Pretty

Dentro de casa.


Marcus olhava para mim como se eu estivesse falando em hebraico, enquanto eu mantinha minha posição entre ele e Adam, que procurava se levantar do chão e não parecer tão humilhado.

— Estou te protegendo! Agora será que dá para você sair da frente e me deixar acabar com esse babaca aproveitador.

— O que? – Perguntei exasperada. Impedindo que ele passasse por mim.

— Qual é, Amanda? Esse infeliz estava te atacando e você ainda o defende?

Atacando?

Ai meu deus. Ele realmente havia entendido aquilo daquela forma?

— Ninguém estava me atacando, Marcus! Por favor. – Empurrei-o de leve até que ele recuasse uma distância segura.

— Ele estava te segurando contra a árvore como um animal!

Jesus Cristo, me ajude.

— Você entendeu tudo errado. Não é nada disso. Marcus… Ele é meu namorado!

— Hã? – O loiro murmurou, estupefato. – Isso é alguma brincadeira?

— Desculpa. Eu devia ter te dito antes. – Falei pesarosa para o meu amigo. – Melhor eu te explicar em casa, ok?

Olhei para Adam que acariciava a mandíbula com um olhar duro, levemente puxado para o homicida.

— Coloca gelo nisso, e desculpa. Eu falo com você depois! – Falei para Adam. Puxando, com muito esforço, Marcus pelo braço.

— Ei, você veio! O quê... – Teri disse quando a encontramos no caminho até o carro. Lynn e Crystal estavam com ela.

— Oi, desculpa. Eu preciso ir. – Falei, cumprimentando-a brevemente. – Te ligo mais tarde. E, pode dar uma olhada no seu irmão? Mas não brinque com ele.

— Por que? – Questionou ela, franzindo o cenho.

— Ele não vai estar de bom humor. – Alertei comedida. – Até mais.

Despedi-me e corri atrás de Marcus que saíra na frente quando eu parei. Será que aquilo significava que a minha “semana e tanto” havia finalmente começado?

Dentro do insuportável pouco espaço do carro, Marcus não me deixou ouvir sequer o som da sua respiração. Ele estava oficialmente me ignorando, mas ao descermos do veiculo, exatamente quando eu percebi que ele não tinha nenhuma intenção de parar e falar comigo, agarrei seu braço e o detive na entrada.

— Por que você está com tanta raiva? – Perguntei nervosa.

Tudo bem, eu estava errada. Mas também não era para tanto.

— Eu não estou com raiva, Amanda. Eu estou, primeiro, surpreso com a classe de idiotas com os quais você consegue se envolver. E, segundo, constrangido. Por ter feito um papel ridículo tentando te defender do que eu supus que fosse um ataque! – Esbravejou ele.

Eu sei que devia calar a boca. Eu sei.

— Por que diabos você achou que fosse um ataque? Eu não poderia beijar um garoto por simples vontade própria? Você deve achar que eu sou alguma freira só por ter crescido em um colégio interno. Nem parece que você também estava lá! O mais engraçado é que essa nem é a primeira vez que você faz isso.

Há dois anos, antes que Marcus deixasse o colégio interno, ele arremessou uma lixeira em um garoto que tentava pegar o próprio celular, que eu, da maneira mais infantil possível, me recusava a devolver. A má interpretação dele lhe rendeu um sermão e uma advertência.

— Aquilo foi um impulso. – Falou, relembrando o incidente.

— E aquilono lago foi planejado por acaso?

— Olha. Em todas as vezes em que nos encontramos nos jogos, aquele cara foi um puta pé no saco. E quando chegamos lá e ele pediu para falar com você, eu percebi que ficou desconfortável. Pensei que ele estava te assediando. – Verbalizou. – Você demorou e eu fiquei preocupado, então fui atrás de você. E quando eu vi ele segurando os seus braços daquele jeito, e como te beijava, pensei que estivesse te forçando. Então eu fiz o que qualquer um faria. Me desculpe por ser tão burro e não notar que não era bem isso. Eu sinto muito mesmo. – O sarcasmo na voz dele deixava claro que ele não sentia tanto assim. Mas acabei me sentindo mal de qualquer forma. Foi tudo culpa minha.

— Você tem todo o direito de ficar assim. Me desculpe. Eu sinto muito, de verdade, por não ter te contado nada sobre ele. É que ontem nós tivemos um problema e as coisas ficaram muito confusas. Acho que eu só queria esquecer.

— E aí eu te arrastei para aquele lugar, ao qual você nem queria ir… – Proferiu com escárnio, quando finalmente juntou todas as peças.

— Eu achei que não conseguiria. Mas tudo ficou bem no fim. Certo? Sem mortos. Só alguns feridos. – Zombei.

Marcus sorriu, mas seu olhar ainda era distante. Como eu havia sido estúpida. Isso que dá dar ouvidos a nossa maldita voz interior.

— Vamos almoçar. Ter socado a cara daquele mané me abriu o apetite. – Expressou, caminhando lentamente na direção da porta da frente.

— Tudo isso por uma rixa de jogo. – Brinquei seguindo-o.

— Eu não ligo para a porcaria de um jogo. Mas ele ter pego a melhor garota antes de mim… Isso sim é uma merda.

Fiquei parada por um segundo, olhando embasbacada enquanto ele abria a porta e adentrava o saguão da casa. Como ele podia ser tão impróprio e, ao mesmo tempo, tão charmoso dizendo esse tipo de coisa? A questão verdadeira era: Por que eu não conseguia repreende-lo? Porque não era nada demais? Ou porque, secretamente, eu gostava dos seus elogios engraçadinhos?

