Segunda semana de aula.

Para Katherine, na verdade, era como se fosse a segunda; para a maioria dos alunos ali, era a terceira.

As relações com os colegas nada haviam mudado desde o primeiro dia em que pisara ali. Fala sério, o que precisaria fazer para mudar aquilo?

Como era a aula de geografia - matéria que, para Kath, nunca passaria de um punhado de informações inúteis, perdendo apenas para português e história (afinal, quem é que precisava saber da derrubada da bastilha da França no ano X ou se a oração do anúncio de sabonetes perfumados era uma oração subordinada adverbial concessiva reduzida do particípio?) - ela se ocupava lendo mangás ou livros, desenhando suas LineArts com caneta esferográfica ou escrevendo suas histórias ou cenas aleatórias de Lapsos Criativos - ou apenas CALC.

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Então, a garota percebe. Nunca viveria uma aventura de verdade. Não conheceria seus heróis, porque eles não passavam de personagens. De nomes escritos em uma folha de papel impressa em Century Schoolbook.

Ela se encolhia em sua cama, como um pequeno caroço, dando-se conta de como era diminuta.

O universo era infinito. Em todas as direções haviam milhares de estrelas, incontáveis vezes maiores do que ela. Um dia, a Terra sumiria, mas de que importaria? Ela estaria morta.

Ela era pequena. Criativa. Fantasiosa. Mas completamente impotente na imensidão que a cercava. De sete bilhões de pessoas no mundo, poderia ela ser lembrada? E, mesmo que fosse, um dia o Sol engoliria a Terra. De que adiantaria ser lembrada quando não haveria mais ninguém para se lembrar?

E, de tudo o que a cercava, poderia não existir uma só coisa que pudesse fazer para fugir daquela rotina? Nascer. Estudar. Trabalhar. Se aposentar. Morrer. Estaria fadada à aquilo? De todo o universo, seria aquele seu destino?

O peso da percepção a esmaga contra seu colchão. Sua cabeça não a permitiria dormir naquele momento; estava mais ligada do que nunca.

A garota fantasia por um momento a possibilidade de se afundar no nada. De repente, era como uma célula de um corpo. Ninguém a notaria, não faria diferença.

Ela cresceria. Viveria. Faria amigos. Então, morreria. Sua filha choraria por ela. Sua neta se lembraria de sua avó.

Sua bisneta conheceria seu nome, mas a filha de sua bisneta nunca saberia que ela existira. Ela acabaria com sua lembrança, e sua lembrança acabaria com o tempo.

O que era morrer? Se o destino de todos era o esquecimento, morrer não era apenas o nascer do fim? De repente, não tinha mais medo da morte, mas do esquecimento.

Então, aquilo era morrer?

De repente, morrer não parecia tão ruim.

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Katherine lê a página que escrevera.

Por um momento, fica em choque. De onde saíra aquilo?

Ela sempre pensara demais, mas nunca soubera que seus pensamentos chegavam àquele ponto.

Então, aquele era seu destino? Ser esquecida? Nascer, crescer, morrer?

Por que seus irmãos não viam como tinham sorte? Todos morreriam, mas não era melhor morrer se aventurando, jovens e enérgicos, do que mais velhos, em uma cadeira de balanço com tubos no nariz, quando não pudessem mais respirar sozinhos?

Sua alma não era sua base? Sua essência?

Então, não seria a alma de cada um não sua vida, mas sua lembrança?

Quereria ela ser lembrada como uma velha sobrevivente, ou como uma garota heróica?

Katherine fecha o caderno, os próprios pensamentos se abatendo sobre ela.

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A garota mal conseguira se concentrar na aula depois disso - se era que conseguia antes - mas se esforçara para manter os olhos na professora. Talvez conseguisse se distrair com seus cachos mel, ou seus olhos castanho-caramelo.

Cansada, ela fecha os olhos por alguns instantes e apoia a testa na mesa.

Então, algo muda.

Ela não percebe de imediato, mas logo repara.

O silêncio. Um silêncio total e absoluto se espalha na sala de repente, interrompendo a professora no meio da frase.

Ela ergue os olhos.

Não há mais ninguém na sala. Os alunos, a professora, todos sumiram.

Exceto por um homem.

Devia estar na faixa dos trinta anos. Os cabelos eram repicados, de um tom profundo de negro. Em seu queixo cresce uma barba rala, quase imperceptível. A pele era de um meio termo pálido entre o salmão e o rosado, e os olhos eram de um tom brilhante de uma cor que lhe despertava uma vaga lembrança de seus cursos - ciano, a mais bela das cores primárias. O mais belo tom de azul.

A cor era exatamente a mesma dos olhos de Chris, mas, ao mesmo tempo, era como se fossem duas completamente diferentes.

Sua expressão estava impassiva, uma mistura de sério e neutro, com os olhos quase semicerrados, o queixo levemente erguido e a cabeça inclinada para frente.

Apesar de o homem não ser marcadamente alto, Kath teria que inclinar a cabeça para cima para olhá-lo se estivesse próxima.

Mas não estava. O homem estava onde antes estava sua professora, e, àquela distância, era como se ela o olhasse em pé de igualdade.

Ela se levanta.

– Quem é você?

Discretamente, ela pega um punhado de sal de uma aba de sua bolsa-carteiro que servia de lancheira.

– Ainda é cedo para dizer - ele responde. A voz é rouca e áspera, mas Kath não detecta ameaças nela. Na verdade, a maioria das pessoas não repararia, mas Kath sente um tom diferente em sua voz. Um tom que nunca ouvira antes, mas, certamente, acolhedor.

– O que você quer? - ela indaga, se aproximando, devagar.

– Vim avisar.

– Avisar de quê?

– Muitas coisas. - ele reponde. Katherine começa a se irritar.

– Bom, cite uma!

– Cuidado com os Olhos Azuis - ele diz.

– Cuidado com o quê? - ela pergunta. Então, uma outra voz a chama.

– Katherine!

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De repente, tudo está mais claro. A garota não reparara que o ambiente estava mais escuro, mas estava.

Todos os alunos estão de volta, e todos a olham, confusos e divertidos. Risinhos surgem de todos os pontos da sala.

A professora está a encarando à sua frente.

A garota não hesita em caminhar em direção à porta, nervosa. Sua professora a chama:

– Katherine, está se sentindo bem? O que está acontecendo?

Ela se vira para fechar a porta.

– Quem me dera saber as respostas - ela murmura, e então dá novamente as costas para a sala, sem saber exatamente aonde ir.