— Alô? – cochicho ao atender ao telefone rapidamente, pois Malkina ainda está dormindo e não tenho a intenção de incomodá-la.

— Oi, é o Franklin, tudo bem? – Frank é o meu melhor amigo, desde que nos mudamos para Coimbra, em Portugal. Nossa amizade surgiu rapidamente, como se eu o conhecesse há anos. Frank leva a vida na maior simplicidade, sempre com o sorriso no rosto, fazendo todos ao seu redor rir até sentir dor de barriga. Gosto da proteção que ele me oferece, além da confiança que sinto nele. Conheci Frank através de Malkina, minha tutora, que trabalha na Universidade em que Franklin faz mecatrônica.

— Estou bem – olho no relógio e não são seis horas da manhã ainda. – Por que você está me ligando tão cedo? – bocejo ao terminar a frase, ainda aos sussurros.

— Estou em frente à sua casa, desce aqui! – ele parece estar animado ao telefone.

— Mas Frank...

— Anda logo Louise, desce!

Com certeza Frank é a única pessoa que conseguiria me tirar da cama a essa hora! Bom, eu sou uma garota bem reservada, gosto de pensar sobre as coisas e até prefiro ficar sozinha, mas tem algo em Frank que acabe me libertando um pouquinho dessa minha falta de socialização. Levanto da cama rapidamente, ponho o primeiro moletom que vejo em minha frente, visto uma calça jeans levemente rasgada e calço meu converse de cano alto. Desço as escadas lentamente, para Malkina não ouvir que estou saindo.

— Espero que seja algo bem importante! – digo, fuzilando-o com o olhar.

— Tenho certeza que você irá se interessar nisso – ele me entrega três folhas A4 grampeadas. Leio com atenção o conteúdo da impressão.

“Jovem é encontrada morta no quintal de casa. A Jovem Petrícia, de 18 anos foi achada morta no quintal de sua casa, hoje às 18h local, África do Sul. Junto com Petrícia, foram localizadas algumas pedras desconhecidas, porém, estimadas numa quantia equivalente a milhões de dólares. As pedras estão sobre responsabilidade dos órgãos governamentais do País. Acredita-se que houve contato físico, mediante estado do local onde a jovem foi encontrada: vidros espalhados pelo local, assim como grandes galhos de árvores. A jovem, que aparentemente não tem família, foi cremada hoje, às 22h.” Há fotos do quintal onde Petrícia foi encontrada e também uma foto do rosto da garota.

Ao terminar de ler, olho para Frank que está esperando – impacientemente – a conclusão de minha leitura.

— Onde você encontrou essa notícia? – entrego as folhas para ele.

— Depois do que você me contou, eu comecei a procurar por informações. Fiquei preocupada Louise, você é a número 3, quase a próxima, não quero te perder.

— Confesso que tudo leva a crer que esta seja a número 1, realmente. – penso por alguns segundos, deixando o silêncio entre nós. Enquanto isso, sento na escada à frente do prédio. – Se Petrícia for a Um, temos alguns grandes problemas, Frank.

— Temos? – ele senta-se ao meu lado.

— Eles encontraram algumas pedras, provavelmente o que continha dentro do receptáculo dela. Se não acharam o receptáculo, deve estar sobre o poder dos Daliperianos.

— E eles conseguem utilizar os itens restantes? – ele questiona, parece estar tão apreensivo quanto eu.

— Eu ainda não sei. Nunca conversei sobre isso com Malkina.

— Você vai contar isso para ela? – questiona me mostrando as folhas, mais uma vez.

— Acho que vou – pego as folhas de sua mão. – Quero ver o que ela pensa sobre isso. – levanto da escada e limpo a possível sujeira em minha calça. – Eu vou entrar, Frank. De repente ficou frio – justifico.

— Também senti, Louise. – ele também se levanta e me dá um beijo na testa. – Bom, eu vou para casa, tenho aula daqui a pouco. Nos falamos mais tarde?

— Claro! Pode aparecer aqui! Boa aula! – subo as escadas e aceno para Frank, que caminha em direção a sua casa, retribuindo o aceno. Subo as escadas com todo cuidado, mais uma vez, não quero ouvir Malkina falando no meu ouvido. Abro a porta do apartamento bem devagar, evitando barulhos. Entro e fecho a porta com toda cautela.

— Onde estavas, Louise? – encontro Malkina sentada ao sofá, vestida com seu roupão e segurança uma xícara.

— Conversando com Frank.

— Sobre? – ela bebe do líquido após o questionamento.

— Isso! – entrego as folhas à tutora, que lê rapidamente seu conteúdo e folheia para ver as fotos.

— É ela! – ainda sem tirar os olhos das imagens – Como Franklin encontrou?

— Não sei! Ele disse que depois que conversamos com ele, ficou preocupado e fez algumas pesquisas.

— Maldita hora para essa cicatriz aparecer, não é?

— Pelo menos temos alguém para dividir nossas histórias! – vou até a pia e pego minha xícara e servi um pouco de café preto, que Malkina acabou de preparar – Não lamento por estar com ele na hora que a cicatriz surgiu.

— Bom, de todo modo, temos informações valiosas aqui!

— Também cheguei a essa conclusão, Malkina. Os Daliperianos estão com o receptáculo da Um, correto?

— Provavelmente. Mas tem mais uma coisa, Louise.

— O que? – acabo sentando ao lado dela.

— Onde está Ugo, o tutor de Petrícia?

≥ — ·

Jayden! – escuto meu pai adotivo me chamando, no andar de baixo.

