Murtagh neste momento se encontra próximo da costa, na Espinha. Ele rondara toda a Alagësia e por mais que não tivesse lugar fixo, de alguma forma ele sempre acabava ali. Sempre ao final de uma viajem Murtagh se sentava numa grande pedra no alto de um monte que tinha a vista para o mar, era somente um ponto azul no horizonte, mas mesmo assim era o mar.

Perto do anoitecer com as costas para a paisagem perturbadora da Espinha, virado para o ponto azul e de olhos fechados Murtagh meditava. Ele pensava em nada especificamente, ficava só ouvindo os animais e insetos, sentindo o vento e os poucos raios de luz que lhe batiam na perna. Tentar prestar atenção nas ondas se desfazendo nas rochas ao longe era um ótimo treino. Porém Murtagh não tinha mais pelo que lutar. Certos dias achava um desperdício de tempo, mas se não treinasse o que ele faria?

Um dia Murtagh havia estado num humor tão escuro pensando nos pecados que cometera, nas pessoas que perdera que quase havia ido até Eragon. Ele sabia que o irmão o ajudaria a se sentir melhor, mas no meio do caminho desistiu, ele não queria se sentir melhor, queria enfrentar tudo o que fizera, mesmo que isso o destruísse e uma parte mais sombria dele desejava que isso acontecesse. Murtagh não via Eragon dês da última batalha contra o rei, ele já o contatara, mas foram comunicações curtas e pelo visto o irmão havia desistido de conversar com o cavaleiro solitário, fazia um ano que nenhum dos dois se falava.

Murtagh ouviu passos, vários passos. Neste momento estão há três quilômetros de distância. Cinco homens, ele conseguiu identificar. O Cavaleiro continuou sentado, mesmo que nunca tenha visto alguém andar por aquelas áreas, que eram chamadas de amaldiçoadas, não se deixou abalar pelo grupo que se aproximava.

Dois quilômetros. Murtagh começou a prestar atenção nos passos da formiga que subia na pedra onde ele se sentava. Comparando com a formiga o grupo de humanos são desajeitados e barulhentos. Um quilômetro. O sol havia se posto faz algum tempo agora, mas Murtagh continuava imóvel.

Pela direção que o grupo vinha Murtagh pode dizer que partiram de Carvahall. A cidade onde o irmão passara sua infância estava só alguns quilômetros de Murtagh, mas ele nunca sentira vontade de passar por lá. Somente sobrevoar o local já o fazia lembrar-se de coisas que queria esquecer completamente.

Agora a pessoa mais próxima do grupo estava só a alguns metros de Murtagh, mas ainda oculta pela floresta. O Cavaleiro esperou, no momento em que a pessoa colocou o primeiro pé para fora da cortina de árvores Murtagh virou-se na pedra, saltou três passos até onde o intruso se encontrava e o imobilizou contra uma árvore. Somente aí abriu os olhos.

A pessoa que Murtagh imobilizava é um soldado de no máximo vinte e cinco anos, a expressão de seu rosto era de total medo. Os outros soldados chegaram pouco tempo depois, mas Murtagh continuou encarando aquele a sua frente.

– Acalme-se Murtagh – falou um homem alto musculoso que tinha vestes nobres e carregava um martelo na cintura, pela posição do resto do grupo este era obviamente o líder.

Largando o soldado Murtagh virou para o que falara com ele tão calmamente. Nesses anos Murtagh evitara todo o contato humano possível, mas nas poucas vezes que falara com alguém este se sentia aterrorizado pela presença do Cavaleiro.

– Há quanto tempo, Roran – cumprimentou Murtagh. Ali em sua frente se encontrava Roran, “Martelo Forte”, seu primo. Algumas vezes Murtagh ria amargamente ao pensar que antes achava que estava sozinho, porém mais tarde descobriu ainda ter um irmão e um primo. Apesar de sentir Roran ainda menos como família do que Eragon. Mas se pensasse bem, aquela coragem estupida deveria correr no sangue da família de sua mãe.

– Dois anos para ser exato – Roran comentou.

– Por que está me procurando? Suponho que não tenha vindo até aqui para fazer um passeio – disse o Cavaleiro se apoiando na rocha e cruzando os braços.

– Tenho uma mensagem de Nasuada – disse Martelo Forte, os olhos de Murtagh se estreitaram ao ouvir o nome da Rainha – Ela pede para que a encontre o mais rápido possível.

– O que ela quer? – Murtagh perguntou com olhos estreitos e maxilar cerrado.

– Não sei, Nasuada só pediu para que procurássemos por você e se o encontrasse, mandar a mensagem – disse Roran – Mas posso dizer que por seu comportamento é algo de suma importância.

Murtagh e Roran se encaram por alguns segundos. O primeiro com sua costumeira postura desafiadora e o outro com a firmeza do líder que se tornou na guerra.

– Posso considerar a mensagem entregue? – Roran perguntou.

Murtagh simplesmente concordou com a cabeça, o Cavaleiro parecia absorto demais em seus pensamentos para usar palavras. Roran percebendo que não conseguiria mais nada dele ordenou para que seus soldados voltassem para Carvahall. O mesmo estava entrando na floresta quando parou e virou-se para o primo.

– Murtagh – ele disse a fim de chamar-lhe a atenção e somente continuou quando o Cavaleiro levantou os olhos alguns segundos depois – Não sei o que aconteceu entre você e Nasuada. Não sei o que fez nesses últimos dois anos e também não sei quais são suas intenções ao vagar por aí sozinho. Mas não deixe que essas coisas atrapalhem sua verdadeira missão. Pois uma coisa eu sei, você é um Cavaleiro de Dragão, Murtagh.

Com estas últimas palavras Roran entrou na floresta deixando Murtagh sozinho novamente. O Cavaleiro nem se deu ao trabalho em subir na rocha, escorregou ao chão e com as costas apoiadas na pedra voltou a meditar. Mas desta vez ele não ouvia as ondas se quebrando, agora sua mente estava num lugar muito mais longe do que o mar.

Depois daquele último encontro com Nasuada o Cavaleiro nunca tentara entrar em contato com a nova rainha e nem ela com ele. Nasuada era uma das poucas pessoas, senão a única, que entendia o porquê dele ter se afastado, então que motivo ela teria para chama-lo?

Thorn, Murtagh chamou seu dragão que estivera presente através de sua mente durante todo o acontecimento. Sim?, ele respondeu. Murtagh conseguiu sentir o gosto de cervo tostado na língua de Thorn através da ligação que os dois compartilhavam. Ignorando a sensação o Cavaleiro falou Nós vamos para Urû'baen.