POV Jay

— Bom trabalho Kim. Assim que a Hailey e o Atwater cheguem com o suspeito fala com eles sobre essa nova informação. – Pede Voight.

— Certo. – Assente Kim.

Ainda estou a processar a informação quando ouvimos um barulho alto e a Sargento Platt surge a correr pelas escadas. Embora sentado na minha secretária espreito por cima dos monitores a tempo de conseguir ter um vislumbre da aflição com que sobe as escadas.

— Voight. – Diz com angústia enquanto recupera o fôlego. – Acabei de receber uma chamada. – Faz nova pausa e olha em volta. Passa os olhos por toda a equipa e por último, antes de se dirigir novamente ao Voight, demora o olhar em mim. – Algo correu mal na detenção. A Upton levou um tiro. – Finaliza.

Os momentos seguintes demoraram segundos, mas na minha cabeça pareceram minutos. Toda a equipa olhou incrédula para a Sargento Platt. Em completo silêncio. Solto um sorriso, não podia ser verdade. De seguida, olhamo-nos entre todos a tentar perceber o que se está a passar.

— O que se passou? – Pergunta Voight.

— Não sabemos. Apenas que estavam em perseguição na rua e que a Upton foi apanhada. – Explicou.

— Como é que ela está? Onde foi o tiro? – Atiro já a colocar-me de pé.

— Segundo consta num ombro. O estado dela não tenho informações. Apenas que está inconsciente desde que o levou. – Finaliza com cuidado.

— Med? Eu vou para lá! – Tento manter-me calmo. Embora saiba que estou a pouco de me passar.

— Jay! Calma! Vamos todos ter calma! – Pede Voight. – A investigação não pode parar. – Eu vou ao Med ver o que se passa. – Informa.

— Nem pensar. Eu também vou. – Comunico.

— Nem pensar que fico aqui! – Exclama Rojas enquanto se levanta.

— Sim Voight, nós não somos apenas uma equipa, somos uma família. Vamos todos ao Hospital. – É o Adam quem comanda a situação. Vejo que Kim acena em concordância.

O Voight fica perplexo no meio da sala. Sentindo-se derrotado suspira, e acena afirmativamente. Todos se preparam para sair quando Truddy Platt volta a interromper.

— Gente há um problema. – Volta a suspirar. – Devido às manifestações que estão nas ruas a ambulância está presa e estão com dificuldades em chegar ao hospital. – Não ouço mais nada. Saio a correr já a agarrar no telemóvel.

Corro o mais depressa que consigo para chegar ao meu carro. O telefone já a chamar. Ao longe consigo ouvir Rojas a dizer que vai comigo.

— Jay… - Atende ao segundo toque. Fecho os olhos quando ouço o som de fundo. Sirenes. Ele estava na ambulância com ela.

— Kevin, como é que ela está? – Pergunto ao entrar no carro.

— Inconsciente… - Sussurra. – E a perder muito sangue. – Tinha preferido um soco no estômago à sensação de ouvir aquela informação. Rojas abre a porta do condutor e passa-me sinal de que ela irá levar o carro. Olho para ela por um segundo. Suspiro, e acabo por aceitar. As sirenes de fundo a ecoarem-me na cabeça.

— Estão em que zona? Estou a sair com a Rojas, vamos escoltar-vos. – Explico quando entro do outro lado do carro.

— Não dá mano, vocês não vão conseguir passar. – Engulo em seco já a amaldiçoar as manifestações. – Sigam para o Med, encontramo-nos lá. – Ordena Kevin. No momento em que a Vanessa arranca vejo o restante da equipa a chegar à garagem.

— Estamos a caminho. Kevin… - Suspiro e encosto a cabeça ao banco. – Ela tem que sobreviver. – Sussurro. Ouço a Brett no fundo, embora não perceba o que diz, sei que naquele momento a Hailey está em boas mãos.

— Ela vai sobreviver mano, esta pequena é forte. Até já. – E desliga.

Fecho os olhos e revejo mentalmente os últimos dez minutos. Raios! Isto não podia estar a acontecer. Não a ela. Não quando eu ainda tinha tanto para lhe dizer. Não a ela…

Abro os olhos e noto a velocidade que a Vanessa leva. Parecia que íamos em plena perseguição. Na realidade a nossa perseguição era outra. Nenhum de nós os dois estava disposto a perdê-la. Não a ela…

— Isto não pode estar a acontecer. – Só depois de o dizer é que noto que o fiz em voz alta. – Eu é que deveria de ter ido com ela. – Amaldiçoo-me.

