Outra vez

Capítulo 3 - Não sinta


Megan suspirou cansada enquanto o motorista abria a porta para que ela pudesse descer em frente a mansão, aquela noite parecia não ter fim. Sorriu minimamente e agradeceu a mão estendida que a ajudava com o vestido volumoso. Subiu três degraus da escada da entrada enquanto ouvia o carro se afastar.

Fechou os olhos ao sentir um vento gelado perpassar por sua face e observou as imponentes janelas francesas. A mansão Marra ainda guardava o esplendor de outrora, mas lhe faltava a alegria que sentira ali durante a infância. As paredes agora abarcavam um ambiente frio e solitário.

Fechou a porta atrás de si subindo a escadaria do hall de entrada na escuridão. Já estava acostumada com aquele caminho após muitas noites de bebedeira que tivera na adolescência e se aprimorara em subir para o quarto sem ser notada.

A casa estava em silêncio sepulcral enquanto ela acendia as luzes do quarto da adolescência. O cômodo tinha se transformado um pouco, mas ainda guardava resquícios e fotos daqueles anos. Megan fitou um porta retrato que ficava em sua penteadeira enquanto retirava os brincos. Na foto os pais e ela sorriam felizes na sua festa de aniversário de dezesseis anos. Lembrava-se daquele dia como se fosse ontem, ao acordar os pais a surpreenderam com um gigantesco café da manhã e com suas presenças, já que normalmente sempre estavam trabalhando, Dorothy e Brian também estavam por ali, assim como seu grandpa.

Suspirou. Não queria pensar naqueles anos. As coisas tinham mudado, ela tinha mudado e sua família também. Ainda conversava com a mãe diariamente, mas não a via há três meses, quando ela viera passar uma semana na mansão. Desde que se tornou embaixadora da ONU para causas humanitária Pâmela percorria o mundo com seu novo marido a tiracolo. Megan não tinha raiva de Ernesto, até gostava do novo padrasto, mas sentia ciúmes, como se ele estivesse retirando a mãe de sua vida aos poucos, manipulando sua atenção em seu tempo livre.

Jonas, apesar de tudo, ainda era seu pai e mesmo que não se falassem diariamente, Megan sabia que ele se arrependia amargamente por não ter lhe dado mais atenção no passado, o que tentava remediar ao longo dos últimos anos. Atualmente, ele vivia no Brasil e estava proibido pela justiça de sair do país, vivia em prisão domiciliar com Verônica e os dois filhos gêmeos. Megan sabia que não se falavam mais pois todas suas ligações eram monitoradas, mas sempre que podia o visitava e passava um ou dois dias em sua companhia.

Sentia falta de sua família, de vê-la reunida. Fora o trabalho e o serviço voluntário que fazia pouca coisa realmente instigante lhe restara na vida. Talvez fosse este o principal motivo de ter aceitado aquele pedido de casamento tão repentino, queria construir uma família, desejava filhos para povoar aquela casa e um marido em quem se apoiar. Conhecia Ian há poucos meses, mas sentia como se fosse há anos, tamanha a intensidade daquilo que viviam.

— Alice, are you sure?(Alice, você tem certeza?) – Megan perguntava enquanto era arrastada pela amiga para dentro de uma boate em Nova Iorque. – I have several appointments tomorrow. (Tenho vários compromissos amanhã.)

— Don’t worry. Just a few minutes and we can go. (Não se preocupe. Apenas alguns minutos e poderemos ir.) – Ela sorriu e Megan sabia que levaria mais do que alguns minutos. - I have a friend that I want you to meet. (Tenho um amigo que eu quero que você conheça.)

Megan suspirou enquanto a seguia pela pista de dança lotada em direção a parte mais restrita da boate. Estava em Nova Iorque por alguns dias para a semana de moda e também para se encontrar com clientes da Marra. Tinha um almoço de negócios no dia seguinte e não poderia se atrasar. A empresa estava com maior aceitação no mercado desde que Davi assumira a presidência, mas ela não podia falhar nos primeiros meses trabalhando ali.

