Teméria, 1279.

Vilarejo de Lathlake

Duas semanas depois...

Um prato quente de sopa foi posto diante de Ciri. A jovem roçou levemente as mãos, numa vã tentativa de se aquecer do frio. Mais um indício do fim do outono. Não tardaria até que a Teméria estivesse branca, coberta de neve por meses. Faltava pouco para este dia acontecer, o que fez a Bruxa se lamentar. Queria muito passar o inverno com Geralt em Touissant, terra que parecia desconhecer o significado da palavra “frio”. Não muito tempo atrás, Ciri imaginou sua vida no Caminho sendo interrompida por suas idas à Kaer Morhen, onde aguardaria tradicionalmente a passagem do inverno junto aos bruxos remanescentes da Escola do Lobo. Mas agora que Vesemir estava morto, passar o inverno em Kaer Morhen suscitava más lembranças. Lembranças que os bruxos remanescentes da Escola do Lobo desejavam evitar.

—O inverno está chegando.

Um copo foi posto ao lado de sua sopa por Dora. Meio copo de Licor de Mahakam. A Bruxa riu. Poucas bebidas tinham o poder de afugentar o frio como a sagrada e enfadonha bebida dos anões. O primeiro gole fez sua garganta queimar e o frio de seu corpo se dissipar. Apesar de não ser uma novata no quesito “copo”, Ciri sabia que precisava ir com cuidado. Não queria acabar tão bêbada já tão cedo.

Não que houvesse trabalho a fazer, de qualquer modo. Ciri passou as últimas duas semanas trabalhando em conjunto com o sisudo e sempre distante Bruxo Bjorn de Skellige. Qual lugar de Skellige? A Bruxa jamais soube, pois Bjorn era extremamente reticente em contar qualquer coisa sobre sua vida, que dirá sobre seu passado. E assim Ciri também era, evitando contar sobre seus problemas com a Caçada Selvagem, sua forte amizade com bruxos e feiticeiras, além de toda sua atribulada e agitada vida, permeada por guerras, Magia e viagens entre dimensões. Mas mesmo se contasse suas histórias, Ciri duvidava que Bjorn acreditasse nelas. Do mesmo modo como ele ainda insistia na tese de que ela só matara afogadores e nada mais.

—[Queijo, já disse! Eu pedi queijo, não linguiça!]

Ciri voltou seus olhos para as palavras em nilfgaardiano, ditas em voz alta. Logo, descobriu a quem pertencia aquela voz. Um Cavaleiro Negro. E não estava sozinho. Acompanhado de outros três soldados, em suas suntuosas e pouco práticas armaduras, os nilfgaardianos travavam uma verdadeira batalha verbal para serem compreendidos por Dora e Lucius.

—O que ele está dizendo?

—Não sei. Jurava que era linguiça, mas ele parece bravo. – cochichou Dora a Lucius. Um dos nilfgaardianos reclamou com o outro.

—[Se essa cadela temeriana errar outra vez, juro que a arrasto pelos cabelos e esfrego a cara dela nesse prato.]

O clima estava pesado. Dora já estava nervosa, com a testa suando. Ciri inquietou-se. Sabia nilfgaardiano. Aprendera ainda em Cintra, quando era uma princesa e herdeira do Trono. Seu ímpeto em ajudar Dora e Lucius era, no entanto, detido pelas palavras de Geralt. “Fique longe dos nilfgaardianos”. Ciri sabia que havia fundamento no apelo do bruxo, afinal, para todos os efeitos, ela estava morta. Se o seu pai Emhyr descobrisse tudo, sem dúvida ele iria atrás de Geralt e forçaria Ciri a ser a próxima Imperatriz, destino este que provocava náuseas nela só de pensar.