A Hailey tinha acabado de chegar de Nova Iorque. Era o primeiro caso em que trabalhava desde que teve a ajudar o FBI.

— Não te podes massacrar com isso Jay, a culpa não é tua. – Conforta enquanto faz uma ultrapassagem.

Em poucos minutos chegamos ao Chicago Med. Ainda nem a Vanessa tinha estacionado eu já tinha saltado do carro e corria para o hospital.

— Vanessa, não está aqui nenhuma ambulância. – Grito em desespero. Corro ainda mais. Como é que era possível, só esperava que aquilo apenas quisesse dizer que a ambulância já tinha saído. A quem queria eu enganar? Simplesmente ainda não tinham chegado.

Entro, num misto de desespero e adrenalina, pelas portas automáticas, conhecendo bem o caminho a fazer. Ao longe já avisto a Maggie.

— Onde é que ela está? Levaram-na para que sala? – Falo alto e começo a andar à volta a olhar para todas as salas.

— Detetive Halstead, posso ajudar? – Ouço a voz calma da Maggie atrás de mim. Olho-a mas não a vejo. Tenho a visão toda enevoada. Pisco algumas vezes para afastar a névoa que se formou e tenho um vislumbre da enfermeira chefe a olhar para mim interrogativamente. Atrás dela aparece Vanessa. Clareio a voz antes de falar.

— Hailey… - Sufoco. – Levou um tiro. – Digo a hiperventilar.

A expressão confusa que tinha muda. Primeiro compreensão, depois apreensão, e por fim confusão novamente. É através daquelas mudanças que percebo o que temia. Ela ainda não havia chegado. Fecho os olhos enquanto espero a resposta.

— Lamento detetive Halstead, mas ainda não chegaram ao Med. – Informa com pesar.

No momento em que ouço Maggie, o sinal sonoro que sinaliza a chegada de uma nova ambulância dispara. Não penso duas vezes e corro de volta para a porta onde entrei. Sou seguido pela Maggie e pela Vanessa. Mas não posso evitar um grunhido de revolta quando vejo ainda ao longe que na maca quem vem deitado é alguém moreno e cumprido e suficiente para ficar com os pés de fora.

Maggie lança-me um olhar de lamento enquanto se dirige há nova situação, e eu, bem, eu fico parado no meio da entrada com as mãos na cabeça. Sinto a mão da Vanessa no meu cotovelo em forma de conforto. E eu só queria saber onde eles andavam com a Hailey.

Logo atrás surge o restante da equipa. Voight lança-me um olhar interrogativo. Apenas aceno negativamente com a cabeça e viro costas. Volto para o balcão central onde já se encontra novamente a Maggie. Ficamos a olhar um para o outro. Ela não ousa abrir a boca e eu também não quero. Apenas queria que aquela ambulância chegasse para eu ver com os meus próprios olhos o estado em que ela se encontrava.

— Dr. Marcel, ainda bem que aí vem, fique connosco, está a chegar uma ambulância para Bagdade. – Olho rapidamente para onde Maggie se dirige. Troco um olhar com o Dr. Marcel e vejo-lhe a compreensão a passar pela cara. Um de nós estava a caminho. – Vou ligar para o Dr. Halstead para se juntar a nós.

Passam alguns minutos e o sinal sonoro de uma nova ambulância surge no momento em que identifico a sua chegada pelas luzes das sirenes. Passo a ver aquele momento como em câmara lenta. O meu coração dizia-me que era aquela a ambulância, e os meus olhos confirmaram no momento em que a porta traseira se abriu e vi a cabeça do Kevin.

— São eles… - Digo para mim, digo para o ar, digo para a Maggie, o Dr. Marcel e o meu irmão, que entretanto já estavam a caminho da entrada. Sigo-os. A boca seca e as mãos suadas. A porta principal abre e por fim vejo-a.

— Brett, Foster… - Cumprimenta a Maggie. E assim pede para elas falarem. Toda a equipa se chega à maca.

— Detetive Hailey Upton, 32 anos, ferimento de bala no ombro direito, a bala não saiu, traumatismo severo na cabeça, sempre inconsciente. – Tudo se passa muito rápido, enquanto a Brett vai explicando a situação e chegam em passo de corrida à entrada.

Assim que me aproximo sinto os olhos a arder pela primeira vez. Faço automaticamente força para expulsar qualquer lágrima que quisesse aparecer. E pisco repetitivamente para tentar clarear toda aquela situação.