Alice era uma amiga de longa data. Conheceram-se enquanto ambas frequentavam o colégio no Vale do Silício e mesmo sendo filha de empresários da tecnologia ela quis seguir a carreira de atriz, ao longo dos anos tinha feito papéis relevantes no cinema e algumas participações em séries televisivas, desde setembro ela era a protagonista da série de maior sucesso da temporada da HBO. Megan tinha assistido apenas sua estreia, mas sabia que as críticas eram positivas. Por isso estavam ali aquela noite, era uma confraternização de final de gravações da temporada entre o elenco e produtores da série.

Hello, guys. The joy of the party is here. (Olá, pessoal. A alegria da festa está aqui.) – Alice disse sendo abraçada por alguns dos colegas. – I want you to meet my friend, Megan Lily. (Quero que conheçam minha amiga, Megan Lily) – Megan viu quase todas as cabeças a encararem como se a conhecessem, cumprimentando-a ao longe e se sentou ao lado de Alice na grande mesa. – Where is Ian? (Onde está o Ian). – Alice perguntou a um dos homens mais próximos.

Megan não ouviu a resposta. Sentia-se deslocada ali, não conhecia ninguém. Após alguns minutos disse a Alice que ia ao bar e a amiga apenas assentiu em concordância. Megan suspirou como se desejasse não estar ali e passou a mão pelos cabelos curtos enquanto se sentava em uma das extremidades do grande balcão que formava o bar da parte superior da boate. Pediu algo ao garçom e sentiu alguém se sentando ao seu lado.

Hello, I was asking myself why you are so lonely. (Olá, estava me perguntando por que está tão sozinha). – Megan nem se virou em direção aquela voz masculina grave bebendo um gole daquilo que pedira. – Maybe because you don’t want to talk to an idiot like me. (Talvez porque você não quer falar com um idiota como eu). – Megan se perguntava quando ele desistiria.

— You’re right. (Você está certo.) – Movida pela curiosidade ela se virou para seu interlocutor e aquilo que encontrou a impressionou. – But I could give you a chance. (Mas poderia lhe dar uma chance.)

O homem sorriu enquanto o garçom lhe entregava um whisky. Seus olhos não se desviaram do de Megan e ela percebeu que ele era muito mais bonito do que a média geral, pela roupa que portava, pelos cabelos alinhados e pelos olhares que ele recebia das pessoas ao redor, principalmente mulheres, Megan supôs que ele fosse alguém conhecido, talvez um modelo, ou até mesmo um ator.

I’m Ian MacKay. Nice to meet you. (Sou Ian MacKay. Prazer em conhecê-la.)

— Are you scottish? (Você é escocês?) – Megan perguntou curiosa.

— What did denounce me? My hair or my name? (O que me denunciou? Meu cabelo ou meu nome?) – Ele sorriu ao que Megan também sorriu, o humor dele era contagiante. Ian passou as mãos nos fios ruivos os bagunçando um pouco e Megan sentiu vontade de bagunça-los mais.

— Both. I’m... (Ambos. Eu sou...)

— I know who you are Megan. (Sei quem você é Megan). – Ian disse e ela o olhou surpresa, não por ele saber quem era ela, mas por admitir isso, as pessoas geralmente fingiam não conhecê-la, homens principalmente, de modo a não mostrarem-se interesseiros.

— I think everyone knows. (Acho que todos sabem.) – Megan murmurou o encarando com os ombros curvados, odiava a fama gratuita que tinha por causa dos pais. – You seem to be known too. (Você parece ser conhecido também.) – Megan disse reparando que duas mulheres o encaravam do outro lado do bar.

— I’m an actor. (Sou um ator.) – Megan o mediu como se o avaliasse, o que não passou despercebido por Ian, mas ela não se importou.

Ele deveria atuar na série de Alice, talvez fosse até mesmo a pessoa que ela queria apresentar. Não podia negar que ele era bonito e deveria ser bom de pegada também. Megan mordeu os lábios ponderando os pós e os contras para aquilo. Há tempos não ficava com caras apenas por uma noite, seu último namorado sério tinha sido Tuca e a relação findara um ano depois quando ambos perceberam que não tinham muitas coisas em comum, principalmente na parte sexual. Ian parecia ser o tipo de cara do qual ela não se arrependeria em se envolver casualmente e seria ideal para acabar com o longo período de seis meses em que ela não ficava com ninguém. Sem pensar muito ela o beijou e o que começou no bar daquela boate terminou em um quarto de hotel.

