Quando Yur Tomason despertou estava manietado com umas algemas antigas de metal, mãos atrás das costas, sentado no chão frio do cargueiro. Cabeceou atarantado, tentando ignorar a terrível dor de cabeça, procurando situar-se e preparar-se para se defender, fugir ou atacar. A sua boca era de uma secura desértica e o seu estômago revolvia-se enjoado. Ao perceber-se amarrado e com os movimentos condicionados, urrou frustrado e zangado.

Olhou em volta e notou o autómato dourado voltado para um painel que fumegava e crepitava, soltando um odor peculiar a circuitos queimados. Estava no interior de uma sucata voadora e identificou de imediato a nave: a Millenium Falcon. Lendária, mas deplorável. Mítica, mas degradada.

Arrastou-se com a ajuda das pernas. Apoiou as costas na parede mais próxima, fez força com os joelhos e colocou-se de pé. Virou a cabeça, alertado pela berraria que ouvia daí, onde se situava a cabina de pilotagem. Aos rosnados do wookie sobrepunham-se os gritos do corelliano e do socorriano.

Uma vez de pé, Tomason ensaiou uma corrida e investiu contra a porta aberta da cabina, exigindo:

— Soltem-me, seus imbecis! Soltem-me! Por que raio me amarraram e me deixaram num canto, como um velho dresseliano aleijado? Ei! Estão a ouvir-me?

O seu ombro esquerdo esbarrou na ombreira, sentiu um ardor indicando que se magoara numa qualquer saliência, mas não desistiu dos seus protestos.

— Ei, eu disse para me soltarem! Vocês estão completamente doidos. Acham que ganharam alguma vantagem ao me terem raptado, seus imbecis? Só vão atrair mais problemas.

— Lando, cala-o! – exigiu Han sem largar as alavancas da consola. – O barulho que esse tipo faz está a desconcentrar-me.

O socorriano destravou o seu cinto de segurança e levantou-se.

— Ei, o que vais fazer?

Tomason recebeu um empurrão e caiu na cadeira que antes era ocupada pelo barão administrador de Bespin. Gemeu porque se aleijou num braço que ficou esmagado contra o encosto. Ajeitou-se para ficar mais confortável, repuxou os pulsos, mas as algemas estavam bem fechadas.

— Calminha, Calrissian!

Lando debruçou-se sobre ele.

— Tem tu calma, Tomason. Não queres ficar pior do que já estás.

Fechou o cinto de segurança à bruta e o taanabiano sentiu-se ainda mais preso. Estrebuchou e remexeu-se. Lando, entretanto, tinha puxado o banco rebatível e sentava-se atrás do lugar do copiloto. O protesto seguinte ficou entalado na garganta, pois quando Tomason abriu a boca para exigir, mais uma vez, que o libertassem, o cargueiro foi sacudido violentamente e escutou-se o som de um rebentamento. Alarmes múltiplos encheram o painel do lado direito do piloto. Han lançou uma mão lesta aos botões e calou-os a todos. Pediu ao wookie que reforçasse os escudos defletores.

— Os teus amigos estão por perto a vigiar o teu empreendimento, Tomason? – perguntou o corelliano num tom irónico.

O taanabiano, engoliu em seco, abriu e fechou os olhos e gaguejou:

— O quê? O que estás… para aí a dizer, Solo?

— Sabemos que estás a negociar com os imperiais. Já descobrimos o jogo todo!

— Não sei do que estás a falar – tentou o taanabiano, firmando a sua voz. Deu um salto na cadeira ao escutar um urro de aviso do wookie.

— É para eles que estás a fabricar os clones. Chega de dissimulações – pediu Lando de paciência esgotada. Cuspia as palavras misturadas com gotas de saliva. – A tua presença em Hkion não é casual. Estendeste a armadilha e eu também apareci aqui. Uma coincidência interessante… É um jogo que preparavas para ganhar. Aquele encontro a uma mesa de sabacc foi apenas um engodo, para me encontrares mais depressa. Sabias do Jedi, sabias que eu viria porque o Jedi é amigo do Solo. Tão fácil, tão estupidamente fácil. – Suspirou alto, apertando os lábios. O cargueiro sacolejou novamente, a fuselagem a crepitar e a ranger. – Existem antigos líderes do Império que estão interessados na tua pequena exploração fabril que usa tecnologia genética kaminoana e tu fazes-lhe a vontade. É somente um negócio, ganhas uma fortuna, pouco te importas com o que estás a provocar. Caramba! Julgava que os de Taanab eram agricultores!

— Não sei do que estás a falar! – repetiu o taanabiano furioso e agitou-se na cadeira, preso pelo cinto. – Quem me paga é o governador de Hkion. O mordomo da casa real que se chama Tir’etakion. O que ele vai fazer com os clones não me interessa! Não conheço nenhum antigo líder do Império, não existem intermediários entre mim e o mordomo. Fabrico os clones para Hkion para defender o sistema de um ataque traiçoeiro da Nova República, foi o que ele me contou. Ofereceu-me a fábrica, cobriu o meu investimento inicial. Sim, é somente um negócio… e bastante lucrativo.

