Pretty

Bem vinda, tentação.


Vamos, Amanda. Acabe logo com esse silêncio!

O garoto paralisado ainda aguardava, com um semblante sério, que eu prosseguisse.

— Eu já ouvi versões até demais dessa história. Mas a única que eu queria ter ouvido, desde o começo, é a sua. Era a única que realmente me interessava. – Falei magoada, vendo-o abaixar a cabeça. – Você desconfiou da minha habilidade de separar as coisas e de ser justa sobre se você era ou não uma pessoa confiável. E isso é o que mais me chateia, Adam. Você me pedia para confiar em você, enquanto você mesmo não confiava em mim.

— Eu sinto muito. – Adam disse, dando um passo a frente. Não me afastei, mas minha expressão deve tê-lo refreado. – Por favor, me perdoe.

— Eu não vou te julgar pelo que você fez no passado, Adam. Apesar de ter sido algo terrível. Você já me mostrou muitas vezes quem você é de verdade, e tem coisas que ninguém consegue fingir. Eu me apaixonei por você pelas suas ações e não pelo que ouvi dizer, e isso não vai mudar por causa de Janice, de Dave, ou de qualquer outra pessoa, por mais que eu entenda o quanto eles podem estar magoados. Mas, apesar de todas essas coisas que eu estou dizendo, eu preciso pensar. Você não foi sincero e não confiou em mim. E eu não vou fingir que não me machucou. – Aproximei-me dele e envolvi seu rosto com as mãos, mantendo a cabeça baixa. Não queria correr o risco de ceder. – Eu não quero mais falar, pois não vai mudar a forma como eu estou me sentindo. Acho que realmente só preciso pensar. – Conclui fitando-o.

Adam assentiu duramente, mas pareceu entender o que eu queria dizer.

— Só quero que você saiba que eu te amo! E que se não tive coragem de te contar antes, não foi por não confiar em você, mas por não confiar que não te perderia!

Novas lágrimas nasceram nos meus olhos e novamente senti que sufocaria.

— Me dê um tempo, ok? – Afastei-me dele e andei depressa até o carro.

Só queria a minha cama e colocar a cabeça no lugar. Mas já contava vários minutos dentro do carro do lado de fora da casa. Pensava em tantas coisas. Em tudo o que eu ouvira desde que chegara àquela escola, como tudo finalmente fazia sentido. Todas as indiretas de Dave sobre Adam. A posse de Janice. As advertências de Teri. Tudo. Quando foi que eu caí de dentro da nuvem?

Lentamente saí do carro, entrando em casa com passos de gato. Todas as luzes estavam apagadas, exceto por um ponto de luz no canto da sala de estar, onde uma poltrona de design clássico ficava, perto de uma mesinha redonda de madeira entalhada. Minha mãe estava sentada na poltrona, usando um hobby e pequenos óculos de leitura, que ela usava para ler o livro que segurava nas mãos. Imediatamente ela ergueu a cabeça para me ver com seus habituais olhos curiosos.

— Oi filha. – Ela disse, fechando o livro. – Você chegou cedo. Pensei que fosse...

— Não quero conversar agora mãe.

A mulher estreitou as sobrancelhas e levantou-se da poltrona. Mesmo brigando para controlar minhas emoções, não consegui conter as lágrimas que nasciam nos cantos dos meus olhos e a vontade de desabar ficou incontrolável. Anne apenas examinou meu rosto com toda a atenção e voltou a se sentar, agora no sofá.

— Não precisamos conversar. – Disse por fim, lacrimosa.

Eu queria... Eu precisava tanto que alguém me abraçasse, e os braços pela mulher oferecidos fizeram-me cair de pronto em um copioso choro. Refugiei-me imediatamente em seu colo, como se fosse um esconderijo seguro. Não queria pensar em nada agora, só desejava que aquele turbilhão de sentimentos ruins cessasse de uma vez por todas.

— Se quiser falar, em qualquer momento, eu estou aqui. – Minha mãe, depois de alguns minutos, ofereceu hesitante, passando a mão sobre a minha cabeça que estava apoiada em seu colo. Ergui-me, ficando sentada no sofá voltada para a frente, sem olhá-la diretamente. Senti como se tivesse despertado de um lapso.

— Eu só preciso dormir. – Falei, levantando-me do sofá. Caminhei até a escada, mas a culpa me impediu de subir sem mais nem menos, então virei-me mais uma vez para a mulher. – Mas obrigada.

