumas amigas do colégio.

— Sua mãe disse que você fez amigas. Fico satisfeito.

Satisfeito? Ok.

— Preciso do telefone de alguma delas. – Ele disse, estendendo um bloco de anotações e caneta para mim.

Peguei-os, contrariada, e anotei o número de Teri, que ela escrevera no papel com o endereço da festa. Ele pegou o bloco de volta e voltou a fitar os papéis. Virei-me e ele voltou a falar.

— Quero você em casa a meia-noite. Sem atraso. – Disse.

Estanquei e fechei os olhos, respirando fundo. Quantos anos ele achava que eu tinha? Dez, provavelmente. Saí pela porta, um pouco irritada, mas nada iria estragar minha primeira noite em liberdade. Por sorte encontrei Victor, na varanda, exatamente quando pensei que teria que pegar um táxi.

— Boa noite, Victor. – Cumprimentei-o.

— Boa noite, Amanda. Está linda. – Ele sorriu, amarelo.

— Obrigada. Pode fazer um favor e me deixar em um lugar? – Perguntei.

— Não. – Choquei. – Mas posso te emprestar o carro. – Choquei de vez. – Você tem carteira e sei que é responsável.

— Sério? Caramba. Obrigada mesmo! – Saltitei quando ele estendeu as chaves para mim.

— Traga-o inteiro. – Ele gritou, enquanto eu entrava no carro.

— Prometo. – Gritei de volta.

Meus pais nunca haviam me emprestado seus carros. Michael dizia que me daria um, quando eu fizesse dezoito anos, mas custava me deixar dirigir com mais frequência? Só para não perder a prática?

Dirigi como se pilotasse uma nave espacial, e, com a ajuda do GPS, consegui chegar ao endereço da festa sem problemas. Era uma casa grande e branca, sem muros. Encontrei um lugar para estacionar e adentrei a residência, um pouco confusa com o meu entorno. A sala estava completamente lotada de jovens e parecia haver muito mais gente espalhada pela casa. Enquanto algumas pessoas dançavam, outras se agarravam pelos cantos, e tive de me esforçar para passar por elas, às vezes esbarrando em alguém. Definitivamente eu nunca tinha estado em uma festa de verdade. Procurei por Teri, Jocelynn ou Crystal primeiramente, mas não as vi em parte alguma, então pensei em pegar uma bebida e esperar em algum canto menos abarrotado. Cheguei na entrada da cozinha, pedindo algo a um garoto que parecia o “segurança das bebidas” e ele logo me passou uma garrafa pequena de vodca de frutas. Na volta para a sala, de repente, senti alguém me segurar pela mão e me virei, pensando ser uma das meninas, mas me surpreendi ao ver que era o garoto de antes, Dave, que segurava um copo de bebida com a outra mão. Levantei uma sobrancelha para ele em reprovação.

— Ei, garota nova. Ainda não nos conhecemos direito. Qual é o seu nome? – Ele disse, sorrindo, visivelmente meio alterado com a bebida. E eu tinha a impressão de que ele já sabia bem qual era o meu nome e só queria puxar assunto.

"Que bom, um bêbado." — Pensei, amofinada.

Dave era um garoto bem bonito, qualquer um diria isso, mas a maneira como ele me conduzia lentamente até a parede, me cercando, não me agradou nem um pouco. Quando encostei minhas costas na parede percebi que estava sem saída, a não ser encará-lo.

— É Amanda! Acho que agora nos conhecemos "direito". – Falei, tirando minha mão da sua. – Sabe onde está Teri?

— A bonequinha não está aqui. Mas que bom que você veio. – Ele sorriu, olhando-me dos pés à cabeça.

Meu rosto pegou fogo de vergonha e raiva. Odiava quando me olhavam daquele jeito.

— Certo. Acho que vou ligar para ela. – Eu disse, tentando sair de seu cerco.

— Olha... – Ele começou, apoiando-se na parede com um braço e deixando desconfortável a distância entre nossos corpos. – Desculpa eu ficar te encarando hoje, na aula. É que você é mesmo muito bonita.

Ele realmente ia ficar me olhando daquele jeito, como se eu não estivesse olhando bem para ele e percebendo?

— Tudo bem. Olha, eu vou mesmo procurar a Teri. Te vejo por aí. – Falei, agora passando por ele. E desta vez, graças aos céus, ele não me impediu.

Quando voltei para a sala, Teri e Crystal entravam pela porta e eu fui depressa até elas.

— Ei. Você veio! – Teri disse, me abraçando, e, novamente, estranhei o gesto. Meus colegas do internato nunca demonstravam afeto com toques se não fossem realmente íntimos. Mas acho que eu já estava até me habituando com esse jeito espontâneo dela. – Vamos nos divertir muito hoje.