Megan não acreditava que aquela noite se tornaria um namoro sério. Ela pretendia deixá-lo naquele hotel na manhã seguinte e seguir para os seus compromissos. No entanto, quando acordou ele já estava em pé revisando um roteiro e a conversa fluiu naturalmente. Ela conheceu mais sobre a vida dele. Ian tinha 28 anos, vivia em Los Angeles, era protagonista da mesma série de Alice, cursara cinema em Yale contra a vontade do pai que era advogado e morava em Edimburgo, a mãe morrera quando ele tinha dez anos, seu primeiro papel na televisão foi de coadjuvante em uma série na NBC, esperava ser indicado ao Emmy com seu primeiro protagonista e tinha um cachorro que se chamava Spock.

Aquela referência ao mundo nerd ligou um alerta na mente de Megan e ela se apressou em sair dali, pouco falando sobre si. Ian perguntara se podia ligar depois para que eles voltassem a sair e Megan dissera que sim, mas não passara seu telefone, nem ele tinha pedido.

Uma semana depois quando ela já estava em Palo Alto ele ligou, disse que tinha conseguido o número com Alice e a convidou para um encontro na sexta. Megan quis apresentar uma desculpa, mas era muito fácil gostar dele, de sua conversa e de sua presença. Marcaram algo para o sábado e ele a levou para um show em Los Angeles.

Três encontros depois Ian a pediu em namoro e ela aceitou pois já se afeiçoara a ele e sua constante presença. O namoro foi discreto no início, ele também prezava pela própria privacidade, mas depois de muitos rumores e algumas fotos Megan admitiu tudo para imprensa. Há oito meses estavam namorando e na última quinta ele a tinha pedido em casamento durante um jantar na mansão Marra. Para muitos era um passo apressado na relação, mas para eles não, pois tinham vivido muitas coisas nos últimos meses. Mesmo morando em cidades diferentes, sempre se encontravam aos finais de semana, mesmo que fosse apenas para se verem algumas horas. A distância não era um empecilho e os planos que eles faziam para o futuro eram semelhantes.

Megan terminava de passar um creme nas pernas enquanto se preparava para dormir quando ouviu o celular tocar. Sorriu por já antecipar que era seu noivo do outro lado da linha esperando dizer boa noite ou bom dia, já que ele se encontrava na Escócia em visita a família durante os dias de férias que tivera.

— Sweetheart, I miss you. (Querida, sinto sua falta) – Megan ouviu assim que atendeu e sorriu por também sentir saudades dele.

— Me too. When will you come back? (Eu também. Quando vai voltar?)

— On Wednesday. (Na quarta-feira.) – Megan se recostou em um dos travesseiros enquanto o ouvia. Mais quatro dias e o veria. – My father wants me to stay until the weekend, but I have some business to attend and I want to see my fiancée as soon as possible. (Meu pai quer que eu fique até o fim de semana, mas tenho alguns negócios a resolver e quero ver minha noiva o quanto antes.)

— I’m sure she wants to see you too. (Tenho certeza que ela também gostaria de vê-lo.) – Megan reprimiu um bocejo enquanto pensava no quão forte era aquela palavra; noiva.

— Are you tired? (Está cansada?) – Não pôde evitar sorrir novamente, ele sempre estava preocupado com o bem estar dela. – I can call you in another time. (Posso ligar em outro momento.)

— No, I’m just a little bit tired. I worked so hard today and then we had the realease of the new Marraphone. (Não, estou só um pouco cansada. Trabalhei muito hoje e depois tivemos o lançamento do novo Marra Fone.)

— I’m sure it was a success and you were beautiful. (Tenho certeza que foi um sucesso e você estava linda.) – Ambos riram ao telefone. – I have some news too. (Tenho algumas notícias também.)

— Good ones. I hope. (Boas. Eu espero.) – Mais um bocejo reprimido, estava realmente cansada, mas ainda não tinha falado com Ian naquele dia tão corrido.

