— Branca, aqui é Thonny – digo, parando o carro no acostamento.

— Quero o contato deles – ela solicita, sem rodeios.

— Qual sua intenção? – estranho seu pedido. Branca é a única tutora que mantive contato após a chegada da nave. Ela sabia do envolvimento com os Dalips e sempre considerou a alternativa de fazer o mesmo, mas sempre neguei passar o contato deles.

— Cinco me deixou para encontrar os outros guardiões – ela explica. – Se ela me rejeita, não merece minha consideração! Quero que eles peguem-na!

— Branca, minha intenção em manter contato com os Dalips sempre foi proteger Jayden. Você quer fazer o oposto total!

— Não me interessa! – ela grita ao telefone. – Ingrata! Todos esses anos eu cuidei dela com todo o amor e carinho e na primeira oportunidade ela me abandona?

— Branca, lamento, mas eu não posso te ajudar. Jayden também descobriu a verdade e provavelmente já mantém contato com algum deles. Estamos muito ocupados tentando encontrá-lo.

— Esqueça Thonny! Eu farei isso sozinha! – e escuto a ligação cair.

≥ — ·

Corro em direção à casa de Charlotte o mais rápido possível. A cidade ainda está na mais repleta escuridão e não há raios no céu, possibilitando que tudo fique mais escuro. Seguro o receptáculo embaixo do braço esquerdo e mantenho o mesmo nível de corrida.

— Charlotte? – chamo ao bater na porta de sua casa, que prontamente se abre.

— Olá Jayden, querido – diz a mãe de Charlotte ao abrir a porta, encarando-me cm surpresa e logo em seguida direcionando o seu olhar para o receptáculo em meu braço.

— Será que a senhora pode chamar a Charlotte? – digo, tentando parecer calmo.

— Claro, só um momento! – ela deixa a porta entreaberta, permitindo que eu veja a casa iluminada com luzes de emergência e velas. Em poucos segundos Charlotte está à porta. Ela vem para a rua e fecha a porta de casa.

— Aconteceu alguma coisa? – ela questiona, preocupada.

— Char, você tem que confiar em mim. Sei que vai ser estranho o que vou te dizer agora, mas estou sem tempo e preciso resumir tudo – digo, enrolado em meus pensamentos.

— Diga – ela está apreensiva.

— Sou uma espécie de alienígena. Por isso o número no meu pescoço e a cicatriz em minhas costas. Além disso, existem outros seis de mim espalhados por aí. Consigo falar mentalmente com cada um deles através deste anel – e mostro-lhe o anel em meu dedo – e cada um de nós possui, digamos que, poderes. Descobri o meu primeiro hoje.

Ela ri levemente para mim e vejo que não está acreditando.

— Certo, sei que você não está acreditando, então, olhe isso – e faço um raio surgir no céu.

— Coincidência! – ela acusa.

— E isso também é coincidência? – faço quatro raios aparecerem em sequência, formando as letras C H A R.

— Ok, isso não é! – ela se espanta.

— A cidade está sem luz porque eu fiz isso. Posso controlar a eletricidade. Meu pai está aliado com aqueles que destruíram meu planeta, e agora, está atrás de mim. Preciso ir embora do Brasil e encontrar os outros.

— E como você fará isso? – ela pergunta, segurando minha mão.

— Dois, quer dizer, Ricky vai fazer metade do serviço. Ele consegue voar e vai me buscar, mas está na Irlanda e levaria tempo para ele vir até o Brasil. Penso em pegar um avião e ir para mais próximo dele.

— Vou junto – ela comenta.

— Nem pensar! Além de ser perigoso ele não conseguiria levar nós dois – argumento.

— Então quando tudo estiver mais tranquilo eu vou – ela afirma. – Não quero ficar longe de ti, Jay.

Ela se aproxima e sinto seus lábios tocarem os meus. Por um momento, solto o receptáculo e minhas mãos tocam em seu rosto. Meus olhos se fecham e tudo se resume àquele beijo. Minhas mãos correm seu cabelo, enquanto sorrio ao beijá-la. Pela primeira vez sinto que também não quero deixá-la.

— Quero que você venha depois – digo baixinho.

— Eu vou! – ela confirma. – Você quer ajuda do meu pai?

O pai de Char é um dos diretos do aeroporto mais próximo de onde moramos e ele é a minha única salvação. Tenho sorte por ele gostar de mim e não ter muita afinidade com a polícia local – onde meu “pai” trabalha –, que sempre atrapalha as ações do aeroporto. Não sei se será muito fácil conseguir convencê-lo, mas preciso tentar.

— Quero – afirmo.

— E para onde?

— Até Guiné já seria um bom caminho.

