Eu achei esse diário hoje, escondido no sótão. Não faço idéia de quem era, não parece o tipo de coisa que mamãe teria, e está velho e empoeirado demais para ser algum presente que papai tenha comprado pra alguma de suas namoradas. Talvez seja de alguém que tenha morado aqui antes, mas eu não sei. A casa é velha, pode ser de alguém de fora da cidade. Acho que nunca vou saber, afinal está todo em branco, com exceção à contracapa, que tinha algo escrito, sim.

"Pertence a:
C.B."

Isso me dá arrepios.
São as minhas iniciais.

Antes de qualquer coisa, tem algo que você precisa saber sobre nós. Nossa cidade é real, mas não existe. Northlake é uma cidade pequena, em um cantinho esquecido do Maine, Estados Unidos da América. Mas você nunca vai achar ela em um mapa, nem vai ouvir falar de nós no noticiário. Somos uma Cidade-Branca, por que é como se, para o resto do mundo, estivéssemos escondidos em meio as nuvens (ou ao menos eu e meu irmão chamamos assim). Existem várias delas nos EUA, você certamente já ouvir falar de alguma (Haven, Hawkin,Chesters Mill, Wayward Pines, etc), sua existência comprovada por seus habitantes e apenas conhecidas por quem é de fora por boatos que se espalham rápido e em semanas são esquecidos. Sabe, não tem como documentar a nossa cidade. Você não pode simplesmente tirar uma foto e levar ela embora, ou comprar um exemplar do jornal local para mostrar aos seus amigos. Há uma espécie de magia que nos protege. Fotos que pareciam perfeitas, não são mais do que um borrão ao cruzar o limite da cidade. Textos inteiros se resumem a uma folha em branco ou uma mancha de tinta ilegível. A cidade não quer que outros saibam. Muitos não ficam nem com suas memórias ao irem embora, e os quando as mantém não é por muito tempo, aos poucos as imagens de Northlake gravadas em sua mente vão tornando-se imprecisas e distantes, como um sonho da noite passada, até que você simplesmente esquece. Northlake existe sempre, firme e sólida, mas só para nós.
Cidades assim existem por um motivo: as vezes, a "realidade" não é boa o bastante para a verdade que se esconde atrás das cortinas. Ninguém nos ouve, ninguém nos vê, e as vezes eu acho que sou a única que percebo.

Mas eu descobri um jeito, uma maneira de burlar as regras. Eu descobri meio de contar a verdade. Não sei ao certo o porque deu certo.
Talvez a Cidade queira que eu conte tudo.
Do meu jeito.
A verdade escondida por trás das cortinas, que ninguém mais vê.
Espero que não se importe se eu for rude ou direta demais. Se eu fosse delicada, você não entenderia direito a coisa.