E me vi naquela situação de novo, completamente machucado, sozinho no camburão naquele fim de mundo arborizado, quente e verde. Só eu, meus pensamentos e o totem em minhas mãos. A minha cabeça doía, tinha acabado de bater de carro, estava sangrando e morrendo de calor, os mosquitos, que já me atacavam, agora estavam quase me devorando. O que mais uma pessoa pode querer além de ficar no meio da Amazônia, sozinho, machucado, sendo perseguido e pra completar, ainda ter esses malditos mosquitos te picando?

2 semanas antes

Estávamos nos últimos 15 minutos de aula do ultimo tempo da semana, logo depois iria começar as férias, os alunos da minha sala já tinham se tocado disso (eu digo “já” pois eles não eram do tipo de ser que de longe você aponta como inteligente. Meu dia tinha começado estranhamente bem, as pessoas não podem me chamar exatamente de sortudo, pois nunca a sorte olha pro meu lado, sempre que ela olha, o azar fica com ciúme e me agarra logo depois. Sabendo disso já comecei a ficar preocupado, não me atrasei pra escola, não estava chovendo, a temperatura estava agradável pra um dia de verão, as aulas tinham sido animadas e produtivas... Imaginava no máximo uma gripe ou queda de luz, eu realmente não poderia nem sonhar no que estava por vir.

- Rodrigo! Preste atenção! Não é desse tipo de matéria que você gosta? – disse Natália para mim.
- Hãn? Ah! Sim, adoro essas coisas de civilizações antigas. – respondi.
- Shhh! Deixe a professora acabar a matéria antes que entremos de férias! – sussurrou Flávia para nós dois – Não conseguirei ficar duas semanas esperando saber o fim dessa matéria!

- Então, acreditavam que o El Dorado, era uma cidade com incríveis avanços tecnológica e coberta em ouro que ficava pela região próxima a Colômbia, Venezuela, e parte do Brasil. De acordo com historiadores venezuelanos, em vestígios de registros dos colonizadores espanhóis, para chegar ao El Dorado, você deveria ter uma chave para abrir a cidade. Mas, alguns historiadores colombianos discordavam dessa ideia, de acordo com cartas, também espanhóis, encontradas na própria Colômbia, estava registrado que um homem escolhido, vindo dessa cidade era o único que poderia abri-la. – afirmou a professora de história.

- E os brasileiros? Eles encontraram alguma carta, pedra escrita ou coisa do tipo? – perguntou Rhamon.

- Não, os historiadores brasileiros no início procuraram bastante pela região amazônica, mas não encontraram nada relacionado a isso. E, por ser uma questão histórica espanhola e o Brasil ter sido colonizado por Portugal, todas, ou melhor, 99,9% das pesquisas e buscas por El Dorado no Brasil, foram canceladas e mandadas para outras áreas mais ligadas a cultura nacional, entre elas a independência brasileira, que é nossa próxima matéria! – disse ela sendo interrompida pelo sinal da escola indicando o início das férias.

- Até que enfim! – gritou Mariana após ser acordada pelo barulho das pessoas saindo desesperadas da sala.

- Gente ainda está de pé nosso almoço? – perguntou Rita

- Como assim? Falamos dele o dia inteiro e você ainda pergunta se está de pé? – reclamou Mariana.
- Ela só quis confirmar. E como você ousa ficar dormindo na aula de História! – retrucou Flávia.

No meio dessa discursão eu comecei a guardar meu material, eu estava de férias, duas semanas longe daquela sala, para um aluno é a melhor sensação que existe. Enquanto botava meus cadernos na mochila, um envelope caiu dele. Eu estranhei pois não lembrava de ter anotado nenhum bilhete em papel avulso, muito menos um envelope. Peguei ele no chão pra ver melhor, ele seria completamente branco se não fosse pelas coisas escritas em azul. O remetente e o destinatário.

- Né, Rodrigo?! – disse Flávia me desconcentrando.

- Oi? Desculpe, eu não prestei atenção. – respondi guardando rápido o envelope na mochila.

- Puts! É muito lerdo! – retrucou Natália rindo.

- Tá, que seja, vamos logo? – disse Amanda. – Se nos atrasarmos a reserva é cancelada!

A caminho do restaurante, nós parecíamos uma gangue de marginais, 11 adolescentes de 17 anos, gritando e correndo pelas ruas da cidade, alguns se xingando. Eu acho que quem passava por perto não ia quer nos ter como filhos. Pode ser esse o motivo de nossos pais nos botarem naquela escola onde não iam se preocupar com os filhos até que acabasse a faculdade, ou coisa parecida. Todos que estudam lá, moram lá, de acordo com a diretoria, esse é o melhor jeito de “vigiar” os alunos que não estudam.

- A reserva está no nome do Prof. Rico. – disse Bruna – Reserva para 14.

Ao falar o número de lugares, todos nós nos espantamos por um momento, sempre erámos 13, nós 11, Eu (azarado), Amanda (baixinha), Rita (tão inteligente que dá medo), Flávia (viciada em história), Bruna (...), Natália (implica comigo), Nina (implica mais), Rhamon (sensato), Vinícius (se acha), Mariana (nervosinha), Beatriz (Bia), mais 2, Marcos (meu amigo desde sei lá quando) e Lucas (saiu da escola a pouco tempo) que estudava em outras escolas. Então ficamos um pouco confusos.
- Bruna, você tem certeza que são... – Nina ia perguntar.