— É. Até a meia-noite. – Reclamei.

— Hora para voltar? – Crystal perguntou, colérica. – Também temos. Meia-noite e meia. Quem nossos pais acham que somos? Cinderelas? – Ela murmurou, para ninguém especificamente. – Viu a Lynn? A Jocelynn. É assim que a chamamos.

— Não. Não deve ter chegado ainda. – Respondi.

— Ela já deve estar chegando. Vamos pegar algo para beber. – Teri disse e saiu na frente.

— Escuta. Teri está querendo afogar as mágoas, por causa do Kyle, então o nosso trabalho é não deixar que ela se envergonhe, muito. – Contou Crystal, baixo. – Aquela é a Hanna. A namorada!

Ela apontou uma garota alta e loira, que parecia mais uma modelo saída de um catálogo da Victoria's Secret. Honestamente, fiquei um pouco triste por Teri ter que competir com aquilo, embora a achasse também muito bonita. Hanna, aparentemente, era uma daquelas garotas que sabiam o que fazer para chamar a atenção, e realmente faziam.

Seguimos Teri até a cozinha e elas pegaram coisas para beber. Mas, enquanto nós bebíamos devagar, nossa companheira virava uma dose atrás da outra e Crystal me lançava olhares visivelmente desesperados. Quando Jocelynn chegou, Crystal e eu conversávamos, sobre Nova York, e Teri já parecia bastante bêbada. A morena pendurou-se no pescoço da ruiva e esta começou a fazer gestos interrogativos para nós, que demos de ombros.

— Ela sempre bebe assim? – Perguntei para Crystal.

— Assim, não. Ela está deprimida porque não consegue se declarar para você sabe quem. – Contou, rolando os olhos.

— Não devíamos fazê-la parar? – Perguntei, vendo Teri rir com Jocelynn, bebendo outra dose de alguma coisa.

— Tudo bem. Teri é responsável. Ela vai ficar bem!

Uma hora depois, Jocelynn havia sumido com um garoto e Crystal e eu tentávamos tirar Teri de cima do sofá, onde ela dançava como uma universitária no Spring Break. Eu não sabia se ria, ou se ficava preocupada com o estado da menina. Vi Adam passar, aparentemente discutindo com uma garota morena, e não vi outra alternativa.

— Adam! – Chamei-o. Ele prontamente se virou para nós, e também a garota. Ignorei a expressão irritada dela. – Pode nos ajudar?

Ele parecia meio alcoolizado também, mas, com certeza, bem menos que a irmã. Quando ele a viu, deixou a discussão com a outra garota, que me fuzilou com os olhos.

— Ei, irmãzinha. Desde quando dançar em cima de sofás virou seu esporte favorito? – Ele disse, tirando-a de cima do sofá e colocando-a no chão.

— Adam. Não seja chato. Vá se divertir. Cadê aquelas garrafas que pedi para você esconder? – Ela questionou, entre um soluço e outro.

— Eu bebi tudo, sua cachaceira. Além disso, você já bebeu demais. Não acha? – Ele disse, sendo puxado pela garota de antes.

— Ela está bem, Adam. Deixa sua irmã se divertir. Vem. – Ela o chamou.

— Não enche, Janice. É a minha irmã! – Proferiu, rude.

A garota olhou-o furiosa e saiu, andando para o meio dos adolescentes dançantes. Olhei-o, um pouco pasma, mas as outras nem se importaram. Adam se voltou para nós e sorriu.

— Não deixem que ela beba mais, tá? Daqui a pouco ela melhora. – Ele disse e se afastou.

— Por que não estamos nos divertindo? – Teri resmungou.

— Porque alguém não consegue controlar o consumo de bebida. – Crystal exprimiu, sarcástica.

— Vou pegar um copo de água para ela. – Falei, rindo.

Crystal assentiu, sentando no sofá com Teri.

Fui até a cozinha e peguei o copo de água, mas, quando voltava, a morena que estava com Adam veio falar comigo.

— Oi. Como você se chama mesmo? – Ela perguntou, com um projeto mal executado de sorriso no rosto.

— Amanda. – Respondi.

— Pois bem, Amanda. Escuta. Eu entendi que agora a pouco você só quis ajudar a Teri. Mas Adam e eu estamos juntos e eu não gostei da forma como você chamou por ele. Não quero nenhum mal entendido depois do acidente no refeitório. Entende? Você é nova então é melhor você saber por mim que o caminho não está livre. Ok? – Disse ela, olhando-me de cima a baixo. Então se virou, quase batendo o cabelo comprido e escovado em mim, e foi embora.

