Já estava há quatro meses namorando com aquele rapaz. Era, talvez, o primeiro relacionamento que mantinha por tanto tempo, em grande parte por ainda não ter apresentado o homem a sua estranha família.

Não aos seus pais, claro. Lao e Poppy haviam realmente gostado do rapaz quando apareceram de surpresa e a mãe estava mesmo criando a expectativa de vê-la casada logo. Não, pela primeira vez na vida seu problema não era os Bei Fongs, mas sim de seus amigos de guerra, aquela família de quem era mais próxima.

Era um dia importante para o grupo. O primeiro aniversário do caçula do Avatar, Tenzin era um bebê engraçadinho e o primeiro dominador de ar a nascer em mais de 130 anos e por isso estavam dando uma festa gigante de comemoração.

Talvez aquele não fosse o melhor momento para apresentar alguém, era uma festa de família no fim das contas, mesmo que tivessem muitas pessoas além da família, mas de qualquer forma ele já estaria lá de qualquer forma.

— Você não precisa se preocupar, querida — dizia Poppy, arrumando a massa negra sobre a cabeça da filha — Seus amigos vão gostar dele, é um cara legal e vai ser um bom pai um dia.

Apenas esse comentário já fazia sua barriga revirar de uma forma estranha. Não estava pronta para ser mãe ainda, nem sabia se estava pronta para casar, na verdade até se perguntava se aquele relacionamento não havia sido apenas um impulso, afinal, depois que Sokka havia lhe dito que estava pronto para pedir Suki em casamento, ela percebeu que seria apenas ela.

O enjoou subiu por suas corpo e ela foi obrigada a erguer a cabeça para não vomitar. Gostava das crianças no fim das contas, inclusive já havia ouvido algumas piadas do tipo "seus instintos maternos".

— Mãe, sem pressão — ela respondeu, colocando a mão sobre a barriga na tentativa de acalmar.

"É normal estar nervosa, Toph" ela dizia para si mesma enquanto a mãe colocava mais um grampo em seus cabelos "Você não tem um namorado sério desde Satoru".

Tinha 31 anos agora e sabia que o comentário geral era que ela deveria se estabilizar, alguém para lhe fazer comida agora que nenhum dos irmãos poderia estar por perto para cozinhar para ela e ajuda-la com as coisas básicas que, como cega, ela não podia fazer sozinha.

Talvez tenha sido esse o grande fator que a levou a sair com um não-dominador da nação do fogo que ela conhecia a menos de algumas horas. Mas ele parecia conhecer o seu ponto fraco: bajulação e foi assim que começaram a passar cada vez mais dias juntos.

Logo Kantoo já estava acostumado a ir para a casa dela depois do expediente para cozinhar para ela e antes que pudesse perceber seus encontros com Sokka se tornaram cada vez mais breves, apenas no conselho e em alguns encontros da gAang.

— Pronto filha. — disse Poppy, segurando os ombros de Toph, sabia que a filha não podia ver, mas estava feliz que ela havia confiado na mãe para aquele dia — Você está linda.

— Obrigada mãe — ela respondeu, tocando a mão da mulher atrás dela.

Havia algo de estranho naquele dia, algo que a estava incomodando há muito tempo e não era sobre o fato da rainha doçura ter realmente aprovado seu namorado, apesar de que isso realmente a fazia se questionar sobre o caminho que estava tomando em sua vida. Porque se Katara estava achando que bom, então talvez ela devesse estar fazendo o contrário.

Mas não era a esposa do Avatar que a incomodava naquela noite e sim o irmão dela que parecia estar evitando tudo e qualquer um. Ela conhecia aquele temperamento dele, mas normalmente era algo que ela conseguia concertar com algumas horas e na manhã seguinte a noiva e ele se acertariam de novo e todo o drama estaria acabado, mas não parecia o caso.

Aquela situação era insuportável, estar no meio de uma casa lotada com um vestido bonito, bancando a namorada perfeita enquanto seu amigo estava em algum lugar longe de tudo. Toph odiava as festas de criança do seu grupo de amigos, mas ter Sokka por perto tornava as coisas menos piores em dias normais. Costumavam se esgueirar para o mais longe possível das outras mesas fazendo pequenas apostas e desafios bobos e ocasionalmente bebendo quando algum dos seus amigos mais responsáveis se compadecia dos únicos "não pais" da festa.