O corpo pequeno e inanimado da minha parceira estava coberto de sangue. Podia ver-se um buraco no colete que ela usava, precisamente no ombro direito. A camisola anteriormente branca, estava vermelha por todo o braço direito. O pescoço, e o cabelo louro, solto, completamente colado com o líquido vermelho que saía algures da cabeça. E era muito, pois toda a parte superior da maca tinha sangue. Podia ver através da máscara de oxigénio a palidez que já adornava aquela pele sedosa. Ela estava a perder muito sangue.

Sigo-os como se a minha vida dependesse daquilo. Talvez dependesse mesmo. Sou barrado à entrada da sala pelo meu irmão.

— A partir daqui é connosco. – E faz um olhar que eu compreendo como: “Fica quieto”. Apenas aceno.

Deixo-me ficar do lado de fora a olhar por toda a parede de vidro que nos separa. No momento em que começam a tirar-lhe o colete, a Maggie fecha a cortina e sai da sala.

— Lamento Jay, vais ter que ir esperar com o restante da equipa. – Pede enquanto coloca uma mão no meu ombro.

Quando me dirijo para a entrada, vejo todos de volta do Kevin, que está a ser reconfortado pela Vanessa. Permaneço em pé. Dou por mim de costas para todos eles, com a testa encostada numa parede. Estava em pânico. Sentia as pernas e o peito a tremer, as mãos suadas, uma ligeira náusea e a respiração acelerada.

Porquê? Porquê ela? Preferia mil vezes estar no lugar dela. Levaria novamente o tiro de meses atrás quantas vezes fosse preciso. Tudo, menos passar por aquela situação, a doce Hailey. A minha doce Hailey.

— Jay… - Kim. Chama-me delicadamente. Talvez com medo que eu possa não gostar. Respiro fundo e olho para ela. – A Maggie está a chamar-nos para esperarmos numa sala privada, apenas para a equipa. - Finaliza com um sorriso doce.

Viro-me lentamente e tenho toda a equipa nas minhas costas a olhar para mim. Sustento o olhar, um a um, e em todos reconheço os mesmos sentimentos, assustados e com medo. Hank Voight é quem dá o primeiro passo, joga um braço em volta da minha cintura e faz sinal para caminharmos. A Maggie espera-nos ao pé do balcão e seguimo-la silenciosamente. Passamos ao pé da sala onde sei que a Hailey está, mas continua tudo igual, fechado, não consigo saber o que se passa lá dentro.

Um pouco mais à frente chegamos à sala que nos foi destinada. Eu conhecia bem aquele hospital, aquela parede toda vidrada virada para o corredor principal iria dar-me a oportunidade de saber quando eles a levassem para dentro. E não é preciso muito para isso acontecer. Logo depois começo a ouvir barulho e o som da maca a alta velocidade.

— Hailey… - Sussurro. Toda a equipa se levanta e em segundos está ao meu lado.

É então que a vejo. Pálida tal como entrou. A máscara de oxigénio na boca e nariz. Um lençol cobria o seu corpo inanimado. Um saco de soro. E para finalizar, o maior soco no meu estômago: um saco de sangue. A Hailey estava a receber uma transfusão de sangue. Ladeada pelo Dr. Marcel e pelo meu irmão, desaparecem ao virar do corredor.

Contemplo o sítio por onde desapareceram durante aquilo que me pareceu uma eternidade. Faço uma prece silenciosa para que os dois excelentes médicos que a acompanham a tratem e a tragam de volta. De volta para mim. Não podia ficar sem ela. Não agora. Não quando ela tinha tanto para viver. Não quando ainda tínhamos tanto para viver. Os dois.

Amaldiçoo-me por ter sido um covarde e ter desperdiçado a oportunidade de esclarecer tudo quando voltou de Nova Iorque. De não ter explicado pormenorizadamente a razão daquela saudade louca que eu tinha dela. Devia de ter aproveitado aquele abraço apertado, no meio do aeroporto, enquanto com a cabeça apoiada no cimo da cabeça dela, tentava ao máximo aspirar o cheiro do cabelo, bem como o seu próprio aroma.

Fecho os olhos com mais força, quando os olhos azuis mais belos de todos iluminam a minha mente, e sinto o cheiro dela como se tivesse voltado àquele momento no aeroporto. Para acabar comigo e aprofundar ainda mais o meu ataque masoquista replico dentro da minha cabeça, o som da sua inconfundível risada. Tudo junto, numa autêntica espiral, tenho o momento que tentava reprimir desde que recebi a notícia. Ao mesmo tempo em que bato, de pulsos cerrados no vidro há minha frente, sai de dentro de mim o maior dos gritos de revolta.

Eu não podia perder a minha parceira. A minha melhor amiga. O amor da minha vida.