Capítulo IX

Era estranho acordar sabendo que não encontraria Binho no café da manhã, no almoço, jantar ou em qualquer hora do dia. Nós nos conhecemos a pouquíssimo tempo e parece que já faz anos. Assim como Thiago, que conheço desde os 10 anos, quando ele era apenas o filho da cozinheira do palácio. Depois que sua mãe sofreu um grave acidente e morreu, ele resolveu se tornar guarda do castelo, para dar uma condição de vida melhor aos seus irmãos mais novos.

Já faz três dias que a família real voltou para a Inglaterra e esse tempo está me mostrando o quanto eles fazem falta, especialmente Binho e Mili. Mili porque está se tornando minha melhor amiga. Na verdade eu nunca tive amigos, só a Tati, mas nós nem passamos muito tempo juntas, eu nem posso contar os meus segredos para ela, é como se existisse uma barreira entre nós, não sei por quê. E o Binho por que... Ah, é o Binho.

Na verdade isso só está me deixando cada vez mais confusa. Eu sempre tive absolta certeza de que o Thiago era o amor da minha vida, que nós um dia conseguiríamos enfrentar todos os problemas e ficaríamos juntos, mas agora não sei de mais nada. Não tenho certeza se continuo querendo isso. E menos certeza ainda se não quero mais nada, se estou disposta a esquecê-lo. O medo de fazer a escolha errada é o que tem me assombrando nos últimos tempos.

– Pensando em mim? – Ele sussurrou ao se aproximar.

– Acho que sim. – Ri fraco tentando disfarçar, como se ele fosse saber o que passava pela minha cabeça alguns segundos atrás.

– Espero que seja algo bom. – Ele sorriu e eu sorri de volta. – Sabe... Eu acho que essas duas semanas serão boas para nós. Eu digo isso porque eu não vou ter que ver o Rubens e fingir que está tudo bem, que eu não tenho ciúmes dele com você.

– Eu estava com saudades de passar mais tempo com você. – Eu disse sem saber ao certo se estava com mais saudades dele ou do Binho.

– Tem um lugar aqui no castelo pouco frequentado. Na verdade ninguém nunca vai lá. Eu pensei que nós poderíamos nos encontrar depois que seus pais forem dormir.

– É uma boa ideia. - Sorri.

Eu estava ansiosa para o nosso encontro, pois quem sabe assim eu não tiro nota do que realmente sinto pelo Thiago.

O dia foi passando e eu não tinha nada para fazer. Já tinha me esquecido como era ser solitária nesse castelo imenso. Quando a noite finalmente chegou eu fui para o meu quarto e fiquei esperando que Thiago viesse me buscar. Ele bateu na porta e entrou.

– Vamos? – Ele falou baixo para não correr o risco de alguém ouvir.

– Vamos.

Fomos calmamente, passo por passo até o lugar misterioso. Era uma sala escura, onde tinham alguns livros velhos, não sei por que estariam lá e não na biblioteca.

– Você tem certeza que ninguém entra aqui? – Eu perguntei.

– Absoluta. Já faz um tempo que eu estou observando.

Nós ficamos lá conversando e foi tão bom. Já fazia tanto tempo que não ficávamos assim. Ele me contou como seus irmãos estavam, disse até que o sonho da mais nova era me conhecer. Achei tão bonitinho.

***

Essas duas semanas foram as duas semanas mais rápidas da minha vida. Quando me dei conta já estava dentro do avião pensando em como ter ficado esse tempo com o Thiago me fez bem, mas ao mesmo tempo me fez ficar ainda mais confusa. Eu estava com um frio na barriga em pensar que encontraria o Binho e veria aquele seu sorriso novamente. Ele é lindo.

Acabei adormecendo enquanto lia uma revista dentro do avião e acordei com minha mãe dizendo que havíamos chegado. Eu me assustei quando me dei conta disso, pois em questão de segundos eu o veria. Meu Deus, eu devo estar horrível, que vergonha. Peguei um espelho que tinha dentro da minha bolsa e dei uma arrumada no cabelo, foi só isso que deu tempo de fazer antes da porta do avião se abrir.

Desci e me deparei com toda a família real nos esperando ali fora.

– Espero que tenham feito uma boa viagem. – Disse o rei.

– Melhor impossível. – Respondeu meu pai.

– Nem turbulência teve, para a nossa sorte. – Agora foi a minha mãe.

– Bom, sejam bem-vindos ao nosso humilde castelo.

– Isso foi ironia, né? – Perguntei para Binho e Mili de uma forma que só eles pudessem ouvir.

– Deve ter sido. – Eles riram.

– Eu senti tanta falta de vocês. – Sorri enquanto abraçava os dois de uma vez só.

– E nós então? – Mili disse. – O Binho não parava de falar de você.

– Milena! – Ele disse corado e eu ri.

– Que foi? Vocês vão se casar mesmo! – Ela disse rindo da vergonha do irmão.

– Crianças, vamos entrar! –A Rainha disse. – Crianças... Nunca lembro que eles estão crescidinhos. – Ela disse para si mesmo e nós rimos da sua reflexão.

Me hospedei em um quarto, tomei banho e me arrumei para o jantar de boas vindas. Eu, Binho e Mili não aguentávamos mais ficar lá, no meio de tanta formalidade. Depois que estávamos saindo, Binho me puxou pelo braço no corredor.

– Oi. – Ele disse.

– Oi. – Eu disse um pouco sem entender.

– Eu queria te convidar para ir em um lugar hoje. A Mili também vai.

– Claro. – Sorri.

– Então onze horas esteja pronta que eu vou te buscar no seu quarto. A Mili vai passar lá antes pra te ajudar a se arrumar, porque nós vamos num lugar bem específico, digamos assim.

– Ok. – Ele piscou para mim e foi para o seu quarto.

Logo que eu cheguei no meu quarto a Mili bateu na porta. Eu abri e ela entrou rapidamente, segurando algumas coisas.

– Nós vamos num barzinho meio “rock and roll”, por isso eu trouxe algumas roups que combinem com isso. Você não precisa usar isso se não quiser, mas eu não aconselho você ir de vestido de princesa, é muito arriscado te reconhecerem.

– Ai meu Deus. – Eu disse pegando uma peça de roupa. – Isso aqui é uma calça de couro? – Perguntei maravilhada e ela concordou. – Eu sempre quis usar uma calça de couro! – Ela riu.

– Essa é a sua oportunidade, então!

Nos arrumamos e eu estava amando aquilo. Coloquei a calça, uma regata preta cavada, um top por baixo e um coturno. Look total preto. A Maquiagem era mais clara, mas com um delineado preto e um batom pink, para dar um toque mais “feminino”.

A Mili estava com um vestido preto de couro e um all-star branco. Usava uma maquiagem parecida com a minha e os cabelos soltos, assim como o meu.

Binho bateu na porta e abriu mesmo sem pensar na possibilidade de estarmos peladas, sorte que estávamos prontas.

– Tudo certo? – Ele perguntou e nós concordamos.

Continua...