Quando Zago retornou ao templo Otto e os outros membros de seu grupo, ficaram felizes por ver que o garoto realmente tinha conseguido apanhar as frutas.

–Vamos garoto, sente-se entre nós! – Disse o velho lenhador.

Zago largou no chão a bolsa carregada de frutos e, ignorou quando alguns membros de seu grupo aproximaram-se com visível interesse.

–Conte-me rapaz, o que viu lá em cima?

Tentando não se mostrar surpreso, o garoto deu de ombros.

–Uma árvore carregada de frutos.

Otto arqueou uma das sobrancelhas e tentando esconder um leve sorriso, pegou uma fruta do monte que se espalhara no chão quando a mochila caiu, e a jogou para o menino.

Zago o encarou durante alguns segundos para logo em seguida sorrir.

Quando se preparou para dar uma mordida na fruta que segurava Lorde Haung adentrou no templo dando ordens para que os homens preparassem suas barracas para acamparem.

–O grupo de Otto ficará na parte de trás do templo, logo abaixo da ponte de entrada. Enquanto isto, os restos dos homens ficarão aqui comigo esta noite.

Alguns homens do grupo de Otto começaram a recolher seus pertences e se direcionar para a parte de trás do templo. Zago foi o último deles. O menino não conseguia tirar a figura feminina que acabara de ver.

Aquela garota... Lorde Haung falou muito sobre a "flor do deserto", mas nunca havia dito que era uma garota comum. Na verdade,a chamavam de "flor do deserto" pois, de acordo com a lenda, a garota havia sido criada pela areia mas mesmo assim, era delicada como uma flor.

Zago não tinha tanta certeza da última parte, a garota que ele havia visto não era nem um pouco delicada, era como uma selvagem.

–Zago, venha rápido antes que Lorde Haung veja que você não está se apressando!

Otto gesticulava para que o garoto se aproximasse e se ajeitasse próximo aos outros homens do grupo.

–Não se preocupe Otto, ele não liga muito pra mim.

O garoto arremessou sua mochila no chão que foi parar nos pés de um homem que estava sentado.

–Você tem algum problema com mochilas? –Disse o homem estranho.

–Não que eu saiba...

–Não seja grosso com ele M'aiq, ele é só um jovem perdido.

–Não trate esse menino com gentileza Otto, ou ele vai nos botar em uma encrenca danada.

M'aiq encarou Zago firmemente, mas o garoto simplesmente ignorou-o sorrindo até que Otto surgisse para acalmar ambos.

Puxando o jovem para um lugar mais afastado, Otto mostrou aonde supostamente seria montada a barraca de Zago.

–Não se preocupe você está seguro aqui.

–Estou seguro de M'aiq, mas não dos colossos... Você não acha que estou um pouco afastado de mais do grupo?

O Velho lenhador tentou esconder a vergonha que era extremamente visível.

–Sinto muito rapaz, os outros membros acham que você pode ser perigoso... Sabe como é, por ser...

–Um menino de rua.

–Sim... Isso mesmo.

O garoto desviou seu olhar para o horizonte enquanto Otto parecia tentar concertar a situação novamente.

–Sabe garoto você não precisa se importar sabe como é eu sei que você nunca faria nada para nos prejudic...

–Não se preocupe Otto, eu já me acostumei.

O garoto não se importou com as falas de Otto e encarou o ancião por alguns segundos e, mostrou um leve e largo sorriso antes de voltar sua atenção para o horizonte. O velho lenhador decidiu fitar o horizonte por alguns segundos antes de dizer um "sinto muito" e se afastar.

Novamente, como sempre, Zago estava só. Abandonado pelo seu próprio "bando" assim como fora abandonado quando criança.

"Pelo menos os colossos não devem se abandonar", pensou.

Durante a noite, os recém soldados se revezavam para manter a guarda e, receosos, esperavam a todo o momento um ataque de monstros que nunca viriam.

Como ao longo da noite o revezamento ocorreu, era a vez de Zago de manter a guarda. Mas o garoto estava cansado e caiu em um sono profundo, acordando logo em seguida em um lago.

