Me separei, saindo do transe. Abri meus olhos para certificar de que aquilo havia sido mesmo real. Ele me encarava com aqueles olhos que hoje estavam mais verdes que a grama, mas em alguns dias estavam azuis. Sorriu para mim e foi impossível não sorrir de volta. Eu estava ainda mais confusa. Mais confusa ainda. Impossível estar mais confusa que isso.

– Eu acho que... – Ele começou a dizer. – Não sei se deveria falar.

– Fala. – Encorajei-o.

– Eu acho que estou apaixonado por você.

Os olhos dele pediam uma resposta. Ele estava esperançoso e eu comecei a suar. Era evidente que eu sentia algo por ele, algo muito forte, aliás. Mas ainda tem o Thiago. Eu não tenho certeza de absolutamente nada, nada mesmo.

– Você é muito importante pra mim. Bem mais do que eu imaginei que seria. – Foi o que eu consegui dizer e não era mentira.

Ele pareceu satisfeito.

***

Acordei com batidas na porta. Na verdade tinha alguém quase a escancarando. Fui até ela e abri. Era o meu pai, completamente bravo.

– O que aconteceu? – Perguntei.

Ele entrou sem falar nada, logo atrás vieram minha mãe, o Binho e os pais dele. Por um momento me envergonhei, pois eu estava horrível, tinha acabado de sair da cama.

– Ferrou. – Binho disse. Moveu os lábios, para ser mais exata, para que só eu entendesse.

– O que significa isso? – Meu pai perguntou me mostrando o tablet, que estava aberto em um site de notícias.

O pior era que a reportagem tinha como título “Casal real é visto em uma boate nesta noite”, com uma foto minha e do Binho nos beijando logo embaixo.

– Vocês perderam o juízo? – Perguntou o pai de Binho, dessa vez. – Sair do castelo escondidos, sabendo de todos os riscos e ainda irem para um bar de quinta categoria?! Vocês têm uma reputação a zelar! São os futuros representantes de um povo.

– Desculpa – Eu disse. – A gente só queria se divertir.

– Não. – Binho disse. – Você não tem que se desculpa de nada, Ana. Foi tudo culpa minha, eu que levei a Ana pra lá.

– E porque você fez isso? – perguntou meu pai.

– A gente queria saber o que era ter uma vida normal. – Ele respondeu.

– E a vida que vocês têm não é normal? – Minha mãe perguntou.

– Não. –Respondi. – Viver presa em um castelo, não ter amigos e não poder sair sem ser reconhecida pra mim não é uma vida normal. – Eu estava quase chorando, mas não queria que isso acontecesse. Não na frente de todos.

– Olha. – meu pai disse. – O estrago já foi feito, não tem como voltar atrás. Mas vocês precisam prometer que nunca mais vão fazer isso.

Eu e Binho nos olhamos e colocamos as mãos para trás, cruzando os dedos.

– Prometemos. – Dissemos em coro.

– E tem mais uma coisa. - Willian disse. – Eu lamento ter que fazer isso agora, com vocês já tão grandes, mas os dois estão de castigo. Já que querem tanto saber como é ter uma vida normal, a louça do casamento será toda de vocês.

Eles saíram, mas Binho ficou. Só agora percebi que ele também estava de pijama e com o cabelo desarrumado. Na verdade ele estava lindo daquele jeito.

– Desculpa- Ele disse. – Se eu não tivesse te levado para lá, nós não estaríamos passado por isso.

– Não precisa se desculpar, até porque eu não me arrependo de ter ido. – Sorri.

– Nem eu. – Ele sorriu também. Ficamos em silêncio por alguns segundos, mas ele resolveu quebrar o gelo. – Ainda são sete e meia da manhã.

– Eu to morrendo de sono.

– Eu também...

Ele me olhou de um jeito que pude entender perfeitamente o que queria dizer. Trancamos a porta e nos deitamos na minha cama. Nós estávamos de conchinha e eu nunca dormi tão bem.

***

Era o dia do casamento. Mili estava aparentemente nervosa, por isso resolvi falar com ela, antes que começássemos a nos arrumar.

– Mili, fica calma. – Nós rimos.

– Impossível, Ana. Aliás, eu preciso muito falar com você, mas tem que ser a sós.

Nós fomos até o seu quarto, que era a sua cara, aliás.

– Ana, antes eu quero pedir desculpas por o castigo ter atingido só você e o Binho. Até porque eu também estava lá.

– Não precisa se desculpar, sério. Foi um alívio saber que você não tinha sido descoberta. – Ela sorriu.

– E tem mais uma coisa. É que uma coisa muito louca, digamos assim, vai acontecer hoje. E eu queria pedir pra você ficar com essas cartas, e só entregar depois do casamento.

– Pra quem? – Perguntei olhando as cartas que ela havia me entregado.

– Tem uma para você, uma para o Binho e outra para os meus pais. Mas por favor, prometa que só vai ler e entregar depois de tudo.

– Ta... Mas aconteceu alguma coisa?

– Digamos que vai acontecer, mas nada com que você precise se preocupar. Se Deus quiser vai dar tudo certo.

– Ok. – Sorri. – Eu to muito curiosa, mas prometo que vou me segurar.

Passamos o dia todo nos arrumamos e o casamento seria ás sete horas da noite. A agitação no castelo era inevitável, tinha gente correndo para todos os lados. O noivo também estava lá, aliás, estava desde ontem, quando foi feito um jantar “pré-casamento”, digamos assim.

Eu estava indo para o meu quarto, pois já estava com bobs nos cabelos, quando Binho segura no meu ombro me fazendo olhar para trás.

– Oi. – Ele disse rindo um pouco.

– Oi. – Sorri. – E não ria do meu cabelo. – Ele riu mais ainda.

– Desculpa! – Ergueu os braços. – Mas não se preocupe, você continua linda. – Sorri “fofamente”.

– Obrigada.

– Só fui sincero. – Ele sorriu. – Já parou para pensar que daqui um ano seremos nós?

– Já. – Respondi. – Muitas vezes, por sinal.

– Você não se sente confortável com isso, né? – Ele não parecia feliz ao me perguntar isso, talvez tivesse medo da resposta.

– No começo, não mesmo. Mas agora eu não sei...

– Isso é bom? – Ele perguntou arriscando um sorriso.

– Talvez! – Fiz mistério e continuei meu trajeto até o quarto.

– Ei, espera! Eu quero te mostrar uma coisa.

– O que? – Perguntei, mas ele apenas me puxou para a outra direção do corredor.

Entramos em seu quarto, onde havia um mural com muitas fotografias e desenhos.

– Foi você que fez? – Perguntei olhando aquelas folhas de papel, todas perfeitamente preenchidas por traços que formavam imagens maravilhosas.

– Sim... Eu sempre goste de desenhar. Aliás, te chamei aqui exatamente pra te mostrar um desenho que eu fiz. – Ele pegou um papel e me deu.

O desenho era eu e ele nos beijando. Quando vi aquilo meu coração começou a bater forte, não sei exatamente o motivo. Lembrei da noite em que nos beijamos, e para ser sincera, queria muito que acontecesse de novo.

– Ficou lindo. – Sorri.

– Fiquei com medo de você não gostar... Sei lá.

– Eu amei.

Nós ficamos ali sem dizer muitas palavras, apenas olhando um nos olhos do outro. Parecia que eu estava em outra dimensão.