Fiquei olhando para os lados meio atônita, sem entender nada, mas lembrei do copo de água na minha mão e voltei para onde as garotas estavam. Quando cheguei, Teri estava abraçada com o loiro, que eu lembrava se chamar Ryan, com outro copo de bebida na mão, e Crystal parecia discutir com Dave, no outro canto da sala. Fui depressa até Teri e encarei Ryan, que quase a beijava.

— Teri? – Ela olhou para mim, confusa, mas logo sorriu. Estava completamente fora de si. – Você está bem? Venha beber água.

Tirei-a dos braços de Ryan e sentei-a de volta no sofá. Tentei fazê-la beber, mas ela protestou e saiu cambaleante para fora. Fui atrás dela e paramos no jardim, perto de uma cerca. Teri se apoiou nela, aos prantos, e fiquei aflita, sem saber o que fazer. Aproximei-me e ela me abraçou.

— Por que Kyle prefere aquela vagabunda a mim? – Ela disse, alto.

Por sorte, ali não tinha ninguém suficientemente sóbrio para entender o que ela disse.

— Shhhh. Mas ele nem sequer sabe que você gosta dele. E como sabe que ela é uma vagabunda? Talvez você só esteja com ciúme.

Ela balançou negativamente a cabeça e ficou de frente para mim.

— Ela transava com o meu primo e com o vizinho dele, ao mesmo tempo em que já saia com o Kyle.

— Jesus! – Exclamei, espantada. – E ele sabe disso? – Perguntei.

— Não. Meu primo e o vizinho dele foram para a faculdade e só Adam e eu soubemos, mas não tivemos coragem de contar. Todos acham que ela é uma santa. Se ele visse como ela é, então ele perceberia que eu... – Ela recitou, chorando como uma criança.

— Você devia dizer o que sente para ele. Se ele preferir ficar com a namorada, é porque só não é mesmo para ser.

— Eu sei. Eu... – Ela começou, mas não conseguiu terminar. Levou as mãos a boca e correu para um lado mais escuro perto de um arbusto.

Fui para junto dela e segurei seu cabelo, enquanto ela colocava tudo para fora. Felizmente já não havia ninguém do lado de fora da casa. Depois que ela vomitou tudo que havia em seu estômago, caiu na grama, como um coco maduro. Tentei ajudá-la a se levantar, mas ela estava muito desnorteada e bêbada, e isso dificultava tudo. Crystal saiu pela porta, correndo até nós.

— Ai, caramba! Teri. Vem. – Ela disse e me ajudou a carregar Teri até o carro de Victor.

Teri precisava ir para casa e, pelo que eu sabia, ela estava de carona com Crystal, que estava um pouco sem rumo também. Não tanto quanto ela, mas o suficiente para não poder dirigir naquele momento.

— Vou levá-la para casa. Pode me dar o endereço? – Pedi.

Ela me disse e eu coloquei no GPS. Ajeitamos o pudim de cachaça no banco do carona e, antes de ir, pedi a Crystal que avisasse Adam. Por último, aconselhei-a a procurar Jocelynn e esperar um pouco até estar bem para dirigir.

No caminho, eu rezava para que Teri tivesse mesmo esvaziado seu estômago e não vomitasse no carro de Victor, ou eu estaria muito encrencada. Quando chegamos ao endereço, uma casa modesta porém bonita, Teri estava meio sonolenta, mas, pelo menos, já havia recuperado um pouco da coordenação motora. Perguntei se ela tinha as chaves de casa e ela respondeu que sim. Ajudei-a até a sua porta e dali ela disse que conseguiria sozinha. Perguntei também se seus pais não brigariam com ela e ela respondeu, meio indiferente, que seu pai não morava mais ali e que sua mãe era enfermeira e estava de plantão. A garota me agradeceu, com palavras cortadas, e seguiu para dentro da casa. Esperei até ouvi-la trancar a porta e voltei para o carro.

Até pensei em voltar para a festa e ver se Crystal e Jocelynn estavam bem, mas resolvi arriscar que estavam. Elas sabiam bem que não podiam beber demais. Fui para casa, bem mais cedo que o combinado, porém contente. A festa não fora como eu imaginava, mas, só de não ter de ficar encarando meus pais na mesa de jantar, já valia a noite desastrosa.

Já deitada na cama, fiquei pensando na festa, nas conversas esquisitas, e em muitas outras coisas, inconfessáveis até mesmo nestes pensamentos, e, depois de algum tempo, finalmente me deixei levar pela inconsciência do bom amigo sono. Que ele enfim me trouxesse um merecido descanso e me preparasse para um novo amanhã cheio de descobertas novas.