Mas nos últimos dias, Lathlake andava abarrotada de Cavaleiros Negros. Abarrotada demais para o gosto de Ciri. Não que isso fosse ruim para o vilarejo, afinal Adal estava tendo lucro como nunca, consertando armaduras e espadas, quando não fazendo ferraduras para os cavalos. Os Cavaleiros Negros acamparam nas proximidades, mas procuravam o comércio local para se abastecer. Mas embora não fosse uma ameaça concreta, Ciri tinha uma velha sensação de que aquilo era um mau presságio.

—[Pela última vez, sua puta!] – esbravejou o nilfgaardiano, esmurrando o balcão e fazendo Dora estremecer de medo. – [Eu quero queijo!]

—Dora... – aproximou-se Ciri da confusão. – Ele está pedindo queijo.

Dora assentiu, correndo até a cozinha. Em poucos segundos, a temeriana trouxe uma porção generosa de queijo, decerto para ajudar a amenizar o problema. Recebendo a poção, o nilfgaardiano a tomou e se dirigiu à uma mesa, sem sequer dizer “obrigado”. Não que isso fosse esperado.

—Você nos livrou de uma boa encrenca, menina do cabelo branco. – caçoou Lucius, aliviado. Suas bochechas gordas estavam avermelhadas pelo nervosismo.

—E quem diria, você sabe nilfgaardiano... – observou Dora. Ciri desconversou.

—Uma palavra ou outra, não sou especialista.

—A próxima refeição que fizer será por conta da casa. – disse Lucius, surpreendendo Ciri e Dora. Afinal, o estalajadeiro não era conhecido por sua generosidade. Mas Ciri não tinha do que reclamar. Seus Orens do último contrato estavam acabando e uma refeição de graça não era algo a se recusar.

Voltando para a mesa e finalmente tendo a oportunidade de comer sossegada, Ciri provou da sopa pela primeira vez. Estava deliciosa. Ela podia sentir o gosto de cebola e linguiça bem-temperada que Lucius fazia como poucos. Teria degustado ainda mais a sopa, se uma sombra não tivesse se projetado obre a mesa. Uma sombra que, nos últimos dias, tinha aparecido bastante.

—Boa tarde, Magistrado Godfrey.

—Impressionante como bruxos como você conseguem sentir a nossa presença a ponto de descobrir quem é. Turiel também é assim, embora ela explique que meu cheiro de mirto é deveras sobressalente.

—Mirto? – perguntou Ciri, surpresa.

—Tenho um problema no dedão do pé e, de vez em quando, preciso mergulha-lo em uma das soluções medicinais que Turiel me fornece. Mas nem é um cheiro tão forte assim, pois as pessoas só ficam sabendo depois que conto. Enfim, não vou estragar sua refeição com meus problemas de saúde. Tem notícias desse “dragão”? Duas semanas já se passaram e nem sinal dele...

Ciri precisava dar o braço a torcer. As suspeitas de Bjorn – suspeitas não, certezas, a julgar pela firmeza dele – tinham se mostrado praticamente infundadas. Nenhum Dragão foi visto sobrevoando os céus de Lathlake. Sim, é verdade que Ciri encontrou focos de fogo, todos verificados, e que só serviram para alimentar a tese de que, muito embora o Dragão não estivesse na região, algo estranho estava acontecendo.

Em sua busca pelo Dragão, Ciri encontrou acampamentos isolados recentemente destruídos. Todos queimados, desde a fundação. Nenhum sobrevivente para contar o que houve, embora os cadáveres pudessem dizer o bastante sobre suas identidades. Rebeldes. Filhos da Teméria. Seria isto era trabalho dos nilfgaardianos? Afinal, Lathlake estava cheia deles nos últimos dias.

A Bruxa começou sua resposta com um suspiro pesado.

—Nada de concreto sobre o Dragão apareceu ainda.

—E o calhorda dizendo que está perto de enfrentar a fera, fera esta que jamais apareceu ou devorou coisa alguma, nem mesmo uma vaca. Isso me faz pensar se a permanência desse bruxo em Lathlake ainda é necessária por aqui.

Ciri não pôde deixar de franzir o cenho para a insatisfação do Magistrado.