Estava tão desconfortável que sua barriga revirava, todo o conteúdo parecendo querer passar e atingir a superfície e então ela pediu licença para tomar um ar.

A noite a recebeu com uma brisa fresca no rosto quando atingiu a sacada que dava para o jardim privativo do Avatar, o silêncio e a falta de ondas sob seus pés a fez perceber que estava sozinha, ou quase. Em algum lugar a sua esquerda havia uma fonte de água gorgolejando e e alguém que atirava pedras contra ela para que quicassem.

— Por que você nunca me desafiou a isso? — perguntou, sentando-se ao lado do rapaz, sentindo uma tontura repentina, atribuiu isso a própria presença dele, não era a primeira vez que esse tipo de coisa acontecia quando ele estava por perto — Parece muito mais legal do que trapacear crianças.

— Claro que parece — ele respondeu, pegando outra pedra do pequeno jardim e a atirando contra a fonte — Aqui você pode me trapacear.

Toph ouviu os três baques úmidos que a pedra deu na água antes de afundar na água, mas o que mais chamou a sua atenção foi o tom bêbado que parecia se insinuar na voz do mais velho.

— Porque trapacear crianças inocentes se você pode trapacear um bebêzão de 34 anos — ela respondeu, acertando um chute com o calcanhar na parte inferior das coxas firmes, uma vez ele havia dito que começara a se fortalecer para aguentar melhor os golpes dela, sabia que era brincadeira, mas gostava de imaginar que era verdade — É o que eu sempre digo.

Ela esticou a mão para pegar o cantil e ele nem tentou negar, sabia que era impossível. Mas apenas sentir o cheiro quente da bebida e imagina-la descendo pela garganta, rasgando o caminho até o estômago já foi o suficiente para que embrulhasse de novo.

Talvez devesse ceder de uma vez e deixar Katara a examinar, talvez todos aqueles anos tomando chá quente e álcool de barriga vazia estivessem cobrando o seu preço no fim das contas. Não dava pra dizer que ela não havia sido avisada.

— Então, porque você está estranho? — perguntou ela, esticando as duas pernas sobre ele — Ela não aceitou seu pedido?

— Eu não pedi — ele respondeu, escorregando os dedos por debaixo da saia e os deixando descansar sobre a panturrilha firme da amiga — Mas você... — ele fez uma pausa, colocando o peito contra os joelhos dela e esticando as mãos para pegar o cantil esquecido em suas mãos — Parece que não vai demorar muito com o seu novo senhor certinho. — ela bufou, quase rindo com o ciúmes mal disfarçado na voz dele e não precisava sentir o coração para saber disso — Parece uma versão masculina da minha irmã.

— Você nem conhece ele — respondeu, apoiando os dedos do pé contra a barriga, o calcanhar roçando contra a virilha em uma tentativa de achar uma boa posição para afasta-lo do cantil.

Estavam perto demais agora, o peso dele apoiado sobre os joelhos dela enquanto se apoiava em uma única mão na tentativa de pegar a peça de platina das mãos da cega, forçando-a a ficar encolhida contra a pilastra da sacada. Ele havia erguido o vestido de Toph com aquela gracinha e agora ela podia sentir o vento da noite em suas coxas nuas.

Já estavam acostumados aquele tipo de brincadeira, provocações que nunca iam muito além de qualquer forma, mas isso não evitava que ela ainda tremesse com o contato.

— Quando foi a última vez que eu jantei com você? — perguntou, o hálito embriagado a envolvendo quando ele sussurrava em seu ouvido — Ah é, há 3 meses — respondeu, usando a outra mão para se apoiar no chão, tocando a testa com a dela.

— Eu achei que você estava planejando um casamento — respondeu de forma inocente, espalmando as duas mãos no ombro dele, sentindo os próprios braços dele se fechar em torno dela. O cantil esquecido em sua mão.

— Como posso planejar meu casamento sem minha melhor amiga? — ele perguntou, afundando o nariz em seu pescoço, aquele gesto sempre mandava ondas quentes por suas costas e a fazia arquear.

O pés que se apoiava na base da barriga de Sokka foi a primeira coisa a escorregar e em poucos segundo ele estava caido entre as pernas dela, toda a estrutura desmontada com a falta de uma simples sustentação.