— Tô indo! – respondo, gritando também. São 07h da manhã e está na hora de ir para a escola. Hanks me deixa na frente do colégio, que fica próximo ao trabalho dele. Hanks é chefe de polícia, desde que me conheço por gente. Ele é casado com Nina, minha mãe, professora dos anos iniciais do primário.

Pego minha mochila e desço as escadas, vejo que meu pai já está tirando a viatura da garagem, passo pela cozinha correndo e percebo que minha mãe está sentada à mesa.

— Aconteceu alguma coisa, mãe? – me aproximo dela.

— Estou com uma tremenda dor de cabeça, filho – ela fecha os olhos, tentando evitar sua dor. – Vou ficar em casa hoje. Já avisei a escola.

— Ok então mãe – lhe dou um beijo no rosto. – Se precisar tô com o celular. Vê se vai descansar.

— Boa aula, meu amor – e acena enquanto saio de casa.

Entro no carro rapidamente, enquanto Hanks fala na escuta com algum de seus parceiros. Não presto muita atenção no assunto, só reparo quando ele fala “esse caso parece infinito, inferno”. Acho que o dia não começou bem para ele. Dou uma risada, meio debochada.

— Rindo do que?

— Infinito! – coloco o sinto de segurança, enquanto ele começa a dirigir.

— Vai começar com isso? Mais uma vez?

— Não, não vou!

— Ótimo! – ele não tira os olhos do trânsito. - Sua mãe marcou o médico para quando?

— Na próxima semana! Você já havia questionado sobre isso.

— Quero saber de onde veio essa mancha nas suas costas, algum problema?

— Não pai, não tem problema nenhum. Tá tudo bem normal! Tão normal quanto infinito!

Resolvo ficar em silêncio pelo resto do trajeto, que para minha sorte, não leva mais que dez minutos. Hanks me deixa na frente da escola, saio do carro, fecho a porta enquanto aceno com a cabeça para meu pai, que logo dispara em direção ao trabalho. Caminho em direção à minha sala e ouço o sinal tocar quando passo pela porta, com a professora de história logo atrás de mim. Sento em meu lugar e vejo que Charlotte ainda não chegou.

≥ — ·

Vou até meu quarto, pego minha mochila e coloco algumas roupas dentro dela. Passo pela sala, seguro meu receptáculo e ignoro a presença de Lucky no sofá. Maldito!

— Onde você pensa que vai, August? – ele questiona, levantando-se. Continuo a ignorá-lo e caminho em direção à porta, porém, ele se faz mais rápido que eu e bloqueia a passagem. – Você não vai sair dessa casa.

— Do que me adianta permanecer aqui, com um tutor nojento como você? – cuspo as palavras, sem ao menos pensar. – Eu vou aprender sozinho! Não é possível que você seja o último dos tutores! Alguém vai me ensinar!

— August, você não vai a lugar algum!

— Não é você que vai me impedir! – fico invisível e me dirijo à porta dos fundos. Seguro o maçaneta para abrir a porta, mas sinto uma força me puxando para trás.

— Você não deixou a mochila invisível.

— Não deixei porque você se nega a expandir meus conhecimentos – volto a aparecer.

— Pois negar acabou de me ter serventia – o encaro nos olhos, maldito seja!

Volto para meu quarto com o receptáculo. Giro a caixa em todas as posições possíveis, tentando entender como é que se abre. Não vejo nenhum tipo de botão ou fechadura, por isso, fico cada vez mais irritado.

— Mão direita em cima do receptáculo, pense no seu número e levante sua mão – Lucky aparece de surpresa na porta, instruindo-me a abrir o receptáculo. Estranho. No começo penso ser algum tipo de piada, por isso permaneço totalmente parado, até que ele saia do meu quarto. Espero mais alguns minutos, para ter certeza que ele não está por perto e então sigo suas instruções e vejo-o abrir.

≥ — ·

— O que aconteceu? – questiono Charlotte, que só chega para a segunda aula do dia.

— Só dormi mais que a cama, por quê? – ela responde meio envergonhada, vejo-a ficar vermelha.

— Até te mandei uma mensagem hoje pela manhã – cochicho, pois o professor de biologia acaba de entrar na sala e vejo Charlotte desenhando uma bateria – de celular – morta. Sorrio para ela, afirmando que entendi sua mensagem.

Ao terminar a aula, ligo para meu pai e aviso que vou ao shopping com Charlotte e que não irei almoçar com eles hoje. Caminhamos duas quadras até chegar ao shopping e nos dirigimos diretamente à praça de alimentação, onde cada um escolhe um sanduíche.

— Bom, como eu estava te falando, to achando essa história cada vez mais estranha – dou uma mordida no sanduíche, enquanto fito Charlotte.

— Comum não é, né?! – ela também morde o seu e mastiga rapidamente para concluir o raciocínio. – Que tipo de família faz uma tatuagem em uma criança quando ela tem 4 anos de idade?

— Nenhuma Char! Sem contar que não tem nexo nenhum.

— Eles falaram o que? – e bebe um gole do seu suco de laranja que pegamos em conjunto. – Que é o símbolo do infinito?

— Exatamente!

— E por que não fizeram esse oito de lado, então?

— Quando questionei isso, meu pai argumentou que fez o símbolo do infinito, pois, quando me encontraram, o primeiro desejo deles foi me ter para sempre – dou mais uma mordida em meu sanduíche.

— Ou seja, desviou do assunto!

— Mais ou menos isso! – tomo um pouco do suco que está próximo à Charlotte.

— E não acaba por aí!

— Tem mais? – ela morde o sanduíche novamente.

— Tem! Mas não posso te mostrar aqui.