— Excellents. They offered me the role of Flash in the new movie of Justice League. (Eles me ofereceram o papel de Flash no novo filme da Liga da Justiça.)

— In which multiverse? (Em qual multiverso?) – Megan disse rindo ao pensar nos hábitos um pouco sedentários do namorado, apesar do corpo malhado que ele mantinha.

— In this one. (Nesse.) – Ela pode ouvir a risada através da ligação. - I thought superheroes were not your area of expertise. (Achei que super-heróis não fossem sua área de especialidade.)

— They aren’t. (Não são) – Seu sorriso sumiu ao se lembrar que em um passado remoto ela folheara quadrinhos do Flash em um quarto garagem. – How is your dad? (Como está seu pai?)

— Stubborn as always. (Teimoso como sempre.) – Ele respondeu deixando Megan aliviada, se ele percebeu a intenção de mudar de assunto não comentou.

Alguns minutos depois eles tiveram que desligar. Ela estava muito cansada para ficar horas no telefone como costumavam fazer. No entanto, Megan estava feliz, ter alguém que se preocupava com ela era um tanto quanto inédito em sua vida e ela gostava da sensação de se sentir amada.

Ela ainda estava com o celular nas mãos quando o sentiu vibrar avisando sobre uma notificação do instagram. Um de seus assistentes acabara de publicar um vídeo curto sobre o lançamento daquela noite na página da Marra International e a publicação já tinha várias curtidas e alguns comentários, ela também curtiu o vídeo se congratulando pela eficiência de sua equipe.

Percebeu que tinha alguns mensagens não vistas e se lembrou que não verificava o celular há horas. A mais recente das mensagens era de Anna dizendo que chegara em casa e estava bem, apesar de um pouco nauseada. Megan deu um meio sorriso ao pensar em quantas taças de champagne a amiga bebera naquela noite.

Havia outra mensagem, dessa vez de sua mãe; uma foto, na verdade, em que ela estava cercada de crianças amparadas pela Unicef na Índia. Suspirou pesadamente ao perceber como sentia falta da presença de sua mãe cotidianamente. Desde que decidira se mudar novamente para os Estados Unidos há cinco anos e depois decidira, finalmente, entrar na Universidade de Berkeley o contato com a mãe diminuiu bastante. Esperava, no entanto, que ela pudesse ajudá-la com os preparativos do casamento. Isso lembrava que ainda precisavam marcar uma data e, principalmente, anunciar que estavam noivos, já que, além de Ian, apenas a mãe, Dorothy e Anna sabiam, talvez o pai de Ian também, mas não tinha certeza de que ele contara.

A última mensagem foi enviada horas atrás e era de seu pai dizendo que esperava vê-la durante o lançamento do Marra Fone no Brasil. Por favor, filha, tente trazer Davi dessa vez com você. Saudades. Megan fechou os olhos ao ler a última mensagem e deixou o celular no criado mudo ao lado da cama. Seu daddy poderia pedir qualquer outra coisa que ela realizaria feliz, mas aquilo era quase impossível.

Megan estava furiosa. Como ele ousava fazer algo assim sem consultá-la? Seus passos eram apressados pelos corredores da Marra e todos a olhavam apreensivos. Trabalhava ali há pouco tempo, mas todos a conheciam de longa data, talvez por isso a secretária não tentou impedi-la quando ela irrompeu na sala da presidência sem notificação prévia.

What the hell is this? (O que diabos é isto?) – Megan suspirou furiosa mostrando uma folha de papel branco na mão direita.

Davi estava revisando alguns papéis e a olhou confuso, levantando apenas o olhar. Rosemary, a secretária, o olhava no beiral da porta como se perguntasse o que deveria fazer e se desculpasse por aquela interrupção ao mesmo tempo.

Acho que deveria ser mais educada, olhe como assustou Rose. – Davi disse se levantando e indicando a secretária ainda no limiar do escritório. Megan se voltou para ela e se desculpou minimamente. – You can leave us, Rose. (Pode nos deixar, Rose.) – A secretária saiu, fechando a porta.

— You are an asshole.(Você é um imbecil.) – Davi não retrucou, apenas se sentou em um dos sofás da sala e esperou que ela se acalmasse, esses rompantes de fúria duravam alguns minutos. – You should talk in English here. (Deveria falar em inglês aqui.) – Megan disse mais calma e se sentou em uma poltrona, defronte Davi.