— Seu passaporte está aí? – ela pergunta.

— Claro que não! – rio.

— Ele terá que te colocar dentro do avião às escondidas, então. Só você mesmo, Jay!

— Eu volto até em casa e pego o passaporte, enquanto você fala com seu pai – sugiro.

— Não será perigoso?

— Qualquer coisa eu peço pra um raio persegui-lo! – brinco. – Você pode ficar com o receptáculo?

— Que?

— Com esse baú.

— Ok.

— Não deixe ninguém tocar nele, Char, ele e muito importante.

— Tá bom! Se cuide e vá rápido! – ela me dá um leve beijo e entra em casa, com o receptáculo em mãos.

A adrenalina vai começar! – digo.

≥ — ·

Como assim? – questiono.

Estou voltando para minha casa, Ricky – explico. – Preciso pegar meu passaporte, vou conseguir o voo para Guiné.

Ótimo, Oito!

Seu pai não estará a sua espera? – pergunta Louise.

Provavelmente ele está me procurando pelas ruas escuras – Oito responde.

Tome cuidado! – ela diz.

Pode deixar. Vou avisando vocês – ele diz e posso escutá-lo correndo.

— Espero que dê tudo certo! – comento com November e Clarisse que estão em meu quarto.

— O que? – pergunta Maya, entrando no meu quarto, com um sorriso grande no rosto.

— Mmm... Nossa vida aqui na Irlanda – invento.

— Vai dar sim! – ela encosta-se à parede próxima à porta. – Sempre que precisarem de algo podem falar comigo.

— Muito obrigado, Maya! – digo sorrindo.

— Bom, qualquer coisa estou na cozinha, Ricky – e ela sai acenando.

— Acho que tem alguém caidinha por você, Ricky – diz Clarisse.

— Não inventa coisa, Cinco! – respondo.

— O que eu falei sobre números? – November se irrita.

— Desculpa, eu esqueci – digo.

— E acho que tem alguém com ciúmes! – Clarisse implica e November cria a ilusão de jogar um travesseiro em Clarisse, que cobre o rosto para se defender, mas nada a atinge e November começa a rir.

— Depois não me venha com reclamações, se por ventura, começar a pingar em sua cabeça misteriosamente – Clarisse ameaça, rindo.

≥ — ·

— A localização? Irlanda! – digo ao telefone.

— Especificamente onde?

— Não sei ao certo – respondo.

— Há quantos deles?

— Três guardiões – indico. – Eu posso ajudar, se for necessário.

— Entramos em contato mais tarde.

— Ok – e desligo o telefone.

A ligação para Thonny foi apenas uma estratégia para clonar os contatos de seu aparelho telefônico e conseguir o número dos Dalips. É sempre bom ter humanos tecnologicamente eficientes ao nosso favor.

Vou até o quarto e arrumo minhas malas depressa, quero estar na Irlanda para ver essa guardiã sofrer!

≥ — ·

Após correr algumas quadras chego em minha casa e não vejo o carro do meu “pai” estacionado na garagem. Melhor assim!

A porta não está trancada, então consigo entrar com facilidade. Subo correndo até meu quarto e faço a luz acender, para que consiga encontrar meu passaporte mais rápido. Procuro nas gavetas da cômoda, mas não consigo encontrar. Em seguida olho na caixa dos documentos, mas também não está lá.

— Está procurando por isso, Jayden? – diz Thonny à porta, segurando meu passaporte. – Imaginei que você fosse voltar para pegá-lo, assim que visitou Charlotte.

— Como você sabe que estive lá? – questiono.

— Era óbvio – ele responde.

— Sei – desconfio dele. – Você vai me entregar o passaporte Thonny, antes que alguém se machuque.

— Vai me eletrocutar, Jayden? – ele debocha.

— Se necessário for.

Ele dá um passo à frente.

— Onde está Nina?

— No carro, para evitar que você fuja novamente – ele responde.

Estendo minha mão na direção dele e sinto que posso controlar coisas que estão em meu quarto. Coisas que estão por toda a casa. Não sei ao certo como fazer isso. Há uma chapa de metal atrás de mim, que utilizava como mural de fotos. Sinto que posso controlá-la, então deduzo que minha outra herança seja eletromagnetismo, igual aos filmes que já assisti. Assim que sinto a chapa em meu total controle, apago a luz do quarto mais uma vez, abaixo e envio a chapa em direção ao Thonny. Segundos depois posso escutar o barulho dele ao cair. Faço a luz piscar rapidamente com o intuito de localizar o passaporte. Thonny o soltou ao cair. Pulo por cima de Thonny e pego o passaporte próximo à porta e desço as escadas correndo, enquanto escuto o barulho da chapa de metal sendo arrastada.