—Não acho que Bjorn está incomodando os aldeões. Pelo que sei, ele sequer está hospedado aqui, acampando perto da floresta.

O Magistrado parecia surpreso.

—Está defendendo o bruxo agora?

—Bom, não se trata de defender. Há que se admitir que ele prometeu que ficaria longe de confusão. E verdade seja dita, até agora ele está cumprindo com sua palavra.

—Expressão certa, esta que usara. “Até agora”. Bruxos são seres inquietos por natureza e cedo ou tarde, confusão irá encontra-los. Dizem que são as mutações que os tornam mais agressivos, libidinosos, não sei. O que me atemoriza é que me sinto abusando da sorte, não expulsando esse Bjorn quando tudo aponta que não há monstro, que dirá Dragão, que justifique a permanência dele em Lathlake.

—O que sugere? – perguntou Ciri.

—Se até amanhã ele não apresentar nenhuma prova concreta sobre o Dragão, então terei de expulsá-lo daqui e... Mas o que significa isso?!

O Magistrado se sobressaltou na mesa quando a porta da estalagem se abriu repentinamente. Era um esbaforido Adal, o ferreiro do vilarejo.

—Pelos deuses, Senhor Magistrado! Há um Dragão voando no céu, debaixo de nossas cabeças! Juro pelas tetas de Melitele!

—O quê?! – indagou-se o Magistrado. O rugido da fera fez um dos fregueses deixar cair uma caneca de cerveja cheia no chão, fazendo o homem soltar inúmeras maldições. Com grande excitação, Ciri desembainhou sua Zirael e correu para o lado de fora. A primeira visão de seus olhos foi a enorme e incomum sombra projetada sobre o vilarejo de Lathlake. Assim que seus olhos se ergueram para o céu, Ciri entendera o que causara tamanho reboliço.

Bjorn estava certo. Realmente havia um Dragão em Lathlake. Um enorme Dragão negro, cujo bater de suas asas provocava ventos fortes, desalinhando os cabelos de Ciri e sacundindo as árvores próximas. Gritos de pavor e choros eram escutados por toda Lathlake. Os moradores corriam para suas casas e tolamente tentavam proteger suas entradas com tudo que pudesse obstruir a passagem, como se um Dragão simplesmente não cuspisse fogo e destruísse uma casa desde sua fundação com pouco esforço.

—Mas onde diabos se meteu o Bjorn? – esbravejou o Magistrado, também assustado enquanto observava o dragão no entorno do vilarejo.

—Não o vejo desde ontem, senhor. – respondeu Lucius.

—Lucius, procure alguns meninos da vila e vão procura-lo. Oras, reclamou tanto comigo, e agora que o maldito Dragão resolve aparecer, ele some?!

Quando viu os soldados nilfgaardianos da estalagem admirando o Dragão, Ciri estremeceu. “Não posso lutar contra ele aqui”, pensou a jovem bruxa. “Terei de usar os meus poderes e não quero testemunhas.”

Ciri assobiou forte, fazendo Pandora galopar ao seu encontro. Ignorando o Dragão e seus voos rasantes, bem como os gritos de pavor mortificantes dos aldeões de Lathlake, a corajosa égua de Ciri correu em sua direção e com notável destreza, foi rapidamente montada pela Bruxa.

Com Zirael a reluzir em sua mão, Ciri seguiu pela estrada. Seu gesto imediatamente atraiu a atenção do Dragão negro, como ela esperava. Olhando para trás, enquanto galopava para longe com Pandora, Ciri pôde ter uma melhor noção quanto ao tamanho do Dragão. Jamais viu um monstro semelhante. Tão grande e... Bonito. Sim, havia uma beleza peculiar na Morte. Ela jamais entendeu o que Vesemir quis dizer com isto, mas agora, diante de uma criatura mágica e lendária como aquele Dragão, Ciri pôde entender suas palavras.

