Matheus insistiu para o meu pai, quando apareceu para ver como eu estava, que fosse ele a me levar para casa, já que meu pai estava de plantão. Eu obviamente garanti ao meu pai que eu estava bem e que não teria problema algum de Matheus me levar.

Matheus falava no celular, quando eu saí do quarto com uma terrível dor no pescoço. Talvez fosse Aline, e com certeza era ela, já que no tempo que ele estava comigo, ela havia ligado mais de quinze vezes perguntando onde ele estava e com quem.

– Sim quando der eu te ligo, e, por favor, pare de me ligar... – eu o ouvi dizer, e logo depois desligar o telefone.

– Vamos? – disse ele desligando o celular.

– Aonde? – eu sabia onde, me fiz de bobo. Ele olhou para os lados e na certeza de que não tinha ninguém olhando, se aproximou de meu ouvido e disse:

– Talvez para cama! – como aquele sussurrou me perturbou, pude sentir um leve arrepio em minha nuca.

Saímos do hospital com a escolta de meu pai. Na porta, ele disse para Matheus tomar cuidado, já que ele ainda não tinha a carteira de habilitação:

– Ele esta seguro comigo.

– Vão em paz, e qualquer coisa ligue Kayo. – disse meu pai.

Já no carro, Matheus me olhava constantemente e ria levemente.

– Está rindo do que?

– Eu pensei em lhe dizer uma coisa, mais fiquei com vergonha! – pude perceber como ele estava encabulado.

– Oras, você já fez o pior Matheus, me beijou...

– Eu ia falar que te achei lindo deitado naquela cama de hospital...

– Que horror... esse seu lado mórbido eu não conhecia.

– Não. – ele ria – Está vendo o porquê eu disse que eu ficaria envergonhado? É que eu achei lindo eu estar ali, e você precisando de ajuda, de carinho, de atenção...

– Você fala de mim, que eu tenho algo que faz com que as pessoas se apaixonem... mas você também tem algo muito especial .

– Eu não tenho nada, sou o pobre velho Matheus de sempre.

– Ah, mas veja Aline, ela é completamente apaixonada por você, e não somente ela. Outras garotas não tiram os olhos de você na escola.

– Todas me querem, mas eu só quero um! - disse ele pegando na minha mão nesse momento, a erguendo até seus doces lábios e as beijando.

Eu não tinha mais como escapar dos meus sentimentos. Eu estava, realmente, apaixonado por ele.

Quando chegamos a minha casa ele entrou junto comigo.

– Bela casa! – disse ele ao ver a sala com grandes sofás, com uma grande televisão. Havia quadros nas paredes com fotos minhas desde criança, fora as fotos com vovó e vovô tantos maternos quanto paternos. Com minha tia Carol e fotos com Júnior.

Matheus ficou olhando a foto comigo e seu irmão durante um tempo e quanto se virou, eu pude perceber que ele se esforçava para não chorar.

– Quer beber alguma coisa? – eu disse, tentando mudar o clima – Nossa!

– O que foi?

– Minha mãe, eu me esqueci de perguntar para o meu pai se ele falou com ela. MÃE?

Eu não obtive resposta alguma.

– Ligue no celular dela.

– Não! Ela não tem um... MÃE?

– Ela parece não estar em casa... será isso um bom sinal?

Eu olhei profundamente aos olhos de Matheus.

– Eu não vou transar com você, Matheus!

Ele riu.

– E quem pensou em sexo aqui? – a risada dele era algo tão incrível. Aqueles dentes perfeitos.

– Vou fazer algo pra gente beber...

– Pode ser vinho? – disse ele, agora olhando na prateleira com as bebidas do meu pai.

– Só se for pra você. Eu não bebo mais.

– Por quê?

– Quando eu bebo coisas estranhas acontecem.

– Que coisas?

– Não quero falar sobre isso, se quiser beber, sinta-se a vontade. Alias você tem dezoito anos e pode fazer qualquer coisa. – eu fui até ele e o beijei. A reciprocidade dele era incrível.

– Vamos subir, só um pouco? – disse ele, me beijando.

– Matheus... – ele me deixava sem ar.

– Existem coisas que podemos fazer com roupas, sabia? – ele murmurou em meu ouvido.

Acabamos por subir, e por mais incrível que possa parecer, o nosso momento a sós na cama acabou rápido. Não que eu não quisesse algo a mais, mas Matheus ficou bastante pensativo.

– Aconteceu alguma coisa? – eu perguntei me apoiando no travesseiro.

– Sinto saudades do meu irmão. – ele respirou fundo – Você acha que é muito egoísmo eu só sentir saudades dele... pois eu conhecia todo mundo naquele ônibus, de certa forma.

– Eu acho que você não deve pensar nisso. Independente de qualquer coisa, ele era seu irmão... mas de certa forma eu me sinto da mesma forma, pois eu conhecia todo mundo lá, muitos eram meus amigos, mas nenhum deles eram como o Júnior, eu sinto saudades de todos, mas não como eu sinto dele. – senti a voz embargar.