Que espécie de idiota é você, Amanda?

Tomei um banho e vesti-me antes de encontrar Marcus e meus pais na mesa posta para o almoço. Nancy trocava algumas palavra cordiais com nosso hóspede e lhe servia o que parecia ser algum tipo de assado, com um aroma que fez meu estômago virar uma cheerleader.

— Boa tarde – Cumprimentei a todos abrindo um sincero sorriso, como há tempos não fazia.

— Boa tarde, querida. – Minha mãe disse também sorrindo.

— Amanda. – Cumprimentou-me Michael.

—Oi, pai. – Sentei-me a mesa com toda a educação que tinha. De frente com o loiro angelical, que me encarava sem cerimonia. Qualquer resquício de constrangimento pela briga parecia ter desaparecido.

— Vocês não ficaram fora por muito tempo. – Comentou minha mãe, levando o garfo a boca. - Se divertiram?

Marcus olhou de soslaio para mim e de volta para ela.

— Foi um passeio bem interessante. – Marcus falou divertido.

— Mesmo? – Murmurou a mulher, tranquila.

— Fomos a um lago.

— Lago? – Michael pronunciou intrigado. – Me pergunto para que temos essa piscina enorme.

— Às vezes o convívio social é necessário pai.

Não queria admitir, mas aquilo foi uma alfinetada. Depois de todo o meu esforço para cessar as brigas entre nós, e eu é quem estava sendo rude.

— Eu sei que sim. Por isso estou ansioso pela semana que vem. Seus amigos estão certos sobre vir?

— Não tive tempo de falar com eles infelizmente.

Michael fitou-me com os olhos semicerrados, certamente em busca de resquícios de mentira. Senti como se ele estivesse escaneando dentro da minha mente.

— Eu estou... – Ele começou e tomei um sobressalto, batendo os joelhos na tampa da mesa. Por um breve instante todos me fitaram confusos e eu apenas sorri constrangida.

Então Michael continuou.

— Estou muito chateado que seus pais não possam vir. É mesmo uma pena não poder revê-los nessa ocasião. – Continuou ele, tirando-me do abismo da vergonha.

— Pois é. Infelizmente eles só retornam da viagem no dia seguinte ao da recepção. Mas tenho certeza de que em breve vocês poderão se encontrar para conversar e para que ele possa também agradecer a hospitalidade que estão tendo comigo. Desde já, quero eu agradecer por isso, senhor. Obrigado pela gentileza.

Michael sorriu amplamente. Ele nunca sorria assim. Nunca.

— Para nós é um prazer, Marcus. Além de seu pai e eu termos termos uma boa relação. Você e minha filha também parecem se dar muito bem. – Notei uma entonação insinuante em sua voz e me mexi desconfortavelmente na cadeira. – Fará muito bem a ela ter você aqui esses dias.

Dá para acreditar nisso?

Meu pai estava, descaradamente, me empurrando para Marcus. Eu queria jogar molho quente em suas calças e ocupar sua boca com gritos ao invés daquelas alegações impertinentes.

— Querido, você não tem que ir até o escritório? – Anne disse, parecendo perceber o clima pesado.

— Sim. Preciso revisar e assinar alguns papéis. Como Victor faz falta. – Reclamou, quase como se estivesse com saudades dele.

Victor havia viajado para o casamento da irmã, apesar de todas as chantagens emocionais de Michael. Seria o cúmulo do absurdo ele faltar sendo o padrinho.

Logo em seguida Michael saiu e pude me sentir mais relaxada.

— Então, crianças. O que pretendem fazer agora? – Anne perguntou atenciosa. – Gostaria de ficar e fazer-lhes companhia, mas uma velha amiga artista plástica está na cidade para uma exposição e prometi visitá-la.

— Tudo bem, mãe. Nós sobrevivemos algumas horas sem você. – Declarei com sarcasmo.

Anne abriu um meio sorriso, balançando a cabeça deliberadamente. Minha mãe não era o tipo de pessoa que se magoava fácil e isso era bem admirável nela, tenho que admitir. Quando ela se levantou e saiu da mesa, Marcus e eu continuamos nos encarando de maneira inquisitiva.

— Acho que você tem um admirador. – Comecei enfadada.

— Tenho? – Questionou-me ele, com surpresa.

— Não notou o quão impressionado meu pai está com você? Parece que eu estou vendo a segunda vinda de Cristo. – Zombei.

Marcus sorriu de orelha á orelha.

— Está com ciúmes?

— Não. Só acho que você deve ser o tipo de filho que ele sempre quis ter.

Por que sempre que eu dava o meu máximo para não transparecer aquele rancor, ele parecia sair até pelos poros da minha pele?

— Eu não sou perfeito, Amanda. Você já devia saber disso. – Ele disse, olhando-me fixamente. Mas desviei-me dele, achando a apelação emocional que seus olhos verdes e serenos representavam demais para mim.

— Vamos lá para cima! Tem uma coisa que eu preciso fazer, antes que seja tarde. – Ditei, levantando-me e tirando o copo de suco de melancia quase finalizado de suas mãos.

— E o que é tão importante que não pode esperar eu terminar o meu suco?

Puxei-o da cadeira e olhei-o seriamente.

— Contar à Lucy que eu estou namorando!