–Que lugar é esse?

O garoto admirava tudo ao seu redor, o cenário não era nem um pouco parecido com o deserto onde se encontrava o templo.

Tinha água de mais para ser um deserto. As barras de sua calça estavam ensopadas.

Quando tentou se levantar, Zago olhou ao redor e viu uma silhueta distante sentada em baixo de uma árvore enorme, localizada no meio d'água.

–Hey! Você aí espere!

O garoto caminhava o mais rápido possível atrás da silhueta e por um breve pensou que se tratava de Otto. Ele estava errado; a silhueta era feminina.

Quando se aproximou o suficiente para ver com clareza, Zago se surpreendeu.

A garota que estava de costas usava um vestido branco com detalhes verdes, além de possuir os cabelos desgrenhados de uma forma natural, como se estes fossem selvagens. Os pés estavam nus e na cintura, amarrada a uma faixa verde estava uma máscara esculpida em madeira.

Naquele momento, Zago a reconheceu.

–Quem é você?

A menina se levantou e virou calmamente fitando Zago nos olhos, assustando-o.

Os olhos da menina possuíam um tom de azul que ele nunca havia visto antes, talvez aquilo fosse um misto de azul com verde, ele não sabia explicar... Mas eram lindos.

–Quem é você?

A garota devolveu a pergunta com um tom de irritação.

–Meu nome é Zago... Eu vim de uma vila com os meus amigos, nós viemos com o Lorde Haung à procura de...

–Lorde Haung?

A garota parecia agitada e Zago desconfiado tentou prosseguir.

–Isso, nós estamos aqui para procurar uma garota.

A menina pareceu vacilar por um instante, e de repente, seus olhos azuis esverdeados se arregalaram de uma forma que ela demonstrou nervosismo.

–Vocês precisam ir embora.

–Não, espere, eu quero entender.

–Não há o que entender! – A garota começou a se estressar e parecia estar pronta para se defender. – Vá! Agora!

–Escute, por favor, não vou machucá-la. Eu vi como você tratou aquele monstro hoje cedo...

–Monstro?!

O tom de indignação na voz da garota fez Zago vacilar.

–Não, quero dizer... Eu vi como você tratou aquele Colosso hoje cedo, e eu tenho que te dizer algo, suas vidas correm perigo.

Pela primeira vez, a menina parecia apta a ouvir, mas algo começou a surgir no horizonte.

Nuvens negras cobriram rapidamente o céu.

–Ele sabe que você esta aqui...

–"Ele" quem?

A garota arqueou o corpo e observou cuidadosamente o céu antes de dizer:

–Rápido você precisa ir embora!

A garota ia empurrar Zago quando ele segurou fortemente seus braços e olhando em seus olhos, perguntou:

–Qual seu nome?

A garota não vacilou, assim como Zago esperava, isto por que ele havia observado que a garota ignorava suas perguntas por não estabelecer nenhum contato visual, era como se ela tentasse esconder seus olhos, mas quando o garoto a segurou ela não tinha para onde fugir.

–Dália... Meu nome é Dália.

De repente tudo ficou escuro para Zago.

"Quem tu pensa que és para adentrar em nossos domínios? Nós não queremos você aqui, vá embora."

Quando acordou, o garoto estava com a respiração acelerada e suava muito.

Otto estava ao seu lado, colocando um pano em sua testa e, quando viu que o menino acordara, o abraçou fortemente assim como fez no dia em que eles se encontraram.

–Pensei que você tinha morrido Zago! Graças aos deuses, fico contente e aliviado que você esteja bem.

"Foi apenas um sonho" pensou o garoto um pouco mais aliviado.

–Fique aqui, pegarei algo para você comer.

Otto saiu da barraca que ele havia armado para Zago quando este desmaiara.

Zago se levantou e lembrou-se do que havia visto no sonho, ele até mesmo esqueceria o que teria acontecido se não percebesse algo estranho em suas pernas.

Era água... As barras de sua calça estavam molhadas.