– Vocês eram realmente muito próximos um do outro. Eu nunca consegui entender essa ligação. – ele riu – Eu cheguei a perguntar a ele se vocês tinham um caso...

– Eu não acredito nisso!

– Acredite. – disse ele sentando na cama – Eu sei que você não quer falar sobre isso, pois se quisesse, teria falado. O que houve na delegacia?

Chegamos a um ponto que eu não podia esconder muita coisa de Matheus. Eu estava apaixonado por ele, e sentia que ele também estava por mim, mas a grande questão seria dizer a ele ou não que, eu tinha visto Júnior na delegacia, e que isso, de uma forma ainda inexplicável, causou aquele sangramento no meu nariz. Tocar nesse assunto seria doloroso demais, e não se engane em achar que eu não estava preocupado com aquilo, pois eu estava sim. Mas a presença de Matheus fazia com que qualquer dor ou dúvida desaparecesse.

– Foi uma coisa muito estranha, talvez você nem acredite em mim.

– Porque não tenta. Acho que provei a você que tenho a mente aberta.

– Eu acho que ainda não é o momento...

– Fale, estou com você sempre.

Tentei relutar, mais não consegui. Eu não podia entrar em detalhes, então antes de comentar qualquer coisa, eu tinha que pensar mil vezes, e tentar ser o mais sutil possível.

– Acontece que no dia do acidente, aconteceu uma coisa comigo e talvez eu sentisse que algo estava errado, mas não dei importância. Parecia ser algo da minha cabeça, eu pensei ter visto algo, mas o fato foi que ninguém mais viu e eu não sei explicar como ou o porquê.

“Não digo, desde então, mais quando eu era criança, minha mãe dizia que eu era especial. Eu podia sentir coisas, ver coisas ou até mesmo prever outras. Isso foi sumindo conforme eu fui crescendo, de tal forma que fez com que eu realmente acreditasse que aquilo não estava acontecendo.

Eu não me lembro de como foi o acidente, foi tudo muito rápido, mas antes de qualquer coisa acontecer, eu vi ambulâncias e o carro da policia passando com toda a velocidade do lado do ônibus, mas apenas eu vi, ninguém mais.

Um tempo depois eu sonhei com aquela cena e então eu vi uma coisa, uma criatura, algo que parecia humana, mas não era bem humana, ela me atacou no sonho.

Tudo estava normal e então chegou o mandato para que eu fosse relatar o que tinha acontecido. E lá na sala, bem... eu me senti mal, porque eu não podia dizer ao policial isso que eu estou te contando. Ele ficou nervoso e saiu e eu fiquei lá sozinho. Sabe, eu tenho medo de ficar em lugares pequenos, a escuridão e o medo de ficar trancado me causa desespero, e a sensação que eu tive era de algo queria me causar esse medo.”

Eu não podia contar toda a verdade. Contei o que realmente seria mais importante, mas dizer que aquela pessoa era Júnior, isso eu não poderia dizer, não naquele momento.

– Uau! – ele disse, e logo depois levantou.

– O que foi? Eu sou esquisito eu sei...

– Você é meio vidente, sei lá! Isso me dá medo...

– Eu não sou anormal... esquisito talvez...

– Eu não disse que seria, eu apenas disse que isso me dava medo e agora eu entendo o porquê você ficou calado durante tanto tempo. Mas isso não esta me importando agora, estou preocupado com você, pelo que houve na delegacia. O seu nariz sangrou e pelo que disseram, sangrou muito. Eu não sei se acredito muito nessa historia de prever as coisas, mas...

Eu não ouvi mais nada, tudo ficou mudo e eu nem mesmo podia ouvir a minha respiração. Meus olhos ficaram fixados na parede, e então eu vi algo se formando nela. Um nome, bem específico e muito legível.

Família Taurino

Tão rápido eu o vi, ele se foi e aquele tipo de transe sumiu. Nesse momento Matheus já estava em cima de mim, perguntando o que havia acontecido. Eu, ainda tonto disse.

– Família Taurino, você conhece?

– Você está bem?

– Me responde Matheus, você conhece a Família Taurino?

– Conheço... quero dizer... já ouvi historias sobre eles, mais o que isso tem haver? – ele estava desesperado.

– Eu vi esse nome na parede...

– Na parede? – ele olhou para os quatro cantos da parede a procura de algo.

– Matheus, duvido que você veja alguma coisa. – eu estava eufórico. Levantei da cama e comecei a andar para um lado e outro – O que você sabe sobre essa família?

– Bem o que eu sei é que essa família foi meio que extinta aqui na cidade...

– Como assim extinta?

– Eles são antigos, nunca ouviu falar sobre a história deles? Você mora aqui antes de mim.

– Eu não sou do tipo que se preocupa com essas histórias...

– Pois bem, eles moraram aqui há mais ou menos uns duzentos anos, eram considerados bruxos, ou algo assim. A cidade toda, na época, se revoltou contra eles, depois do desaparecimento de cinco crianças, as roupas delas foram encontradas na antiga casa deles. Ela fica no Jardim das Flores, quase no fim da cidade, ninguém vai até lá, todos temem aquele lugar. Talvez você não conheça mesmo, o pessoal do terceiro ano normalmente é chamado para passar a ultima noite do ano letivo na casa, porque muitos a consideram assombrada.