— Você me entende perfeitamente em português. – Davi disse despreocupado, retirando a gravata, o dia já estava no fim e odiava aquilo.

— But the others no. (Mas os outros não.) – Megan apontou, colocando a folha na mesinha de centro que havia entre eles e a empurrando na direção de Davi que apenas a olhou.

— Sei o que tem ai, eu mesmo assinei. – Megan revirou os olhos mediante o óbvio, o que queria era uma explicação.

— O que tem contra o Brasil? – Megan perguntou diretamente. – Por que não pode ir em nenhum lançamento lá? It is important, Davi. (É importante, Davi.)

— Mark me substituirá perfeitamente. – Davi não queria falar sobre aquilo, há dois anos não pisava em solo brasileiro e evitava isso. – Minha presença não é necessária.

— Claro que é, Davi. – Quando ele entenderia aquilo? Ela não conseguia compreender aquela recusa. – Você é o presidente desta empresa, é a imagem dela. Precisamos de você para alavancar produtos.

— Eu não posso, está bem? – Davi também ficou sem paciência, ambos praticamente gritavam dentro daquele escritório. – Eu não quero. Eu já lhe disse isso, não me importune mais. Seu antecessor entendia.

Megan recebeu aquilo como um duro golpe. Dois meses trabalhando ali, depois de um estágio que levara seis meses, ainda não dissipara o pensamento homogêneo de que ela só estava naquela posição por ser uma das sócias, não porque era competente naquilo que fazia. Ainda diziam que o fato de seu antecessor ter sido transferido para a Inglaterra fora por sua causa, poucos sabiam que ele tinha ido por vontade própria, caso contrário ela seria assistente dele com o maior prazer.

Davi era um excelente presidente e ao contrário do que pensava lhe salvara uma imensa fortuna depois do escândalo da prisão de Jonas ter afetado tão negativamente as ações e as vendas de produtos. Ele também era um excelente projetista e entendia o que as pessoas queriam, mas não entedia como fazer as pessoas desejarem aquilo mais do que tudo, coisa na qual Megan era especialista.

É por causa de daddy? – Megan ainda estava irritada, magoada pelo que escutara, mas mais calma. Queria entendê-lo e queria que ele lhe ajudasse a fazer seu trabalho aumentando as vendas no mercado brasileiro.

— I don’t want to talk about this. Maybe in English you can understand. (Eu não quero falar sobre isso. Talvez em Inglês você pode entender.)

Aquela conversa tinha resultado em duas semanas sem que os dois trocassem uma palavra. Ela sabia que ele não queria voltar ao Brasil para não se sentir compelido a visitar Jonas, mas sabia que Davi não compreendia que não teria tanto tempo assim de visitar o pai e poderia se arrepender depois. Jonas descobriu um câncer há um ano, ele estava em tratamento, mas o prognóstico do médico não era bom.

Uma lágrima rolou em sua face. Seu pai desejava ver todos reunidos mais uma vez no natal e Davi deveria estar ali, mas Jonas não queria que o filho fosse apenas porque ele estava doente, portanto proibira Megan de contar sobre a doença. Ela teria que conseguir isso sem quebrar a promessa que fizera ao pai de não abrir a boca, mas convencer Davi a se compadecer de Jonas Marra não seria fácil, ela não tinha conseguido que ele se compadecesse nem mesmo dela há cinco anos.

Ela se deitou, cobrindo-se com o edredon, tentando não pensar. Aquela traição lhe doía e pensar em tudo o que veio depois não era fácil. Ela tentava conviver com Davi pacificamente, mas já se policiara muito para não falar coisas que não deveria, para aplacar a mágoa que ainda sentia. Ian curara um pouco da sua dor, mas algum resquício ainda estava ali sempre que ela olhava nos fundos dos olhos de Davi.

Ela mirou o anel em seu dedo e pensou naqueles olhos castanhos a mirando surpresos mais cedo naquela noite. Percebera que ele vira o anel ali, mas não comentara nada. Com Davi era melhor não dizer, não ver e não sentir.