Perto de uma campina, Ciri saltou de Pandora, que parecia ter entendido que seu serviço de cavalo já havia terminado e correu para longe dali, seguindo seu instinto animal de perigo por perto. O Dragão fez mais um rasante, estando um pouco acima de Ciri desta vez. A Bruxa estava animada para enfrenta-lo, mas não entendia por que o Dragão simplesmente não a atacou com fogo enquanto ela cavalgava Pandora.

Sua confusão não durou muito tempo, pois logo o Dragão abandonou os céus e pousou em solo firme. Ciri chegou a sentir seus pés tremerem. Grama e terra se soltaram, arremessadas pelo impacto do pouso da criatura e pelo vento provocado pelo bater de suas asas. Em seguida, seu urro animalesco e assustador, tendo o Dragão aberto sua mandíbula para soltá-lo, exibindo seus dentes pontiagudos. Um urro tão forte e agudo que Ciri poderia jurar ser capaz de sentir as vibrações de seus decibéis a bater tremulamente em seu rosto, como uma forte rajada de vento.

—Grite o quanto quiser, seu filho da puta! – gritou Bjorn, descendo de seu cavalo e já sacando de suas costas seu machado de prata. Ciri parecia surpresa com sua repentina presença ali.

—Como me encontrou?

—Do mesmo modo que metade da Teméria que decidiu olhar para o céu esta manhã. Eu o segui até aqui, a uma distância segura. Tenha cuidado, pode haver veneno nos dentes.

—Querendo ensinar o sacerdote a rezar? – questionou Ciri, com um sorriso sarcástico nos lábios. Retornando rapidamente a postura de combate, Ciri sentiu seu coração batendo acelerado. O Dragão movimentou um pouco suas patas, fazendo a Bruxa sentir o chão debaixo de seus pés levemente tremer. Sem dúvida, ele era muito pesado, talvez até mais do que aparentava.

Aquele impasse não durou muito tempo. O Dragão abriu novamente sua boca, mas desta vez não veio mais um urro de ensurdecer, mas sim, uma rajada de fogo. Bjorn rolou pelo chão, para longe das chamas. Ciri chegou a sentir o calor do fogo antes de rapidamente se teletransportar. Era hora de contra-atacar, pensou a Bruxa. E foi o que fez, para imediatamente ser detida por uma patada da criatura lendária, fazendo-a ser arremessada para longe. Se Zirael não fosse uma espada resistente, teria se partido diante do impacto contra o chão. Por sorte, foi feita por um ferreiro competente, da confiança de Geralt.

Sua espada caiu para longe de si, mas Bjorn a chutou para mais perto das mãos de Ciri. Tudo que a bruxa pôde fazer para agradecê-lo foi acenar-lhe levemente com a cabeça.

O Dragão não deu descanso aos dois. Cuspiu fogo mais uma vez, em vão. Bjorn rolou mais uma vez para longe das chamas, mas desta vez revestido de Quen. A proteção não durou muito tempo, pois logo o escudo de magia cedeu e partiu-se, provocando o espalhamento no ar de partículas de Magia semelhantes a vidro. Graças à sua agilidade conferida pela Magia de seu Sangue Ancestral, Ciri conseguiu desviar de sua infindável rajada, tão forte que enegreceu a grama e levantou fumaça no ar.

Usando Quen mais uma vez, Bjorn não pôde enxergar o contra-ataque imediato de Ciri. Tentando uma nova abordagem, a Bruxa se projetou para o topo do animal, tentou golpeá-lo na cabeça, mas outra vez o Dragão se esquivou, sacudindo-se com violência. O movimento brusco fez a Bruxa tropeçar e rolar para suas costas. Mas sua tenacidade a impediu de desistir, tendo Ciri aproveitado a chance para arranhar a dura pele do animal com a ponta de sua Zirael. O urro do Dragão não deu dúvidas de que ela conseguiu feri-lo.

—Como ela fez isso? – abobou-se Bjorn, com a agilidade de Ciri.