– E o que aconteceu com eles? Com a família?

– Foram mortos, eram considerados bruxos e foram queimados vivos. A esposa, o marido, a mãe da esposa, e se eu não me engano duas crianças...

– Que horror!

– Pelo menos é o que eu sei, mais como... o que isso tem haver?

– É o que pretendo descobrir. Como um nome que eu nunca ouvi falar, aparece escrito na parede do meu quarto?

– Bem, é como você disse, você é o esquisito – disse ele rindo – fique calmo, não há de ser nada, deva ser apenas sua ima...

–Imaginação! Muitos dizem isso, mas eu sempre duvidei da minha imaginação.

– Esta bem então nós veremos isso amanhã, mas só se você prometer ficar calmo. Eu não quero ver você nervoso, então mocinho faça o favor de se acalmar. – disse ele me abraçando.

Naquele abraço senti minhas forças serem recarregadas, no entanto tivemos que nos separar, pois alguém havia chegado em casa.

Era minha mãe que começou a me chamar.

– Kayo, está no seu quarto? – gritou ela.

– Sim mãe...

– Você está bem?

– Estou! – ela disse mais alguma coisa que eu não consegui prestar atenção, Matheus havia me beijado nesse momento.

– Você é o meu doidinho preferido. Amanhã a gente descobre algo sobre essa família.

– Esta bem então.

– Eu fiz uma escolha e espero que você se habitue a isso, você agora me pertence e eu pertenço a você, nada e nem ninguém vai mudar isso agora, logo se você for meio esquisito, eu também quero ser, porque eu amo você e quero viver do seu lado, sempre!

– Kayo? – era minha mãe na porta. Ela ficou parada ali alguns segundos, eu pude ver seus olhos certa desaprovação, eu e Matheus nos soltamos rapidamente – O que está acontecendo aqui? – perguntou ela, como se já soubesse a resposta.

– Nada, mãe. Estávamos falando...

– Sobre meu irmão! – disse ele, se afastando mais de mim, colocando a mão na boca para disfarçar.

– Entendi... seu pai pediu pra lhe entregar isso... vitaminas. – disse ela com uma sacola na mão, eu fui e as peguei – Matheus eu acho que o Kayo precisa descansar agora.

– Eu já estou descansado, mãe! – ela me olhou com desaprovação de novo.

– Eu disse que você precisa descansar. Por favor, Matheus volte amanhã. Alias amanhã vocês se veem na escola.

– Porque você age assim? – eu perguntei.

– Assim como?

– Dessa forma, querendo se cegar para o que esta diante de teus olhos...

– Menino cala-se agora e Matheus eu não quero pedir de novo.

– Está bem, depois nos vemos Kayo. – ele estava envergonhado, me olhou e depois fitou minha mãe – Não era nada disso que a senhora...

– Até mais Matheus!

Quando ele começou a descer as escadas, ela saiu do meu quarto balançando a cabeça, e foi para o seu quarto. Eu fechei a minha porta.

Aquilo não era justo. Eu não era anormal por ser assim, e muito menos Matheus tinha culpa. Ela não precisava ter o tratado daquela forma. Eu sabia que minha mãe não era burra, alias ela era inteligente até demais, logo eu pensei que se ela soubesse que estava feliz, mesmo que com um homem, ela também estaria. Mas apesar de tudo, aquilo não era importante naquele momento. O nome Taurino não saia da minha cabeça.

A noite então chegou e eu recebi uma mensagem no celular de Matheus, ele me perguntou o que tinha acontecido depois que ele havia saído.

“Não houve nada, ela ficou na dela e eu na minha”.

Eu a amo, e ela sabe que eu sou diferente.

Ele respondeu em seguida.

“Não se preocupe, eu não tenho medo de assumir”.

Eu apenas quero estar ao seu lado. “Sempre.”

“Não é assim Matheus, ser isso, como eles dizem, não é fácil.

“Ainda mais, para alguém como você.”

“Alguém como eu? Falando dessa maneira me sinto um monstro.”

“Não me refiro a ser um monstro”. Você é lindo, popular.

Qualquer um faria qualquer coisa para estar ao teu lado”

“E então porque você não faz”?

Fica comigo?”

“Vamos com calma, Mat. Vamos com calma.”

“Esta bem então”.

Estou pesquisando sobre a família. Amanhã mostro o que achei.

“OK!”

“Então eu procurarei algo aqui. Vejo você amanhã?”

“Claro que verá. Eu já sinto sua falta.”

E ele finalizou dizendo.

“Eu também”!

Eu fiquei divagando até tarde da noite sobre os motivos que me fizeram ver o nome daquela família na parede, além de ter visto Júnior, e sobre a visão que eu tive antes do acidente. Logo, antes de fechar os olhos em um longo e tranquilo sono eu me perguntei: estaria eu realmente imaginando aquelas coisas?