- O Prof. Rico vem almoçar com a gente. – disse Bia interrompendo.

- Não acredito! Agora vai ser uma merda esse almoço... - reclamou Vinícius.

- Você tinha que reclamar, né? – retrucou Rhamon.

- Reclamar de que? – perguntou Marcos chegando com Lucas sem entender a história.

Enquanto a discursão rolava, eu comecei a procurar na minha mochila o envelope pra vê-lo melhor. Quando achei-o e o retirei da mochila.

- Hahaha. Nós discutimos por tudo mesmo... – disse Flávia pra mim fugindo daquela briga sem sentido.

- É! Incrível. Será que sempre vai ser assim? – respondi.

- Não... Bom, pelo menos acho que não. Acho que um dia vamos cada um pedir desculpas ao outro.

- No dia que isso acontecer, me lembre de vestir um colete a prova de balas.

- Hahaha. Você acha que essa briga vai... O que é isso? – perguntou ela apontando para o envelope que eu ainda segurava.

- O que? Isso? – levantei um pouco o envelope. – Pior que eu não sei. Achei isso no meu caderno agora pouco.

- Então abre! – falou ela animada.

Quando eu ia abrir, a atendente do restaurante chegou e disse:
- A reserva está o.k., vamos, eu os levo até lá.

Sentamo-nos à mesa mais isolada de todas, a única que dava para 13 pessoas, nela podíamos gritar, discutir e rir o quanto quiséssemos, mesmo que fosse em outro lugar, nada nos impediria... Um grupo apenas deixou a mochila na sua respectiva cadeira e foi se servir, outros sentaram e ficaram conversando desde a escola até E.T. Sim, nós temos uma imensidão de assuntos aleatórios que chegava a assustar as pessoas que nos ouvia, pois nos não falávamos dessas coisas doidas apenas. Nós gritávamos essas coisas doidas.

Eu fui para o lugar mais longe da porta, próximo a janela, eu sempre me sentava lá. A ordem nunca mudava, de um lado ficava eu, Flávia, Natália, Rhamon, Mariana, Bia e Nina, do outro ficava de frente pra mim o Prof. Rico, Marcos, Lucas, Vinícius, Bruna e Amanda. Sempre pegávamos uma mesa para 12 quando o professor não vinha, mas quando ele vem, a gente pede uma mesa de 14 lugares e sempre acaba sobrando um. Quando me sentei, Flávia já veio pedir pra eu abrir o envelope:

- Anda! Abre! Quero ver o que tem dentro! – disse ela.
- Calma Flávia! – respondi tentando não rir. – Deixa eu ver o Remetente e o Destinatário primeiro!

- Tá... Vai vendo aí que eu estou com fome. – falou ela um pouco desanimada.

Então ela saiu da mesa e quando eu olhei pro lado só tinha eu, Bia, Bruna e Vinícius na mesa. Todos conversando entre si. Voltei meus olhos ao envelope para ler o que tinha escrito nele. Na parte do Destinatário estava escrito apenas Rodrigo Jabarra (meu nome). Porém, na parte do Remetente estava escrito Guilherme Araújo, com uma observação logo abaixo: Não vá sozinho.

Não entendi muito bem porque meu pai tinha me mandado uma carta, muito menos como ela foi parar na minha mochila. Então decidi abrir. Dentro dela tinha 2 papéis dobrados e um cordão. Um papel era muito velho e o outro muito novo. Peguei o cordão primeiro e logo em seguida o papel mais novo, queria vê-los de perto, não peguei o papel mais velho com medo de rasgá-lo.

O cordão parecia uma moeda antiga feita de bronze, porém com uma corrente que servia para pendurá-lo no pescoço. Na frente tinha uma caveira no centro e, em volta dela, vários símbolos que pareciam Maias, Incas ou Astecas. O estranho é que na parte de trás tinha uma frase escrita em espanhol: “Los caminos son trilhados por los mejores, pero son seguidos por los sábios.” Os caminhos são trilhados pelos melhores, mas são seguidos pelos sábios. Eu não entendi muito bem o que era aquela moeda, mas gostei dela. Fui ler o papel para ver se ele explicava o que ela era. Nele tinha uma carta do meu pai dizendo:

Filho,

Estou mandando esta carta só posso confiar essa busca a você. Como você já deve saber pelo seu Professor Rico, eu estive em busca do Totem Do Sol da tribo Karib que habitava em parte da Amazônia. Depois de anos de pesquisa eu achei um mapa que leva direto a ele. De acordo com minha pesquisa, ele tem poderes sobrenaturais que levam quem o portar para a cidade de El Dorado.

Se você for aceitar essa busca, por favor, seja breve. Os Vicente Blancos e os Los Rojos já estão atrás de mim e de minha pesquisa, por isso a queimei e mandei resumidamente para você. Não sei se conseguirei escapar vivo, capturaram sua mãe e por mais que parecesse que o abandonamos, nós nos afastamos para o seu bem.

Agradecemos por tudo que nos deu até hoje.

Guilherme, seu pai que o ama.