Como estão as coisas aí? – Louise me questiona.

Fugindo! – respondo ao tirar o anel do dedo indicador direito, colocando-o no esquerdo, privando-me assim de escutá-los. Ter vozes em minha cabeça enquanto penso o que fazer pode me atrapalhar.

Quando saio de casa me deparo com minha mãe dentro do carro, já ligado. Corro em direção à casa de Charlotte, mas Nina me segue rapidamente. Só então me recordo do eletromagnetismo e, imediatamente, paro no meio da rua e encaro o carro vindo em minha direção. Vejo Nina assustada ao pensar que vai me atropelar, porém, ela não reduz a velocidade. Quando o carro está muito próximo de mim, faço-o voar sobre meu corpo, capotando no ar e aterrissando de ponta cabeça. Não tenho tempo para verificar como ela está, e então, sigo em direção à casa de Char. Coloco o anel novamente em meu dedo indicador direito.

Ai, meu Willow, o que a gente vai fazer? – diz Clarisse.

Ele não foi morto, caso contrário, teríamos outra cicatriz – diz Charlie.

Quem? – questiono.

Supostamente, você! – afirma Ricky, e consigo identificar sua risada.

Só tirei o anel, pensei que fosse atrapalhar minha fuga – explico. – Desculpa se preocupei vocês.

Ok! Tá tudo certo? – Ricky questiona.

Dei um jeito aqui! Estou indo para o aeroporto daqui a pouco, terei que fazer a luz voltar, provavelmente, mas creio que tudo vai dar certo.

Te encontro em Guiné, então? – escuto Ricky perguntar.

Exato! – respondo.

Estou indo para lá, então – ele indica e ninguém mais fala nada. Às vezes é bom não ter seis vozes em minha cabeça.

Chego em frente à casa de Charlotte e ela está me esperando com o receptáculo em mãos.

— Achei que você não tinha conseguido – ela diz enquanto corre em minha direção, abraçando-me.

— Confesso que foi mais difícil do que pensei – respondo. – O que seu pai falou?

— Ele vai nos ajudar. Falou que nunca negaria que um filho conhecesse seus verdadeiros pais – ela me olha, rindo.

— O que? – digo incrédulo.

— Falei que você descobriu que seus pais verdadeiros estão em Guiné e que você deseja muito conhecê-los. Acho que ele acreditou.

— Ótimo! Essa é a minha garota – beijo Charlotte e em seguido lhe dou um abraço apertado. – Quando podemos ir?

— Ele disse que assim que você chegasse levaria você – ela olha para baixo e respira fundo.

— Você logo vai estar comigo, Char – lembro-a.

— Sim, eu vou! – ela tenta sorrir e me abraça mais uma vez. Seu pai surge à porta e balança às chaves do carro e eu afirmo com a cabeça. É hora de partir.

≥ — ·

— Que horas você vai? – November me questiona.

— Ele deve demorar umas seis horas para chegar até aqui, caso o voo seja direto – informo. – Daqui a duas horas eu vou, para não precisar ir muito rápido.

— Você precisa ir com muito cuidado, Ricky – Swane menciona.

— Eu sei disso – respondo.

— O que vamos inventar para a Maya quando Jayden chegar? – Clarisse questiona baixinho. Estamos todos no quarto de casal e acredito que Maya esteja em seu quarto.

— Vou pensar em algo – diz Swane.

— Precisa pensar rápido – comento.

— E você terá que fingir que foi dormir e sair pela janela do quarto, Ricky – Swane me lembra.

— Sem problemas!

— E não se esqueça de levar suas luvas – November diz.

— Não irei esquecer, ainda mais agora que não preciso olhar o relógio para me comunicar com vocês!

— Verdade – Clarisse diz.

≥ — ·

— August? – Lucky chama do lado de fora do meu quarto, enquanto bate levemente à porta.

— Pode entrar – digo. Ele entre e senta em minha cama, ao meu lado.

— Estive olhando seu receptáculo e tenho certeza que duas daquelas pedras não possuem poderes tipiênicos, são somente joias que podemos vender aqui.

— Qual valor podemos arrecadar com elas?

— Milhões! – me espanto com sua declaração.

— Você acha que é uma boa ideia nos juntarmos? – questiono.

— Sei que os outros estão passando por situações complicadas, August, e eu sempre tive a concepção que juntos vocês podem vencer!

— Isso é um sim?

— Sim.

— Vou informar os outros guardiões então!

— Certo. Vou preparar algo para comermos – e ele sai do quarto.

Caribe ou Paris? Qual será o local do nosso QG? – brinco.