Sendo as costas um lugar perigoso demais para se estar diante de um bater de asas de um Dragão, Ciri se teletransportou outra vez para o chão. Seus olhos se voltaram para a lâmina da espada, de outrora reluzente a agora suja de sangue.

O escuro, quase negro, sangue do Dragão a manchar a lâmina de sua Zirael deu uma motivação maior a Ciri, que permaneceu a atacar com afinco e energia, teletransportando-se com sua agilidade mágica e atacando com força. Aproveitando a distração, Bjorn correu para o Dragão, golpeando suas patas com seu machado de prata. O Bruxo ria a cada urro de dor da fera. Os grunhidos de dor do dragão eram agora o seu combustível.

Mas apesar dos esforços dos dois Bruxos, o Dragão era rápido, forte. Alguns golpes foram aparados por ele, e por vezes Ciri chegou a ser ferida pelas unhas de suas patas, mas isso não diminuía sua determinação em mata-lo. A cauda do Dragão também pegou Bjorn desprevenido, lançando o bruxo para longe dali e fazendo-o cair a metros dali. Percebendo estar ileso da queda, o Bruxo tornou-se agradecido aos deuses por estar usando Quen naquele momento, do contrário estaria morto.

Ciri não se lembrava de quanto tempo esteve atacando-o, até sentir-se arfando de cansaço. Tendo uma energia quase inesgotável graças às suas mutações, Bjorn sequer trazia uma gota de suor em sua testa, mesmo usando uma pesada armadura ao estilo de Skellige. O Dragão ainda estava resiliente, mas um pouco de sangue escorria agora de seu couro negro, salpicando o chão. Agora a Bruxa entendia porque boa parte dos matadores de Dragões consistiam em equipes. Sem dúvida, este era um trabalho exaustivo e perigoso demais para uma só pessoa.

Mas um golpe incisivo ajudou a romper a tenacidade do Dragão negro. Reunindo forças em seus braços, Bjorn deu um golpe fortíssimo com seu machado de prata na pata do Dragão. Tão forte que o Bruxo de Skellige foi contemplado com um dedo decepado, seguido de um agudíssimo urro do Dragão, que o fez duvidar se havia escutado, na verdade, um grito feminino. Isso deve ser coisa da minha cabeça, pensou.

Segurando firmemente Zirael, Ciri correu para aproveitar a queda da resiliência do Dragão e ataca-lo com precisão. Iria agora reunir o resto de suas forças e dar um golpe em sua cabeça, capaz de penetrar a sua dura pele e acertar alguma veia importante e, assim, encerrar de uma vez a luta. Mas logo que a bruxa chegou à cabeça do animal e ergueu sua espada para golpeá-lo, os reflexos sobre-humanos de Bjorn lhe alertaram para outra coisa.

Ainda há uns bons metros de Ciri, uma flecha seguia sua trajetória, estando cada vez mais perto de fatalmente acerta-la.

—Ciri, cuidado! – gritou Bjorn. Alertada pelo bruxo de Skellige, Ciri fez a flecha ricochetear para longe com um preciso golpe de sua espada Zirael. “Geralt ficaria orgulhoso e certamente puxaria minha orelha”, pensou com diversão a Bruxa.

Seu atraso de milésimos custou caro. Apesar de ferido, o Dragão percebeu as intenções de Ciri, imediatamente batendo suas asas e voando dali com extrema velocidade. Ciri desiquilibrou outra vez, retornando ao solo e assistindo o Dragão voar para longe dali.

Soltando uns bons palavrões, Ciri observou o Dragão negro rapidamente se tornar pequenino no horizonte. Bjorn agachou-se à grama e recolheu o dedo decepado do Dragão, guardando-o em sua pequena bolsa. Com um grande sorriso nos lábios, o Bruxo caminhou para perto de Ciri, com seu pesado machado de prata pendurado em seu ombro.

—Ele certamente fugiu para o seu covil. Vencemos a batalha, mas não a guerra.