Anne assentiu, com um meio sorriso, mas pareceu triste de qualquer forma. Ainda assim, me virei e subi para o quarto. Não queria que, por causa de um gesto humano, ela pensasse que éramos confidentes.

Acho que Lucy tinha razão quando dizia que nossa falta de convivência com sentimentos fortes, poderia dar nisso. Exagero nas reações. Sentia-me comprimida pela dúvida e pela sensação de ter sido menosprezada. Uma parte de mim se sentia puxada para dentro de um furacão e a outra se sentia segregada, como se não fizesse parte daquilo. Como se estivesse me metendo em algo que simplesmente não era sobre mim. Uma intrusa. No fim, Teri e Kyle estavam certos em não me contar nada, porque não era uma coisa que pertencesse a eles também, era algo íntimo que se tornara público demais. Eu não conseguia não sentir muito por Janice, mas, ao mesmo tempo, só queria que ela desaparecesse. E o problema, o pior deles digo, era que eu não tinha certeza se ainda conseguiria confiar plenamente em Adam e olhá-lo com os mesmos olhos de antes, apesar de o que eu sentia não ter mudado em nada. Argh, minha cabeça parecia uma roda da fortuna, que girava e girava, e sempre caía na pior possibilidade.

Depois de tomar um banho quente, para ver se aliviava um pouco o peso imaginário que eu sentia bem em cima da minha cabeça, deitei-me e olhei para o teto, sem realmente vê-lo.

Um dia após o outro. Um dia pior que o outro.

Minha vida estava girando para o sentido contrário e eu sabia que só eu podia fazê-la voltar a se endireitar. Eu precisava ter paz.

Mas quem sabe amanhã.

* * *

Abri os olhos, com a sensação de ter esquecido algo. Levantei meu tronco lentamente, colocando-me sentada na cama, e franzi o cenho. O que eu estava esquecendo…?

Marcus!

Solucei exasperada, olhei as horas no despertador e, enquanto corria para o closet, me perguntei porquê diabos não o havia ajustado para me acordar no horário certo. Agora estava atrasada e a pressa só me fazia ficar mais atordoada. Após escovar os dentes e me vestir, agarrei a bolsa na saída e corri escada abaixo, partindo depressa com o carro.

Marcus iria me matar! Meia hora atrasada. Para alguém impaciente como ele, seria equivalente a uma eternidade. Quando cheguei apressada ao saguão do aeroporto, não vi o loiro em parte alguma, então, por um segundo, pensei que o avião poderia ter se atrasado e fiquei aliviada. Mas quando duas mãos chegarão ágeis aos meus olhos, vendando-os, todo o meu alivio se transformou em ansiedade e inquietação. Virei-me depressa para o dono das mãos, bem macias por sinal, e sorri.

— Oi “Raio de Sol”. – O rapaz disse, sorrindo calorosamente.

— Olá, Marcus. Desculpe pelo atraso. Sei que você não gosta de esperar. – Falei com ânimo duvidoso.

— Eu não tenho problemas com isso há bastante tempo, Mandy! Pelo contrário, tenho toda a paciência do mundo.

Dei um meio sorriso e olhei para os lados, acanhada.

— Vamos? – Perguntei afobada.

— Claro. Só estou esperando para ver se você vai me dar um abraço de boas vindas ou vai ir me chutando até o carro enquanto eu agradeço a hospitalidade.

Sorri sem graça e aproximei-me para lhe dar um abraço, que ele retribuiu firme e forte. Com a camiseta branca casual e um pouco justa que usava ele parecia ainda maior que dá ultima vez em que o virá pessoalmente. Será que ele estava tomando algo para crescer assim? Acho que não, porque parecia tudo muito natural. Mas talvez eu zombasse dele quando estivesse com um humor mais aceitável.

Cessei nosso caloroso abraço, tentando não me importar com o quão bonito ele ficava “vestido de civil”, e o acompanhei pela saída até o carro. Após acomodar as malas, Marcus se sentou ao meu lado, no banco do carona, e com um enorme sorriso colocou um par de óculos-escuros pretos e o braço direito apoiado na base da janela aberta.

— Sabe, Mandy… Eu sinto que esta vai ser uma semana e tanto.

Ergui uma sobrancelha, dando a partida no motor potente do reluzente Camaro Cupê, e ri baixinho, sacudindo a cabeça de um lado para o outro. Marcus era muito bom com pressentimentos, e sabe o que era péssimo? Que minhas semanas, desde que eu chegara àquela cidade, eram sempre semanas e tanto. E esse “tanto” sempre significava “desastre”. Então, o que esperar de uma semana e tanto?