— Excelente teatro, Tomason! – acusou Han e levantou-se do seu lugar de piloto. Tomason ficou de boca aberta, incrédulo por não o terem levado a sério. – Chewie, toma conta das coisas. Lando, vem comigo. São só quatro e vai ser fácil dar conta deles, mas preciso de um segundo artilheiro.

— Onde vão vocês? O que é que se está a passar?

Lando seguiu Han para fora da cabina de pilotagem, Chewbacca rosnou e Tomason achou por bem calar-se. Deu um safanão, mas continuou com as mãos presas nas algemas e bem apertado na cadeira, com o cinto de segurança que lhe pressionava os ombros. Ao levantar a cabeça, mordendo os dentes irritado com a sua vulnerabilidade, estava á mercê dos seus adversários, entreviu, num dos cantos da janela panorâmica que abria para o espaço escuro e profundo, a ponta de um cruzador estelar. Uma nave que pertencera ao extinto Império Galáctico. Estava maltratada, mal iluminada, esventrada em alguns pontos, o seu interior negro exposto ao vácuo, mas continuava intimidante e assustadora.

Num silvo abrupto, passou um caça TIE pela mesma janela panorâmica. Outra relíquia imperial. Tomason deu um salto na cadeira, magoando mais os ombros. Praguejou e calou-se com um berro do wookie que manobrava sozinho a consola. Ouviu-se o intercomunicador crepitar. Han Solo pedia ao copiloto atenção aos defletores traseiros. E Tomason compreendeu, quando raios verdes e brancos riscaram o firmamento opaco, que estava a acontecer uma batalha espacial entre o cargueiro e caças TIE.

Compreendeu também as suspeitas que recaíam sobre ele. Eram mais do que justas. Ele, no entanto, falara a verdade. Tinha sempre negociado diretamente com o governador de Hkion e estava genuinamente assustado com a perspetiva de o ligarem a um qualquer ressurgimento do Império Galáctico. Não queria problemas para o seu lado. Era um empresário, com algumas ligações ao submundo e ao contrabando, mas nunca se julgara um criminoso. Era um sobrevivente, astuto e egoísta. Isso não ia contra a lei numa galáxia que vivera grande parte da sua História sob uma guerra civil.

Encolheu-se na cadeira, relutante e zangado, resolvendo continuar por esse caminho onde sempre tinha lucrado. Iria sobreviver, iria evadir-se de todas as responsabilidades e culpas, nem que para tal tivesse de se aliar aos seus captores.

Entretanto, no espaço, a dança mortífera prosseguia entre a Falcon e os caças TIE. A ofensiva era sempre feita por quatro naves e como o cargueiro corelliano estava equipado com dois pares de canhões duplos, montados em ambos os polos da nave em forma de enorme disco, o que possibilitava a cobertura de todos os ângulos, auxiliados pela navegação exímia do wookie, foi só uma questão de tempo até que os caças imperiais fossem acabar na mira certeira dos artilheiros. Han Solo estava habituado a sacudir ameaças incómodas, quando se escapava pelas rotas clandestinas do tráfico de especiarias, o mesmo acontecendo com Lando Calrissian, que tinha ensinado grande parte das manobras de evasão ao seu companheiro.

Deste modo, a batalha da Falcon contra os TIE foi intensa, mas curta. A perseguição depressa foi anulada e os caças explodiram, um por um, atingidos pelos disparos laser dos canhões AG-2G, dispersando-se em nuvens de fagulhas incandescentes que logo arrefeceram e sumiram.

Han abandonou a pequena câmara onde estivera a disparar, descalçando rapidamente as luvas, atirando-as de forma displicente para um canto. Desceu o estreito poço, deslizando pelos degraus metálicos. Clamou pelo androide protocolar, dizendo-lhe que tinham de contactar Leia. Já tinha informação suficiente para fazer um relatório que agradasse a Sua Alteza real, ironizou, como o fazia habitualmente sempre que estava pressionado pelos acontecimentos. A fábrica dos clones tinha sido descoberta na lua Apon One, tinham capturado o dono da fábrica e havia um antigo cruzador imperial, munido de esquadras ofensivas de caças TIE, em manobras desconhecidas no sistema.

Threepio estabeleceu a linha de comunicação encriptada e foi recebido, do outro lado, por um Artoo excitado, que se desdobrou em pios e silvos.

— O que foi, lata amarela? Não estou a gostar do tom do astromec. O que se passa?

Lando juntava-se-lhes, igualmente preocupado, uma sobrancelha crispada.

— O palácio real de Hkion está sob ataque. O menino Luke está, neste momento, a combater contra o fantasma de um antigo mestre Jedi e a princesa de Alderaan… oh, céus!

— O que se passa com a Leia? – exigiu Han impaciente.

— A princesa de Alderaan caiu para o lado negro da Força! – exclamou Threepio levantando os braços, em sinal de absoluto horror.