Os dois riram da situação estranha. A sacada interna da casa não era uma área de circulação comum da casa, mas a porta também não ficava trancada, de modo que sabiam que poderiam ser pegos a qualquer momento, mas não estavam fazendo nada demais para se preocupar.

— Eu acho que bati a cabeça — disse, esfregando o lugar onde os grampos cravaram no couro cabeludo, não parecia machucado no entanto.

— Deixa eu ver — ele respondeu, puxando cada uma das peças com delicadeza, antes de afundar os dedos no meio das mechas negras. — É, parece que não tem nada — completou puxando a cabeça dela para mais perto até estar sobre o seu ombro e então bagunçou os fios, deixando-os cascatear pelas costas.

— Então você já pode parar — ela respondeu, dando o seu melhor para parecer irritada enquanto se afastava do corpo forte.

Foi quando tudo pareceu acontecer em um lapso de tempo. Ela podia sentir os olhos dele sobre o rosto dela, os braços a mantendo no lugar; podia sentir o batimento descompassado de seu coração, mas naquele momento não tinha mais certeza de qual batimento era dela e qual era o dele, então rastejou os dedos até alcançar o pulso dele.

Foi em algum momento nesse meio tempo que ele a puxou — ou talvez ele tenha descido — selando a distância entre os lábios. Ela não tinha certeza de quando foi isso, mas sabia que estava segurando o pulso dele quando Sokka colocou a mão em sua coxa, a puxando para o seu colo e ela não apresentou qualquer resistência a isso.

Ela soltou o punho dele e então correu os dedos para os seus ombros, então pelo pescoço e logo estava tateando a face. No meio da escuridão, quando pararam de se beijar, o rosto dele era, provavelmente, a coisa mais clara em sua mente.

Ficaram ali no ar fresco, enroscado nos braços um do outro. As mãos dela ainda apoiadas no rosto dele enquanto se encaravam em uma conversa silenciosa sobre o que deveriam fazer a seguir, depois que recuperassem o fôlego.

Os dedos curiosos da dominadora de metal correram pelo rosto mais uma vez, desenhando os lábios ainda inchados de seu melhor amigo. Aquilo era tão errado e mesmo assim não pode impedi-la de beija-lo mais uma vez. Podia sentir as mãos dele ainda deslizando sob o vestido, fazendo a pele nua se arrepiar com o toque frio e repentino.

Ela não perdeu tempo em fazer o mesmo, deslizando as duas mãos por sob o colete e o empurrando sob os ombros dele. Em algum momento Sokka havia feito o mesmo com o vestido, porque agora ela podia sentir a brisa fria esfriando a pele quente logo que ele passava deixando seus beijos.

Nenhum dos dois falou nada pelo tempo que passaram juntos. Sabia que estavam errados e era melhor evitar ativar a parte consciente que parecia ter adormecido em meio as carícias.

Levaram um bom tempo para recuperar o fôlego. Os corpos suados parecendo incapazes de se descolar, mas então aconteceu o que Toph vinha conseguindo evitar o dia inteiro e ela vomitou na grama do pequeno jardim de seus amigos com Sokka segurando os fios negros a suas costas.

Por algum motivo, esperava que ele fosse embora depois daquilo, mas ele apenas limpou a boca dela e voltou a aninha-la em seus braços, acariciando os fios macios enquanto ajeitava o vestido em suas costas.

— Eu vou levar você para casa e dizer que você passou mal. — afastou-a um pouco, correndo a mão pelas manchas roxas que havia deixado no momento de descuido, não era uma mentira completa e isso era uma vantagem para os dois — Katara vai ver você amanhã e eu não quero discussão — ele disse tocando a ponta do nariz.

Nenhum dos dois falou sobre Kantoo ou Suki, não era algo que passava se quer nos limites da cabeça deles, problema para outra hora. Por mais que Toph soubesse que ele entenderia tudo assim que visse as manchas em sua pele clara.

Então ele a ajudou a se colocar sobre seus pés de nova, era mais fácil para ele se arrumar do que ela e no fim das contas, o seu mau estar havia servido de alguma coisa na noite. Guiou pelo caminho até a saída dos fundos que não passava pelo salão principal onde estavam todos e então sumiram na escuridão, apenas os faróis do satomovél brilhando na imensidão.