—Alguém atirou uma flecha em mim! – indagou Ciri.

—Sim, eu vi. Estranho, não? Por que alguém atacaria você?

—Não sei. Aquele Dragão com certeza estaria morto agora se não fosse por aquela flechada ter me atrapalhado. Não entendo o que aconteceu. Estamos em campo aberto e claramente não havia ninguém por aqui.

—Acho que o disparo veio daquele bosque ali. – disse Bjorn, apontando para a vegetação, um tanto distante dali. Ciri riu, ao apertar os olhos e perceber para onde o b.

—Ah por favor. Está um tanto longe, não? Que arqueiro poderia dar um tiro tão preciso assim, e de tão longe?

—Um elfo conseguiria. – deduziu Bjorn. – Mas se essa flechada te preocupa tanto, podemos investigar isso. Não teremos Dragão algum para lutar agora, afinal. Pode estar há quilômetros de distância.

—Seria bom descobrirmos, senão esse desgraçado irá nos atrapalhar da próxima vez. Ah, se eu tivesse acertado aquele golpe... – alertou Ciri.

—Vou encontrar essa flecha. – disse Bjorn, olhando pelas campinas. Não era necessários maiores detalhes do que o Bruxo de Skellige estava fazendo. Usando seu sentido sobre-humano para encontrar a flecha. Ciri e Bjorn caminharam em silêncio por uns bons metros até encontrar o que restou da flecha, depois do golpe de Ciri. Tendo o pedaço de flecha em suas mãos, Bjorn o estendeu para Ciri.

—Uma coisa eu tenho certeza. Não é uma flecha nilfgaardiana. – disse o Bruxo.

—Espere... – balbuciou Ciri, pensativa. – Esta é uma flecha de um Scoia’tael!

—Tem certeza? – estranhou Bjorn. – Há anos não tenho ouvido falar dos Esquilos. Dizem que estão extintos.

—Sim, eu sei. Mas ainda assim... Essa é uma flecha de ponta dourada. O material dessa flecha também é de primeira qualidade. Uma flecha construída por quem sabe extrair com presteza tudo que a natureza tem de melhor a oferecer.

—Elfos. – concluiu Bjorn. – E obviamente anões, quando o assunto é aço e espada. Mas é fato de que os elfos são os melhores arqueiros do mundo. Por isso, não me espanto que o arqueiro que “quase” te acertou seja um elfo.

—Mas afinal, porque esse arqueiro nos atacou? – balbuciou Ciri. – Será que ele estava protegendo o Dragão?

A hipótese de Ciri soou tão absurda aos ouvidos de Bjorn que o Bruxo riu.

—Impossível. A não ser que ele fosse um druida. Podemos investigar o bosque, se quiser.

—Melhor não. Estaríamos em desvantagem, no elemento dele.

—Eu sou capaz de sentir presenças. Não conseguiriam me emboscar.

—Mas eu não. Melhor irmos embora. Além disso, minha espada Zirael precisa de reparos. – disse Ciri, chamando sua égua Pandora com um forte assobio. Bjorn fez o mesmo, chamando seu cavalo.

—Assim como Havenkar, o meu machado. Tem razão. Vamos embora. Estou ansioso demais em ver a cara de pateta do Magistrado, depois desse dragão ter sobrevoado Lathlake. Aposto que teve que trocar de calças!

Ciri teve vontade de rir da gargalhada divertida de Bjorn.

—Irei exigir um pedido de desculpas formais por ter me chamado de mentiroso.

—Não duvido. Resta saber se ele aceitará. – observou Ciri, enquanto montava em sua égua e seguia de volta para o vilarejo de Lathlake, e desta vez acompanhada de Bjorn. A Bruxa já se preparava para o turbilhão de perguntas que teria de enfrentar, assim que colocasse seus pés no vilarejo. Não poderia reclamar, afinal não era todo dia que um dragão resolvia voar pelos céus, tão perto dos moradores. Por sorte, o dragão apenas os assustou.